(Retirado da Web, de aqui)
No
quotidiano dos dias, acerca de um conhecido, é vulgar ouvir, ou
ler na imprensa acerca de alguém que se finou frases comuns
lapidares: “vivia a sua vida, não se envolvia com ninguém e
todos o/a tínhamos em grande consideração. Era uma óptima
pessoa. ”
A colectividade adora
gente amestrada, que nunca reclama de nada nem de ninguém. Este
género de pessoas, que sempre nos lembra alguém próximo, são a
antítese, a anti-tese, da cidadania. Este modelo de vizinho poderia
ser representado com as três imagens do “não ouço nada”,
“não vejo nada”, “não falo nada”.
Nunca solicitem a estas
pessoas que sejam testemunhas de um facto ocasional, mesmo que o seu
depoimento seja fundamental para que não se pratique uma injustiça.
Em face do pedido, a resposta é sempre a mesma: “sabe, eu
dou-me bem com todos (os envolvidos) e não quero arranjar quezília”.
Jamais se espere uma
opinião sobre qualquer assunto, mesmo que o mundo esteja a desabar.
Invariavelmente, a resposta será: “não me meto nisso. Não me
meto nessas coisas!”
São seres de convivência
apática, onde a indiferença, muitas vezes fria e interesseira,
marca o seu percurso de vida. De pose altiva e marcante, em
contraste, são criaturas sem convicção, onde o medo estende o seu
manto até às coisas mais simples. A raiar o niilista, onde o
pessimismo e o cepticismo são paralelos extremos em qualquer
situação de realidade factual. Perseguindo esta escola filosófica
negam a prática política -nunca exercem o direito de votar-,
repudiam o princípio associativo que conduza ao bem-comum -raramente
praticam um acto de caridade-, não acreditam que a economia é o
motor de desenvolvimento social que emancipa os povos e torna mais
igual a desigualdade.
Embora não acreditando,
pelo calculismo crescente, também não renegam a existência de um
ente superior, Deus, e é vê-los ao Domingo a caminhar para a igreja
mais próxima. Será de supor que as suas orações serão sempre
reivindicativas e a marcar a ameaça velada ao Senhor. Nas suas
cabeças, aparentemente bem arrumadas, voam teses de conspiração
contra a sua pessoa. A sua vida privada constitui segredo de Estado.
Nada se sabe dos seus gostos, desvios, ou desvarios.
No
estertor da Monarquia, Rafael Bordalo Pinheiro, através do “boneco”
do “Zé Povinho”, soube caricaturar muito bem este sofredor do
silêncio.
Como
não podia deixar de ser, a doutrina do Estado Novo, no anterior regime, espalhava ao
vento este modelo de sujeito indiferente, não interventivo na
colectividade, como a maior virtude entre as virtudes. Os que
versavam a discussão e punham em dúvida o pensamento aglutinador
eram classificados como comunistas.
Hoje
os governos, ditos democráticos, semeiam e apregoam a participação
popular como o décimo primeiro mandamento, mas, no fundo, odeiam
quem a pratica.
Os
tempos mudaram mas o homem, em sentido literal, mantém-se igual a si
mesmo.
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