Lourenço Chaves de almeida (1876-1952) foi, entre outros grandes mestres do ferro forjado de Coimbra, talvez um dos seus mais ilustres obreiros. A propósito da sua biografia saída recentemente do prelo, pela mão do historiador José Amado Mendes, que, segundo o Jornal “Campeão das Províncias”, “o levaram a escrever um notável trabalho de recolha e repositório de informações que modestamente intitulou “Memórias de um Ferreiro” e que agora foram dadas à estampa”. Estas “memórias” “foram elaboradas na década de 1940, quase no final da sua vida, altura em que já lhe faltavam condições para se dedicar à arte. Além da idade, foi perdendo familiares e amigos, ao mesmo tempo que escasseava a matéria-prima, em plena II Guerra Mundial”. –extrato retirado da contracapa do Livro de José Amado Mendes.
Porque possuo alguma bibliografia de Lourenço Chaves de Almeida, sobretudo recortes de Jornais da sua época áurea de “trovador do ferro”, como lhe chamou o grande poeta Afonso Lopes Vieira de quem, aliás, era um grande amigo, e, o mais importante, possuo”As Minhas Memórias”, escritas pelo punho do grande mestre do ferro burilado, ou seja, uma segunda versão, escrita pelo punho de Lourenço Chaves de Almeida, como mais abaixo compreenderão.
Infelizmente, não pude contribuir com este legado, que certamente muito teria enriquecido a obra (re)escrita por José Amado Mendes –que segundo o prefácio da sua obra, existem actualmente três versões das “Memórias de um Ferreiro”, uma delas manuscrita pelo próprio Lourenço Chaves de Almeida, e “permaneceu até há pouco no Brasil (na cidade de S.Paulo)”- porque não tomei conhecimento dessa recolha biográfica de Lourenço Chaves de Almeida. Só agora, através do “Campeão das Províncias”, li e me apercebi, certamente, se tivesse sabido antecipadamente, o quanto teria podido contribuir para uma obra excelente que é uma justa homenagem a um grande artífice do ferro.
Para que o leitor entenda como surgiu o ferro forjado em Coimbra, mesmo fugindo um pouco ao tema do homenageado, citando o jornal “Rádio Nacional”, da Emissora Nacional de Radiodifusão, de 7 de Março de 1943. Com o título “Os Escultores do Ferro”, e assinado por José Viana, relata o jornal: “Li algures não importa rebuscar onde, que –“quando a obra é gigantesca a vida do homem que a produz amesquinha-se.
Eis, precisamente, o que se dá com os buriladores do ferro, esses artistas de Coimbra, os primeiros que puseram em relevo e chamaram a atenção de todo o Portugal e do estrangeiro para a arte do ferro, até há umas dezenas de anos atrás julgada impossível de reviver.
Foi há quarenta e poucos anos, mais ou menos, que ressurgiu a nova era dos lavrantes do ferro.
Mestre Gonçalves (António Augusto Gonçalves), nome que vive na recordação de todos os conimbricenses e cuja obra de carinho artístico se encontra patente no Museu Machado de Castro, hoje superiormente dirigido pelo eminente professor dr. Virgílio Correia, regressara de Paris, impressionado com a Exposição de novecentos e os trabalhos em ferro que ali vira.
(…) Então, graças ao seu entusiasmo e à acção da “Escola Livre das Artes do Desenho”, por ele criada e que instalou na velha “Torre de Almedina”, surgiram os novos artistas.
Ali, no ambiente daquelas enegrecidas e pergaminhadas paredes, teve início a obra do renascimento dessa arte de extraordinária beleza!
(…) Dizia-se, quando Mestre Gonçalves tomou sob os seus ombros tão pesado encargo, que a única indústria artística com condições de vida, no país, era a da ourivesaria, nascida no Porto e ali vivendo, de geração em geração, como herança sagrada que atravessa os tempos, conseguindo resistir a todas as vicissitudes.
Principiou o ferro a ser martelado por forma diferente. E, no carinhoso afago com que era trabalhado, sempre a obedecer às regras do desenho e a um verdadeiro sentido artístico, nasciam novos trabalhos, em que se encontravam novos artistas.
Salientam-se, nesse período, os nomes de João Machado, Manuel Pedro de Jesus, Conceição, Fernandes Costa, e depois, mais recentemente, Lourenço Chaves de Almeida, Daniel Rodrigues e Albertino Marques.
Continuando a citar o “Rádio Nacional”,(…) “hoje, só os três últimos nomes que citei nos dão esses trabalhos em ferro, obras primas, irmãs daquelas que nos legaram os grandes lavrantes do ouro.
E com a mesma simplicidade, com que Gil Vicente se notabilizou como artificie do ouro, estes, desconhecidos da maioria dos portugueses, vão produzindo obras como o “Satiro” e “Salomé”, castiçal e candelabro, em que Chaves de Almeida se afirma autêntico estatuário.
(…) As obras destes lavrantes abraçam os mais variados estilos. Os dois primeiros, talvez mais familiariazados com o gótico, o manuelino e o rocaille, também não encontram segredos no renascimento, mais da simpatia de Albertino Marques.
(…) Coimbra possuía já uma notável escola de canteiros, escultores também, que demonstraram nitidamente, graças ao superior critério de um bispo-artista –o saudoso D. Manuel de Bastos Pina-, a profundeza da intuição escultural, também inspirada no renascimento, artistas que se afirmaram e continuam afirmando num meio como o actual, em que nem sempre vence o sentido estético do artista.
(…) É necessário que as casas portuguesas saibam acarinhar as portuguesíssimas obras em ferro, divorciando-se do mau gosto de tanto e tanto estrangeirismo, ou do “pirismo” da maior parte das concepções da chamada “Arte Decorativa” moderna. (Cont.)
3 comentários:
Boa tarde, li o seu post e achei muito interessante porque conhecia o CHaves de Almeida por intermédio de uma sua amiga, Veva de Lima, cuja Casa frequento.
Gostaria de saber, se não fosse pedir-lhe muito, se na sua versão das Memórias, vem alguma menção sobre essa senhora. Se me quiser contactar: mario.nascimento@cm-lisboa.pt
Obrigado e até breve
O Zé Chaves, seu neto, é o sucessor do Almeida.
Ainda está vivo. Vi-o outro dia.
Grande artista tabém, e não só...
Saudações,
Já há uns bons meses que estou para aqui deixar uma mensagem. Tenho o livro, e realmente é uma obra única. Adorei!
Peço que me perdoem esta publicidade descarada, mas criei há algum tempo um fórum online em português, cuja temática é a do ferro forjado. Está muito vazio, tanto por falta de utilizadores como por falta de tempo minha para tentar o dinamizar mais - mas espero através desta mensagem cativar mais alguém. São todos bem-vindos! Podem aceder a ele no seguinte endereço: www.ferroforjado.org/forum/
Caro Lapa, que coincidência! Deixou a sua mensagem precisamente hoje, e nem sei o que me fez vir aqui depois de tanto tempo. Se me puder dizer, o que faz o Zé Chaves? Continua a arte do avô?
Adoraria entrar em contacto com a família de Lourenço Chaves de Almeida, e se possível arranjar uma cópia do Album de Trabalhos tantas vezes referido no livro. Seria algo absolutamente fantástico para colocar no fórum mencionado anteriormente, para que tenhamos todos algo a que aspirar!
Agradeço qualquer resposta!
Tenham umas boas entradas no ano novo!
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