quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

EDITORIAL: A LIÇÃO QUE NÃO SE APRENDE



 Encerrou esta semana o café “Mui Chocolate, na Rua da Gala. Abriu portas em final de Agosto do ano passado. Passados cinco meses, Leonor Prazeres, a investidora do negócio, depois de apostar forte em obras, máquinas e decoração, perante o pouco movimento de transeuntes na Baixa, viu-se obrigada a claudicar agora. Quando falei com esta senhora, numa reportagem que fiz para o jornal O Despertar, era bem patente o seu optimismo: “Estou na meia-idade, naquela altura de balanço existencial em que uma pessoa dá por si a interrogar-se sobre o que fez até agora, o que faz neste momento, e o que quer fazer no futuro. Há quem diga que esta catarse toca todos. O problema será conseguirmos dar resposta. O medo de tomar decisões toma-nos de assalto e condiciona-nos na inacção. Eu era secretária de direcção numa empresa na cidade há cerca de duas décadas. Estava portanto empregada. Há muitos anos que me deitava embrulhada no sonho de ter um negócio meu e acordava com a mesma pergunta: quando vais ser capaz de ser capaz de dar o salto, Leonor?
Ora, apesar de provavelmente ter conseguido passar o seu café, perante esta evidência, está de ver que este sonho, mais que certo, se tornou num pesadelo de terror, de consequências imprevisíveis. Gostaria de ressalvar que, com este texto, não pretendo de modo nenhum julgar a proprietária do encantador estabelecimento –sem favor estava primoroso e tinha um serviço espectacular. Falhar é humano e só não erra quem nada arrisca como a Dona Leonor, que aproveito para lhe enviar um grande abraço pela coragem que sempre demonstrou. O que gostaria de chamar a atenção pública –e já escrevi imensos textos sobre este assunto- é sobre o modo facilitista, quase de encantamento cego, como qualquer um, sem se informar previamente, julgando que está a fazer bem, o melhor, pode sair afectado, quer no campo psicológico, financeiro –porque sai pior do que entrou- e sobretudo familiar. É urgente alertar –e este trabalho de sensibilização deveria caber por inteiro à Câmara Municipal de Coimbra, sempre que possível, na altura do pedido de informações no Atendimento- que qualquer actor, pouco preparado e mal informado, que entre num filme destes, de enredo mercantil onde a desertificação e a escassez de procura marcam a história, pode ficar ferido para o resto dos seus dias. Repare-se que a renda descrita desta senhora era de 200 euros, o que quer dizer que, contrariamente ao que escrevi anteriormente noutras crónicas, o custo fixo do “aluguer” já não é o principal óbice ao sucesso de um qualquer empreendimento comercial. Tomai muita atenção!


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2 comentários:

Super-febras disse...

Amigo
Fico tão triste com estas notícias.
Estou tão longe, já lá vão 35 anos que emigrei.
Não tem sido fácil, mas tenho um teto meu, filhos já casados e empregados, há prior as coisa estão bem encarreiradas. Estou muito agradecido a este país que me acolheu, mas ele não é Portugal nem a cidade onde vivo é a "minha Coimbra".
Em 1979 Coimbra vibrava, o seu coração era a baixa, eu tinha dezassete anos e Ela, a sua gente e a minha pequena aldeia, Ribeira de Frades, eram o único mundo que conhecia. O Canadá fascinou-me e proveu desde o primeiro dia que aqui cheguei para que me sentisse bem, seguro e respeitado. Porém em mim continua um desejo de voltar um dia a Portugal, a Coimbra, à cidade onde nasci. Sinto, com muita angústia, que se o vier a fazer, pelo menos as primeiras vezes passarei na baixa sempre a correr. Darei a impressão que vou muito apressado, que estou muito atarefado! Não a quero ver extinta, quase morta! Não, não quero que me vejam chorar. É que de saudades dela já chega o tanto que me viram chorar aqui.

Um abraço de quem muito o gosta de ler

Álvaro José da Silva Pratas Leitão
Bradford, Ontario
Canadá

LUIS FERNANDES disse...

RESPOSTA DO EDITOR

Perante este seu comovente comentário fico sem palavras, Álvaro José. Por ficar inibido, só escrevo: “bem-haja! Muitas felicidades! Obrigado pelas suas generosas palavras no que toca aos meus lamentos, tantas vezes repetidos e lamechas.