sexta-feira, 28 de dezembro de 2007

O BOMBISTA SUICIDA DA CULTURA COIMBRÃ

Augusto barros (AB), encenador da Companhia de teatro “A Escola da Noite” –Grupo de Teatro de Coimbra, segundo o seu site na Internet, é uma Associação Cultural, sem fins lucrativos, reconhecida como Instituição de Utilidade Pública desde 1998- na última Quarta-Feira, dia 26 de Dezembro, deu uma longa entrevista, de duas páginas, ao Diário de Coimbra (DC).
Para que o leitor perceba melhor, mesmo correndo o risco de me alongar demasiado, tomo a liberdade de reproduzir alguns excertos proferidos por AB. Começa por naturalmente fazer o auto-elogio da companhia de teatro a que pertence, o que até se compreende e nem se leva a mal. Depois, objectivamente, traça um quadro negro do nosso ensino das artes em Portugal, sobretudo, quando diz que “ o grau de iliteracia, até de analfabetismo, e, fundamentalmente, uma coisa que depois condiciona tudo, que é a falta de educação artística desde os mais tenros anos de idade. Isso marca em definitivo a nossa vida futura. Se nós não convivemos com as artes desde pequeninos, continuamos a ser um país pobre”.
À pergunta do jornalista se “percebendo que a cultura não é rentável, no sentido de ter um retorno financeiro, uma companhia de teatro profissional não deveria tentar profissionalizar-se também do ponto de vista comercial? Para não depender totalmente de subsídios.” Responde AB: “Não se pode querer que tudo dê lucro. Eu bem sei que estamos numa sociedade muito louca, que só funciona através do dinheiro, mas que diabo, qualquer empresário percebe que quanto menos pessoas formar pior é a sua empresa. Como é que a ópera ou o teatro pode dar lucro? A não ser que se invista mais, de maneira a que as pessoas sejam mais educadas, vão mais às coisas culturais e o nível de educação geral se eleve com benefícios para a sociedade produtiva. Claro que há fórmulas comerciais que têm muita gente. Já não são arte, nem educação. São diversão e entretenimento. As coisas “pimba”, os Quim Barreiros, os “La Féria “, são clichés que se reproduzem, mas que não ensinam ninguém.”
Continuando a citar o encenador de “A Escola da Noite”, à pergunta do jornalista se não será possível um meio termo, responde aquele: “Esta é uma questão que, infelizmente, em Coimbra, é muito discutida (…) com a contradição entre o que é popular e o que é erudito. (…) Não é verdade que os ranchos sejam para todos. Não é verdade que a “dita” cultura popular –porque a maior parte do trabalho dos ranchos 90%são adulterações- seja para todos. São coisas mal feitas e que dão má imagem da cultura popular.” Não há trabalho de pesquisa bem feito por estes grupos? –pergunta o jornalista. Responde AB: “Eu já dei 10% para isso. Mas não sou eu que o digo. São os especialistas. Até nos congressos de etnografia e folclore passam a vida a dizer que a maior parte dos grupos está a fazer aldrabices. Estão a macaquear tempos antigos. E a fazer ficções sobre tempos antigos que não foram assim. Vejo coisas ridículas, de gente vestida aparentemente à século XIX, com danças que nada têm a ver com aquilo. Não é cultura popular. O vereador da Cultura (da Câmara Municipal de Coimbra -CMC-, Mário Nunes) é um vereador contra a cultura. Julga que defendendo ranchos e bandas consegue votos. É apenas uma questão eleitoral. (…) o vereador da cultura é anticultura. Basta ver-se qual tem sido a viagem do orçamento da Cultura nos últimos quatro ou cinco anos.”
Para salvaguarda de conflitos de interesses, e para que não fique qualquer dúvida, não represento a AFERM, Associação de Folclore e Etnografia da Região do Mondego, o Ministério da Cultura, ou o Vereador da Cultura da CMC.
Depois desta ressalva, dentro da minha abominável ignorância, vou tentar responder a Augusto Barros. Faço-o porque, sinceramente, creio que este senhor foi, acima de tudo, arrogante, absolutista e tremendamente injusto para todas as pessoas que citou e, muito mesmo, mas mesmo muito, para os ranchos folclóricos. Eu conheço muito bem o “interior” destes grupos. Aliás, a AFERM deveria ter uma resposta para dar a este senhor Barros. Mas também não me admira, em Coimbra raramente as instituições respondem a qualquer assunto, mesmo que seja insulto. Só a Psicologia Social poderá explicar este reiterado comportamento.
Vamos então analisar, sob o meu vesgo olhar, ponto por ponto, as afirmações deste douto e futuro candidato a vereador da Cultura de Coimbra. Temos homem. Alegremo-nos ralé de ignorantes.
Comecemos por quando responde que não se pode crer que tudo dê lucro. Porque não? É obrigatório que a cultura, baixa ou alta, popular ou erudita, deva viver à custa de subsídios estatais? Não pode ser auto-sustentável, pelo menos parcialmente? É certo que o Estado não dá os melhores exemplos, agindo discricionariamente, discriminando pessoas e grupos. Favorecendo uns e prejudicando outros. Porém, a meu ver, o princípio que deve estar subjacente à feitura de cultura para massas ou minorias mais eruditas deve ser a sustentabilidade financeira própria e não o contrário, ou seja, o viver-se continuamente à custa de subsídios. Não é que considere que o subsídio seja despiciendo, nada disso. É importante, mas deve ser o acessório e não o essencial, como argumenta aqui o encenador de “A Escola da Noite”. Fala de La Féria como cliché? A meu ver, todos os encenadores ao falarem deste senhor deveriam pôr-se em sentido. Contrariamente ao que afirma, tem muito a ensinar aos subsidio-dependentes que grassam no país.
Depois fala dos ranchos (grupos folclóricos) como se conhecesse alguma coisa destes grupos. Pelo que fala, não sabe, nem conhece nada destes agrupamentos culturais. A maioria dos membros concorre por amor à camisola. Não é só o tempo que despendem como também as roupas e as suas deslocações, que é tudo à sua custa. Os últimos subsídios camarários, aos diversos ranchos da região de Coimbra, salvo erro, rondaram em média entre os 1000 e os 9000 euros. Pensa, por acaso, que esta pequena migalha tapa os buracos destes agrupamentos se não for o altruísmo dos seus membros? Para não falar na forma injusta quando refere que a percentagem de 90% são adulterações -era engraçado saber onde foi colher este valor, seria por amostra?- e o”macanquear” de tempos idos e das suas recolhas. Fala de Giacometti e Leite de Vasconcelos. Foram de facto a pedra basilar para que o nosso folclore não se perdesse, mas sem a carolice dos ranchos muita coisa se teria perdido também. Os Ranchos Folclóricos, tal como uma peça de teatro, não têm de ir ao absurdo da cópia fiel. O seu trabalho é a representação da memória ao mais aproximado possível.

1 comentário:

Vítor Ramalho disse...

A maioria dessas companhias de teatro “trabalha” para uma minoria de iluminados da esquerda chique.
As salas estão praticamente vazias porque não conseguem cativar o povo a que chamam ignorante.
A esquerda, cada vez se afasta mais dos seus ideais, se é que alguma vez os abraçou mesmo.