terça-feira, 26 de abril de 2016

MARGEM D'EUFORIA, NA BAIXA



Junto ao Pelourinho, há cerca de duas semanas, abriu na Praça do Comércio a sapataria “Margem d’Euforia”.
Com o contraste baseado no maniqueísmo dualista, entre o branco e o preto –Maniqueísmo é uma filosofia religiosa, dualista, que combina princípios de diversas doutrinas e divide o mundo em duas partes opostas e sem possibilidades alternativas como, por exemplo, bom, mau-, apesar disso, este novo estabelecimento fura o sincretismo de Maniqueu e cria uma zona verde, de esperança, entre as duas cores apresentadas.
Diana Oliveira é a maestrina que faz tudo. Imaginou o cenário, fez a composição de acordo com um toque de música clássica, executa, dirige a orquestra e simpaticamente recebe o público que, está de ver, a vai ovacionar ao longo de muitos, muitos dias em que o espectáculo estará em cena neste palco, que é a cidade e em que todos somos, ao mesmo tempo, actores, encenadores e público.
Depois de quase uma década a ver como se faz em boas sapatarias na Baixa, este é mesmo o sonho místico realizado por Diana –tal como a deusa da mitologia, perfeccionista, divide-se entre a racionalidade (na caça) e o transcendente (na lua). Nefelibata, tanto é pragmática, com pés no chão, como se deixa levar completamente pela emoção. Portanto, é lógico que esta linda miúda, de pouco mais de metro e meio, veio para revolucionar tudo, desde afirmação, a costumes e até conceitos.
Vamos ouvir Diana Oliveira: “estes primeiros 15 dias, em balanço, são muito positivos. Por obra e devir, não devem nada à Baixa. Foi graças à publicidade que fazemos e à entrega total que colocámos neste projecto comercial.
A Câmara Municipal poderia fazer melhor para desenvolver esta grande área histórica e classificada como Património Mundial, pela Unesco. Este majestoso largo com duas igrejas, uma delas do século XII, está diariamente e durante todo o dia a servir de estacionamento automóvel. Tenho pena que a autarquia não ajude a desenvolver mais a Baixa.
Seguindo o apelo do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, enquanto jovem, vou estar atenta e ser muito acutilante. Falo o que tiver de falar. Estou aqui para vencer através do trabalho. Estamos a praticar um horário alargado, desde as 9h30 às 20h00. Vamos abrir ao Domingo. Tenho que proteger o meu negócio, custe o custar.
Sou muito “idiota”. Estou sempre a imaginar novas ideias, como passatempos no Facebook. Estou aqui porque acredito nas potencialidades da Baixa, sei que vai mudar. Se assim não fosse teria ido para um shopping –tive dois convites. Sei que, esforçando-nos, estamos a contribuir para a sua revitalização.
Estou muito grata aos meus amigos que nos empurram e nos dão alegrias a todo o momento. Estamos a vender muito bem, felizmente. Os que ainda não nos visitaram, não hesitem, venham cá. Recebo-vos com um produto de qualidade e o maior dos sorrisos.


A QUEIMA VEM ATÉ ÀS LOJAS





Caro Colega:
A Comissão Organizadora da Queima das Fitas pretende para o ano 2016 uma aproximação do evento à cidade de Coimbra. Deste modo e particularmente em relação à Baixa, pretende retomar uma antiga tradição: a entrega do cartaz oficial em mão aos comerciantes da cidade. Deste modo, a Comissão Organizadora da Queima das Fitas pretende lançar o desafio aos estabelecimentos comerciais da zona da Baixa de Coimbra a decorarem as suas montras com motivos alusivos à Queima das Fitas, a partir do próximo dia 02 de Maio, segunda-feira. No dia da inauguração das montras, a Comissão Central percorrerá a Baixa, entregando os cartazes oficiais aos comerciantes. 
A v/ colaboração é fundamental.
Atenciosamente,

A Direção da APBC
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-APBC - Agência para a Promoção da Baixa de Coimbra
Rua João de Ruão, 12 Arnado Business Center, piso 1, sala 3
3 000-229 Coimbra
Tel. 239 842 164  Fax. 239 840 242 Tel. 914872418

UM COMENTÁRIO RECEBIDO SOBRE...



Anónimo deixou um novo comentário na sua mensagem "PEDRO FREITAS, O “VAN GOGH” PORTUGUÊS":


O Pedro tem 4 filhos de 4 mulheres diferentes. Um filho está na Jugoslávia, é treinador de basquetebol na principal liga jugoslava. Tem mais dois filhos em Lisboa e um em Arganil. A família de Arganil é a única que ainda lhe mantinha alguma ligação. No entanto, a sua ex-mulher de Arganil, faleceu há dois anos. O filho, a formar-se em engenharia informática, suspendeu os estudos na altura para tomar conta da mãe. Desde então, o Pedro afastou-se da família que lhe restava por se culpabilizar pelo sucedido.
Parece que, infelizmente, o passado de toxicodependência do Pedro tem feito com que ninguém na família o reconheça. Para quem não sabe, já lá vão 20 desintoxicações e 3 comas fruto do consumo de heroína.
Por mais que custe, parece que o Pedro, muito infelizmente, terá um fim solitário.
Mas, dando toda a razão ao Miguel Dias, a admiração e a amizade da maior parte das pessoas pelo Pedro teve sempre apenas como fim ter quadros em troca. 20, 30 ou 50€ por um quadro não é de quem o admira, é de quem não se importa de o ver matar o seu próprio vício em troca de poderem ter um quadro dele.
A hipocrisia de muitos assenta-lhes que nem uma luva.


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Anónimo deixou um novo comentário na sua mensagem "PEDRO FREITAS, O “VAN GOGH” PORTUGUÊS":


Lamento o seu estado de saúde. Dei alojamento ao Pedro em 2007 e em 2014. Tenho algumas obras dele e ele falou-me algumas vezes numa irmã e que a mesma desempenhava funções de relevo numa universidade em Lisboa, mas não me lembro em qual. Também conheço alguém que o tentou ajudar no ano de 2014 e posso tentar falar com essa pessoa. Meu endereço elétronico:casamiramar@hotmail.com


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Anónimo deixou um novo comentário na sua mensagem "PEDRO FREITAS, O “VAN GOGH” PORTUGUÊS":


Lamento que o Pedro esteja doente. Tenho algumas obras dele. Dei-lhe alojamento no ano 2007 e em 2014 e ele comentou que tinha uma irmã a desempenhar funções bastante relevantes, numa universidade em Lisboa, mas não não me ocorre qual. Também conheço alguém que o tentou ajudar em 2014.


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ING Daniel Pimenta deixou um novo comentário na sua mensagem "PEDRO FREITAS, O “VAN GOGH” PORTUGUÊS":


Tenho vários quadros do Pedro, ele é uma pessoa muito cultivada, bem-educado. Tem os seus defeitos como muitos artistas. Mas tenho muita pena de estar longe e não poder ajudar. Quando eu estava em Portugal, pedia-me alguma ajuda e em volta pintava-me um quadro sem eu pedir nada de volta. Só quem não o conhece é que pode falar disparates. É um grande homem, cheio de bondade.
ING DANIEL PIMENTA


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ING Daniel Pimenta deixou um novo comentário na sua mensagem "PEDRO FREITAS, O “VAN GOGH” PORTUGUÊS":


O Pedro é um grande artista e amigo. Como todos os artistas tem os seus defeitos. Tenho vários quadros dele. É uma pessoa honesta cultivada e bem-educada, sem maldade nenhuma. Pena eu estar no estrangeiro e não poder ajudar.
 ING Daniel Pimenta


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Miguel Dias deixou um novo comentário na sua mensagem "PEDRO FREITAS, O “VAN GOGH” PORTUGUÊS":


Hipócritas. Quanto pagaram pelos seus quadros? O suficiente para uma dose???


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SuperFebras deixou um novo comentário na sua mensagem "PEDRO FREITAS, O “VAN GOGH” PORTUGUÊS":


Amigo:

Coitado do DaSilva.
Estava eu aqui já de dente afiado, quando me apercebi do desperdício que seria caso julgasse tal alma implodida.
É que não seriam mais que as minhas manchas se por mim julgadas as suas fraquezas. Encontrar mais que as minhas, seria e é humanamente impossível. Sabe amigo, quem isso me doutrinou conhece o daSiva tao bem!
Para que semear ventos se sei que colherei tempestades.
E ódio? Que ripa um homem que espalha o ódio?

Receba um abraço de quem teme ser julgado irmão e pai bem pior que o Sr. Freitas.

Alváro José da Sila Pratas Leitão
Bradford
Ontário
Canadá





sábado, 23 de abril de 2016

FOSCA-SE! AINDA NÃO FOI DESTA!




Porra, nunca mais sai o meu nome no Expresso!! Todos os Sábados é a mesma ansiedade. De Sexta para Sábado nem durmo a pensar: é desta vez! Vou à banca da Lena, na Praça 8 de Maio, e é a mesma decepção. Nada!
Nos últimos anos têm sido só desapontamentos. Antigamente, todas as noites sonhava com um tio no Brasil. Fui envelhecendo, mais que certo o meu familiar desconhecido morreu, e nunca apareceu.
Distribuindo sorrisos e carinhos pelas velhinhas que me foram calhando em sorte, fui dando o meu cartão e sempre acompanhado com a recomendação: se não tiver a quem deixar a sua fortuna, lembre-se de mim. Até hoje, nunca recebi um telefonema de um qualquer advogado a anunciar-me a boa-nova.
Veio o Totobola, o Euromilhões, as mesmas desilusões, a mesma coisa. Veio o sorteio do Audi oferecido pelo Governo de Passos Coelho e nunca se lembraram de mim.
Comecei a ver as manifestações dos credores do BES e pensei que também deveria fazer parte do grupo. Acontece que nem no banco bom nem no banco mau consta o meu nome. Ao menos que tivesse lá umas aplicações duvidosas. Rien de tout! Nem uma acção, e eu que até me esforço em fazer boas –para lavar a alma e através da redenção, mesmo já tarde, ganhar uma pequena sweet de luxo no Céu, mas isso não interessa para aqui.
Eu até gostava de estar preocupado com o BPI e ganhar um sorriso de Isabel dos Santos, mas qual quê? Chiça! Não é por nada mas uma pessoa sente-se diminuída! Como dizia o outro, isto só pode ser mesmo castigo.
Agora a minha esperança vai inteirinha para os papéis sul-americanos. Espero que o meu nome conste por lá! Tenham paciência, desenrasquem-se, mas eu quero fazer parte do rol. É a minha última oportunidade. Sei que já não tenho muito tempo, caraças!
É certo que nunca tive conta no Panamá, mas deveria ter, não devia? Qualquer português que se preze deveria ter uma contita “offshore”. É ou não é? Que chatice! Fosca-se!?!

CORTEJO DOS PEQUENITOS



VÍDEO DE MÁRCIO RAMOS


Ontem, sexta-feira, realizou-se na Baixa o Cortejo dos Pequenitos. Segundo o Diário de Coimbra, “mais de meio milhar de crianças, em representação de 17 jardins-de-infância do concelho de Coimbra, desfilaram ontem, trajadas a rigor, pelas ruas da Baixa da cidade recuperando uma tradição que esteve três anos arredada da programação da Queima das Fitas e que a Comissão Organizadora da festa estudantil decidiu recuperar para 2016.”

UM COMENTÁRIO RECEBIDO SOBRE...





dasilva deixou um novo comentário na sua mensagem "PEDRO FREITAS, O “VAN GOGH” PORTUGUÊS":


E será que o "pintante" Pedro Freitas alguma vez FOI pai ou irmão de alguém? Pela aragem parece-me bem que não, daí o estar a recolher os frutos da seara que semeou. Por que é que não teve a coragem de se eutanasiar a tempo e horas. Que carga de trabalhos certidões e assinaturas se poupavam.




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Shankara deixou um novo comentário na sua mensagem "PEDRO FREITAS, O “VAN GOGH” PORTUGUÊS":


Isto é horrendo! Eu conheci-o e tenho grande carinho por aquela alma vagabunda que no fundo apenas busca amor e aceitação, mas a sua ingenuidade e rebeldia o fazem um marginal na sociedade... Vi suas obras a serem criadas (até lá tenho em casa) nelas se reflecte os seus desejos e medos... Espero que este não seja um adeus... E que ainda haja um final mais digno para Pedro!




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Mónica Gomes de Sá deixou um novo comentário na sua mensagem "PEDRO FREITAS, O “VAN GOGH” PORTUGUÊS":


Deprimente. Tenho um quadro do Pedro. Chama-se Talisman. Fiquei comovida por saber que se encontra doente e só... Parabéns pela sua atitude perante a situação, e por divulgar ...


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Ana Neto deixou um novo comentário na sua mensagem "PEDRO FREITAS, O “VAN GOGH” PORTUGUÊS":


Quem responde assim não pode ter qualquer tipo de sentimentos. Lamento a falta de sensibilidade.


sexta-feira, 22 de abril de 2016

A BAIXA VISTA DA MINHA JANELA



POR MÁRCIO RAMOS


Bem, em relação ao assalto ao talho, não podemos dizer que os ladrões ficaram ou vão ficar com fome: levaram abastecimento para um bom tempo. Mas passemos a coisas mais sérias.
Depois de repetidos assaltos, se fosse comigo, à segunda ou terceira vez colocava um alarme e câmaras, ou um sistema de segurança com vigilância ligado a uma central de alarmes/polícia, como hoje em dia acontece. Enquanto entram e não entram já a esquadra foi informada e são apanhados em flagrante.
Entendo que os donos do estabelecimento de carnes possam não ter orçamento para a segurança, mas levanto varias questões.
Há vários anos, por volta de 2007/8/9, houve uma onda de assaltos na Baixa. Todos os dias, no mínimo, uma loja era assaltada. Às vezes eram duas numa noite. Devido a tanto crime algumas fecharam. A câmara Municipal decidiu agir com pompa e circunstância e anunciou um sistema de vigilância na zona problemática. Os crimes diminuíram, mas hoje em dia não sabemos que é feito desse sistema. Está activo? Não está? Se funciona, porque não foi detectado este roubo a tempo?
Temos em Coimbra a Polícia Municipal. Esta força só serve para passar multas? Não deveria este corpo municipal contribuir para segurança dos munícipes? Não poderiam agentes aos pares fazerem uma ronda pela Baixa à noite?
Temos a Polícia de Segurança Pública, PSP. Esta polícia tem falta de meios e efetivos humanos, diz-se. Mas durante o dia um agente faz a ronda numa moto 4. Antigamente esta vigília era feita a pé, geralmente em pares. Se durante o dia esta força se faz notar, dando-nos a sensação de segurança -mesmo em algumas ruas quase desertas-, de noite passa-se oposto, porque é raro ver agentes a patrulharem a Baixa. Costuma passar uma ronda perto das 23h00 nas ruas largas, mas fora isso, pela noite dentro, é raro ver agentes policiais.
Na escuridão das ruas, quando todos dormem, não me sinto seguro, mesmo com videovigilância. Especulando, não sei se numa esquina não estará um perigo à espreita. Se for assaltado em plena via –longe vá o agoiro-, não saberei se virá ajuda mesmo com uma câmara presumivelmente a observar-me. Posso estar a esvair-me em sangue, saberei lá se virá algum agente auxiliar-me? Nem imagino, pois não sei se de trás do visor de controle de vídeo estará alguém, que possa fazer deslocar meios de socorro.
Há ainda outro problema, há muito apontado na Baixa: a falta de iluminação pública. Não é que não tenha luz. Tem. O problema coloca-se quando há candeeiros imensamente sujos, ao ponto de a luminosidade não ser distribuída decentemente, com a potência das lâmpadas a serem insuficientes, o que leva a uma deficiente iluminação. Consequentemente, a sensação de falta de insegurança, para além de ser material, é também psicológica.
Quando eu era mais jovem –agora tenho 35 anos-, havia em Coimbra, a vigiar a noite, guardas-nocturnos. Na altura, não andavam armados e faziam vários percursos. Pergunto: porque não voltar outra vez aos simpáticos guardas? Até mesmo para a Alta seriam bem empregues. Deveriam andar armados pois o tempo de hoje não é o mesmo de há 20 anos. Uma boa dezena destes agentes civis na zona histórica iria contribuir para a segurança e ser dissuasora de assaltos e crimes contra o património como grafites.


UMA GRANDE SALVA DE PALMAS




Uma grande salva de palmas para o PCP e o Bloco de Esquerda que colocaram um ponto final na selva que reinava no império das empresas de telecomunicações. Só quem passou por situações sabe a ditadura instalada, sem regras –ou melhor, com regras mas  sempre a seu favor.
Destruíram o sono a algumas pessoas que conheço. Nem mesmo o recurso para a Autoridade Nacional de Comunicações (ANACOM) resolveu questões absurdas. Muito bem! É para isto mesmo que serve o Parlamento.

BOM DIA, PESSOAL...

quinta-feira, 21 de abril de 2016

PEDRO FREITAS, O “VAN GOGH” PORTUGUÊS



O pintor mais célebre da Baixa de Coimbra Pedro Freitas, de nomenclatura completa Pedro Duarte da Silva Freitas, está muito mal de saúde. Internado nos HUC, Hospitais da Universidade de Coimbra, desde Fevereiro último, onde entrou muito frágil, físico e psíquico, já com as defesas naturais descompensadas, viria a apanhar a bactéria multi-resistente aos antibióticos.
Desde essa altura que, alegadamente, o seu estado tem vindo a agravar-se –escrevo “alegadamente” já que me estou a socorrer da minha apreciação subjectiva. Muito magro, já sem voz, o Freitas é hoje uma sombra encolhida de há um ano atrás.

UM POUCO DE HISTÓRIA

Freitas tem obras espalhadas pelo mundo inteiro. Filho do grande escultor Silva Freitas, o Pedro transporta nos genes a criação artística do seu progenitor. Desde muito cedo, sabe-se lá o porquê, enveredou por caminhos de dependência que, mais tarde ou mais cedo, conduzem à perdição. Em 2009, quando o encontrei pela primeira vez na Baixa, dizia-me: “A vida nunca me foi fácil. Às vezes, neste labirinto existencial, tomei por caminhos que não devia. Mas olhe que eu sou um bom pintor. Se for à Internet e clicar “Pedro Duarte da Silva Freitas”, você verá toda a minha obra”, aconselhava-me em apelo.
Voltou a Coimbra em Abril de 2015, e assentou arraiais na Baixa.
Homem de semblante profundamente triste, onde a solidão e a tristeza se podem pegar em braçadas, mostra uma sensibilidade única de génio criativo. Tal como Vincent Van Gogh as suas obras nunca foram muito valorizadas por quem lhas adquiriu –e falo de mim também. É bem natural que o seu percurso, de vida e morte, vá ser muito parecido com o do pintor universal dos girassóis.

TRATADO COMO INDIGENTE

A primeira vez que fui visitar o Freitas ao hospital foi em Fevereiro. Nessa altura, embora já vulnerável, onde a visita já implicava equipamento especial de doença infecto-contagiosa, ainda eram audíveis as suas palavras. Perguntei no gabinete médico da enfermaria se algum familiar já o tinha visitado. Disseram-me que uma sua irmã, de Lisboa, já o tinha ido ver. Por uma questão de prevenção, deixei o meu número de contacto para o caso de ser necessário algo transcendente.
Em meados do mês passado, de Março, voltei. Já pior, falando eu pelos dois, ainda conversei com ele.
A semana passada, numa manhã, recebi um telefonema de uma assistente social dos HUC. Depois da introdução, referindo o facto de lá ter deixado o meu contacto, continuou a funcionária, “estou a ligar-lhe, senhor Quintans, por causa do Pedro. Como deve calcular, ele não pode continuar aqui no hospital. É necessário transferi-lo para uma Unidade de Cuidados Continuados. Lá está melhor do que aqui. Então precisava de lhe pedir um pequeno favor. Coisa simples. Sabe o que é? Para o transferir dos HUC precisamos da assinatura de alguém próximo dele. Então lembrei-me do senhor…”
Interrompi para lhe perguntar a razão de não convocar a irmã, de Lisboa. Respondeu a técnica de acção social: "sabe, ela está longe e só precisamos mesmo de uma assinatura. É apenas um conhecimento e que não implica qualquer responsabilidade. É apenas para sermos rápidos a solicitar a unidade de cuidados continuados. Já agora, senhor Quintans, pedia-lhe que fosse à enfermaria de Cirurgia pedir uma cópia do Cartão de Cidadão do Freitas”.
Como? Interroguei. Então a senhora está dentro do hospital e está a pedir-me que vá à sua instituição pedir um documento? Anuiu a senhora de que faria isso, mas para eu não deixar de ir à unidade hospitalar assinar. Eu disse que sim.
Depois de desligar o telefone comecei a ver que alguma coisa não batia certo e liguei para o gabinete de acção social para voltar a falar com a senhora. Como não estava, deixei recado para me telefonar. Não ligou. Só ao cair da tarde, por insistência minha, consegui entrar em contacto. Nessa altura disse-lhe que não estava certo ser eu a assumir um encargo que é, por obrigação, da família. Que ligasse para a irmã e, no caso de ela não aparecer, então faria eu a substituição. Disse-me a funcionária: “mas eu já falei com a senhora. Ela não se importa que seja o senhor!” –torci o nariz. Imaginei que estava a ser enganado de uma forma vil. Mesmo assim, ficou combinado que se ela não respondesse, esta semana iria assinar o documento.

ENGANAR O POBRE TOLO

Ontem de manhã recebi um telefonema da funcionária dos HUC. Exageradamente simpática, apelando à minha compreensão e humanidade, pediu por todos os santinhos que fizesse este gesto pelo Pedro. “É só mesmo assinar o documento, mais nada! Os documentos ficam à sua espera na Cirurgia”–enfatizou a mulher depois de eu ter concordado.
À hora do almoço fui ao hospital. Na enfermaria disse ao que ia. Trouxeram-me os documentos e, apenso, mais duas folhas para preencher com os dados do Freitas, para pedir o internamento e pensão social de invalidez, e para entregar na Segurança Social. Passei-me! Se há coisas que me tiram do sério é aldrabarem-me e fazerem de mim parvo. Fiquei fora de mim e quem ouviu foi a chefe da enfermaria.
Com apelos à calma pela profissional, comecei a pensar que se não fizesse o necessário quem iria apanhar por tabela seria o Freitas.
Hoje, na Loja do Cidadão, na Segurança Social, perdi parte da manhã. Fiquei a saber que muito do que fui lá fazer é da responsabilidade da técnica de acção Social. Ou seja, podem tirar-se duas conclusões. A primeira é que a familiar do Freitas não quer saber dele. A segunda, é que a funcionária, tentando passar a bola e desonerando-se da sua obrigação social, moral e ética, valendo-se da minha aparente ingenuidade, está a descuidar os cuidados a um doente que não pode responder por si.

MAS HÁ MAIS FAMÍLIA

Passei o dia a tentar chegar à identidade e à fala com a irmã, de Lisboa. Não consegui. Mesmo na enfermaria, escudando-se atrás de uma impossibilidade legal de ceder o contacto, não foi possível. O argumento é que “é uma questão de justiça”. “Se a senhora não quer saber do irmão é um direito dela”, foi-me dito assim mesmo! Perante a minha total impaciência e irritação. Não tenho mesmo pachorra para certos idiotas.
No entanto, de ramo em ramo, hoje, consegui saber que o Pedro Freitas tem três filhos. Dois maiores, a viverem em Lisboa, e um menor, a viver em Arganil.
A pergunta que fica é: porque não tentou a assistente social investigar os seus descendentes? Em especulação, porque não lhe interessa! O que está em causa é despachar uma “coisa” o mais depressa possível. É muito triste o que se está a passar nos HUC com um homem que, pela obra deixada, ficará para sempre ligado à arte.


O FAISAL ENCOSTOU ÀS BOXES





As cidades são portos de confluência onde diariamente aportam novos caminhantes. Uns com vida formada e perfeitamente inseridos, outros, sem eira nem beira, buscam um espaço de convivência como último horizonte. Uns e outros, no essencial, procuram a sobrevivência, passando pelo reconhecimento e salvação. Se os primeiros, os entranhados na sociedade, demandam o mérito numa vida melhor, já os segundos procuram somente acordar e esquecer retalhos de uma memória que, em ambiguidade, os levam à culpa e à redenção. Aos poucos, porque se adaptam ao meio e são pacíficos, vão conquistando o seu espaço e, sem darem por isso, fazem e tornam-se parte do todo societário. Estes, para muitos de nós são “cromos”, personagens diferentes do comum que, pela graça, rebeldia e singularidade, emolduram e transformam as rotinas das grandes urbes. Se no dia-a-dia, em vida, poucos os consideram como gente de nós, pessoas de inalienável direito, já na morte assiste-se a duas manifestações públicas. Se for apregoada através de um meio de comunicação social, como um jornal, não páram as condolências de baba e ranho. Se o seu desaparecimento apenas for notado pelos mais chegados e não houver grande alarido pela sua ausência, o mais certo é o desgraçado até na morte ser ignorado. Em boa verdade, um homem nasce e morre sozinho. E na morte lava-se a alma.
Um dos personagens errantes que vou falar é o Faisal Abadi, senhor do mundo e de liberdade, um simpático natural do Iraque e há mais de vinte anos a viver em Coimbra, depois de ter passado por outros países da Europa. É um amável “vagabundo” destas ruas estreitas, que pela educação –quando não está de grão-na-asa- nos gera afeição e saudade.
O que me levou a escrever esta crónica é que o nosso amigo Faisal, de 58 anos de idade, teve um AVC, Acidente Vascular Cerebral, há cerca de duas semanas. Foi internado nos HUC, Hospitais da Universidade de Coimbra, e, conforme as suas declarações, em processo de recuperação, dentro em breve terá alta e será instalado e apoiado pela Cáritas Diocesana.
Um grande abraço e votos de rápida recuperação para o Faisal.

UM SUBSÍDIO PARA FRALDAS ATRIBUÍDO AOS “DOMINUS”




Hoje de manhã as Ruas Eduardo Coelho, Padeiras e do Corvo apresentavam-se aos transeuntes em nojo saliente pelos dejectos de cão deixados ao abandono pelos donos dos ditos cujos. O recurso foi os comerciantes lavarem as pedras malcheirosas e borradas em frente aos seus estabelecimentos. Pode até pensar-se que, pela demasiada boa-vida consequente da falta de negócio, lhes fará bem, e de certo modo até verdade, mas raia o abuso.
Diariamente, depois das 19h00, quando as lojas encerram e os passantes recolhem às suas residências na periferia, as artérias da Baixa passam a ser o “campus” de liberdade para passear os cãezinhos. Pode até parecer que tenho alguma pedra no sapato contra os “donos” dos animais –coloquei entre aspas “donos” porque com a legislação que aí vem não tarda que o termo jurídico na relação de propriedade desapareça, uma vez que extravasa para “dominus”, proprietário de escravo.  Pouco tenho contra os “tutores” –o termo futuro de relação jurídica de responsabilidade- dos quatro patas, a não ser o emporcalhamento que largam na calçada.


UM COMENTÁRIO RECEBIDO SOBRE...





Anónimo deixou um novo comentário na sua mensagem "UM RAIO DE LUZ NA BAIXA CINZENTA":


Ó
Senhor Luís, está para cair um santinho do altar! Agora só falta pintar aquela empena do prédio ao fundo das escadinhas dos gatos. Mas se calhar isto são ousadias demasiadas para a nossa mimosa cidade. Como dizia uma senhora na tertúlia há dias, o que é preciso é que tudo esteja limpinho, sem maluqueiras. A gente gosta é do branco e, vá lá, quando nos dá dá a irreverência coimbrã, um bocadinho de beje. Essa bonecada até cansa a vista e o espírito. Pronto, saudinha é o que eu desejo.

BOM DIA, PESSOAL...

quarta-feira, 20 de abril de 2016

BAIXA: À SÉTIMA LEVARAM TUDO




Esta noite, por volta das 04h00, foi assaltado o “talho do Machado”, na Rua das Padeiras. Na última década esta é a sétima vez que, em detrimento de outros, os ladrões preferem os enchidos, as carnes e o queijo do José Fernandes e do Fernando Pratas –ex-empregados e actuais sócios em exploração do reconhecido e mais célebre açougue da cidade. A penúltima vez em que sofreram uma intrusão foi na noite de 25 de Fevereiro passado.
Segundo José Fernandes, “desta vez foi uma limpeza geral. Levaram presuntos, queijos, chouriços, carnes diversas e até duas pernas de porco. Rebentaram com uma porta lateral de alumínio, que dá para a Rua do Almoxarife. Estiveram à vontade. Até para transportar os artigos preferiram os nossos sacos. Chamámos a PSP, que tomou conta da ocorrência, e vamos accionar o seguro. Tivemos um prejuízo presumível na ordem dos 800 euros.”
Quando interrogo o que vai fazer para evitar futuros acontecimentos, diz Fernandes: “Vamos contratar uma empresa de alarmes, talvez assentar câmaras de captação de imagens –ainda não sabemos bem."
Quando lhe pergunto se vão manter as portas de alumínio –que naturalmente conferem uma desusada fragilidade ao estabelecimento-, enfatiza José: “substituir as portas não vale a pena. Os ladrões rebentam tudo. Só aplicando ferro reforçado e mesmo assim…”
Deveria falar da segurança que compete assegurar pela PSP, mas já nem sei se valerá a pena bater no ceguinho. Esta corporação de prevenção pública há muito que deixou de fazer trabalho de vigilância nocturna na Baixa. Por vários motivos –não completamente atribuíveis ao corpo de polícia-, sobretudo emanados da política, do Ministério da Administração Interna, entre eles a poupança de meios humanos e de defesa, estabelecimentos e residências, todos juntos, estão entregues à sua sorte durante o período da noite.
Não há dúvida de que, a posteriori, a PSP sempre que chamada acorre –sou testemunha-, porém, só depois de portas arrombadas. Falta polícia no Centro Histórico para prevenir assaltos, mas alguém se importa com esta lacuna?


terça-feira, 19 de abril de 2016

CARTA AO MEU COLEGA






Espero que esta carta te encontre de boa saúde, “Manel”. Aposto que até já estranhavas a minha ausência pela falta de contacto e, sei lá, como tenho andado a escrever aos camaradas lá do vértice da pirâmide estatal –ao Toino Costa e ao Marcelo-, se calhar, já me acusavas de discriminação. Não camarada! Nada disso! Deves saber que tenho um respeito danado por ti e, por silogismo, um colega do mesmo ofício nunca desvaloriza um congénere.
Lembrei-me de te enviar esta missiva, meu amigo –mais pela saudade, acredita-, porque tenho para mim que não passas muito bem, como quem diz, não atravessas os melhores dias. Bom, convenhamos que tens algumas razões de sobra para andares a dormir mal e porcamente. Como se já não bastasse a incontinência urinária do São Pedro, só para chatear, nos últimos tempos os teus prosélitos só te dão desgostos. Foi o caso do nosso amigo comum que em tão boa hora o colocaste como adjunto e, logo por azar, deu no que deu. A seguir foi o outro que foi levar o filho ao infantário no carro da edilidade e com “choffeur” e tudo. Porra! Também é preciso ter azar! Logo havia de lá estar a jornalista do diário! Foi galo! Ou melhor, uma chatice! Se fosse homem, mais que certo, fazia orelhas moucas e olhos cegos do que viu e nada transpirava. As mulheres só nos dão problemas! Como eu te entendo!
Depois, “my friend”, não vi a tua fotografia nos jornais locais de segunda-feira a acompanhar o camarada Marcelo e fiquei apreensivo. Não me digas que o nosso colega não te convocou para a recepção?!? Se não o fez, desculpa lá, mas deveria! Mas nem estranho, convidei-o para vir à Baixa e comer uma sandocha no “Mijacão” e não me ligou nenhuma. Deixa lá! Não te deixes abater! Quando lhe passar a aura de graça, vais ver, não tarda a vir pedir batatinhas e um bilhetito à borliú para assistir a uma ópera no Convento de São Francisco.
Mas, “amico mio”, verdadeiramente, decidi escrever-te depois da inusitada ordem que proferiste para mandar retirar o laço azul da CPC, Comissão de Proteção de Crianças, do edifício da Rua Olímpio Rui Fernandes, e da campanha nacional de maus-tratos.
Desculpa lá, mas passaste-te ó quê? Então depois do vereador da Acção Social e Família, o camarada Jorge Alves, ter autorizado e ter estado no descerramento –se queres uma sugestão, não estragues o serviço do Alves. No meu entender é um dos melhores do executivo. Está a fazer um bom trabalho e, sobretudo, sem precisar de dar nas vistas. Conserva-o. Ele é dos bons.
Andas cansado de mais. Só pode ser mesmo isso. Ou então, imagino, às tantas, como viste lá a sigla CPC, confundiste que era alguma campanha política do movimento Cidadãos por Coimbra (CPC). Foi isso não foi?
Tens de descansar mais, “min venn”! Tens de te poupar! Se assim não for, não chegas a ministro do ex-e futuro secretário-geral do PS o camarada António José Seguro.
Recebe um abraço cá do rapaz.
Como adivinho que já estás sem paciência, vou ficar por aqui. Qualquer coisinha, já sabes onde me encontrar –aliás, basta ligares.



UM RAIO DE LUZ NA BAIXA CINZENTA



Com recurso a andaimes, foi ontem decorado um prédio com frente para o Museu Municipal do Chiado e lateral para a Praça do Comércio. Numa paisagem urbana histórica mas sobretudo muito cinzenta e melancólica, é de salientar estas pinceladas de cor. Já o escrevi, é uma boa iniciativa que pode e deve ser alargada aos muitos edifícios abandonados, com montras de lojas e paredes decadentes a contribuírem para uma solidão desnecessária, que concorre para uma transversal depressão social, e que facilmente se dispensa.

BOM DIA, PESSOAL...

segunda-feira, 18 de abril de 2016

sábado, 16 de abril de 2016

SÃO PEDRO CHORA OU MIJA?

(Imagem desviada, em grande pecado, da Web)




Segundo as notícias, “o Bloco de Esquerda apresentou na Assembleia da República um projecto de resolução para mudar o nome do Cartão de Cidadão para Cartão de Cidadania.”
Sinceramente, cá para mim até bato palmas. O Bloco demonstra que está atento aos grandes problemas do mundo português. Só espero que, em equidade, nos próximos tempos apresente também um projecto de iniciativa parlamentar ao comportamento de São Pedro, senhor de todas as águas do mundo. É que a entidade santífica não pára de nos lançar borrifos para cima, e Deus, na sua omnipotência, parece não ligar. Com a responsabilidade social que o Bloco acarreta, é preciso saber se o santo anda deprimido –e nesse caso entende-se que estamos perante um choro compulsivo- ou estamos em face de uma inusitada incontinência urinária do velho senhor.
Se fosse muito rigoroso até exigia também uma clarificação no sexo dos anjos, acontece que sou muito comedido e não quero pedir de mais.
A bem de todos os portugueses, espera-se uma moção de resolução à questão apresentada. Obrigado.

O CADAXO FOI INTERNADO PARA RECUPERAÇÃO

  


O Joaquim Cadaxo é um pária, um perdido no tempo a recusar regras de cariz social, que deambula pelas ruas, ruelas e mais particularmente pela Praça do Comércio onde assentou o seu quartel ao luar há vários anos e sempre a cair em progressiva degradação.
Graças à atenção dispensada a este caso pela assistente social Joana Nogueira, da Divisão de Acção Social e Família –Equipa de Rua/EMIS – Equipa Móvel da Câmara Municipal de Coimbra de Intervenção Social- o Cadaxo foi internado para reabilitação nesta última quarta-feira.
O facto de referir o nome da técnica camarária não vem ao acaso. Fui testemunha do seu redobrado esforço e sensibilidade para encaminhar este desenraizado da vida e, tal qual como criticamos, na mesma medida e em equidade, devemos relevar quando constatamos o oposto. Conhecendo (parcialmente) os escolhos em que se navega no oceano da doença mental em Portugal, e sabendo que alguns bons resultado assentam sobretudo e essencialmente na dedicação de muitos bons funcionários públicos, é um prazer escrever sobre um êxito ainda que diminuto e incompleto. Como alguém diria, ninguém espere salvar o mundo sozinho, mas se isoladamente salvar apenas uma pessoa estará a contribuir para uma transversal e necessária humanidade.


(TEXTO ENVIADO, PARA CONHECIMENTO, À CÂMA MUNICIPAL DE COIMBRA)

BOM DIA, PESSOAL

sábado, 9 de abril de 2016

UM COMENTÁRIO RECEBIDO SOBRE...





Victor Costa deixou um novo comentário na sua mensagem "TERTÚLIA “COIMBRA E O MUNDO" (2)":


Amigo Quintans obrigado pela intervenção, pelo agitar das águas, pela racionalização e frieza.
Também subscrevo a sua perspetiva, é preciso que das tertúlias as questões e as preocupações as ideias e as propostas saiam das salas e dos seus participantes e cheguem à urbe.
A cidade, os outros e a autarquia precisam delas ter conhecimento.

TERTÚLIA “COIMBRA E O MUNDO" (2)





O relógio da torre da Universidade, a cabra, tinha acabado de bater as onze badaladas (23h00). O tempo, esse espaço virtual que divide o eventual em efeito real, tinha escoado como um suspiro. No agradável espaço do Recordatário da Rainha Santa Isabel, aquelas quase duas horas, a ouvir “histórias de vida” contadas na primeira pessoa, tinham passado a correr. O tema era, relembro, “Coimbra e o Mundo – Perspectivas em debate”. O excelente painel constituído por quatro eméritos cidadãos de Coimbra, respectivamente, Américo Santos, Armando Braga da Cruz, Francisco Andrade, Arnaldo Baptista e pelo anfitrião convidado para presidir à sessão José Simão, foi um doce para os ouvidos dos presentes. A apresentação, muito bem desempenhada, esteve a cargo de Hélder Rodrigues e Isabel Garcia.
E foi anunciado o final da primeira parte com a leitura de um poema de Pitty Tavarela, com o título “Estudante”. A seguir abriu-se o leque para perguntas e desabafos intimistas, na mesma linha do ambiente nostálgico e romântico. Estava aberto o confessionário com acesso ao muro das lamentações.
Foi dada a palavra a uma senhora sentada no canto direito. Como introdução, agradeceu a realização da tertúlia e a seguir atirou a matar: “as nossas instituições são quase impenetráveis para o cidadão”. Virando-se para Arnaldo Baptista, da Praxis, rematou: “o empresário em Coimbra não é reconhecido nem acarinhado por contribuir para o desenvolvimento da cidade.
A Estação Velha é para mim um frenesim. Está melhor. O cidadão de Coimbra tem ideias megalómanas. Não tem de ter a Estação do Oriente (Lisboa), tem é de estar limpa. A Hidráulica (Agência Portuguesa do Ambiente) é um problema –referindo os muros em mau estado que marginalizam o Mondego. O encerramento da linha da Lousã foi um roubo aos cidadãos”. E continuou na plangência, “para refazer um muro que já existia tive de entregar 40 requerimentos. Quando me pediram o 41º desisti. Coloquei uns taipais e uns arames.
Tenho reclamado para os Monumentos Nacionais sobre o estado decadente da porta da Igreja de Santa Cruz. Há tempos fui lá. Estive imenso tempo para ser recebida. Quando veio o arquitecto, depois de lhe apresentar o problema, disse que não se podia fazer nada porque era um Monumento Nacional. Ofereci-me para colocar óleo a minhas expensas. Não senhor! Não podia, disse. As instituições não ouvem nem servem o cidadão.”
Porque conhecia o problema do muro particular, pegou na palavra José Simão. “Quero falar da freguesia de Santa Clara!”, impôs a frio. “Nós temos cá um habitante muito antigo, com cerca de 1800 anos. Foi descoberto nos Alqueves por Santos Rocha, em finais do Século XIX. O Convento de São Francisco foi uma batota do Governo. Foram lá descobertas trezentas e tal ossadas. Não sei onde páram. Até hoje não me deram explicações. Há coisas que acontecem em Santa Clara! Agora está melhor porque a cidade já não pode crescer mais em altura e então só pode crescer para as margens. O quartel tem sido vandalizado. Não tem um único fio de cobre. Roubaram tudo!”
Atrás de mim, outra senhora estava ansiosa para exaurir e limpar a alma. “Sobre o fado, em vez de ser apresentada a canção de Coimbra na Casa da Escrita, numa sessão em que estive, foi apresentado o fado de Lisboa.
Tenho um prédio na calçada dos Gatos. Contíguo ao meu edifício, tem andado lá a decorrer uma obra. Tinha andaimes. Era uma obra ilegal. Eu avisei para terem cuidado. O homenzinho respondeu: “nós temos de morrer!”. Ontem caiu e não se sabe como está. Os andaimes, depois do homem ter caído, desapareceram logo. Isto é tudo assim!”
A seguir falou um ex-funcionário da desaparecida Poceram –fábrica de Cerâmica de Coimbra, liquidada por insolvência em 2010 com 150 empregados para o desemprego. “Na década de 1990, a certa altura era preciso fazer remodelações na casa. Já havia quatro milhões cabimentados em subsídios a fundo perdido. As autoridades locais não deram andamento. Foi para a Figueira da Foz. O Santana Lopes fez tudo num mês, e uma parte da fábrica foi para lá.”
Outra senhora, agora do lado esquerdo, pediu a palavra. “O que é que o nosso poder local fez?” –interrogou. E prosseguiu, “não vamos para lado nenhum. Continuamos abandonados. Como é que os políticos estão a desenvolver a cidade? Nós, a zona de Santa Clara, somos Marrocos. Já cá estou há meio-século. Coimbra é mesquinha, pequenina, porque os políticos assim o querem. Porque é que temos uma cidade envelhecida? Porque é que os jovens passam cá e não ficam?”
Um homem em frente a mim disse: “a Universidade, o Hospital e a Câmara Municipal são os pilares do emprego em Coimbra!”. E continuou, “De que modo é que isto ajuda os empresários? Pelo condicionamento (do elevado peso do emprego público na cidade), talvez esteja aqui a razão de Coimbra não progredir.
Vitor Costa, artista plástico e ex-presidente da Junta de Freguesia de Almalaguês, pediu para explanar. Virando-se para Braga da Cruz, questionou: “já se falou que os projectos aqui nascem, não se desenvolvem, e florescem noutras cidades. Que proposta tem a comunicação Social?”

UM PERGUNTA DESESTABILIZADORA

Estava no final e tudo a correr tão bem -como quem diz na paz dos anjos. Não sei se Deus estaria a tomar notas no seu imenso caderno social onde apontará as frustrações e as vaidades do mundo. O que sei é que eu, sentado na minha cadeira de espectador, enquanto escrevia, numa espécie de balanço existencial entre o ser e o parecer, estava dividido entre o ir embora na concórdia do Senhor e não dizer nada sobre o que estava a assistir -já repetidamente visto vezes de mais- e plasmar o que pensava. Se partisse sem um pio, não voltaria a mais nenhuma tertúlia igual, pelo tédio causado pela falta de consequência prática, mas ficava bem visto –já que conhecia a maioria dos presentes. Se falasse –porque já estou acostumado a ser assim- todos voltariam os olhos para mim e, numa  unânime condenação intelectual,  pensariam: “o que quer este gajo? Só veio cá para desestabilizar!”
E pumba! Como se lançasse uma granada na encantadora sala protegida pela santa, atirei o mote e a pergunta: o tema da tertúlia é:Coimbra e o Mundo – Perspectivas em debate –de que modo é que o que se passou hoje aqui sai para o conhecimento de Coimbra?
Numa primeira fase, notei o incómodo mas aguentei. Numa segunda, em raciocínio lógico, pareceu-me que perceberam e acomodei-me melhor no assento. De pouco vale contar bonitas histórias e lamentos carpidos dos munícipes se circularem em circuito fechado. O resultado é, como diria José Gil: a não-inscrição. Se não chegar aos receptores visados não existe. A ser assim, será sempre uma acção sem qualquer prestabilidade. Não passará de uma conversa de café. Tenho notado isto mesmo nos últimos tempos em Coimbra. Deste problema gravíssimo, da irresponsabilidade da comunicação social na vida comunitária, ao não dar ênfase aos eventos decorridos na cidade, falarei em outro texto.
Vá lá! Saí inteiro do Recordatário. Não sei se por todos os presentes serem da minha faixa etária se por obra e graça da Rainha Santa Isabel.


sexta-feira, 8 de abril de 2016

FALECEU MANUEL AUGUSTO DA SILVA





Com 94 anos, faleceu hoje Manuel Augusto da Silva. O “senhor Manuel”, como era carinhosamente tratado, foi um dos grandes comerciantes da Baixa de Coimbra. Durante largas décadas a sua loja de tecidos a metro, a Transmontana, e de artigos para o lar, na Rua do Corvo, e até cerca de 2005, expediu produtos têxteis para todo o país. Pelo seu estabelecimento, sobre a sua orientação ministrada em bons ensinamentos, passaram vários empregados e hoje estabelecidos por conta própria na cidade.
Durante as décadas de 1980/90 habituei-me a ler as suas crónicas na página do “Fala o Leitor” do Diário de Coimbra. Recordo bem, eram textos simples, sem grande rasgo literário, mas com uma acutilância incrível e sempre em defesa da Baixa de Coimbra. Apesar de bem de vida –o que aos meus olhos ainda relevava mais a sua condição de interventivo no tecido social-, escrevia sobre tudo o que, aos seus olhos, lhe parecia injusto para alguém. Partiu um modelo de comerciante de parâmetros únicos, que não se acomodava ao meio em que se inseria, e que sem medo colocava o dedo na ferida.
O corpo do saudoso Manuel Augusto da Silva encontra-se em câmara ardente no Centro Funerário Nossa Senhora de Lourdes (Capela Ressurreição). Amanhã, Sábado, pelas 10h00 será celebrada missa de corpo presente e, em seguida, o féretro seguirá para o Cemitério da Conchada.
À sua família enlutada, nesta hora de grande sofrimento, em nome da Baixa –se posso escrever assim- os nossos sentidos pêsames.



TERTÚLIA “COIMBRA E O MUNDO” (1)





Passava pouco mais de quinze minutos das 21h00 no Recordatório da Rainha Santa Isabel quando José Simão, convidado pela organização para presidir à sessão, ocupou o lugar de anfitrião. O presidente da União das Freguesias de Santa Clara e Castelo Viegas, com a sua voz rouca e castiça, cumprimentou os “tertulianos” e congratulou-se pela vinda dos cerca de trinta presentes que responderam afirmativamente ao convite do “Ciclo de tertúlias” imaginado por Hélder Rodrigues e Isabel Garcia. “Oxalá estes encontros tragam benefícios para Coimbra, para todo o mundo e conforme o tema da tertúlia”, enfatizou o também ex-jornalista.
Depois de Simão, falou Isabel Garcia, empresária, gerente da editora Minerva e declarada mulher de causas ligada há muitos anos à Liga dos Amigos dos Hospitais da Universidade de Coimbra. Como introdução, disse: “como é que nasceu esta ideia? Foi entre mim e o Hélder. Pretendemos com esta iniciativa e outras que se seguirão um olhar para dentro, de Coimbra, e outro para fora, para o mundo.”
O tema para discussão era “Coimbra e o Mundo – Perspectivas em debate”. Foram convidados quatro oradores, sobejamente conhecidos e “apaixonados por Coimbra e a sua região”, respectivamente: Américo Santos, juiz jubilado e presidente da Assembleia Geral do Clube de Comunicação de Coimbra (CCC) e membro da Associação dos Antigos Estudantes de Coimbra, Armando Braga da Cruz, ex-locutor da RDP e presidente da direcção do CCC, Francisco Andrade, ex-atleta e treinador da Académica na década de 1960, ex-presidente da Junta de Freguesia de Olivais e vice-presidente do CCC, e Arnaldo Baptista, emérito empresário de Coimbra, pelo fulgor com que se entrega ao desenvolvimento em prol da cidade, foi nas pastelarias Vasco da Gama que tudo germinou e agora a braços com o projecto “Praxis”, a nova cerveja de Coimbra.
Seguiu-se Hélder Rodrigues, engenheiro aposentado e colaborador do Diário as Beiras. Começou por agradecer a presença de todos e esclareceu que, com este evento, “se pretende um encontro tranquilo. Pretende-se formas de ajuda, nem que seja só um bocadinho, para que Coimbra melhore”.

OS ORADORES DESAFIADOS A FALAREM DA SUA EXPERIÊNCIA

Do grupo de quatro oradores presentes, o primeiro foi Américo Santos. Explanou sobre a Associação dos Antigos Estudantes de Coimbra (AAEC). Iniciou a apresentação dizendo que “Coimbra, como cidade, tem mais habitantes que Aveiro. Temos muito a mania de dizer mal de nós. Temos dois Panteões Nacionais em Portugal. Um está em Coimbra, só que neste não se gasta um tostão. 
Quando Guterres era primeiro-ministro (1995-2000) a determinada altura disse que isto era um pântano e foi embora. Nessa altura, chegou a estar cabimentada uma verba para a remodelação da Estação de Coimbra B. Alguém, com poder na cidade, disse: “não senhor! Nós queremos um metro”. Então, como se adivinha, nem tivemos uma coisa nem outra!
A AAEC propõem-se saber quantos somos. Somos 245 mil antigos estudantes. A associação existe desde 9 de Maio de 1959. Estamos situados no Largo da Portagem num andar que é nosso. Qualquer estudante que tivesse andado na Universidade –mesmo que não tivesse feito uma única cadeira- pode ser associado. O custo anual é de 24 euros.
O segundo arguente foi Arnaldo Baptista. Com grande simplicidade, começou por afirmar que “um empresário tem de ser sério e criativo. Sou um apaixonado por Coimbra. Quando viajo o negócio está sempre em primeiro lugar. Coimbra está doente. A ACIC, Associação Comercial e Industrial de Coimbra, (em decreto de insolvência), e o Clube de Empresários de Coimbra refletem a patologia de Coimbra.
Represento 180 postos de trabalho. A “Praxis”, a nova cerveja artesanal, é apenas a filhota mais nova da empresa. Uma vez encerrada a Fábrica de Cerveja de Coimbra (Topázio) prometi a mim mesmo que iria devolver a cerveja à cidade. Não foi fácil. Há um deserto de ideias. Há um deserto empresarial. Tenho uma Unidade de produção em Taveiro, ao melhor da Europa. Esteve quase 8 anos para ser licenciada. Qualquer projecto, por muito inovador que seja e com as novas tecnologias, corre o risco de num ano estar obsoleto. Estas faltas de sensibilidade levam a que as coisas não avancem. A “Praxis”, para estar neste ponto, teve de contar com uma enorme paixão, uma enorme teimosia.
Temos um novo produto a Cito-Cidra. É um produto novo que só existe em Coimbra. É resultado de uma tese de mestrado. A matéria-prima é a laranja e a maçã -50/50 de cada fruto nesta combinação.
Pena foi que a Direcção Geral de Economia tenha ido para Aveiro, isto diz bem a inércia do poder local.
(No tempo de Carlos Encarnação) O projecto Crioestaminal foi para Cantanhede porque esteve na Câmara Municipal de Coimbra um ano e meio para se dar uma simples resposta. Jorge Catarino, na altura o presidente da Câmara de Cantanhede, em dois dias resolveu o assunto.
O terceiro foi Armando Braga da Cruz. “Coimbra era o centro da rádio” começou por dissertar. “Toda a rádio nacional passava por Coimbra. Lisboa acabou com a “tarde desportiva”, produzida pelos estúdios da cidade, porque fazia concorrência à Antena 1. Hoje perdemos os emissores todos. Até perdemos a transmissão da Serenata Monumental para o Internacional. Durante 17 anos tivemos sempre a transmissão da serenata para o Internacional. Hoje é a Rádio Universidade que faz a transmissão para Coimbra.
Elegemos pessoas (deputados) para defender Coimbra que nunca vimos por cá. Por exemplo, Zita Seabra de onde é?
Carlos Candal (de Aveiro e já falecido) disse um dia que Coimbra é o bidé do Mondego. O fado de Coimbra (na rádio) não aparece em lado nenhum. Somos uma ilhota artilhada. A comunicação social é extremamente importante. A RDP não está interessada em voltar atrás. As pessoas deviam ser condenadas pelos negócios que fizeram à custa da RDP.”
E o quarto e último palestrante foi Francisco Andrade. Começou por falar da Académica de Coimbra que já foi, quando atingiu o pico de notoriedade, na década de 1960. “Quer na direcção, quer na equipa, porque tinha de ser assim, eram todos estudantes. Há a crise de 1962, há a emancipação da mulher. (Enquanto atletas) Todos tínhamos vindo para Coimbra para ganhar para nos formarmos. Nessa altura, todo o indivíduo que chegasse a Coimbra era da Académica. Havia na Praça da República um determinado café ligado à extrema-esquerda. Nós sobrevivemos! Foi através disto, do futebol, que elevámos Coimbra e para o país.”

(ARTIGO EM CONTINUAÇÃO)