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Segundo o Jornal de Notícias de hoje, "um funcionário do Tribunal de Matosinhos foi à cela de um detido na Cadeia de Custóias penhorar vários objectos pessoais, relativo a dívida de uma multa não paga, e devido a uma infracção cometida por uma mota de água".
A ordem de execução, no valor de 904.48 euros (referente a 604.48 euros de multa mais 300 euros de despesas) levou à apreensão de um televisor, uma pequena aparelhagem, um leitor de DVD e uma consola de jogos plystation. Mas o valor total dos objectos não chega para cobrir o valor total da infracção. Apesar de penhorados, os objectos não foram ainda retirados ao executado, que continua, pelo menos, para já, a poder utilizá-los, ficando “fiel depositário”.
Há dias, em Coimbra, um indivíduo, presumivelmente toxicodependente, entrou numa loja de velharias para vender um objecto pessoal que lhe era muito querido. O dono da loja, titubeante, com respeito, disse-lhe que não podia comprar aquele objecto. O homem, quase de lágrimas nos olhos, suplicou que aquele adquirisse o seu artigo, pois precisava urgentemente de 190 euros para pagar uma multa, ao mesmo tempo que mostrava o extracto de sentença, transitado em julgado pelo tribunal. Neste extracto, a multa era remível em 90 dias de prisão. O dono da loja, a gaguejar, sem saber o que lhe dizer, foi-lhe dizendo que as coisas estavam más e que não poderia comprar. Então, num gesto de compreensão, atirou-lhe: porque não faz um requerimento ao juiz a pedir que mande transformar a prisão em serviço cívico? Diz o homem: “Quem pensa o senhor que é o juiz e todo o sistema? Eles não querem saber se tenho dinheiro ou não. Eu tenho é de pagar e mais nada. Nem que tenha de ir assaltar alguém. Se não pagar vou dentro, e, assim, numa espécie de fanatismo religioso, num legalismo obsessivo, ou pago ou vou malhar com os ossos lá dentro. Só vêem aquilo e mais nada. Para eles, o que importa é que eu pague e que se cumpra a lei”.
O homem saiu, sem conseguir os seus intentos, e o dono da loja ficou a pensar até onde vai levar este autismo, falta de sensibilidade e obsessão pelo cumprimento da legalidade. Sem o sentirmos estamos novamente a viver um igualitarismo extremo, um novo positivismo jurídico, doutrina jurídica com génese na Revolução Francesa, assente num individualismo feroz, de ideia fixa, em que o importante era o cego cumprimento da lei sem ter em conta as diferenças existentes em cada indivíduo.
Não é preciso pensar muito para ver que o vendedor de ocasião, se não conseguiu alienar o objecto, inevitavelmente, assaltou alguém, ou, pelo menos, foi conseguir aquela verba por meios pouco claros. Então façamos um balanço das presumíveis consequências dele não ter pago a multa. Os danos para a comunidade não serão muito mais onerosos?
E no caso do preso em Custóias, o funcionário do Tribunal, “braço” que a mando deste cumpre este legalismo idiota, tem o direito de tirar o mínimo básico a alguém que está numa cela preso, e privado da liberdade? Tenho a certeza de que a minha opinião não será unânime, mas, por um momento, num exame de consciência, pensemos um pouco o que é melhor para a sociedade.
Será que a lei deve continuar a ser fria e cega? É que em boa verdade, por estar vendada, talvez aí resida a actual crise da justiça. Só vai preso quem não tem dinheiro.
1 comentário:
O mesmo sistema que liberta pedófilos, assassinos e outros criminosos tem depois destas coisas. Uma vergonha de justiça e de país.
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