quinta-feira, 29 de novembro de 2007

MEGACOMÉRCIO: O MITO DO DESENVOLVIMENTO

(IMAGEM DE BRAGA PINHEIRO)


  Neste último fim de semana, de 25 de Novembro, ficámos a saber, quer pelo “Expresso”, quer pelo “Diário de Notícias”, que o patrão dos patrões, o presidente da Confederação do Comércio Português, José António Silva, ponderava a hipótese de, conjuntamente, com o presidente da CGTP, Carvalho da Silva, de aderir a uma greve geral, em face do crescente aumento de falências e subsequente desemprego no comércio, quer de pequenos empresários, quer de funcionários. Ficou-se a saber que a partir de 2004 este sector perdeu 250 mil empregos. Prevê-se, também, que para os próximos quatro anos desapareçam mais 100 mil postos de trabalho.
Não vou pronunciar-me se, sendo uma medida inédita, é a mais indicada ou outra qualquer –sabe-se, agora, que foi fumo sem fogo, uma vez que o presidente da Confederação veio desmentir e afirmar que tudo não passou de um mal-entendido. Uma coisa é certa, José António Silva ficou numa posição periclitante, muito fragilizada, e, das duas uma, ou avança com medidas reivindicativas ou então dever-se-á demitir. Caso não o faça deverão ser as diversas associações comerciais do país a pedir a sua cabeça. Depois deste "mal-entendido”, penso, iniciou-se um processo sem retorno que não pode parar mais e o “big boss” do patronato tem de mostrar que está à altura do lugar que ocupa. Criou expectativas nos operadores, agora, alguma coisa terá de fazer para chamar a atenção do governo perante este continuado empobrecimento de um sector, o pequeno comércio, que foi um dos maiores empregadores do país. Hoje, corre-se o risco, caso não se tomem medidas drásticas de salvação de todos, de assistirmos ao seu desaparecimento, e, no caso concreto, se se concretizar o anteprojecto do novo licenciamento das grandes superfícies, que liberaliza ainda mais a abertura de hipermercados e centros comerciais.
Bem sei que o consumidor comum está perfeitamente de acordo que abram mais grandes superfícies e, se possível, que estejam abertas 24 sobre 24 horas. Egocentricamente, acha até que esta guerra não é sua, diz respeito apenas aos comerciantes, a quem considera atávicos e anacrónicos, que não conseguiram modernizar-se e adaptar-se aos novos tempos, sobretudo, tendo em conta os horários praticados hoje; iguais há 50 anos atrás. Se levarmos à letra a doutrina neoliberal desta desbragada liberalização, que nos é impingida, e aceite pela maioria, como um mito do desenvolvimento, esse acto legislativo, levará a uma maior concorrência entre as grandes superfícies e, no limite, a um embaratecimento dos produtos. Aparentemente, no curto prazo, assim é. Mas a médio prazo todos pagaremos bem caro este excessivo laivo de concorrência, esta falta de limites. Basta atentar no abandono dos Centros Históricos. -Chamei-lhe mito, porque, a meu ver, mesmo produzindo impacto sobre a sociedade, na sua constante repetição, nunca deixará de o ser e jamais se tornará uma verdade sem contestação. O desenvolvimento implica uma concertação de factores –como a saúde, a educação, a habitação, o emprego, etc.- e sustenta o crescimento económico do todo social, bem como o político e até o filosófico. O desenvolvimento é um progresso de um estado a outro, de tal modo que o seguinte é sempre mais perfeito que o anterior, mas sempre, verticalmente, devendo ter em conta a maximização da sociedade no seu todo, atingindo-se um nível de vida razoável. Como se vê facilmente, no caso da extinção do comércio de rua, apenas uma franja, ainda que elevada, consegue obter um melhor nível socio-económico, mas esse patamar é alcançado à custa do esmagamento de milhares de pessoas e de uma classe (os comerciantes). Então pergunta-se, quem vai sustentar estas pessoas, empresários e funcionários, empurradas para o desemprego? É óbvio que serão os nossos impostos, aumentando a despesa no Orçamento Geral do Estado. Diga-se a propósito, presentemente, por parte de alguns comerciantes com menos de 60 anos, está a assistir-se a uma corrida desenfreada às pré-reformas. Mesmo com as penalizações associadas é preferível receber pouco do que ter de pagar sem se ganhar para isso.
O Estado, tendo apenas em meta o racionamento económico, a concentração, espalha a crença na sociedade de que o mito do desenvolvimento assenta na grandiosidade dos fins, sem ter em conta os meios, no presente e no futuro. Tudo se sustenta na mega estrutura: é a mega superfície comercial, é o mega transporte em alta velocidade (TGV), é o mega aeroporto (OTA, ou outro), é o mega hospital, é a mega maternidade. Pouco importa que no futuro a população média esteja impossibilitada de usar estas estruturas, por falta de suporte financeiro. O que interessa é construí-las hoje, em nome do desenvolvimento de amanhã.
Todos sabemos que os consumidores (que somos todos) são agentes privados que exercem livremente os seus direitos de adquirirem os bens de consumo ao mais baixo preço. Até porque o estado da economia nacional empurra-nos a todos para os produtos de menores dígitos, mesmo sabendo, antecipadamente, que serão inferiores a outros, comparativamente. O problema é que ao escolhermos o mais barato, normalmente, é importado, e, em bloco, numa cegueira continuada, estamos todos a contribuir para o encerramento de estabelecimentos e produtores nacionais. 
Valerá a pena pensar nisto?

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