segunda-feira, 18 de agosto de 2008

COMÉRCIO TRADICIONAL: UMA MENTALIDADE TACANHA



Hoje, 17 de Agosto, ao ler no jornal PÚBLICO a notícia com o título “Associação Comercial de Viseu está a rever o modelo da iniciativa Noites Brancas, onde se lê, a determinado passo que “esta Associação Comercial do Distrito de Viseu (ACDV) está a repensar o formato das Noites Brancas, depois da fraca adesão por parte dos lojistas do centro histórico da cidade à última edição da iniciativa. As Noites Brancas de Viseu, decorreram nas sextas-feiras do período entre 11 de Julho e 8 de Agosto passado, só contaram este ano com meia dúzia de comerciantes que aceitaram prolongar o horário de funcionamento dos estabelecimentos até às 23h00.” Relembro que o conceito “Noites Brancas” é um formato importado de outros países no sentido de representar para o comércio tradicional uma espécie de pedrada no charco, para que através do movimento alegórico, de animação e artes, conjuntamente com o comércio aberto nesses dias, até quase ao bater da meia-noite, o consumidor perceba que ali, nos centros históricos, vive e sobrevive e sobretudo trabalha gente.
Continuando a citar o PÚBLICO (…) “os comerciantes justificam que não vale a pena prolongar os horários dos estabelecimentos, por não acreditarem que, durante a noite, vendam mais do que durante o dia. “Não há clientes”, atira uma das lojistas da Rua Direita. Explica que abrir as portas do estabelecimento para além do horário habitual a impediria de jantar. A outra hipótese implicaria pagar horas extraordinárias ao único empregado que ainda mantém. O fraco volume de negócios dos últimos anos obrigou-a a reduzir o número de funcionários de seis para um. Aquele que resistiu à crise só ainda não foi despedido porque “não há dinheiro para lhe pagar a indemnização”, acrescenta a mesma lojista.”
Vamos por partes. Primeiro, como ressalva de interesses, sou comerciante. Trabalho no comércio desde os meus 16 anos (tenho 51). E digo isto para que se não pense que sou uma andorinha esvoaçante a comentar um assunto de que tenho informação mas não possuo conhecimento. Noutras áreas é verdade, que, como outras pessoas que escrevem, só possuo mesmo a informação e comento-a como se fosse um grande teórico, sejamos honestos. Não é o caso aqui. Passando a imodéstia, sei do que falo.
E, ao ler este texto do jornal, não fico surpreendido. Um dos maiores problemas do comércio de rua é a falta de fé, acoplada com uma mentalidade tacanha, residual no “deve” e “Haver”. Para além da campainha da máquina registadora não conhecem mais nada. A maioria destes comerciantes (velhos, com toda a carga negativa do tempo que a frase possa ter) herdaram os negócios dos pais. Não foram eles que os criaram, se assim fosse talvez pensasem de uma outra maneira. Se os seus parentes hipoteticamente viesse outra vez à terra iriam ensinar-lhes que o comércio é realmente uma profissão mercantil, mas, acima de tudo, é uma arte, onde a sensibilidade e a sua razão de ser é o bem comum. “Negócio” é, como sabemos, a negação do ócio. Aquele que, em vez do lazer, do descanso, da preguiça e da inacção, opta pelo trabalho, pela construção, mesmo assente nas mais-valias, busca, é certo, o seu interesse individual, mas, nesta prossecução egoísta, como dizia Adam Smith, no século XVIII, “todos os indivíduos são levados, como que por uma mão invisível, a atingir o melhor benefício comum”. A propagação do consumo é o único fim e propósito de toda a produção e é através dele que se atinge um estádio de desenvolvimento imparável como o dos nossos dias. Comerciar é uma profissão que remonta ao início da humanidade. Lembremo-nos de povos da Antiguidade, que foram grandes viajantes expansionistas de todo o globo –muito antes dos descobrimentos portugueses-, os Gregos e os Fenícios, que, nas suas trocas, por artes e manhas se elevaram na classe social e, na História Universal, da lei da morte se libertaram.
Ora se esta gente, esta classe de comerciantes contemporâneos, só pensa em si mesma, no seu umbigo, nada dá sem receber em dobro, como poderão eles crescer? Se só vêem o imediato –negócio, negócio-, como podem eles contribuírem para o bem comum? Se acreditarmos no princípio de que só cresce quem reparte, logo estas pessoas, inevitavelmente, estarão condenadas a desaparecer.
E se tenho este parecer, não se pense que não continue a reivindicar urgentes apoios do governo para estas e outras pequenas empresas para que, através da sua sobrevivência, mantenham os vários empregos familiares e assim prescindam do apoio do Estado no tocante a subsídio de desemprego.
Mas, se para estas pessoas, que para além da máquina registadora não existe mais mundo a repartir, só interessa a sua gaveta, como é possível sair desta crise, mesmo que o governo intervenha? Para estes comerciantes, que nem amostras são dos antigos grandes beneméritos, as zonas onde estão inseridos são apenas para extrair ou sugar. Actuam como parasitas. Servem-se da cidade do mesmo modo que alguém se serve de uma prostituta, ou seja, sem qualquer respeito pela sua intrínseca dignidade.
A crise no comércio tradicional não é só comercial é essencialmente social e os resultados estão à vista de todos. Admite-se que, nos tempos difíceis que se vivem, as lojas continuem a encerrar às 19 horas em ponto? Admite-se que continuem a encerrar das 13 às 15horas? Admite-se que continuem a encerrar ao sábado às 13 horas?
O comércio, enquanto grande instituição de mérito histórico, prescinde desta gama de comerciantes pacóvios, preguiçosos, de mentalidade rasteira e ultrapassada. Encerrem as vossas lojas quanto antes e dêem lugar a gente nova, com garra e vontade de trabalhar e desenvolver as cidades, vilas e aldeias.
Olhem, vão bugiar! É o mínimo que, a praguejar, depois de ler a notícia, posso escrever.

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