Em 21 de Setembro, do ano passado, escrevi um texto –que pode ser lido neste blogue e foi publicado, no dia seguinte, no Diário de Coimbra- a que dei o título “ A INSUSTENTÁVEL LEVEZA DE SER COMERCIANTE”. Nele contava a história, um verdadeiro drama humano, de um homem, a quem chamei Anastácio, que, depois de várias décadas como empregado, um dia sonhou em ser patrão de si mesmo.
Durante uma década este homem lutou contra as adversidades da vida, do tempo, e dos homens. Há cerca de quatro anos, o seu mar de sonhos começou a ser tempestuoso. Progressivamente, o centro da cidade foi-se esvaziando, como um rio a que foi desviado o seu caudal, as ruas foram ficando cada vez mais sós e sem pregões, e, consequentemente, o estabelecimento de “Anastácio” foi ficando cada vez mais entregue aos ruídos da madeira das prateleiras, outrora plenas de artigos de moda e hoje cheias de nada, com caixas de camisa ocas por dentro, tal como o seu dono, que aos poucos foi ficando cada vez mais só, e, tal como as prateleiras, fingindo estar repletas, também a sua auto-estima se foi adaptando á realidade e fingindo que estava tudo bem. Então, há cerca de quatro anos, não aguentando a pressão dos seus credores, contraiu um empréstimo de 100.000 euros, dando de hipoteca a sua casa, onde vive com a mulher aposentada e o seu filho.
No fim deste mês de Abril, Anastácio, com 56 anos de idade, vai encerrar o seu estabelecimento. Com ele encerra um sonho, um filme de terror que preferia não ter vivido. Encerra cheio de dívidas e com uma prestação mensal ao banco de 1000 euros. Não vai ter direito a subsídio de desemprego. Com as lágrimas nos olhos, dizia-me à bocado: “perdi tudo, e até a casa, que tinha pago, vou perder. Não vou conseguir pagar os 1000 euros de prestação ao banco.
“Anastácio” tem uma funcionária – a "Maria"- com 52 anos. Trabalha nesta casa há mais de 30 anos. Mais de vinte como colega, e, ultimamente, há dez como empregada de Anastácio. Isabel, uma mulher cheia de vida, contendo as emoções, não vá uma lágrima saltar, quando lhe pergunto o que vai fazer, responde, encolhendo os ombros: “sinceramente, parece que estou anestesiada, é como se não conseguisse vislumbrar a tragédia que aí vem. Pago 250 euros de renda de casa, tenho comigo a minha mãe e a minha filha que ainda não está a trabalhar. Como é que vou viver senhor Luís?”.
E eu tenho resposta? Você, leitor, tem? Pois não, não temos mesmo! Então não fazemos nada? Que merda de comunidade somos nós, que quando dois dos nossos membros estão numa situação aflitiva nada fazemos? Está certo o nosso comportamento?
Bem sei que, para esvaziar o seu sentimento de inactividade, vai dizer que ele é que é culpado. “Quem o mandou estabelecer-se por conta-própria”, dirá você, como lavando as mãos deste drama humano. Mas o Anastácio não tem o direito de errar? E o erro seria só dele ou devido a consequências anómalas? Mesmo que fosse da sua responsabilidade, será que não tem o direito de colocar em prática o sonho? É mais fácil admirar um Belmiro de Azevedo, por ser um homem de sucesso, não é? Sinceramente!!
Bem sei que você vai referir que existe uma ACIC, Associação Comercial e Industrial de Coimbra, e uma APBC, Agência de Promoção para a Baixa de Coimbra, e são eles que se devem preocupar com o futuro dos seus associados. Pois é, deveriam preocupar-se sim. Mas, coitados, andam tão embrenhados com a CIC, feira Comercial e Industrial da cidade, lá têm eles tempo para olhar para o futuro do Anastácio e da Maria. O que interessa é o trabalho político que dá no olho, o resto é paisagem.
O que é que interessa esta história? Ora, ora! Vamos mas é beber um café! Cada um que se governe! Homessa!
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