quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

ESTA CAPA É PARA REFLECTIR...




 Tenho por costume não entrar muito na crítica de sentenças ou acórdãos dos tribunais. No fundo, penso, caindo na esparrela facilitista de examinar de fora, apenas com informação, sem ter assistido ao julgamento e, portanto, sem conhecimento, que agindo assim, mais não estou do que a contribuir para esta onda destrutiva da justiça. Não quer dizer que esteja imune ao que se diz. Creio, apesar disso, que temos de ter alguma contenção. Ou seja, bem no fundo, acredito nos profissionais que todos os dias exercem e aplicam o direito. Não tenho nenhuma dúvida, como em todas as profissões, há bons e maus executantes. Fosse esta sociedade menos litigante, mais responsável a resolver os seus conflitos, fosse o poder político mais consciente e deixasse de legislar a esmo e transformando-nos numa sociedade garantística –hoje tem-se garantias para tudo, só as obrigações é que rareiam-, tivessem os tribunais meios para executar, e tenho absoluta certeza de que teríamos uma outra face da justiça. Isto não quer dizer que, dentro do sistema judicial, não haja imensos problemas, mas disso sabe quem lá trabalha.

Apesar do que escrevi em cima, vou criticar um acórdão de segunda instância que vem publicado hoje no Jornal de Notícias (JN). É apenas isto: uma mulher de 38 anos, psicóloga que para o caso é irrelevante, em 2007, no Terreiro do Paço, em Lisboa, conduzindo a 120 quilómetros hora, atropelou mortalmente duas pessoas e feriu gravemente uma terceira, deixando esta incapacitada.
Em Abril de 2010 o colectivo de primeira instância condenou a infractora a três anos de prisão efectiva.
Em recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, vem agora este tribunal de apelação dizer o seguinte: “Perante o circunstancialismo apurado, as penas (…) se mostram ajustadas”, lê-se no acórdão a que o JN teve acesso. Mas a Relação considerou também que basta a censura da condenação e a ameaça do seu cumprimento para que a justiça seja feita, tendo em vista a reinserção de Maria Paula na sociedade”, e, portanto, a condutora leva uma pena suspensa. Fica em liberdade mas sob vigilância apertada.

Ah, é verdade! A sobrevivente do atropelamento recebeu da seguradora da condutora meio milhão de euros, onde se incluía a indemnização pela morte da filha, de 20 anos.
Já o filho da segunda vítima mortal recebeu um cheque de 210 mil euros.

Em resumo, pelos vistos, todos os envolvidos ficaram bem. Os mortos foram para os anjinhos, os sobrevivos receberam chorudas indemnizações, a infractora melhor do que passar uns anos a ver o sol aos quadradinhos, e o tribunal, lavou as mãos como Pilatos, com o argumento da reinserção.
Mas há apenas um “senão”, os juízes esqueceram a sociedade. Perante a comunidade, a Justiça, enquanto deriva máxima da paz social, como ficará? Sairá engrandecida com esta tentativa de reinserção? Não. Claro que não. Porque contrariamente a um dos preceitos do Direito, “não prejudicar ninguém”, a colectividade fica lesada, no sentido de que, segundo Ulpianus, um jurisconsulto do Império Romano, a justiça é a vontade constante e perpétua de atribuir a cada um o que é seu”.

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