quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

UM CASO DE POLÍCIA



 O Luís Cortês é um conhecido músico de rua que anima os nossos becos e praças –habitualmente, costuma estar junto à Loja do Cidadão. Como é muito pobre, ganha a vida desta forma certamente porque a natureza ou Deus, na sua imensa generosidade, quiseram compensá-lo com este talento em retribuição pelo facto de ele ser deficiente motor. O Cortês só tem um braço e é invisual.
Nos últimos tempos, quem sabe se, talvez em cortes na saúde igualmente como o Governo, a natureza lhe esteja a retirar protecção? A verdade é que o Luís gradualmente tem ficado muitas vezes doente. No ano passado chegou a estar internado nos HUC, Hospitais da Universidade, vários meses. Como é acometido de ataques epilépticos e tem anemia, volta e meia sente-se mal e sofre uma recaidela. Quem lhe vale é a companheira, a Maria de Fátima. Para se manter direito tem de tomar muitos medicamentos para conseguir angariar uns trocos diariamente junto à Loja do Cidadão. Quem sabe se os tomará sempre? Deduzo que pela falta de dinheiro, provavelmente, muitas vezes, não o fará.
Ontem, cerca das 20h00, na sua casa, no Largo do Poço, o Luís começou a perder o pé, caiu esmurrou-se e começou a vomitar. Vamos dar a palavra à Fátima: “quando vi o seu braço todo negro, e como não se tinha em pé e sempre a vomitar, liguei para o 112 e contei o que se estava a passar. Disseram logo que não era caso urgente para vir uma ambulância e para o transportarem ao hospital. Eu queria explicar, mas despachavam-me sempre. Fiz sete chamadas para este serviço de urgência e disseram sempre a mesma coisa. Eu explicava que ele tinha caído, tinha um braço todo negro. Não se tinha em pé e estava a vomitar, mas eles não queriam saber. Disseram que fosse de táxi.
Angustiada com a situação do Luís fui à praça de carros de aluguer, junto à 2ª Esquadra, e contei ao motorista o que se estava a passar. O taxista, como o Cortês estava a vomitar, disse que era um acaso de ambulância e não o podia transportar porque lhe sujava o carro todo.
Fui a pé aos Bombeiros Voluntários, na Avenida Fernão de Magalhães. Fui muito bem atendida pela funcionária, mas não tinham motorista de noite para conduzir a ambulância. A senhora, numa gentileza, talvez condoída com a minha situação, do meu telemóvel, ligou para o 112 e também a ela lhe responderam que não era caso de socorro urgente. A funcionária interrogou: “não era caso… como não era caso urgente? Se uma hora antes o 112 tinha transportado um indivíduo que estava caído numa rua da Baixa em coma alcoólico?”. Responderam do outro lado, “que aí era um caso diferente, porque o bêbado poderia morrer asfixiado!”
Fui à 2ª Esquadra da PSP pedir auxílio e contei o que se estava a passar. Ligaram também para o 112 e veio então uma ambulância da Cruz Vermelha de Pereira do Campo. Chegámos ao hospital era meia-noite. O Luís ficou lá internado.
Isto estará certo, senhor Luís? Porque é que nos fazem isto? Será por sermos pobres? Quatro horas à espera para ser socorrido. Estará isto bem? No ano passado, através do telefone, disseram-nos que tínhamos de mudar de número de porta… é o 69! Se calhar já memorizaram e, como é um prédio, já lá foram várias vezes para o segundo andar e até para o terceiro, às tantas, pensam que somos nós que estamos sempre a chamar. Será isso?"


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