sexta-feira, 3 de agosto de 2018

EDITORIAL: UFA! QUE CALOR!… (QUE NEM É ASSIM TÃO NOVIDADE)






São 16h13 no relógio electrónico da Farmácia Universal, em frente a Câmara Municipal. A mesma máquina, que também serve de termómetro, marca 39 graus Célsius.
Embora não seja nada de novo – relembro que em 05 de Julho de 2010 o mercúrio atingiu 40 graus – a Baixa parece encolhida pela molenguice. Em qualquer chão onde bata a canícula está praticamente tudo às moscas. Os passantes, como a ocultar-se de um perigo oculto, procuram desesperadamente a sombra projectada pelos edifícios mais altos e antigos. Avistam-se turistas em fila indiana. As esplanadas, incluindo as do Largo da Portagem e da Praça do Comércio estão sem gente. As lojas comerciais, como se fizessem parceria com os cafés, estão vazias de clientes.
Nas ruas largas, logo no início da Rua visconde da Luz, em frente ao antigo BES, somos abraçados pela espectacular musicalidade de duas jovens a tocar acordeon. Mais acima, em direcção ao Largo da Portagem, vários músicos de rua dão um colorido sonoro a uma paisagem que parece macilenta e a transpirar languidez.
Tal como escrevi em 2010, talvez fizesse sentido seguir o costume dos nossos amigos espanhóis, que fazem um interregno de várias horas para sesta quando o Sol está pique, e encerrar umas horas durante a tarde e reabrir depois das 17 e até às 21h00.
Bem sei que para a maioria de comerciantes da Baixa isto que escrevo não é assunto - e muitos, se pudessem neste momento, atiravam-me com o que tivessem mais à mão.
Uma coisa é certa, podemos fugir a tudo menos de nós mesmos. Mas a realidade, ou verdade, ainda que possa ter várias interpretações subjectivas, é só uma. E estes horários que se continuam a praticar diariamente não servem a cidade, não servem a Baixa, não servem os comerciantes, não servem os visitantes.
Tenho para mim que, apesar do anunciado pelo Governo em contrário, embora possa haver excepções, a maioria dos operadores que trabalham no comércio concordam que a procura, por vários factores económicos e sociais, tem vindo a regredir. Ora, em face do rendimento que tem vindo a cair para os comerciantes, o que fazem muitos destes? Alteram o seu modo de estar e procuram adaptar-se aos novos tempos? Nada disso. No inverso, vão encolhendo os seus horários e vão-se habituando a um negócio de conta-gotas, em que está transformada actividade mercantil. No adverso, sem se encetarem outras formas de resistência, o claudicar, no encerramento definitivo de estabelecimentos, passou a funcionar como defesa.
Mesmo já com os meus ouvidos cheios de insultos e impropérios, mesmo assim, ainda consigo interrogar: será culpa do calor, que nos está a comer a vontade e a transformar-nos em pessoas incapazes de lutar contra as adversidades da vida?
Valerá a pena pensar em alterar velhos hábitos enraizados que conduz a maioria ao empobrecimento?

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