terça-feira, 7 de junho de 2011

O TAIPIO JÁ VOLTOU DO HOSPITAL





 Em metáfora, se as cidades são jardins, as ruas serão canteiros e as pessoas que nelas habitam serão flores. Sempre que uma destas rosas adoece, e temporariamente ou definitivamente desaparece, o canteiro fica mais empobrecido. Tal como nos jardins verdadeiros, nestas “leiras” em forma de artérias, há umas plantas que se tornam mais marcantes e outras menos. Há algumas que até picam sem lhes chegarmos. No entanto, para equilibrar, há outras que são ternas, sedutoras, estão ali apenas porque cumprem uma missão existencial. É como se entendessem que não querem mais do que viver simplesmente. Não perturbam o ambiente à sua volta, não fazem guerra a ninguém. Precisam somente que as deixem em paz.
O Taipio, o chinês da nossa rua, poderia perfeitamente ser uma dessas flores. Está instalado há muitas décadas na Rua Eduardo Coelho, no Largo do desaparecido armeiro Carlos Almeida. Acontece que há cerca de um mês teve um AVC, Ataque Vascular Cerebral. Esteve internado no hospital. Naturalmente que fui lá vê-lo. Fiz o mínimo. Ir lá era quase uma obrigação. Teve lá muitos amigos a saber como estava a sua saúde.
Hoje veio visitar-me. Já saiu da unidade hospitalar. Está a fazer fisioterapia diariamente. Ainda arrasta um pouco a voz e ficou ligeiramente “apanhado” do lado esquerdo. Tenho a certeza de que irá recuperar. É isso mesmo que todos esperamos. Que as suas melhoras sejam rápidas. Os seus vizinhos, os seus clientes de pilhas, de braceletes e outros pequenos serviços, tenho a certeza, sentem-lhe a falta.
Ver o Taipio todos os dias lá no largo era como um vaso com uma rosácea. Há um mês que falta lá animação. Está mais vazio e sem cor. Falo por mim, todos os dias quando lá passava atirava: “então, novidades?”. E ele, umas vezes com ar sério outras nem por isso, respondia-me sobre o que sabia. “A menina Ernestina, aquela velhota que ainda é virgem, e que mora no 13, anda a lançar uns olhares de engate ao “Chico” sismólogo. Queres ver que é desta que ela vai perder os três vinténs?”. E ríamo-nos a bandeiras desfraldadas. É assim o “Vitinho”, como também é conhecido cá na nossa rua. Isto tudo para dizer que o “canteiro”, sem a sua presença, está mais soturno e sem graça. Desde que ele foi internado a Rua Eduardo Coelho não voltou a ser a mesma. Pode ser impressão minha, mas, sobretudo à noite, o silêncio parece mais triste e cheio de dor. Se calhar sofre pela ausência do mais simpático chinês da nossa rua.

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