Antes de ir directamente à questão que me
levou a escrever esta crónica vou brincar com a palavra Sota. É um vocábulo
giro porque, ao mesmo tempo, tem significados antagónicos. Tanto quer dizer “o que cavalga a sela” –por tanto instiga
superioridade- como, em contrário e mais comum,
se infere uma subalternidade, no exemplo “sota-capitão”. Quer dizer ainda “mulher astuciosa”. E ainda “a
parelha dianteira, num carro puxado por mais do que uma”. Por outro lado,
se lermos “sota” da direita para a
esquerda sugere-nos outra palavra: atos.
Por conseguinte, “atos”, já no novo
acordo ortográfico, entre várias interpretações, pode significar diferentes divisões ou partes de uma peça
teatral.
Ora, depois desta estapafúrdia introdução, vou
chegar onde queria, que era mostrar que a Rua da Sota, tendo em conta a sua
definição etimológica, está a cumprir à risca o seu destino. Nos últimos cinco anos,
pelas decisões camarárias respeitantes ao trânsito nesta artéria, foi uma
guerra pegada entre o então executivo da extinta junta de freguesia de São
Bartolomeu, de cor rosa (PS) e liderado por Carlos Clemente, e o então executivo
autárquico da Coligação por Coimbra, PSD, PP, PPM, chefiado por Barbosa de
Melo. O argumento de dissenso invocado era o estacionamento, que do lado do
Hotel Astória era a pagar e do lado dos armazéns Raf era gratuito. Depois,
para complicar ainda mais a interpretação, há dois anos, foi colocada uma placa
junto ao Banco de Portugal, no Largo da Portagem, em que se proibia a
circulação “excepto residentes e ligeiros
para cargas e descargas”. Mais abaixo estava uma placa que indicava “zona estacionamento de ligeiros sujeito a
pagamento”. Ou seja, entre as duas indicações havia uma contradição
implícita. Uma ordem anulava a outra.
No seguimento de que esta rua está fadada para
a confusão, ontem o sentido de trânsito foi invertido. Isto é, agora para se
entrar nesta via terá de ser pelo Largo das Ameias, junto ao Café Angola. Sobre
uma pequena rampa de acesso, se for um veículo de mercadorias, aparentemente não
tem espaço facilitado para virar à direita. Mas junto ao Banco de Portugal –outrora
entrada e agora saída-, parece-me, ainda é pior. Para além de ter uma outra
rampa inclinada entra-se numa via estreita. Salvo melhor opinião, uns ingressos
nada fáceis pelo que constatei ontem mesmo. Mas, antes de saber as razões que
estiveram na origem desta decisão, fui ouvir os responsáveis pelos
estabelecimentos comerciais. Estão satisfeitos? Não estão?
Da parte dos que consideram positiva a medida
Celso Baía, da Casa Baía, é um deles. “Concordo
inteiramente. Passaram de 10 para 24 lugares de estacionamento. Já não circulam
aqui carros em alta velocidade. Está muito melhor! Os meus clientes já podem
vir calmamente ao meu estabelecimento”. Também Fátima Ferreira, funcionária
dos Armazéns Raf, concorda. “Está melhor! Já podemos carregar e descarregar à
vontade. Era um conflito diário com os outros automobilistas sempre a apitar.
Agora podemos trabalhar calmamente. Hoje é o primeiro dia. Vamos ver como vai
correr.”
Dos que estão contra, comecei por ouvir Ana
Lúcia, do Salão Sota. “Não consigo
entender o porquê desta alteração de movimento de trânsito na rua. Não faz
qualquer sentido. Não devem ter mais nada para fazer, então inventam. Só pode!”.
Também Jorge Fernandes, da Barbearia Adónis, partilha o mesmo sentimento. “É uma mudança para acabar com o negócio na
Baixa. É um absurdo! Não faz sentido! Mais valia fechar o trânsito de vez. Com
esta medida, não há melhoramentos. Antes pelo contrário. Acho que nos prejudica
muito!”
Também Rosário Freitas,
funcionária do restaurante Calado & Calado, está contra. “É muito mau! Hoje temos menos gente! Estão
a passar menos carros. Se o negócio já estava mal, agora piorou. Não vejo
qualquer vantagem! Enquanto funcionária, estou preocupada. Se o restaurante
fosse meu fazia imediatamente um abaixo-assinado a solicitar a reposição do
anterior”. Pedro Pereira, do restaurante “Solar do Bacalhau”, ex-Giuseppe
& Joaquim, também partilha de opinião similar. “Com esta mudança, há menor visibilidade do nosso restaurante. Quem vem
agora tem de vir de propósito. É um risco inverter o sentido do trânsito. Valia
mais manter como estava e permitir o tráfego entre as 8h00 e as 19h00. Após
esta hora do encerramento do comércio a rua passava a ser somente para peões e
para carga e descarga. Parece-me que esta alteração, como está, não está bem!”
E O QUE DIZ CLEMENTE?
Carlos Clemente, ex-presidente da extinta Junta
de São Bartolomeu e agora adjunto do Gabinete de Apoio à Presidência nas áreas
de apoio às Juntas de Freguesia, salubridade pública e os cemitérios, em seu
nome pessoal aceitou explicar o seu ponto de vista sobre esta nova postura
camarária. “Enquanto ex-autarca, e é nesta
condição que aceito prestar declarações, considero esta medida acertada. Aliás,
era uma reivindicação antiga da junta de freguesia a que presidi. O que está em
causa, e é preciso salientar isto muito bem porque não há outra qualquer
intenção, é melhorar a circulação automóvel na Rua da Sota. Evitar que aquela
via continue a ser uma “escapatória” para quem quer fugir ao trânsito da
Avenida Navarro, um atalho de atravessamento a grande velocidade. Agora, com
esta mudança, as pessoas que vêm para a Baixa tem mesmo de se deslocar para
esse fim. É uma medida positiva. Acaba-se com o estacionamento em segunda fila.
Deu-se maior dignidade à rua e a todos os operadores comerciais, concedendo-lhe
mais espaço pedonal e menos para os automóveis.”
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1 comentário:
Não vejo melhoramento algum com esta absurda alteração, bem pelo contrario. Não me recordo de alguma vez fazes parte das opções de grande plano da Junta de São Bartolomeu esta reivindicação, e fui as ler todas antes de escrever este comentário. No tempo de Barbosa de Melo era um marasmo mas agora é uma brincadeirinha, ou seja, fazer por fazer e nada mais.
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