segunda-feira, 2 de agosto de 2010

A RUA DO CALCETEIRO DE ALMOXARIFE...





 A Rua do Almoxarife é uma curta perpendicular às artérias das Padeiras e Eduardo Coelho. Durante décadas, situada na toponímia do casario histórico, foi uma rua perdida nas trevas, apagada, tanto comercialmente como em habitação. Para além de poucas pessoas a morarem na rua estreita, praticamente só uma catedral se manteve nesta viela durante as últimas décadas: a Tasca da Maria. Nesta igreja, onde todos os dias se rezam sem ajoelhar e há confissões sem padre, teima em resistir às alterações comerciais que quase diariamente ocorrem no Centro Histórico. Ali, naquele recanto pantagruélico quem mais ordena é o povo trabalhador do comércio. À volta dum carapau e dum copo “de três”, naquele pequeno espaço de tertúlia, todo o cristão é religioso, boémio e anticristo.
 Nos últimos anos, talvez para provar que as ruas também são dinâmicas, e que hoje um beco morto pode ser amanhã um recanto cheio de vida, a Rua do Almoxarife foi reocupando os seus espaços comerciais e habitacionais. A fazer companhia à tasca da Maria, na revitalização anímica, está a pequena frutaria da simpática Isabel Gândara.
 À hora do almoço, quando eu ia a passar, chamou-me. Estava na companhia do filho. “Já há uns dias que ando para lhe dizer…por causa daquela tampa de saneamento” –e aponta uma cobertura em ferro mas que está com a pedra que a recobre praticamente toda quebrada-, já ali caiu tanta gente. Ainda na semana passada uma velhinha estatelou-se ao comprido…como o senhor normalmente comunica estas coisas lá à câmara. Olhe que há cerca de três semanas o meu marido andou aí a calcetar o chão. Só que como a tampa de ferro é em pedra branca, aí, já não consegue, senão arranjava-a também.” –eu sei que foi verdade. Nesse dia, o Jaime, um ex-comerciante, veio ter comigo a correr: “ó pá, traz a tua máquina fotográfica e vem à Rua do Almoxarife para colheres umas imagens espectaculares: o marido da Isabel da frutaria anda ali a tapar os buracos na calçada. É um bom exemplo…”. Acontece que naquele momento não me foi possível e quando saltei em busca do “boneco” o cidadão já se tinha ido…

3 comentários:

Jorge Neves disse...

Mais do mesmo nas ruas da Baixa

Anónimo disse...

O que me chama a atenção neste texto(e que me deixa contente)é o facto de as pessoas da baixa quando têm algo para dizer ou mostrar,seja bom ou mau,lembram-se do Questões e do Luís.É engraçado,não é?
Isto é demonstrativo,acho eu,do bom trabalho que o amigo tem vindo a desenvolver.Deve ser recompensador.Por outro lado,é a prova de que os canais institucionais não funcionam como deve ser.
Mas que interessa isso?Temos o Questões Nacionais e o Luís do Encanto da Freiria!
Parabéns e obrigado Amigo.
Marco

LUIS FERNANDES disse...

Obrigado aos dois por terem comentado: ao Jorge Neves e ao Marco pinto. Quanto aeste último, resposta, sempre lhe vou adiantando que por um lado é bom, por outro nem por isso. No lado bom, é que realmente uma pessoa sente que está adesempenhar um papel útil em prol de um colectivo melhor. No lado menos bom: é que às vezes as pessoas pensam que uma pessoa não faz mais nada senão escrever e ouvi-los. Mas, mesmo assim somando os dois -bom e menos bom- numa balança, sinto que, no dia-a-dia, estou a contribuir para dar voz aos apelos de muitos gritos contidos dentro do peito de muita gente.
Abraço. Como sempre é generoso.
Obrigado meu amigo.