sexta-feira, 28 de setembro de 2007

ASSALTOS NA BAIXA DE COIMBRA: O ESCÂNDALO

(FOTO DE BRAGA PINHEIRO)


 Dona Graça chora desalmadamente. Apoia o seu queixo redondo no braço esquerdo sobre o balcão do seu estabelecimento. As lágrimas correm copiosamente no seu rosto de menina que o tempo, pela força de 16 horas diárias de trabalho, ao longo de várias décadas, foi deixando marcas de impregnada e indisfarçável dureza. É um dó ver esta mulher, naquela expressão máxima de sofrimento, modelo de uma Madalena, a soluçar de dor, de olhar sofrido, vazio , procurando algo ou alguém a quem o possa amarrar e fazer dele, por momentos, um porto de abrigo, e nele poder, em catarse, despejar toda a revolta que lhe vai na alma.
Graça foi assaltada esta noite, de 27 para 28 de Setembro, pela quarta vez durante este mês. Nesta noite, de maiores consequências que as anteriores, o seu estabelecimento, com grades de ferro, foi arrombado e vandalizado. Foram roubados, além de várias centenas de euros em dinheiro, vários quilos de chouriços, vinhos finos, licores e várias cervejas. Ao seu lado, Lurdes, com sapataria ali ao lado, nesta mesma manhã, teve a pior surpresa da sua vida: do seu armazém foram roubados cerca de 50 pares de botas, de colecção de Inverno que recebera há menos de uma semana. Este montante, ainda não pago ao fornecedor, ascenderá a cerca de 4000 euros. De olhos húmidos, doridos e encovados, quando lhe pergunto como se sente, fixa-me e responde: “ódio, frustração e incapacidade de nada poder fazer. Como é que vou aguentar esta vida?”.
Há comerciantes a dormirem dentro das lojas de caçadeira engatilhada, há espera do primeiro que se aventure. Quando morrer gente, que, no limite, poderão ser inocentes, será nessa altura que as instituições vão reagir? E quando falo em instituições, falo no Governo Civil, na Câmara Municipal e no Comando da Polícia de Segurança Pública.
O senhor Governador Civil entende que o Presidente da Câmara deve abrir concurso para guardas nocturnos. Carlos Encarnação, o presidente da autarquia, rejeita responsabilidades na segurança da urbe e, peremptoriamente, afasta a hipótese desta solução e remete o problema para o Comando da PSP. Para o Comissário Rui Moura “a Baixa é policiada todos os dias e este corpo de polícia tenta rentabilizar ao máximo os recursos de que dispõe. Sobre meia dúzia de estabelecimentos no fim de semana, e de acordo com os dados de que dispunha, não havia referência de que tivessem alarmes”. (Sic) –in Diário de Coimbra de 12 de Setembro último.
Ou seja, se atentarmos, todos passam a bola ou para o parceiro do lado ou, no caso do Comissário, passa o ónus para os homens do comércio. Neste driblar de bola, os desgraçados dos comerciantes, sem ordenado, sem direito a aposentação, a sofrerem diariamente assaltos e a insensibilidade de quem deveria ter a responsabilidade pela sua segurança, são o mexilhão deste mar revolto de marinheiros sem “gana” para conduzirem a bom porto esta nau da Taprobana. Sofram comerciantes. Talvez para o ano, depois de milhentas reuniões e quando vocês não tiverem nada para roubar, então sim, irão ter mais policiamento. Não se enervem. Vamos com calma, sim? Não façam ondas.

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