domingo, 31 de agosto de 2008

CULTURA: FILHA DE UM DEUS MENOR (3)





Há dias fui visitar o Museu do Caramulo. Até lá chegar, encontrei imensas placas sinalizadoras e indicativas de “museus”, já dentro da Vila, e junto ao museu, nenhuma. Resultado, como não conhecia, andei mais um quilómetro, que, ida e volta, somaram dois.
Para aceder ao museu, paguei catorze euros (éramos dois). Como já passava do meio-dia, e a casa de memória encerrava para almoço das 13 às 14, como não deu tempo para apreciar todo o extenso acervo, saímos e voltámos depois da hora de reabertura. Como saímos cedo, e vendo as placas indicativas de aldeias típicas, fomos visitar a que nos pareceu mais bonita: Bezerreira. Junto à estrada nacional uma placa a indicar a aldeia. Andámos, andámos e lá entrámos no lugarejo típico sem qualquer placa a indicar o nome do lugar. Percorremos a pé a pequena aldeola e, com desdita, vimos as imensas casas em pedra de granito completamente em ruínas. À saída, havia várias estradas sinuosas mas nem uma única placa a indicar qualquer destino. Entrámos na primeira e fomos parar a outra aldeia em sentido contrário ao Caramulo. Lá voltámos atrás e finalmente encontrámos o rumo certo. Quanto custará uma placa? Se não estivesse tão deficitário, palavra que me apetecia oferecer uma ao Presidente da Câmara Municipal do Caramulo.
No dia seguinte fui à Mata Nacional do Buçaco. Como entrei de carro, paguei 2.50 euros. Se fosse de monovolume pagaria 5 euros. Se entrasse a conduzir um autocarro pagaria 25 euros. Para além destas taxas, se visitasse a Capela ou o Museu Militar, que estão encerrados à hora do almoço, teria de, naturalmente, pagar ingresso.
Numa primeira apreciação, a frio, ao pagar entrada para a mata, o primeiro pensamento que nos ocorre é: “está correcto! Esta medida serve de portagem impeditiva que toda a gente leve o popó para o interior da floresta. Este ónus serve de medida protectora do ambiente. Como partimos de premissas erradas, naturalmente que a conclusão será errada também. Esta medida taxativa não pretende proteger a floresta, é no mínimo uma norma economicista que, para além de prejudicar o turismo do Luso, serve apenas e só para realizar verbas. E porque digo eu isto, pergunta você? Muito simples, não existe alternativa. O trajecto entre o pórtico de entrada da mata, o Hotel e a Cruz Alta é bastante longo, e feito em piso de calcário, em paralelepípedos. Como é assim, o resultado é que poucos voltam atrás renegando o pagamento. E aqui é que se prova que se a medida é para proteger a floresta é em vão. Em boa verdade, também não está prevista a desistência, porque não existe junto à portagem nenhum parque de estacionamento.
“E que alternativa deveria haver, já agora conte lá!”, interroga-me você, com ar de que está na presença de mais um “Chico-esperto”. Eu, sem desarmar, explico. Deveria haver dentro da Mata Nacional uns pequenos comboios, estes sim a pagar, que levariam as pessoas a conhecer e a percorrer a densa área de 105 hectares, classificada pelos botânicos como um dos melhores arboretos da Europa. Assim já me calaria. Esta era a verdadeira alternativa. Até vou mais longe: para além destes percursos dentro do interior desta “floresta Amazónica” deveria haver outros desde o Luso até às portas da mata.
Segundo informações que consegui no Luso, parece que há uns cerca de vinte anos a Pensão Alegre, que pertenceu ao Marquês da Graciosa –já agora aproveito para aconselhar a visita, é lindíssima a sua arquitectura antiga e muito bem recuperada-, conjuntamente com a Pensão Regional (também muito bonita e acolhedora), tinham umas “charretes”, puxadas por cavalos, com cocheiros vestidos de farda e a rigor, que faziam um largo percurso. Com o decair das termas, por isso ou por outros factores, a verdade é que acabaram estes transportes típicos.
Depois, há cerca de uma dezena de anos, houve um empresário arrojado que ousou avançar para o transporte de pessoas em pequenos comboios, entre o Luso e a Mata do Buçaco. Requereu as licenças, que lhe foram concedidas, mas não passou do primeiro ano. E aqui começa o desiderato. Para algumas pessoas que ouvi, “foram concedidas as licenças ao investidor, mas ele nunca saiu da Avenida Emídio Navarro. Os motores aqueciam muito até ao Buçaco e ele desistiu e foi-se embora”. Quando pergunto: se nunca saiu da avenida como saberia ele que os motores aqueciam? Esta interrogação fica sem correspondência.
A seguir vêm outras pessoas, que não se querem identificar, que dizem mesmo que durante um ano o comboio circulou entre o Buçaco e o Luso. Porém, os taxistas, vendo-lhes fugir a clientela para o comboio, trataram de fazer a vida negra ao pobre homem, que, assim, sem saudades, logo que pode, partiu. “Olhe, por estas guerras entre profissionais do mesmo ramo, perdemos todos: perdeu o homem, perdeu o turismo e perdeu o Luso!”
Se é verdade ou não, se estes desabafos serão “tricas”, isso não sei, limito-me a escrever o que ouvi. O que sei, em minha opinião, é que o Luso precisa de um transporte deste género para aproveitar o afluxo turístico e, calmamente, tirando partido da mata do Buçaco, poder usufruir daquela maravilhosa e imensa paisagem verde.
Quanto ao facto de se pagar para entrar na floresta, também ouvi uns comentários curiosos: “Olhe, há cerca de uns oito anos, o Movimento dos Jovens Católicos de Luso puseram a correr um abaixo-assinado para que se onerasse o acesso à mata do Buçaco. A medida, para além de ser ecológica, permitiria arrecadar umas verbas que se destinariam à revitalização daquele imenso espaço verde; à sua limpeza, conservação e sobretudo à recuperação das capelas da Via-Sacra, no percurso do Sacromonte.
A verdade é que se implantaram as portagens de acesso e, passados todos estes anos, tudo continua…para pior. As verbas nunca foram empregues para o fim a que se destinavam. As capelas, da Via-Sacra, sobretudo as esculturas originais do século XVIII, provavelmente da escola de Machado de Castro, estão num estado degradado, péssimo, que raia o escândalo, pelo abandono negligente”.
Quando lhe pergunto se acha que esta medida de ingresso onerada prejudica o Luso, este declarante afirma sem pestanejar: “Claro! Esta gente não está absolutamente nada interessada em proteger ou desenvolver seja o que for. Olham apenas para os nossos recursos sobre a bitola economicista. Querem é sacar! Estão pouco interessados na cultura ou na sua perpetuação. Ainda que apregoem o contrário, eles substituíram a memória do passado pelo vazio do presente!”

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