quinta-feira, 4 de setembro de 2008
UM CASO PEDREGULHOSO NA JUSTIÇA
O caso Paulo Pedroso está aí na boca de toda a gente. Como se sabe, este dirigente do PS viu-se envolvido, em 2003, no “escândalo Casa Pia”. Segundo o Jornal Público, “É a 21 de Maio de 2003 que o Juiz Rui Teixeira pessoalmente pede o levantamento da imunidade parlamentar do deputado, para que “seja detido, constituído arguido e presente a um primeiro interrogatório judicial.” O próprio Pedroso anuncia-o numa conferência de imprensa no Parlamento.”
Continuando a citar o jornal, “No final desse dia, Pedroso sai do Parlamento para o Tribunal de Instrução Criminal, onde é interrogado durante a noite e a madrugada por suspeita de envolvimento em 15 crimes relacionados com práticas sexuais com menores. Na manhã seguinte é detido preventivamente, seguindo para o Estabelecimento Prisional de Lisboa, de onde só sairá 4,5 meses depois.”
Agora, como se sabe, em primeira instância, Pedroso ganhou a acção contra o Estado Português por ter estado preso preventivamente. Segundo o acórdão condenatório, “os indícios eram insuficientes para imputar ao arguido qualquer crime concreto (…) para além de mais “não ocorriam os perigos de perturbação do inquérito e da ordem e tranquilidade pública”, alegados pelo procurador João Guerra e ratificados pelo Juiz de Instrução Rui Teixeira.
E aqui começa o calvário para entender as diversas posições, do Ministério Público, do Juiz de instrução e agora a sentença das Varas Cíveis do Tribunal da Relação de Lisboa.
Comecemos pelo procurador João Guerra. Ao propor ao Juiz de Instrução a Prisão preventiva de Paulo Pedroso, certamente fê-lo perante os fortes indícios de culpabilidade em presença e só assim se entende que os seus argumentos convencessem o Juiz Rui Teixeira, e este desse seguimento à prisão preventiva.
Com o sabemos o Ministério Público e o Juiz de Instrução são dois pilares fundamentais do edifício da justiça, que actuando interligados, são órgãos independentes entre si. Ora aqui já podemos começar pelas interrogações. Se há época seriam indícios demolidores para os dois pilares de um órgão de soberania (tribunal), como é que hoje, à luz do Tribunal da Relação de Lisboa, os elementos de prova eram insuficientes para imputar ao arguido qualquer crime concreto? Considerando despiciendos os juízos de valor, uma interrogação ressalta à vista: serão estes dois homens, João Guerra e Rui Teixeira, tão negligentes ao ponto de, no caso em análise, sem uma ponderação exigível, optarem, os dois, arbitrariamente, pela medida de coacção mais grave?
Continuando a especular, como se falou à época, poderemos também entender este ilegal procedimento dentro da tese de cabala para destruir a cúpula do PS? E estes dois homens, experimentados profissionais, iriam arriscar as suas carreiras para, duma forma manipuladora de indícios, restringir o curso político partidário do país, coarctando, através de um escândalo, o Partido Socialista? Há muitas perguntas que ficam sem resposta, mas a procissão ainda agora vai no adro. Estou em crer que o recurso do Ministério Público para o Supremo, e através do futuro acórdão (procedente ou improcedente) irá dar luz neste caso que, infelizmente, a ser verdade, a sentença das Varas Cíveis de Lisboa, mais uma vez envergonha a justiça portuguesa.
Poderemos, no limite, desvalorizar as acções do proponente João Guerra e executiva de Rui Teixeira, tendo em apreço que há época quase todos os crimes com moldura penal para além de três anos levavam a chancela de prisão preventiva, sem ter em conta que essa medida coactiva é um instituto excepcional de salvaguarda, de prevenção social. Mas mesmo assim, neste qui pro quo, continuamos cheios de interrogações.
Levando em consideração que após a fase de inquérito não foi deduzida acusação contra o ex-deputado, naquela altura, aquando da detenção, os factos probatórios poderiam não oferecer dúvidas aos dois magistrados. Seria assim? Ou, pelo contrário, as provas eram realmente baseadas em pequenos indícios, em minudências, e estamos, conforme diz a juíza Amélia Lopo, perante “um erro grosseiro”, um “excesso de zelo”, um “abuso de direito”? Para a dignificação da justiça, era bom que estas questões fossem respondidas nos quesitos do próximo acórdão do Supremo.
Por outro lado, todos sabemos que a pirâmide da justiça em Portugal está velha e caduca. Não se modernizou, não acompanhou o progresso e o desenvolvimento social. Quem entra num tribunal apercebe-se do que digo, que aliás as palavras não são minhas, são de Marinho Pinto, o actual bastonário dos advogados, que, pelo menos aqui, no chamar a atenção para as assimetrias e anacronismo da justiça, tem todo o mérito.
Se por um lado, a justiça, no seu pragmatismo, continua na época das luzes, finais do século XVIII e seguintes, por outro, aparentemente, tornou-se mais humanitária. Aboliu-se a pena de morte e consagrou-se a vida como o primado da lei. Porém, nos tempos que correm, o que se assiste é a um desvalorizar contínuo do valor pessoa-vida. Diariamente, quase escandalosamente, constatamos que o custo de uma vida pode ser ressarcido com uma pena suspensa ou trabalho comunitário, ou até em importância monetária…que nunca será paga pelo homicida.
Curiosamente, ou não, a escola Constitucional de Coimbra, conotada com a esquerda, numa obsessão por Direitos, Liberdades e Garantias para os arguidos tem contribuído para essa despenalização. Já a escola de Penal desta cidade, com ligações à direita, é mais pragmática com penas mais proporcionais e de acordo com alguma racionalidade.
Esta recente alteração aos códigos Penal e Processo, feita pela escola de Lisboa, relacionada com a esquerda, veio a dar no que estamos a assistir, ou seja: ninguém se entende.
Parafraseando um bom articulista, Santana-Maia Leonardo, “Para o centro-direita, os homens são capazes do Bem e do Mal, cabendo à sociedade discipliná-los e orientá-los para o Bem; para a esquerda socialista, o Bem e o Mal são conceitos relativos. O centro-direita preocupa-se com a segurança de pessoas e bens, defendendo as forças da ordem e coloca-se ao lado das vítimas; a esquerda socialista preocupa-se com as garantias de defesa do arguido, tem sempre uma justificação sociológica para o crime e acha sempre excessiva a intervenção da polícia.”
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