Esta coisa de uma pessoa ser interrompida a qualquer hora pelo toque do bip está mal. Ainda bem –salvo seja- que as coisas estão más como ó camano e não dá para manter o telemóvel, caso fosse assim, ainda seria pior. Não é por nada, mas aquele toque invade-me o mais profundo da alma, não sei se estão a ver, e fico irritado, pronto! É que há situações em que o toque, para além de invasor, é martirizador. Não sei se conseguem acompanhar, mas imaginem, uma pessoa está assim no “bem-bom”. Está a subir a montanha, assim a fazer um esforço danado para aguentar a carruagem nos trilhos, assim para não descarrilar e deixar a passageira a ver passar os comboios, de repente toca o aparelho…pumba, lá se vai a tracção às quatro rodas.
Isto só para dizer o quê? Que andava eu hoje em serviço de grande reportagem de investigação na Baixa quando me toca o espalhafatoso bip. Fiquei capaz de morrer, eu seja ceguinho! É que o raio do aparelho denunciou-me logo. Fui apanhado em flagrante com a boca no trombone. Por acaso foi chato, porque a coisa até estava a correr bem. Cheguei à Rua das Fangas deveriam ser aí umas sete da manhã. Coloquei-me escondidinho atrás da escuridão de uma porta semi-aberta, preparei o material e esperei. Estava um frio gelado como ó caraças, fogo! Mas trabalho é trabalho e frio é frio. Eu estava ali para descobrir porque é que o Encarnação vai dar ao slide da autarquia.
Eram então nove e pouco, quando ele abriu a porta com aquele ar dolente, de olhos semi-cerrados, a fazer lembrar o falecido Abecassis da Câmara Municipal de Lisboa, não sei se conheceram. Se calhar não?! Olhou para cima, revirou os olhos para baixo, espreitou o céu, e só então se pôs ao caminho. Um cão rafeiro, talvez frustrado com o frio da manhã ou, quem sabe, descontente pelo abandono precoce do presidente, ainda ensaiou um ladrar de raiva, mas quando viu a perna do político em posição de ataque, desistiu.
E toc…toc…toc…o som dos sapatos de Encarnação martelavam a calçada. E eu atrás dele, embrulhado na sombra da neblina matinal, atento aos sinais exteriores de aparência a ver se descobria alguma coisa. Foi então que tocou o bip. “Bip…bip…bip”, fosca-se, eu bem tentei subir a gola do sobretudo coçado como o raio e fazer baixar o chapéu de abas largas, mas qual quê? Estava apanhado. O homem do PSD, presidente camarário por mais uns dias, virou-se para trás e, desmesuradamente, abriu os olhos de espanto. Nunca pensei que conseguisse abrir tanto as persianas, sério, até fiquei banzado. Pôs-se hirto, mudou de cor, colocou novamente a perna em posição de ataque e os braços em defesa. “Mau mau! O melhor é zarpar daqui e seguir o exemplo do rafeiro lá atrás, no início da rua”, pensei cá com os meus botões.
Fui então telefonar para o director Luís Fernandes. Como sempre este tipo é um estropício. Como eu arfava mais que uma locomotiva a vapor, nem dei grande troco ao gajo. Só percebi, “faça o favor de ir hoje ao café Santa Cruz às 14h30, vai haver uma conferência de imprensa para ajuda aos sem-abrigo da Baixa, e sob o lema “traz um pacote de café ou açúcar”. Por acaso a ligação estava com um ruído estranho, até parecia que estava a ser escutado, e nem ouvia muito bem. Ainda interroguei o Luís Fernandes, “mas diga-me lá, ó chefe, mas os sem-abrigo, de que fala, são os comerciantes?”, mas qual quê, não obtive resposta. Parece coisa do diabo, há dias que nada corre bem. E lá fui eu então à hora marcada para o melhor café da Baixa.
Na mesa central da conferência jornalística lá estava o Armindo Gaspar, o presidente da APBC, Agência para a Promoção da Baixa de Coimbra, e o Jorge Alves, o presidente da associação Integrar.
Fiquei muito mais descansado depois de os ouvir, afinal, felizmente, não tem nada a ver com a distribuição de café e açúcar aos comerciantes. Eu tenho cada uma! Palavra, até fiquei de trombas comigo próprio. Porra, porque é que uma pessoa há-de logo pensar o pior? Está bem que as coisas, cá para os lados dos comerciantes, estão pelo piorio, mas também não é tanto assim…que diabo!
Trata-se então de um “desfile solidário de Natal” que se irá realizar no próximo Sábado e que percorrerá as ruas da Baixa. A concentração será junto à Casa Aninhas, pelas 10h00, em frente à Câmara Municipal de Coimbra. A ideia é que cada participante leve vestido uma peça alusiva ao Natal ou, isso seria o ideal, que vá vestido de Pai Natal. O que se pretende é, por um lado, dar animação ao Centro Histórico, por outro, é que as pessoas contribuam com um pacote de café ou de açúcar.
Portanto, faça o favor de se vestir de Pai Natal e, no próximo Sábado, participe. Agora não se desculpe com a falta de açúcar nas prateleiras dos supermercados para não dar nada. Pode levar, em substituição, um litro de mel da Lousã, ou, sei lá, um presunto de Chaves. Eles aceitam tudo…
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