(Imagem de Leonardo Braga Pinheiro)
Começo por
uma ressalva, considero-me um cidadão medianamente informado.
Diariamente e semanalmente, leio todos os jornais de informação da
cidade. Como a maioria, umas notícias tomo mais atenção, nomeadamente sobre
a Baixa, outras menos. Confesso, vou poucas vezes ao sítio da Internet da página oficial da Câmara Municipal de Coimbra. Em
contrapartida, sou um leitor diário e participante da “Página da
Câmara Municipal (Não Oficial), no Facebook.
Depois da justificação,
vamos ao que me levou a escrever esta crónica. O meu interesse sobre
a questão citada em título, sobre a audiência pública -em que se
pedem contributos aos cidadãos para melhorar o edital antes do
arranjo final e aprovação na Assembleia Municipal e posterior
promulgação em Diário da República- de actualização de
“Tabelas, Taxas e Preços do Regulamento Municipal sobre Ocupaçãode Espaço Público”, começou nesta última sexta-feira, 03 de
Março, pelas 16h44, quando recebi o seguinte e-mail:
“Boa tarde,
Enviamos em anexo o
regulamento municipal e tabela de taxas e preços para vossa
apreciação.
Aguardamos os
vossos comentários e/ou sugestões até dia 9 de Março de 2017.
Gratos pela vossa
atenção,
Jerónima”
–
APBC - Agência
para a Promoção da Baixa de Coimbra
Rua João de Ruão,
12 Arnado Business Center, piso 1, sala 3
3 000-229 Coimbra
Tel. 239 842 164
Fax. 239 840 242 Tel. 914872418
apbcoimbra@gmail.com
Eu não
lera nada nos jornais sobre a abertura desta discussão pública.
Estava de ver que o que estava em cima da mesa era um assunto muito
importante para a Baixa -mais à frente, vai-se compreender a razão.
Como tal, mal tive tempo, comecei a ler o enorme documento, que
parece uma obra de arte de Christo a embrulhar edifícios em pano pelo
mundo fora. Comecei a tomar notas sobre possíveis alterações que,
a meu ver, seriam muito importantes para a reanimação da Baixa e
que posteriormente iria apresentar na Câmara Municipal de Coimbra.
Desde o estacionamento público, passando pela ocupação de
sinalética dos estabelecimentos, até aos banhos públicos, em que
serão cobrados quarenta cêntimos aos que nada têm, muito haveria
para contribuir.
Por não
conseguir perceber a data da publicação no Diário da República
-em que se autoriza a autarquia a abrir o procedimento- e que, neste
caso, eram dados 15 dias de audiência prévia aos cidadãos, hoje,
fui à Secção de Atendimento da Câmara Municipal para saber
exactamente quando terminava o prazo de comparticipação cidadã.
Foi então que o coração me caiu aos pés. A data de publicação
foi a 7 de Fevereiro e, depois de 15 dias úteis, terminou em 28 de
Fevereiro.
Ou seja, um assunto tão importante para o desenvolvimento da Baixa,
como são os custos com ocupação de espaço público e em que, no
mesmo regulamento, está inserido sobretudo, o estacionamento na via
pública, fora, a meu ver, “escandalosamente” pouco
publicitado -lembro que muitos editais têm um prazo de 30 dias. As
razões para tal comportamento adivinham-se: a edilidade precisa de
gerar taxas a todo o custo. Saliento que não se pode acusar a autarquia de não ter cumprido a lei. Não é isto que está em
causa. O que se chama à colação é que o procedimento, a bem da
cidade e da recuperação da Baixa, deveria ter ido muito mais além.
ATÉ
TU FOSTE ESQUECIDA, APBC?
Naturalmente
que convém esclarecer o que aconteceu para, só depois do prazo legal
ter expirado, a Agência para a Promoção da Baixa de Coimbra (APBC)
-a única entidade ligada ao comércio tradicional de rua- se dirigir
aos comerciantes a pedir o seu contributo para melhoria do
Regulamento Municipal.
Vitor Marques, presidente da APBC explica o que aconteceu: “os
nossos serviços não souberam nem se aperceberam da abertura da
discussão pública deste Regulamento. Foi por acaso, em conversa na
semana passada, que soube da importância de contribuir para a
melhoria deste documento. Infelizmente, quando tomei conhecimento, o
prazo já estava esgotado e legalmente pouco poderia fazer. Como é
óbvio, pelo lugar que exerço e em nome pessoal, tenho pedidos de
alteração a solicitar à Câmara. Para tentar causar o menos dano
possível aos comerciantes pelo desconhecimento, dei ordens aos
serviços que superintendo para que, apesar do prazo ter esgotado, se
enviasse o e-mail e para que cada um possa contribuir com opiniões
para melhorar os custos. Depois de receber as alterações, conto
levar as mensagens à Câmara Municipal e, apesar de fora de tempo,
conseguir ser ouvido.”
ESTA
VERGONHA NÃO PODE CONTINUAR
Como
sabemos, os políticos andam sempre com a cidadania e a participação
pública na boca, mas é só como bandeira panfletária.
Verdadeiramente nunca estiveram, nem estão, interessados em falar e
ouvir o cidadão. Basta verificar que os Períodos de Intervenção
do Público, no Executivo e na Assembleia Municipal, são
demasiadamente rígidos na pré-inscrição, precisamente para evitar
que o hemiciclo, contrariamente à sua génese, se transforme num
fórum popular. Para intervir no Executivo a inscrição tem de
obrigatoriamente ser feita com 7 dias de antecedência. Para pedir a
palavra na Assembleia Municipal são necessários 5 dias -até à
vigência do anterior executivo de coligação PSD/CDS/PPM qualquer
cidadão que pretendesse interferir bastava no próprio dia e antes
da abertura dos trabalhos pedir autorização ao presidente do
congresso e seria admitido. É lógico que também não estava bem
assim. Parecia que o cidadão andava de chapéu na mão a pedinchar.
Mas os socialistas, que alteraram o regimento em 2015, foram do oito
para o oitenta. Vamos transcrever o artigo 72º:
“PERÍODO DE
INTERVENÇÃO ABERTO AO PÚBLICO
1- Os munícipes,
ou os grupos que sejam portadores de interesses municipais
relevantes, podem tomar a palavra nas sessões da Assembleia quando
essa faculdade seja o meio adequado, para os promover ou defender.
2-
O pedido de intervenção é feito ao Presidente da Assembleia, com
antecedência mínima de 5 (cinco) dias, que ouvida a Conferência de
Representantes decidirá sobre a pretensão.”
(Respirar
fundo)
Ou seja, no
número 1: os munícipes podem tomar a palavra quando essa faculdade
seja o meio mais adequado, ou os grupos que sejam portadores de
interesses municipais relevantes.
Por outras palavras, o cidadão só pode defender os seus direitos na
Assembleia se forem considerados pela “comissão” o “meio
adequado” para a manifestação; os grupos podem aceder ao pódio
se forem portadores de interesse relevante (sobre a óptica do presidente e dos líderes dos grupos parlamentares).
No número 2: cabe ao presidente da Assembleia, que depois de ouvida a
Conferência de Representantes decidirá da pretensão do
cidadão -e onde mora o direito à manifestação e revolta do cidadão? Imaginemos que alguém se pretende manifestar sobre este absurdo regimento. É um assunto relevante? A comissão autoriza?
Não sei se
estou a ser claro, mas estamos perante a inversão do Direito
Constitucional. Quando estamos num (aparente) estado de Direito em
que o cidadão, nas suas muitas prerrogativas constitucionais, tem
direitos à livre expressão e manifestação, é o próprio texto da magna carta que
o torna imperativo, eis que, salvo melhor opinião, a Assembleia Municipal, através do
subterfúgio, coarcta o direito e o submete a uma comissão de
análise (ou Censura).
É caso para interrogar: na autarquia, na Assembleia Municipal, no
grupo de deputados que aprovaram este Regimento não há um único
jurista que perceba qualquer coisinha de Direito Constitucional e
peça, com urgência, a revogação deste estranho regulamento?
MAS,
VOLTANDO À VACA FRIA...
Não
esquecendo o que deu aso a esta crónica, era bom que Vitor Marques,
em representação da APBC, apesar do tempo se ter esgotado para o
efeito, fosse ouvido pelo executivo para este absurdo procedimento
(de não fazer publicitar um acto público para além do Edital).
Este executivo PS ainda tem cerca de seis meses para provar que é menos mau do que parece. Ficamos todos à espera que o bom-senso impere.
Este executivo PS ainda tem cerca de seis meses para provar que é menos mau do que parece. Ficamos todos à espera que o bom-senso impere.
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