UM MURRO NO ESTÔMAGO...
Conhecia a “Conquiscentro”, uma casa de tintas e vernizes, há mais de duas décadas ali na estrada velha de Lisboa. De vez em quando ia lá comprar o que precisava. Ao longo dos últimos anos fui-me apercebendo do encolher de empregados. De cinco funcionários, o quadro de pessoal foi minguando. Até há cerca de três meses, que já só restava a Eugénia.
Há um mês e pouco encontrámo-nos por aqui, na Baixa, e ela, de olhos cabisbaixos, sem aquela alegria tão característica, tão própria dela, em simpatia esfusiante, como se me estivesse a comunicar o falecimento de alguém muito próximo, disse: “pediram a insolvência. Dentro de dias –não sei quantos- vamos encerrar!” –notei que as suas órbitas se inundaram repentinamente e, de dentes cerrados, fez um grande esforço para não chorar. Lá lhe disse aquelas palavras de circunstância, que se dizem a quem está muito abalado pela tristeza: calma, Eugénia, não perca a esperança. Às vezes fecha-se uma porta mas, logo a seguir, abre-se uma janela.
Hoje fui lá à loja e encontrei-a encerrada. Embora já antevisse, pela comunicação da leal funcionária, mas a verdade é que foi um choque. Não é o primeiro que sinto, infelizmente. É uma sensação esquisita, como se naquela partida se fosse um pouco de mim. As firmas, enquanto entidades jurídicas, têm personalidade. Mas a sua vivência entre nós, ao longo das décadas, faz parecer que ganham alma na vivência da cidade. Bem sabemos que os estabelecimentos, como tudo, estão sujeitos à lei da vida: nascimento, apogeu e morte. Mas custa muito ver desaparecer estes pedaços de memória. E quanto não custará à Eugénia que trabalhou lá 30 anos? Enfim, talvez valesse a pena pensar no assunto. Não é tão linear quanto parece…
1 comentário:
Finalmente por aqui passei!
Mais importante do que quer que se diga é sem dúvida o que se faz nestes caminhos em que nos vamos cruzando. Obrigado pelo encorajamento.
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