segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

MORRER NO DIA DE NATAL



 O meu cão morreu ontem. Não que pretenda transformar este acontecimento num drama de baba e ranho. Nada disso! As coisas são assim mesmo, entendo. Primeiro prezo os humanos e só depois vêm os animais. Mas é sempre uma perda. No curto tempo de vida dos animais, afeiçoamo-nos completamente. Eles estão sempre presentes nos momentos mais alegres ou tristes das nossas vidas. Com aquele olhar inexpressivo, de meiguice e complacência, talvez como a tentar compreender a frieza e inumanidade de que somos feitos, de boca aberta a arfar e a dar ao rabo, o meu cão “Dim” vai deixar-me saudades. Morreu de uma dessas doenças da moda que dizimam os nossos amigos fiéis, a “Leishmaniose canina”. Morreu como sempre viveu. Isto é junto a nós. Há uma semana estive para o mandar abater. Numa última esperança, talvez para me evitar o peso, os meus filhos, em última instância de lhe prolongar a existência, levaram-no ao veterinário. Depois de fazer análises, diagnosticou então o clínico que os órgãos internos ainda não estavam muito afectados e poderia durar mais um tempo. Mentalmente fiquei contente. Pensei para comigo que às vezes, num apriorismo bacoco, desistimos de algumas iniciativas por as catalogar antecipadamente. Afinal, tal como os médicos humanos, os veterinários também se enganam, e o cão morreu ontem. Não é que esta ocorrência seja algo de novo para mim, já enterrei vários animais, mas, mesmo assim, não deixa de me provocar um vazio. Afinal, durante muitos anos, foi o nosso guardião, durante a noite e o dia. É nesta partida que, como sempre, ficamos a pensar se fizemos tudo o que deveríamos fazer. E escrevo isto porque, apesar de gostar muito de animais, não ando com eles ao colo e a tratá-los melhor do que algumas pessoas chegadas. Para mim, os bichos, serão sempre uma projecção dos nossos sentimentos. Uma espécie de espelho que mostra a alma. Ou seja, quem não gosta e não respeita os animais não poderá nunca ser grande ser humano.
Foi num extraordinário dia de Sol, símbolo de vida, de esperança, que depositei hoje o meu “Dim” numa cova aberta no meu quintal. Mais uma vez, igual a outras, perante aquele corpo estático e retesado, fiz a comparação connosco, humanos. A dissemelhança é enorme.
Ainda há dias o meu cão, sempre que me via ou pressentia ao longe –porque eles têm um faro apuradíssimo- apesar de doente, abanava o rabo de contentamento, como a querer transmitir-me que a sua doença, na comparação com a alegria que parecia sentir por me ver, era uma coisa menor. O simples facto de estar vivo era uma graça.
Hoje, ao ver aquele corpo hirto, não pude deixar de pensar também que na morte, no acto supremo, no fim do caminho percorrido, há uma enorme semelhança connosco. Neste acto de dar o último repouso a um animal, faço sempre analogia com um humano e vêm-me à memória as palavras do padre: “veio da natureza e, no fim da missão, no fim da vida regressa à mesma natureza:”


2 comentários:

Liliana Azevedo disse...

devo confessar que este seu texto me fez chorar. Adoro animais e também eu senti muito a perda dos meus. Afinal de contas eles fazem parte da família. Estão sempre lá, felizes só pelo simples facto de nos verem. Tenho a certeza que o Dim foi feliz enquanto foi vivo e sei que ele agora é uma estrelinha que descansa em paz num "mundo" melhor. Beijinho

LUIS FERNANDES disse...

Obrigada, Liliana. Sei -porque te conheço desde criança- que és uma boa pessoa. Tens bem a quem sair -estou a lembrar-me do teu pai, que era um óptimo Ser Humano.
Um grande abraço e muito agradecida.