quinta-feira, 8 de março de 2018

DIAS, NAQUELES DIAS, DE UM DIA COMERCIAL...

(Imagem de Leonardo Braga Pinheiro)



Lição de vida: podes pôr em causa a honorabilidade
de qualquer mortal,   mas jamais   de   um    licenciado
pela Universidade de Coimbra do tempo do Antigo Regime!”

Bem vestida, emanando em redor um perfume caro, septuagenária em boa forma física capaz de romper ainda meias-solas, mais que certo licenciada pela Universidade de Coimbra -superioridade que marcou a geração de 1940/50, já que nesse tempo só poucos tinham acesso ao ensino universitário, e lhes deixou um ego maior que um nabo enorme nascido na terra dos fenómenos, no Entroncamento-, a fazer lembrar a doutora Joaquina, pose altiva, de olhar para cima do comum dos mortais, em passo ligeiro entrou no estabelecimento de miudezas baratas carregada de vários sacos. A funcionária, simpaticamente, dirigiu-se-lhe:

-Desculpe, minha senhora, mas tem de fazer o favor de deixar os sacos aqui na caixa...
(Como picada por uma cobra, a mulher, ou melhor, a senhora doutora como manda a cartilha, sentiu-se ferida no mais profundo da alma mas, mesmo assim, virando-se devagar para a empregada, com voz bem timbrada, retorquiu) minha senhora, se desconfia de mim, eu também posso desconfiar da senhora...
querida -complementa a vigilante-, não me leve a mal mas eu sou empregada... São as ordens que tenho do patrão...
querida?!? Abespinhou-se a cliente. Não me trate por querida, que eu não sou sua querida... Está a ouvir? Ao mesmo tempo que se encaminhava para a porta de saída a resmungar.

A funcionária, quase com as lágrimas a saltarem dos olhos tristes, virando-se para os restantes clientes que assistiram a cena, lá foi esparramando o seu descontentamento em jeito de desabafo: “já viram isto? O que posso fazer? Vou contra as ordens do patrão?”

Lição de vida: podes pôr em causa a honorabilidade de qualquer mortal, mas jamais de um licenciado pela Universidade de Coimbra do tempo do Antigo Regime!

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