(Leonardo Braga Pinheiro)
Antes de dar o primeiro chuto nas ideias que
estão muito baralhadas na minha cachimónia,
aviso já que não sei nada de nada, ando sempre à pesca do que os outros
escrevem para, a seguir, como se eu fosse melhor, apanhar o que eles não deram
importância e nem se quiseram curvar. Dou mais erros num texto que o Ti Zé
Lavegadas, lá na minha aldeia, manda umas caralhadas em meia-hora de conversê. Afirmo ainda que sou um tipo
de moral duvidosa –se tivesse alguma nem sequer ousava começar esta crónica.
Tenho a mania de criticar os outros mas não olho para o que vai cá em casa.
Digo ainda que sou pior que a maioria… ou igual. Tudo está bem quando dizem bem
de mim, assim no género: “escreves tão
bem, Toino! Gostei tanto daquele texto sobre o fadista que perdeu a voz que
nunca teve porque sempre foi mudo e nunca cantou”. E eu, pobre alma vaidosa
e insignificante, que anda neste mundo a ver se safa e à procura de um cantinho
para descansar quando as pernas já não derem mais, perante tal encómio,
derreto-me todinho como manteiga dura em banho-maria.
E para que estou eu para aqui com esta
lengalenga? Até se me pareceu que você queria perguntar mas, para não me
interromper e não parecer mal, nem ousou proferir bitaite. Eu vou explicar. É que ando de candeias às avessas com o
jornalismo que se pratica cá na nossa cidadela –bem sei que deveria estar
calado, porque sou pior, mas deixe lá seguir o meu raciocínio. Não é por nada
mas alguém tem de dar um murro na mesa –ora para se dar um punhado na mesa, ou
mesmo uma punheta, tem de se ter um
certo calo no lombo da mão e portanto quem não tiver magoa-se. Talvez por isso
mesmo já se entenda a razão de poucos darem a voz por muitos. Saliento que até
nem me custa muito fazer uma punheta
–dar uma punhada pequenina- porque até andei no Karaté –é certo que nunca
passei do terceiro nível mas isso também não interessa nada. O que quero dizer é
que não me magoa muito dar o murro sobre a mesa.
Vou então continuar.
Antes de descarregar veneno sobre os profissionais da imprensa, gostaria de
dizer em sua defesa que, a meu ver, a culpa maior não lhes pertence. Cá na
minha forma tosca de ver, os jornalistas hoje estão transformados em entregadores de pizzas. Eu que nunca
entrei dentro de uma redacção, imagino o chefe –sem ofensa para um que tenho
muita consideração- chamar um jornalista e proclamar: “toma aí nota para amanhã! Tens às 10 horas o cortejo das crianças na
Baixa; às 11h00 tens na Alta, na Sé Velha, a missa de corpo-presente por aquele
gajo rico e que até foi comendador; ao meio-dia vais à Universidade que se vai
apresentar aquele novo projecto, da Reitoria, sobre as praxes; às 14h00 voltas
à Baixa e vais ao Café Santa Cruz por causa da conferência de imprensa sobre o
“Comércio vem para a Rua”; às 15h00 vais à Câmara Municipal e tiras notas sobre
aquela discussão sobre se as reuniões do executivo devem ser, ou não, públicas;
às 16h00 vais ao jardim-escola, ali junto aos Arcos do Jardim, e falas com os
pais das crianças sobre o que pensam sobre o futuro da praxe; às 17h00 vais ali
junto à Ponte de Santa Clara e escreve qualquer coisa sobre o assoreamento do
Mondego e o facto do barco turístico ir migrar para águas de outra freguesia
–mas atenção, tem de ser um texto curto, sei lá, à volta de quinhentos
caracteres, não mais! Às 18h00 vê como está o tempo, se continua a chover e faz
frio. Escreve uma peça curta, aí de 250 caracteres, sobre este Inverno que nos
come a alma. Às 19h00 tens de voltar à redacção para compilar a edição para o
dia seguinte. Estamos entendidos? Vamos embora! Que um jornal não pode parar!”
Ora se porventura for
assim, que imagino que seja mesmo, como é que os “desgraçados” entregadores de notícias frescas têm tempo para
escrever? Cá no meu entendimento pacóvio, escrever
implica, acima de tudo e para além de se gostar, um espaço, vazio, no dia, uma paragem para fazer
reflexão. Escrever é um acto
solitário de amor. É uma introspecção espiritual, uma catarse, uma oração em
torno do Eu pessoa. É uma masturbação espiritual diária cujo obra
final será o climax entre si mesmo e
o seu espírito em desassossego. Como dizia Fernando Pessoa acerca dos poetas, o
escritor é um fingidor; finge que está feliz quando a sua alma chora; ri de si,
dos seus próprios disparates e palermices. Conseguir fazer uma crónica com
outro acompanhante a falar ao lado é quase impossível. Escrever é precisar de tempo para ir às reminiscências do âmago, às
nossas memórias, à nossa experiência de vida. Sem esta pausa, sem este abandono
físico e entrar no transcendental, ninguém conseguirá passar da mediania.
Depois desta defesa dos
jornalistas, tentando de certo modo justificar os constantes erros que cometem,
vamos então aos factos que me fizeram maçar o leitor com um assunto que não
interessa nem ao Pai Natal e muito menos ao Menino Jesus. Há dias o Diário as Beiras publicava uma notícia
sobre um furto num museu da cidade e perpetrado por um seu funcionário. Em determinado
ponto afirmava inverdades. É certo que escreveu sobre as informações
disponíveis mas, e aqui é que bate, o jornalista não pode ficar-se apenas pela
rama da árvore –por que todos sabemos que, nesta vida, nada é o que parece.
Jornalista que o é, de facto e por amor, tem de ter acoplado à sua essência uma
curiosidade intrínseca. Mais, deve sempre desconfiar da versão contada e, assim
sendo, partir para a génese que lhe deu origem. Mais ainda, e esta a mais
importante, é conseguir transcender-se, sair da sua posição, da sua qualidade
de mensageiro, entre o emissor e receptor, e colocar-se no lugar do leitor. E
interrogar-se: se eu estivesse a ler esta
crónica o que achava? –neste caso, desta que estou a escrever, é muito
fácil saber o que se pensa: que sou
maluquinho da tola, chato c’mo caraças, e que Deus me perdõe!
Para equilibrar as coisas e não se pensar que
tenho uma pedra no sapato contra o Diário as Beiras, vou debruçar-me sobre uma
notícia, de ontem, do Diário de Coimbra. O título era “Câmara vai “corrigir o que está mal” na Conchada”. Prosseguindo, “Manuel Machado garantiu ontem que a Câmara
de Coimbra (CMC) irá corrigir “tudo o que estiver mal no Bairro da Conchada,
mas quer primeiro “averiguar no local de que se queixam os moradores. (…) Maria
José e Isaura estiveram ontem, juntamente com José Soares, no gabinete do
presidente da CMC para entregar um abaixo-assinado a “exigir condições de
habitação dignas” no Bairro da Conchada. Os moradores, acompanhados de
elementos do Movimento Cidadãos por Coimbra, representariam alegadamente as 28
famílias do bairro, que se queixarão de problemas relacionados com a humidade,
o frio nas habitações e ainda o efeito das alcatifas para a saúde dos
moradores. Antes da reunião com Manuel Machado, o porta-voz, José Soares,
garantia que há vários anos que reivindicam condições junto do Departamento da
Habitação, queixando-se de “abandono” por parte da autarquia. Garantiu ainda
“outras formas de luta” caso as exigências não fossem ouvidas. “Vamos invadir o
Departamento de Habitação e ocupar os gabinetes do vereador e de outros
responsáveis”, garantiu. “Têm feito de conta que somos números”, continuou José
Soares, apoiado por Pedro Bingre Amaral, do movimento Cidadãos por Coimbra, que
visitou o bairro e as habitações e considerou “justas” as reivindicações. No
final da reunião, José Soares e Pedro Bingre Amaral acusaram, entre outras
críticas, Manuel Machado de “falta de humanidade, de cortesia e de respeito. O
autarca considerou que os moradores foram “claramente instrumentalizados pelo
movimento Cidadãos por Coimbra e confirmou ter-lhes dito que se não estivessem
satisfeitos para “devolverem a chave”. Há centenas de pedidos para habitações
que aumentam todos os dias. “A situação é dramática”, afirmou, prometendo, no
entanto, resolver todas as situações que se justifiquem”.
Bem sei que fui demasiado extensivo e que você
desse lado até já ressona mas, mesmo assim, vou continuar. Salvo melhor
opinião, estamos perante um exemplo acabado de mau jornalismo. Desde o início
da notícia que ficamos sem saber a quem pertencem as habitações. Presume-se que
será a autarquia a proprietária, mas, para se aferir de um juízo equitativo e
certo, era preciso que estivesse escrito. Mais ainda, quanto paga de renda cada
morador neste (aparente) bairro camarário? Porque não interrogou a jornalista o
representante? Há quantos anos são residentes na mesma habitação? São estas
questões não formuladas que podem transformar uma notícia numa não notícia.
Quanto à exclamação de Manuel Machado, em que
afirma “se não estivessem satisfeitos
para devolverem a chave”, quase que me inclino a dar-lhe razão –faltam as
tais informações para complementar o raciocínio. No entanto sempre vou dizendo
que nas últimas décadas a CMC, em relação às suas habitações espalhadas na
cidade e aos proprietários privados sempre usou um peso e uma medida diferente.
Se o que se infere for verdade, é bom que, agora, a edilidade sinta na pele o
que os pequenos proprietários particulares, tratados como ricos e abastados
capitalistas pelos serviços do Departamento de Habitação, sentiram nas últimas
décadas.
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1 comentário:
Fácil, fácil...
Para quem utiliza os jornais para se promover, o escriba revela veneno a mais. Além da posse de veneno revela desconhecimento e enviesamento ideológico.
O escriba quer ser conhecido; gosta de o ser. Faça um jornal!... Deixe de utilizar o espaço dos comentários no facebook dos jornais para se promover. E tome as gotas, que parece estar a precisar!
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