segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

COMÉRCIO: UMA TENTATIVA DE, A PARTIR DO PASSADO, ADIVINHAR O FUTURO (2)





  Estamos, portanto, em 1982, em que para além de assistirmos a várias desvalorizações cambiais do Escudo, também, por força de empréstimos vultuosos no exterior, e para que estes fossem concedidos, autorizámos o FMI a intervir na economia portuguesa impondo regras pretorianas.
Apesar de uma inflação elevadíssima e de falências em catadupa na indústria, o comércio de rua, fruto da sua concentração “aguentou-se” bem e até, curiosamente, abriram alguns “shopings” dentro da cidade. Embora houvessem insolvências, comparativamente, foram raras. Chegamos então a 1986, em que, juntamente com Espanha, foi assinado o tratado de adesão à então CEE (Comunidade Económica Europeia), passando a fazer parte de doze países membros da futura Comunidade Europeia, hoje com 27 Estados-membros.
É então, fruto desta adesão que traz milhões em subsídios para o país, que começa o espartilhamento do comércio de rua. Se por um lado aumenta o consumo, por outro, assiste-se à descentralização dos centros de venda. Até esta data, falando de Coimbra, todas as aldeias, vilas, como por exemplo Lousã e Condeixa, e cidades em redor, como por exemplo, Aveiro, Viseu, Guarda e Leiria vinham abastecer-se em Coimbra. Como, progressivamente, começam a abrir vários estabelecimentos de moda em tudo o que era aglomerado de pessoas, a cidade, inevitavelmente, foi perdendo importância estratégica como baluarte comercial.
No aspecto residencial, o centro da cidade, resultado do apogeu comercial, uma grande maioria de comerciantes, proprietários de prédios com lojas no rés-do-chão, tinham transformado os seus andares superiores em armazéns de apoio ao estabelecimento térreo. Mais grave ainda: tinham suprimido as entradas individuais de acesso.
Por sua vez, como a maioria da habitação no centro histórico (Alta e Baixa) era decrépita, de má qualidade, e muitos dos locados nem casa de banho possuíam, a autarquia, utilizando verbas de programas de fomento à habitação social, foi autorizando e construindo bairros que deslocalizaram muitas centenas de pessoas para a periferia. Ao mesmo tempo ia esvaziando o centro histórico de automóveis e, servindo cada vez pior de transportes colectivos, ia impondo a ditadura do pedonal. Numa política calculada, “semeava” parquímetros em tudo o que fosse espaço para estacionar.
Em 1993 abrem em Coimbra duas grandes superfícies comerciais: o Continente e a Makro. Com estas aberturas comerciais, no centro da cidade, começa a razia de encerramento indiscriminado das mercearias e lojas de electrodomésticos. Por esta altura, em 1994, resultado da assinatura de Portugal à Organização Mundial de Comércio, começam a surgir as lojas dos “300”, que, a par das duas grandes superfícies, “rebentam” com muitos estabelecimentos quase centenários de artigos decorativos e lojas de ferragens.
Por outro lado, com abertura destas duas mega-superfícies, assiste-se à criação de novas centralidades e, residencialmente, há uma nova vaga de deslocalizações. Consequentemente assistimos a uma nova variação de fluxos e afluxos à cidade de Coimbra: por um lado, o consumidor da loja de rua, até aí fidelizado, começa a mudar-se para os novos mega-centros de consumo. Por outro lado, a periferia, já autosenstável comercialmente, através dos seus novos estabelecimentos, pela novidade e preços, desvia o cliente das suas pequenas lojas para estas novas catedrais de consumo. Ou seja, este consumidor das zonas limítrofes da cidade, ao deixar de comprar nas suas terras, empobrece o seu pequeno comércio nativo em favor do emergente. Mas, curiosamente, nesta deslocação, também não vem favorecer a cidade enquanto coração do pulsar comercial, uma vez que o seu trajecto é directamente planeado entre a sua residência e a superfície de compras. E naturalmente, perante este cenário de deserção, o centro histórico vai ficando cada vez mais esquelético e solitário. E entra o novo século XXI.
Se vos quero fidelizar a ler o que estou a escrever, tenho de fazer uma paragem para um pequeno café…pode ser no Santa Cruz, na Baixa de Coimbra, você conhece. Já volto a seguir.

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