sexta-feira, 9 de outubro de 2009

EDITORIAL: ESTE PAÍS É UMA COMÉDIA

(ESTA IMAGEM FOI TOMADA DE EMPRÉSTIMO, COM A DEVIDA VÉNIA, AO "JGARGJ", DO NETLOG)



Como se sabe, termina, finalmente, já no domingo o ciclo de eleições que, nos últimos meses, atravessou o país de lés-a-lés.
Começo por dizer, e já o escrevi aqui várias vezes, de que é preciso votar. Usar o direito de sufrágio é decidir. É não deixar aos outros a possibilidade de escolherem por nós. Não interessa em que partido se vota, tendo em conta o fim a que se destina. Tenho para mim que o universo partidário não se divide entre partidos bons e maus. Todos concorrem para a defesa dos seus eleitores. Evidentemente que cada eleitor deve votar naqueles que, quer ideologicamente, quer pragmaticamente, se identifica, quer para o parlamento europeu, quer para o parlamento nacional, quer para as eleições regionais. A questão é fazer uso de um direito/dever que custou muito a conquistar. O direito de voto, ainda que seja residual na eleição, é talvez a maior afirmação da individualidade na decisão colectiva. Ninguém pode dizer que ama a sua liberdade e respeita a dos outros se não exercer o direito de voto.
Eu até entendo quem não vota. Metaforicamente, passando para o outro lado do espelho, o que vemos? Uma “catrafada” de gente, maioritariamente, apenas preocupada com um lugar ao sol. Procuram simplesmente uma reforma dourada. Prometem o céu até às eleições. Depois da contagem dos votos esquecem tudo. O maior paradigma hipócrita é andarem nas campanhas a darem beijinhos a tudo o que é mulher. Nesta fase serão mesmo democratas. No dia seguinte às eleições, beijinhos só mesmo no melhor torrão de açúcar. Nos apertos de mão a mesma coisa. Por exemplo, aqui em Coimbra, em campanha, todos visitam o centro histórico. Andam de loja em loja a cumprimentarem os comerciantes. Fora do período pré-eleitoral, quem viu por aqui o actual presidente da Câmara? Ou os outros candidatos? Alguma vez compraram alguma coisa numa destas lojas? Saberão alguma coisa do que se passa actualmente no comércio dito de tradição?
Os políticos que almejam uma boa fatia de poder –não todos, obviamente, é preciso não generalizar- são como actores de teatro que estão sempre prontos para desempenhar qualquer papel cénico. Pode ser o de vilão ou o de melhor pessoa do mundo. A peça, diga-se o lugar a conquistar, é que vai dizer qual a performance a desempenhar.
Depois passemos à profusão de panfletos distribuídos nas campanhas. Quantas fortunas se gastam nesta altura? E para quê? Quantas pessoas, verdadeiramente, lerão os programas dos candidatos? E os poucos que se dão ao trabalho de os lerem acreditarão no que está lá escrito? Actualmente, com o elevado desenvolvimento da imprensa escrita e falada, fará sentido este desperdício que são os panfletos eleitorais? Creio que não. O que seria preciso é que os jornais e a televisão cumpram mesmo o seu papel de informar os seus públicos, respeitando todos os candidatos, partidários ou independentes, de igual modo, sem ter em conta o seu peso eleitoral. Se a imprensa cumprisse não seria preciso gastar milhões em outdoors que conspurcam as nossas aldeias, vilas e cidades, e que se irão manter até muito depois do Natal. Já para não falar nas ofertas de isqueiros, canetas, chouriços, máquinas de lavar. Será que ninguém vê que a corrupção começa aqui? Se uma funcionária pública, sendo a lei levada à letra, não pode receber um simples ramo de rosas, porque motivo os candidatos políticos, que irão concorrer para gerir os destinos de todos, podem oferecer o que lhes der na real gana? Deveria ser obrigatoriamente proibido toda a oferta de bens tangíveis. É que a discriminação começa aqui. Quanto maior é o partido, ou a riqueza do candidato, maior serão as suas ofertas para corromper os eleitores.
Toda a lei eleitoral deveria ser revista com urgência. Hoje, passados mais de trinta anos de democracia, nesta área de divulgação eleitoral, continuamos na mesma, como se estivéssemos em 1974.
E mais ainda: deveria ser criado um colégio eleitoral (ou um senado, o nome é irrelevante) para decidir, em caso de dúvidas levantadas pelos eleitores, quem pode ou não candidatar-se. Refiro-me a candidatos indiciados na justiça, refiro pretendentes condenados em trânsito em julgado, refiro aspirantes políticos –e esta medida é mais polémica- que prometendo o céu, depois de eleitos, transformam a nossa vida num inferno. Este órgão seria uma espécie de Tribunal Constitucional na análise de perfil de candidatos, sempre que fosse chamado a intervir.
É natural que num primeiro momento se pense que tal medida viria colidir com a liberdade constitucional de cada um poder candidatar-se a um cargo político. O problema é que, para defender essa mesma liberdade, é preciso fazer a monda de ervas daninhas. A bem do bom trigo político é preciso expurgar o joio.
Agora, voltando novamente para este lado do espelho, no próximo domingo é preciso votar. Não lhe vou dizer que o deve fazer em consciência porque isso é uma frase feita. Vote antes com alguma racionalidade, a possível, dentro da informação que dispõe do candidato. Mas vote mesmo. Não se pode manter o actual sistema com índices de abstenção na ordem dos 40 por cento em média nas eleições europeias, legislativas e autárquicas. Se todos continuarmos neste deixa correr o sistema entra em colapso. Que ninguém pense que pelo facto de não votar que vai obstaculizar a eleição. Os candidatos, com mais ou menos votos serão sempre eleitos.

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