sexta-feira, 31 de maio de 2013

ROSTOS NOSSOS (DES)CONHECIDOS


 Quem atravessou hoje a Praça 8 de Maio à hora do almoço, se, em frente à Igreja de Santa Cruz, não se apercebeu de uma figura humana, hirta, pintada de branco como saída das trevas e das trovas do vento, quando alguém colocava uma moeda no pequeno cesto, de repente, o largo era invadido por uma voz melodiosa, bem timbrada e afinada, de anjo, numa harmónica sinfonia celestial. Então vamos lá saber quem é esta imagem mitológica.

"Chamo-me Cláudia Santos. Tenho 24 anos, e sou desempregada activante. Frequentei o conservatório na área de guitarra e estudei fotografia no ensino superior. Como estava sem nada fazer, reuni comigo os meus heterónimos de emergência, e, dando uma metafórica palmada em cima da mesa, um deles gritou: Cláudia, isto não pode continuar assim. Tens de te atirar à vida, rapariga. O que é que sabes fazer? Ali mesmo, tratei de inventariar os meus talentos. Tenho alguns. Fixei-me no canto. Eu sempre gostei de cantar, mas, por uma razão ou outra, nunca o consegui fazer. Foi assim que descobri que o poderia fazer. Afinal eu sou dona da minha vontade. É ou não é? Como tudo na vida, a primeira vez foi um pouco difícil. Agora já é para mim quase normal. Está correr muito bem. Por acharem a ideia muito original, as pessoas páram e dão uma moeda para me ver e ouvir e eu sinto-me muito bem. Pressinto que estou a alegrar as ruas da cidade, a fazer algo de útil. Que acha o senhor da minha performance?"

UMA IMAGEM, POR ACASO...


UMA QUEDA APARATOSA NA CALÇADA




 Hoje, cerca das 14h00, uma senhora de Brasfemes, quando passava no Largo do Poço, calcou uma pedra solta na calçada e estatelou-se ao comprido, magoando-se seriamente. Valeram-lhe alguns funcionários da Sapataria Caravela que, estendo-lhe a mão, ajudaram a levantá-la. Numa das suas pernas era visível uma mancha negra e um dos pulsos parecia quer crescer de inchaço. Um pouco combalida, lá foi dizendo: “sou uma doente oncológica. Bolas! Não sei como aconteceu isto. Porque não arranjam a calçada? Isto está um perigo! Olhe que fiz a “espargata”. Se calhar vou ter de ir ao hospital, sobretudo por causa do pulso –e tentava afagá-lo como se o braço fosse um passarinho.
De salientar que os pisos de quase todas as ruas da Baixa estão simplesmente deploráveis. Por exemplo na Rua Sargento-mor, segundo as declarações de comerciantes, as quedas de transeuntes são diárias. A meio da artéria, em frente à loja da Lena, são visíveis duas crateras enormes; uma tampa de saneamento sem cobertura de pedra e um buracão no meio do solo.
Especulando, já que, pelos vistos, a autarquia não terá meios para reparar estes atentados à segurança, no mínimo, deveria sinalizar e declarar esta zona de “perigo para a saúde pública”. 

(TEXTO ENVIADO, PARA CONHECIMENTO, À CÂMARA MUNICIPAL)

quinta-feira, 30 de maio de 2013

UM COMENTÁRIO RECEBIDO SOBRE....



António Martins deixou um novo comentário na sua mensagem "AS ELEIÇÕES PARA A ABCC":


Meu Caro Amigo Luís Quintans:
Congratulo-me com a iniciativa. E, ao ver quem integra a direcção, isso, para mim, é garantia de um trabalho profícuo e dedicado. Estes, ao contrário de outros simples mostruários de fotografias em periódicos, são, sempre foram, Pessoas dedicadas a causas, Homens com espírito de missão, Colegas preocupados. Um abraço para eles, com votos dos melhores êxitos. E, já agora, se for preciso uma mãozinha e o desejarem, já sabem onde a encontram. Sem cobrar nada, é claro.
António Martins


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COMENTÁRIO DO EDITOR

 Dr. Martins, meu amigo –sem empregar o tratamento de “caro”-, esta sua disponibilidade não me surpreende, porque o senhor sempre foi uma pessoa empenhada. Quis a vontade de alguns não saberem ver o quanto a sua imensíssima experiência poderia ter ajudado a causa comercial. Talvez por isso mesmo se entenda como é que os comerciantes chegaram ao estado em que se encontram. Mas enfim! Contrariamente ao que se afirma, o destino não é por obra do acaso mas sim feito por homens. Na maioria dos casos, são estes mesmos indivíduos que, através do seu poder interesseiro e emaranhado, em conluio, visando apenas o seu lado egoísta, interferindo no presente e condicionando o futuro, são os fabricantes dos propósitos individuais e colectivos das comunidades. Incluindo os homens da riqueza e do poder, estas mesmas sociedades serão tanto mais felizes quanto estes fazedores de destinos estiverem dispostos a abdicar do seu calculismo e se entregarem a causas sociais. Mas o que estou a escrever já o senhor está farto de saber.
Voltando à sua disponibilidade, meu amigo, a sua oferta é fantástica. Estamos todos a partir de simples vontades. Isto é, para fazer obra, não temos dinheiro, não temos meios que, para já, permita chegar ao seu objecto, que é a solidariedade de partilha. Toda a ajuda que surgir de aqui em diante é bem-vinda. Portanto, em suma, já fica a saber que o iremos aborrecer. Conte mesmo com isso. Em nome de todos quantos fazem parte desta lista agora eleita, um enorme abraço. Bem-haja.

quarta-feira, 29 de maio de 2013

AS ELEIÇÕES PARA A ABCC



 A fim de nomear os novos corpos-gerentes para a Associação de Beneficência ao Comerciante de Coimbra, no biénio de 2013 a 2015, realizaram-se hoje na sua sede provisória, no Largo da Freiria, as eleições correspondentes. Concorreu apenas uma lista –denominada de Lista A- constituída por Armindo Gaspar, presidente, Arménio Pratas, vice-presidente, Luís Quintans, secretário, Quirino Adelino, 1º tesoureiro, Hélder Gonçalves, 2º tesoureiro. O conselho fiscal é construído por Victor Espírito Santo, presidente, e assessorado por Leopoldino Dias e Francisco Veiga. Foi eleita com 8 votos a favor. Nenhum contra. Nenhuma abstenção.
Não é de mais repetir que esta a nova agremiação tem, tal como o logótipo indica, por objecto a beneficência. Isto é, não pretende ocupar nenhum lugar deixado vago por outra qualquer associação de defesa da classe. É uma associação original, creio que, no género, a primeira no país. O que se pretende é, acima de tudo, a sensibilização geral para a ajuda interpares. O que se procura é o valor comunitário; o princípio do um por todos, todos por um. O pouco que alguns detêm e possam partilhar, mas alguma coisa, seja lá o que for, e poderem ajudar aqueles que nada tem e estão a atravessar um caminho de carência extrema, de pedras pontiagudas que ferem a alma de quem sempre trabalhou e não é reconhecido por ninguém. Nem pelos consumidores –que sempre olharam o comerciante como um explorador-, nem pelo Estado, que não o reconhece como um motor de desenvolvimento e gerador de riqueza. Os comerciantes são tratados pelos governos, hoje, como uma coisa descartável, de que se já não têm utilidade são para desaparecer, sem qualquer direito a subsídio de sobrevivência. Este Estado totalitário, pior para os empresários que uma qualquer nação estalinista desaparecida, um dia, acredito que brevemente, será julgado por extermínio e pelas atrocidades cometidas contra a dignidade desta classe.
Este projecto está carregado de utopia? Acredito que sim. Mas o espírito que subjaz é o mais puro dentro da caridade, no sentido do dar sem olhar a quem, e da solidariedade, na direcção da partilha. Vamos conseguir fazer alguma coisa? Vamos tentar. Foi para isso mesmo que se encetou este caminho. Um agradecimento enorme a todos os elementos que compõem esta lista hoje eleita. Sem eles não seria possível levar esta ideia em frente. Um grande abraço fraterno. Oxalá ninguém precise de ajuda. Seria bom que assim fosse, mas, infelizmente, sabemos que a miséria, cada vez mais e com maior intensidade, está a bater à porta dos comerciantes de rua.


TEXTOS RELACIONADOS


ROSTOS NOSSOS (DES)CONHECIDOS



ROSTOS NOSSOS (DES)CONHECIDOS: O TENOR

 Tal como andorinha que do norte de África regressa na primavera, o Geraldo Duarte Santos, de 52 anos de idade, volta e meia, invade as ruas estreitas e, com o seu inconfundível vozeirão de tenor a cantar canções do Quim Barreiros, enche a Baixa de um inconfundível calor humano.
Tal como outros caminhantes na cidade que percorrem esta vida em busca de coisa nenhuma, o Geraldes é uma criança enorme, de sorriso doce, com corpo grande e mente pequena. Os seus gestos são ternurentos e não faz mal a ninguém. Tem um discurso algo monocórdico e nunca se sabe onde começa a ficção e acaba a realidade. Já escrevi muito sobre ele no meu blogue. Encanta-me a sua forma de ser. Gosto dele, e ele sabe isso. Quando regressa ao centro histórico vem sempre visitar-me e cravar-me ora uma moeda ora uma flauta. Como passarinho abandonado por todos, percorre estas praças e becos em busca de atenção e de um abraço amigo –coisa complicada nestes tempos de individualismo, digo eu. Nasceu em Macinhata do Vouga, ali para os lados de Águeda. “Já há muitos anos que ando aos caídos”, diz-me com a voz entaramelada, mas sem dramas, como alguém que as pedras do chão, à força de tanto ferir a alma, tornaram duro nas palavras mas aceitou o destino que lhe calhou em sorte. Prossegue, “durmo num prédio velho, junto à Estação Velha. Sei ler e escrever, graças a Deus. A minha mãe está em Macinhata. É muito pobre. Trabalhei nas quintas, estive em Espanha, sempre na agricultura. Não recebo nada do Estado. São as pessoas que me ajudam, graças a Deus, Nosso Senhor! Quando tenho fome vou ter com os muitos amigos que tenho nos cafés e nos restaurantes e eles dão-me comer. Toda a gente gosta de mim, graças a Deus! Não faço mal a ninguém. Ajudam-me. Gostam de me ver e ouvir cantar. Adoro cantar. Sabe que estive com o Quim Barreiros na Queima? Ele ouviu-me cantar… “Tiro o carro, meto o carro, à hora que eu quiser, na garagem apertadinha da doçura da mulher..”. Canto bem, não canto?”

UMA ENTREVISTA, POR ACASO...



 Todos os dias, logo de manhã, me cruzo com ele na rua estreita, acompanhado pela esposa, Cila, sempre agarradinhos, como eterno apaixonados, a ponto de me fazer inveja. O Francisco Veiga, de 68 anos de idade, e mais de meio-século de actividade comercial, emérito e reputado comerciante da Baixa de Coimbra, faz parte de uma estirpe em completo desaparecimento. Começou como marçano no comércio, de alpercatas rotas, estômago a dar horas e uma vontade imensurável de alcançar um estatuto de dignidade. Atirou-se à vida sem freio, conheceu o êxito e a glória de ter sido considerado um dos maiores profissionais da moda na cidade. A roda desandou e hoje, como a maioria dos lojistas do ramo de pronto-a-vestir, está novamente na mó de baixo. Escrevo assim mesmo, porque o “Chico”, como é gentilmente tratado por aqui, não tem medo das palavras. No entanto, e é por isso que o admiro e considero, continua uma pessoa humilde, não perdeu o porte, o sorriso, e, acima de tudo, a disponibilidade de se dar para os outros, sabendo que a simplicidade deixa marca nas pedras da calçada. Deu-me para ouvir o Veiga. O que terá ele para dizer?

Apanhaste-me de surpresa, pá! Conheces a minha história de trás para frente. Sabes o que penso de tudo o que nos está acontecer. Queres que eu te repita o que já disse tantas vezes? Está bem! Estou cansado, meu amigo! Cansado de trabalhar para uma causa perdida. Olho para esta Baixa na actualidade e, em analogia, vejo um campo cheio de silvas misturado com ervas daninhas, onde a vida humana praticamente desapareceu. Faz-me sangrar o coração, pá! Eu comecei no desaparecido Carlos Camiseiro, na Praça do Comércio, tu sabes. Esta zona era um pulsar permanente de actividade. Às vezes dou por mim a interrogar como foi possível, indo atrás de lentilhas, destruir tudo isto. Começou logo com a criação de novas centralidades, com muita construção na periferia, que foram recebendo, em transferência massiva, os moradores mais novos e deixando cá os mais velhos. Tal como em outras zonas históricas do país, a edificação antiga, aqui, salvo excepções, não tem qualidade. Falta conforto. A seguir foram licenciando as grandes superfícies e, então sim, desta vez, foram sendo deslocalizados os consumidores mais endinheirados. Hoje esta zona velha tenta sobreviver à custa de um cliente idoso e pouco poder económico. Andamos todos, eu e outros, há mais de 15 anos a alertar as autoridades, nomeadamente a Câmara Municipal, para a hecatombe que está acontecer e nada se fez para o evitar. Pelo contrário, dá a impressão que a intenção foi sempre correr daqui os pequenos operadores, entre comércio e serviços, que eram a alma e davam movimento a esta área habitacional e comercial. Há actividades que já desapareceram e não voltam mais pelas dificuldades que lhes foram impostas. Optaram por ir para a periferia. Com os serviços administrativos aconteceu o mesmo. Basta lembrar o caso da esquadra da PSP. Ninguém se lembra que estes prestadores públicos eram o catalisador de um todo e ao abandonarem o centro da cidade a Baixa ficou mais isolada e deserta. A autarquia, da mesma forma que faz no Mercado Municipal, deveria cobrar um valor muito baixinho na primeira hora de estacionamento público –apenas para fazer o controle, aí 10 ou 20 cêntimos.
Se quiserem fazer alguma coisa, e antes que morra de vez, é preciso começar pela recuperação do edificado. É urgente criar condições para virem pessoas para aqui residir, sobretudo casais novos. Tenho nostalgia de ver crianças a brincar nos pequenos largos. Já se vêem alguns estudantes mas não chega. Os universitários não fazem despesa. Dormem cá mas vão comer às cantinas. O fundamental é apostar nas famílias. É preciso arriscar em novos paradigmas. Por exemplo o trânsito no canal. Neste momento, tendo em conta a acelerada desertificação e degradação social, é essencial repor a circulação de transportes colectivos nestas vias largas. Desde o princípio, por volta de 1990 e quando tornaram estas ruas pedonais, que sempre fui contra. Por parte dos comerciantes, ninguém me deu razão, mas agora torcem a orelha. Outro grande problema são as rendas habitacionais e comerciais. Deveriam ser condicionadas e de modo a não haver nem locados nem estabelecimentos encerrados. Alguns estão nesta situação há vários anos. Lojas fechadas, como tanto se vê, são uma má imagem, geram insegurança, para quem nos visita. O aspecto de abandono é desolador, é um desgosto, pá!. Deveria ser criada legislação para obrigar os proprietários a só poderem ter uma casa encerrada ou uma loja durante seis meses. Seria uma forma simples de desencadear o abaixamento das rendas.
Tenho muita saudade da Baixa de outros tempos. Muita saudade do movimento, do ambiente que se vivia aqui. Desapareceram os pregões, o barulho de fundo tão pitoresco desta zona. Agora só o silêncio impõe o seu manto dominador; é tudo muito triste, soturno, sem cor. Vejo o futuro com muita apreensão. As pessoas andam desanimadas, sem alento, sem esperança no dia de amanhã. Se fosse mais novo emigrava. Não me dá prazer viver no nosso país. Graças a Deus, contrariamente a tantos casais que conheço por cá e que estão com divórcios, esta terrível crise não está afectar a minha família. Tenho uma mulher maravilhosa, sabes? Continuamos apaixonados. É o que me vale quando, de manhã, acordo e penso que tenho de vir trabalhar para a loja. Tento, por todos os meios, retardar a minha volta diária. O Comércio, que outrora me deu tantas alegrias, neste momento é a minha cruz. Sinto-me preso, pregado a esta situação. É um martírio que estou a passar. Não pelos clientes, esclareço. Quero dizer pela sua raridade. São poucos e não têm dinheiro para gastar. Somos acusados de não nos modernizarmos. Mas como? Só afirma isto quem nada sabe. A nova lei do arrendamento (Novo Regime de Arrendamento Urbano), entre outros erros crassos, foi a desgraça do comércio. Mesmo assim quero acreditar que esta actividade tradicional tem futuro. Nem que seja pelos meus filhos e, acima de tudo, os meus netos, que tanto gostava de ajudar e não posso. Tenho medo deste futuro que é já hoje.”

UM COMENTÁRIO RECOLHIDO NO FACEBOOK

(Imagem da Web)


"Na passada 6.ª feira, o Suplemento "Magazine" do Diário de Coimbra, divulgava, em reportagem fotográfica, o último jantar vínico organizado pela ACIC - Associação Comercial e Industrial de Coimbra, antes, dizia, do seu anual Concurso de Vinhos. Em tal reportagem se viam, sorridentes, os seus Presidente e Vice-Presidente Adjunto. Isto só em Coimbra. Uma associação que, este ano, perfazia 150 anos de existência, caminha, ao que parece, inevitavelmente, para a insolvência. Dos seus cerca de 25 trabalhadores efectivos, resta apenas um, estando a maior parte no desemprego e sem receber os pagamentos a que aquela associação se comprometeu com os mesmos. O comércio e a indústria de Coimbra definham, não suportando os efeitos da crise vivida. Aquela associação nenhuma acção desenvolve em prol daqueles. Limita-se, qual associação vinícola, a tratar de jantares e concursos de vinhos. E os seus principais dirigentes sorriem ...”

António Carlos Machado Martins
(ex-funcionário da ACIC)

segunda-feira, 27 de maio de 2013

SORRIA, ESTÁ A SER LEVADO

(Imagem de Leonardo Braga Pinheiro)

Durante cerca de três anos, o Montepio Geral cobrou em duplicado o aluguer de um Terminal de Pagamento Automático (TPA). Instado a devolver a cobrança ilegítima, com o argumento de que passou muito tempo, a instituição de crédito apenas devolveu metade.


 No último trimestre de 2012 o Montepio Geral, balcão da Portagem, em Coimbra, depois de muitos anos como associado, cobrou-me 5 euros de Comissões de Manutenção. Eu não reclamei. Nos primeiros dias de Janeiro deste ano colectou-me o dobro: 10 euros. Como se fosse picado por uma serpente, então acordei do torpor de não conferir como deveria os extratos bancários e, numa vontade que, desde sempre, deveria ter tido e não tive, deu-me para verificar os lançamentos da associação mutualista. Foi assim que constatei que desde 2009 me estava a ser cobrado em duplicado o aluguer do TPA –há quatro anos o banco substituíra-me a máquina por outra mais moderna.
Neste primeiro mês do ano fui ao banco pedir explicações para os dois factos anómalos. Quanto à denominada comissão de manutenção exigi que me fosse replicada a razão de tal cobrança. Isto é, na reciprocidade, que serviço me era prestado que justificasse a retirada de 10 euros por trimestre. A funcionária não soube dar uma resposta satisfatória. Apenas disse que eram normas internas do banco. Pedi o Livro de Reclamações. Em face da minha irritação e pedido, tentando apaziguar, argumentou que se eu quisesse exporia o assunto à gerência. Aceitei e não registei o, para mim, abuso de confiança no livro das queixas. Passados dias recebi uma comunicação a informar-me de “que tinha sido creditada a importância de 10 euros, embora não se garantisse a continuada isenção”. Já por mais duas vezes esta mesma situação se verificou. Tornaram a debitar e, novamente, como se rebobinasse um filme, se repetiu a situação. Mais uma vez as verbas foram repostas e acompanhadas da missiva de que seria temporário.
Também nessa mesma hora, desse dia de Janeiro, confrontei a funcionária com as minhas suspeitas de haveria duplicação dos pagamentos do aluguer do TPA. Nessa mesma altura, foi afirmado que, de facto, estava a haver uma cobrança ilícita. Foi-me dito também que “ficasse descansado que o banco devolveria as verbas retiradas por engano”. Nos meses subsequentes continuei a ver o meu dinheiro voar da conta. Em justificação, foi-me dito ao balcão que o sistema não assumia imediatamente o erro, mas que não me preocupasse que seria realizado o devido ressarcimento.
Há dias, recebi uma comunicação do Montepio Geral a informar-me de que “Pela presente informamos V. Ex.ª sobre a operação efectuada nesta data na conta indicada. Créditos Reg. TPA. Mais se informa que: Procedemos ao estorno de 50% das mensalidades do TPA, desde Julho de 2009 a Março de 2013”.
Como não poderia deixar de ser fui ao Montepio Geral, balcão da Portagem. Procurei que me fosse fundamentada a razão de, perante um notório erro bancário de cobrança duvidosa, aliás, assumida nesta comunicação, apenas me ser devolvida metade da importância em falta. O argumento da funcionária foi de que “por ordens superiores, passou demasiado tempo e, assim sendo, só será restituída metade.”
Naturalmente que o protesto foi ratificado no Livro de Reclamações. Para além desta reivindicação escrita seguiu também uma exposição para o Banco de Portugal, endereçada ao Departamento de Supervisão Comportamental, e outra para o Provedor de Justiça.
Sem querer ser juiz em causa própria, e com a devida e necessária independência, parece-me evidente que estamos perante reiterados abusos de confiança bancária, sobretudo na unilateral cobrança de comissões de manutenção, e má-fé, quando ao viés de restituir o devido, pelo locupletamento, e pagar juros, ainda subtrai metade. Por alma de quem o Montepio Geral teima em fazer de mim um reiterado pacóvio? Termino com uma interrogação: o que é isto?

sábado, 25 de maio de 2013

BOM DIA, GENTE DE ESPERANÇA...

LEIA O DESPERTAR...


LEIA AQUI O DESPERTAR DESTA SEMANA 

Para além  do texto "UMA ENTREVISTA, POR ACASO", deixo também as crónicas "A BAIXA E A BAIXINHA NO BE FADO";  "EM NOME DA ROSA";  e "REFLEXÂO: LAVRAR NAS PEDRAS"




UMA ENTREVISTA, POR ACASO…

 Praticamente, com raras exceções, almoço todos os dias no “Marcius”, na Rua da Sofia. Enquanto estou sentado num dos bancos do balcão, do pequeno snack-bar onde cabe apenas uma dezena de pessoas um pouco apertadas, vou mirando o aspeto cansado do casal Victor Pereira e da Graça Santos –a Dona Graça, como é gentilmente tratada por todos, pelo respeito conquistado à força de trabalho, da luta e do sacrifício diário. Enquanto mastigo as habituais delícias pantagruélicas, inimigas do meu ventre e que me deveria tornar comedido, sou sempre acometido por dois pensamentos. Um deles é o facto da Dona Graça ser, para mim, a melhor cozinheira da cidade e, como águia aprisionada cujo destino é voar, ter de se manter engaiolada ali num espaço tão exíguo e não poder mandar-se ao vento; outro é eu sentir que, por tal pitéu primoroso, pago tão pouco e estou a participar numa injustiça, onde o mérito não está a ser legitimamente relevado e ressarcido. Desde há meia dúzia de anos, quando entre 2007 e 2009, foi assaltada 15 vezes no seu anterior estabelecimento, na Rua Velha, e, pela passividade camarária foi obrigada a claudicar, que passei a ver esta senhora como modelo de uma descomunal força invisível que se apreende mas não se vê. Vamos ouvir a Dona Graça:



“Tenho muita saudade da Rua Velha, senhor Luís  –e uma lágrima mais afoita começa a balouçar entre cai e não cai. Foram muitos anos. Mais de uma dezena que por lá passei. Embora seja aqui muito bem tratada por toda a clientela, e também esteja na Baixa, lá, na Baixinha –porque há mesmo duas classificações em divisória para a mesma área-, onde tinha a minha tasca, era um ambiente diferente. Naquelas ruas estreitas está o coração, o pulsar de vida, a essência natural das coisas. A sua ambiência pitoresca, peculiar, pura, é como um cosmo no Universo, uma pequena aldeia no meio de uma grande cidade onde todos se conhecem. Ali tinha a amizade sincera, a camaradagem. Deixei lá muitos amigos. Ainda que, volta e meia, me visitem já não é a mesma coisa. Embora estejamos apenas separados por uma rua larga as pessoas afastam-se. Tenho mesmo muitas saudades desse tempo –e os seus olhos parados ficam presos numa imagem perdida no vácuo. Graças a Deus, o meu negócio aqui, na Rua da Sofia, está a correr bem. Tenho muita clientela. O problema é que, para o manter, sou obrigada a levar barato e tenho pouco lucro. Trabalho cada vez mais para ganhar cada vez menos. Quer dizer, como sou poupada e trabalhadora, tenho as minhas contas em dia, entende? Também faço por isso. Esforço-me muito, sabe? Trabalho 14 horas por dia, sábados e domingos. Depois deste meu horário ainda vou fazer umas horas para outro serviço externo ao meu snack. Tenho de me multiplicar para fazer face às despesas. Naturalmente que nesta descrição incluo o empenho do meu Victor, o meu marido, que trabalha aqui comigo a tempo inteiro.
Às vezes custa-me a entender a razão de as pessoas não virem à Baixa. Esta zona tem tudo. Por cá compra-se mais barato do que nas grandes superfícies. Há melhor qualidade nos produtos. Sendo assim, porque se afastam as pessoas da zona histórica? Interrogo-me e não consigo chegar a uma conclusão. Houve interesses em licenciar as grandes superfícies. Por parte dos executivos dos últimos 20 anos, houve desleixo e um deixar-correr o marfim. A cidade já há muito que está esgotada na oferta. No entanto, pasme-se, continuam os licenciamentos. Nunca se fizeram estudos de impacto comercial. Trataram sempre os comerciantes da Baixa como coisas descartáveis. Sinto uma profunda raiva, e, ao mesmo tempo, uma intensa frustração que me consome a alma; uma impotência surda pelo que está acontecer. Os comerciantes também têm muita culpa no cartório; aceitaram sempre tudo, sem um queixume, um ai. Nunca levantaram a voz. Se eu pudesse encerrava a Baixa durante uma semana. Talvez assim, residentes na cidade e políticos da Praça 8 de Maio, verificassem que faz falta. Nunca aceito propaganda no meu bar das grandes superfícies. Isso é que era bom! Se não nos deixam lá publicitar os nossos produtos vêm para aqui? Homessa! Estas grandes áreas foram as grandes responsáveis pelo estado a que isto chegou. Foram a bomba de neutrões que tudo destruiu, história, edificado, vidas, famílias inteiras. Os políticos da última vintena de anos, que passaram nos paços do concelho e contribuíram para a degradação ambiental desta zona, deveriam ser todos julgados em processo comum por atentado à dignidade da pessoa humana. Sinto uma enorme tristeza  –encolhe o queixo, cerra os dentes, e novamente os olhos se inundam. Quando vejo comerciantes, que trabalharam toda a vida e contribuíram para a Segurança Social, encerrarem e ficarem na miséria dá-me uma dor no peito. Porra! Não se trata assim nem os animais quanto mais gente!
Acredito no futuro da Baixa. Mas sabe? O problema é que a recuperação vai demorar mais de uma década. E quem é que lá chega? Dos que estão agora, quase de certeza, nem um lá vai chegar para festejar! O executivo municipal deveria dar amparo. Não quer saber. O estacionamento público deveria ser gratuito durante as primeiras duas horas para permitir que mais gente cá viesse comprar. Perante o que está acontecer, os dramas estão à vista de todos –você sabia que amputaram uma perna ao senhor Manuel Magalhães, da desaparecida Sapataria Reis? Coitado! Acabar assim! A edilidade deveria isentar todos os novos licenciamentos para investimento e desonerar as taxas de toldos e publicidade a quem cá está e faz um esforço danado para se aguentar. Não se sente nenhum apoio por parte da autarquia. É assim uma coisa estranha, que está no meio de nós mas não faz parte de nós –e note, este sentimento já vem de longe. Não digo isto por questões partidárias. Essa questão dos partidos transcende-me. Eles, como reis num palácio, estão lá mas não sabem nada do que se passa aqui nas ruas, nas lojas, nas casas com pessoas a passarem fome. O deles, o seu ordenado, está certo, sabe? Esse, verdadeiramente, é a causa de todos os nossos problemas. Estamos a ser dirigidos por pessoas que não têm o mínimo de sensibilidade social. Com tantos edifícios devolutos, levam daqui cada vez mais serviços públicos e transferem-nos para a periferia. Querem o quê? Eu gostava de ter um presidente de Câmara dinâmico, que olhasse nos olhos os pequenos comerciantes. Estive tantos anos na Rua Velha e aqui há cerca de cinco anos e, nem este (Barbosa de Melo) nem o anterior (Carlos Encarnação), nunca os vi no meu estabelecimento. Gostava de ver um presidente, pelo menos uma vez num mandato e fora da campanha eleitoral, a entrar por aquela porta e que me cumprimentasse. Por culpa deles, há um enorme divórcio entre os políticos eleitos e nós, pequenos empresários. Estamos a viver um momento de sufoco. Para nos aguentarmos deveriam embaratecer a Luz, a água, as taxas, os impostos. Como se colocassem uma gota de veneno diariamente no nosso prato, estão a matar-nos lentamente. Se continuar assim é impossível sobrevivermos.
Penso muitas vezes em abandonar a Baixa  –por vontade do meu Victor já tinha ido há muito. Mas sabe? Não gosto de deixar nada a meio. Não gosto de desistir. Se fosse mais nova emigrava. Cada vez me sinto menos gente e mais coisa com as pessoas responsáveis pelo nosso destino. Sinto-me inferior, discriminada. Sinto ser um joguete nas mãos e na vontade de quem nos governa. Apesar de tudo, ainda conservo alguma esperança que isto um dia mude. Este sistema que nos rege está falido. Temo muito pelos meus netos. Acredita?”

 

A BAIXA E A BAIXINHA NO BE FADO

 Sobre o lema “Coimbra Ger(a)ções A Baixa e a Baixinha” e inserido no espírito do Ano Europeu do Cidadão, as associações Apojovi e a Aposenior vão realizar hoje, sexta-feira, entre as 19 e as 20h30, uma tertúlia no Be Fado, na Rua Adelino Veiga, com entrada livre. Esta palestra, com moderação de Vera Martins, será apresentada sob o âmbito de “dois projetos que se unem no propósito de fomentar a participação ativa dos cidadãos e de organizações da sociedade civil na revitalização de duas zonas emblemáticas da histórica cidade de Coimbra: a Baixa e a Baixinha.”
O encontro será seguido de um jantar, com custo de 15 euros, onde serão recordados momentos armazenados na memória coletiva. Quer para o debate, quer para o jantar, a organização deste evento, com apoio da Câmara Municipal de Coimbra, para além de ter presentes no painel representantes dos empresários da Baixa, espera poder contar com muitos residentes e comerciantes interessados em discutir o futuro desta zona de antanho. 


EM NOME DA ROSA

 Quem atravessa a Praça do Comércio, ao lado da Igreja de São Tiago, é surpreendido por uma pequena tenda branca, que, só por isso, se distingue no espaço envolvente. Mas, como a curiosidade é mais forte e nos corrói, olhamos para o seu interior e deparamos com uns bouquets com rosas de vários feitios e de todas as cores. Na primeira impressão parecem-nos naturais. Depois aventamos serem de seda. Mas como não damos por concluído o processo interrogamos o vendedor, o Alexandre Tavares. Conte-me, interrogamos, Alexandre, como é que consegue ter aqui rosas tão apelativas, viçosas e tão carregadas de beleza?
“Embora não pareça, estas rosas são de madeira. São importadas da Holanda em bruto. Depois de as recebermos, nós –eu e a minha namorada Lígia Collos- fazemos os arranjos florais;, damos cor, borrifamos com cheiros, de vários perfumes e criamos os bouquets originais. Estamos aqui na praça há pouco tempo, mas felizmente está a ser um sucesso. Vendemos bem na semana da Queima das fitas. O nosso público-alvo é sobretudo o das comemorações, como, por exemplo, Dia da Mãe, aniversários, casamentos e até para o cemitério temos vendido, para lembrar o desaparecimento de um ente querido. Aproveitando esta publicidade, convidamos todos os leitores a visitar o nosso stande”


REFLEXÃO: LAVRAR NAS PEDRAS

 A semana passada escrevi aqui que, nesta última quarta-feira dia 22, a Comissão Instaladora (CI) da recém-criada Associação de Beneficência ao Comerciante de Coimbra (ABCC) iria realizar um jantar no Restaurante Jardim da Manga para se tentar elaborar uma ou mais listas para conseguir levar este benemérito projeto em frente. O Diário de Coimbra fez o favor de anunciar o evento na terça-feira. Para além disso, neste mesmo dia e na data do jantar andaram, de porta em porta, vários elementos da CI a convidar comerciantes para comparecerem no repasto. As respostas da maioria foram desoladoras. Desde “não posso, tenho de ir buscar o meu filho”; “amanhã, quarta? É muito em cima, não estava a contar!”. Para quem está farto de correr Seca e Meca para conseguir constituir a ABCC, ouvir estas respostas é simplesmente demolidor. Como é que se consegue lavrar nas pedras?


sexta-feira, 24 de maio de 2013

O LOUCO MUNDO FISCAL PERSECUTÓRIO




 Há cerca de dois meses foi realizada a escritura pública da Associação de Beneficência ao Comerciante de Coimbra (ABCC). Cerca das 9h00 do dia 18 de Março, fui à secção das Finanças, na Loja do Cidadão, para liquidar a retenção por conta relativo ao acto notarial. No caso, eram 51,70 euros. A funcionária pública preencheu o impresso correspondente e digitalizou a importância no TPA, Terminal de Pagamento Automático. Ou porque ainda estava ensonado, ou na razão directa de ser um bocado lerdo, não verifiquei a importância subscrita e cliquei no ok. Quando recebi o talão da máquina, então sim olhei e o que vi? A verba de 206,81 euros. Ou seja, por erro da funcionária e falta de atenção da minha parte, tinha-me sido retirada aquela importância. Reclamei perante a senhora, que recalcitrou que eu deveria ter tomado atenção. Isto é, a culpa era inteiramente minha. Como já estou habituado por outras coisas cá na minha vida, que agora não conto, e apanhar com tudo em cima, nem achei anormal. Como estava bem disposto, no meio de um sorriso, até respondi que como a minha conta estava recheada, nem ligava ao que pagava –saberá lá o Criador as misérias que me apoquentam, mas passemos à frente, que de tesos não reza a história. A funcionária das Finanças imediatamente fez uma devolução no TPA da mesma importância e eu, na paz dos anjos e fé em Deus, segui a minha vida e nunca mais pensei no assunto.
Hoje, dia 24 de Maio, endereçada à ABCC, recebi uma notificação, por citação postal, com o título “Identificação da Dívida em Cobrança Coerciva”, no valor de 226,19 euros. Estranhei porque a ABCC só agora constituiu a sua lista, as eleições legitimantes serão na próxima quarta-feira, e, por esse facto, ainda não foi possível iniciar a actividade, enquanto acto primeiro de inscrição nos serviços fiscais. Fui à Loja do Cidadão para ser esclarecido. Lá, não era possível, uma vez que não havia acesso ao documento da sua génese. Só na 2ª Repartição de Finanças, na Avenida Fernão de Magalhães. E como pregador em busca do Santo Graal, lá coloquei as alpercatas ao caminho. Ali, naquela catedral de recolha de impostos onde todos ajoelham sem rezar e sem miar, depois de muita dificuldade em aceder à origem da importância lá se conseguiu saber que um qualquer acto tinha dado origem à retenção por conta do valor de 226,19 euros, incluindo custas. Mas que acto foi esse? Perguntava eu à funcionária, muito simpática, por acaso. Não sabia, respondeu. O sistema não informava o que deu origem à tributação. Entretanto os meus azeites começaram a ferver –o que não é preciso muito, confesso com grande desgosto da minha pessoa. Veio o chefe, boa aparência, simpático até onde se poderia ser, e tentou defender o indefensável: se ali estava escrito no sistema que havia um pagamento era porque havia mesmo. Afirmava-me assim na minha cara de palonço, que já é de família. E a teimosia continuava. Eu afirmava-me inocente e o chefe reincidia na defesa da máquina. E, passando assim mais de uma hora, nem eu ia almoçar, nem ele, nem a sua subalterna. E o clima estava tenso. Até que me lembrei do engano da funcionária na Loja do Cidadão. Por sorte, às vezes, na minha religiosa distracção, tenho mesmo sorte. Então não é que tinha guardado o talão? E lá se resolveu o pleito que em tudo me parecia um processo de Kafka. Apesar da minha falta de jeito para tratar com estas máquinas que nos hão-de destruir a todos, acabei em bem com a funcionária, que perante as minhas graçolas –às vezes consigo rir quando me apetece chorar- que até ganhou uma nova cor nas faces do rosto cansado. O chefe, também fatigado, agastado e desmotivado com todas estas ondas de choque entre a Administração e o contribuinte, presumo, perante a minha inegável razão, veio pedir desculpa. Gostei dele pela forma simples como se retratou. Creio que fiz um amigo.
Mas, depois de tudo acabar em bem, só uma pergunta se me alavanca na cabeça: e se eu não tivesse o talão da devolução da máquina do TPA?
Para onde caminhamos? Ninguém sabe, mas uma constatação persiste: com este sistema, em que os contribuintes passaram a ser extensões e escravos das máquinas, não vamos longe. Vamos todos ser triturados. Os funcionários, como este chefe que acabei a admirar, vão ser todos lançados no desemprego. Por sua vez, o cidadão ficará cada vez mais à mercê dos computadores e não terá qualquer defesa. Será que ninguém vê isso?

quarta-feira, 22 de maio de 2013

BAIXA: EM BUSCA DE UM SENTIDO



 Acompanhado do Francisco Veiga, hoje, durante parte da manhã, percorremos as lojas da Baixa convidando os comerciantes a estarem presentes logo num jantar, no Restaurante Jardim da Manga, para apresentação pública da já legalmente constituída Associação de Beneficência ao Comerciante de Coimbra e elaboração de listas concorrentes a sufrágio para os novos corpos-gerentes.
O ambiente que se sente nos estabelecimentos vazios, sem um único cliente, sem espírito de alento, é simplesmente aterrador. O desânimo é simplesmente palpável a olho nu. Em uma qualquer loja, desde a Rua Adelino Veiga, a Eduardo Coelho, Corvo, à Rua da Louça ou outra qualquer artéria, transpomos a porta principal e o que vemos em quadro repetido? Num lado, dois velhos, marido e mulher, encostados ao balcão, de caras fechadas e carregadas de preocupação. No outro canto um funcionário de braços cruzados, como se esperasse a pancada demolidora para o mandar para o desemprego. Começo a expor o que nos leva ali. Em respostas passadas a papel químico, nem deixam acabar: “não posso. Tenho os anos do meu neto!”. Não posso, é muito em cima, à quarta-feira vou à aldeia!”. Não posso, tenho de preparar logo as coisas para amanhã!”. Não posso. Eu nunca janto!”. Não posso… se ao menos fosse ao almoço…”.
Mas o que mais me impressionou pela recorrência foi: “até ao fim do ano vou fechar! Estou aqui a fazer o quê? A matar-me?”
Esta semana encerrou a Boutique Romy, no Largo da Freiria. Até ao fim do mês, segundo alegações dos próprios, vão encerrar diversas lojas: uma na Rua Visconde da Luz, uma na Rua Eduardo Coelho, outra na Rua das Padeiras e ainda outra na Rua da Gala. Para além disso,  até Agosto, também na Rua Eduardo Coelho, a outrora muito conhecida rua dos sapateiros, duas quase centenárias sapatarias, da mesma sigla familiar, ou serão concessionadas a uma marca internacional ou claudicam de vez.
Perante estes encerramentos em massa, e que até ao fim do ano vai ser arrasador, o que vai acontecer à Baixa? Neste momento, sobretudo nas ruas estreitas, a tristeza, a solidão, e a falta de esperança invadiram cantos, recantos e becos. Esta zona comercial, outrora viçosa e prenhe de vida, agora parece, de facto, um cemitério. O que torna este clima ainda mais sui generis é que nos campos-santos vêem-se pessoas a chorar. Aqui não. Como sombras de um silêncio perturbador, adivinham-se esboços de gente que se arrasta sem ânimo e sem vontade de lutar por ideal perdido há muito. A angústia tomou conta destes residentes. Talvez porque o percurso de dor tenha sido demasiado longo, as lágrimas secaram e já não sai nada. O que se sente são espasmos estrangulados em farrapos de ansiedade. Fará algum sentido tentar remar contra a maré, constituindo novos instrumentos que permitam acudir a estes estados de alma? O que vai ser o futuro desta zona comercial?

terça-feira, 21 de maio de 2013

REFLEXÃO: LAVRAR NAS PEDRAS


REFLEXÃO: LAVRAR NAS PEDRAS

A semana passada escrevi aqui, no blogue e jornal O Despertar, que, amanhã, quarta-feira dia 22, a Comissão Instaladora (CI) da recém-criada Associação de Beneficência ao Comerciante de Coimbra (ABCC) iria realizar um jantar no Restaurante Jardim da Manga para se tentar elaborar uma ou mais listas para conseguir levar este benemérito projecto em frente. O Diário de Coimbra fez o favor de anunciar o evento hoje, terça-feira. Para além disso, também hoje, durante a manhã, andaram de porta em porta, nas lojas, vários elementos da CI a convidar comerciantes para comparecerem no repasto. As respostas da maioria foram desoladoras. Desde “não posso, tenho de ir buscar o meu filho”; “amanhã, quarta? É muito em cima, não estava a contar!”. Para quem está farto de correr Seca e Meca para conseguir constituir a ABCC, ouvir estas respostas é simplesmente demolidor. Como é que se consegue lavrar nas pedras?

A BAIXA E A BAIXINHA NO BE FADO



A BAIXA E A BAIXINHA NO BE FADO

 Sobre o lema “Coimbra Ger(a)ções A Baixa e a Baixinha” e inserido no espírito do Ano Europeu do Cidadão, as associações Apojovi e a Aposenior vão realizar na próxima sexta-feira, entre as 19 e as 20h30, uma tertúlia no Be Fado, na Rua Adelino Veiga, com entrada livre. Esta palestra, com moderação de Vera Martins, será apresentada sob o âmbito de “dois projetos que se unem no propósito de fomentar a participação ativa dos cidadãos e de organizações da sociedade civil na revitalização de duas zonas emblemáticas da histórica cidade de Coimbra: a Baixa e a Baixinha.”
O encontro será seguido de um jantar, com custo de 15 euros, onde serão recordados momentos armazenados na memória coletiva. Quer para o debate, quer para o jantar, a organização deste evento, com apoio da Câmara Municipal de Coimbra, para além de ter presentes no painel representantes dos empresários da Baixa, espera poder contar com muitos residentes e comerciantes interessados em discutir o futuro desta zona de antanho. 

EM NOME DA ROSA



EM NOME DA ROSA

 Quem atravessa a Praça do Comércio, ao lado da Igreja de São Tiago, é surpreendido por uma pequena tenda branca, que, só por isso, se distingue no espaço envolvente. Mas, como a curiosidade é mais forte e nos corrói, olhamos para o seu interior e deparamos com uns bouquets com rosas de vários feitios e de todas as cores. Na primeira impressão parecem-nos naturais. Depois aventamos serem de seda. Mas como não damos por concluído o processo interrogamos o vendedor, o Alexandre Tavares. Conte-me, interrogamos, Alexandre, como é que consegue ter aqui rosas tão apelativas, viçosas e tão carregadas de beleza?
“Embora não pareça, estas rosas são de madeira. São importadas da Holanda em bruto. Depois de as recebermos, nós –eu e a minha namorada Lígia Collos- fazemos os arranjos florais;, damos cor, borrifamos com cheiros, de vários perfumes e criamos os bouquets originais. Estamos aqui na praça há pouco tempo, mas felizmente está a ser um sucesso. Vendemos bem na semana da Queima das fitas. O nosso público-alvo é sobretudo o das comemorações, como, por exemplo, Dia da Mãe, aniversários, casamentos e até para o cemitério temos vendido, para lembrar o desaparecimento de um ente querido. Aproveitando esta publicidade, convidamos todos os leitores a visitar o nosso stande”

segunda-feira, 20 de maio de 2013

UMA ENTREVISTA, POR ACASO...



UMA ENTREVISTA, POR ACASO…



 Praticamente, com raras excepções, almoço todos os dias no “Marcius”, na Rua da Sofia. Enquanto estou sentado num dos bancos do balcão, do pequeno snack-bar onde cabe apenas uma dezena de pessoas um pouco apertadas, vou mirando o aspecto cansado do casal Victor Pereira e da Graça Santos –a Dona Graça, como é gentilmente tratada por todos, pelo respeito conquistado à força de trabalho, da luta e do sacrifício diário. Enquanto mastigo as habituais delícias pantagruélicas, inimigas do meu ventre e que me deveria tornar comedido, sou sempre acometido por dois pensamentos. Um deles é o facto da Dona Graça ser, para mim, a melhor cozinheira da cidade e, como águia aprisionada cujo destino é voar, ter de se manter engaiolada ali num espaço tão exíguo e não poder mandar-se ao vento; outro é eu sentir que, por tal pitéu primoroso, pago tão pouco e estou a participar numa injustiça, onde o mérito não está a ser legitimamente relevado e ressarcido. Desde há meia dúzia de anos, quando entre 2007 e 2009, foi assaltada 15 vezes no seu anterior estabelecimento, na Rua Velha, e, pela passividade camarária foi obrigada a claudicar, que passei a ver esta senhora como modelo de uma descomunal força invisível que se apreende mas não se vê. Vamos ouvir a Dona Graça:

“Tenho muita saudade da Rua Velha, senhor Luís  –e uma lágrima mais afoita começa a balouçar entre cai e não cai. Foram muitos anos. Mais de uma dezena que por lá passei. Embora seja aqui muito bem tratada por toda a clientela, e também esteja na Baixa, lá, na Baixinha –porque há mesmo duas classificações em divisória para a mesma área-, onde tinha a minha tasca, era um ambiente diferente. Naquelas ruas estreitas está o coração, o pulsar de vida, a essência natural das coisas. A sua ambiência pitoresca, peculiar, pura, é como um cosmo no Universo, uma pequena aldeia no meio de uma grande cidade onde todos se conhecem. Ali tinha a amizade sincera, a camaradagem. Deixei lá muitos amigos. Ainda que, volta e meia, me visitem já não é a mesma coisa. Embora estejamos apenas separados por uma rua larga as pessoas afastam-se. Tenho mesmo muitas saudades desse tempo –e os seus olhos parados ficam presos numa imagem perdida no vácuo. Graças a Deus, o meu negócio aqui, na Rua da Sofia, está a correr bem. Tenho muita clientela. O problema é que, para o manter, sou obrigada a levar barato e tenho pouco lucro. Trabalho cada vez mais para ganhar cada vez menos. Quer dizer, como sou poupada e trabalhadora, tenho as minhas contas em dia, entende? Também faço por isso. Esforço-me muito, sabe? Trabalho 14 horas por dia, sábados e domingos. Depois deste meu horário ainda vou fazer umas horas para outro serviço externo ao meu snack. Tenho de me multiplicar para fazer face às despesas. Naturalmente que nesta descrição incluo o empenho do meu Victor, o meu marido, que trabalha aqui comigo a tempo inteiro.
Às vezes custa-me a entender a razão de as pessoas não virem à Baixa. Esta zona tem tudo. Por cá compra-se mais barato do que nas grandes superfícies. Há melhor qualidade nos produtos. Sendo assim, porque se afastam as pessoas da zona histórica? Interrogo-me e não consigo chegar a uma conclusão. Houve interesses em licenciar as grandes superfícies. Por parte dos executivos dos últimos 20 anos, houve desleixo e um deixar-correr o marfim. A cidade já há muito que está esgotada na oferta. No entanto, pasme-se, continuam os licenciamentos. Nunca se fizeram estudos de impacto comercial. Trataram sempre os comerciantes da Baixa como coisas descartáveis. Sinto uma profunda raiva, e, ao mesmo tempo, uma intensa frustração que me consome a alma; uma impotência surda pelo que está acontecer. Os comerciantes também têm muita culpa no cartório; aceitaram sempre tudo, sem um queixume, um ai. Nunca levantaram a voz. Se eu pudesse encerrava a Baixa durante uma semana. Talvez assim, residentes na cidade e políticos da Praça 8 de Maio, verificassem que faz falta. Nunca aceito propaganda no meu bar das grandes superfícies. Isso é que era bom! Se não nos deixam lá publicitar os nossos produtos vêm para aqui? Homessa! Estas grandes áreas foram as grandes responsáveis pelo estado a que isto chegou. Foram a bomba de neutrões que tudo destruiu, história, edificado, vidas, famílias inteiras. Os políticos da última vintena de anos, que passaram nos paços do concelho e contribuíram para a degradação ambiental desta zona, deveriam ser todos julgados em processo comum por atentado à dignidade da pessoa humana. Sinto uma enorme tristeza  –encolhe o queixo, cerra os dentes, e novamente os olhos se inundam. Quando vejo comerciantes, que trabalharam toda a vida e contribuíram para a Segurança Social, encerrarem e ficarem na miséria dá-me uma dor no peito. Porra! Não se trata assim nem os animais quanto mais gente!
Acredito no futuro da Baixa. Mas sabe? O problema é que a recuperação vai demorar mais de uma década. E quem é que lá chega? Dos que estão agora, quase de certeza, nem um lá vai chegar para festejar! O executivo municipal deveria dar amparo. Não quer saber. O estacionamento público deveria ser gratuito durante as primeiras duas horas para permitir que mais gente cá viesse comprar. Perante o que está acontecer, os dramas estão à vista de todos –você sabia que amputaram uma perna ao senhor Manuel Magalhães, da desaparecida Sapataria Reis? Coitado! Acabar assim! A edilidade deveria isentar todos os novos licenciamentos para investimento e desonerar as taxas de toldos e publicidade a quem cá está e faz um esforço danado para se aguentar. Não se sente nenhum apoio por parte da autarquia. É assim uma coisa estranha, que está no meio de nós mas não faz parte de nós –e note, este sentimento já vem de longe. Não digo isto por questões partidárias. Essa questão dos partidos transcende-me. Eles, como reis num palácio, estão lá mas não sabem nada do que se passa aqui nas ruas, nas lojas, nas casas com pessoas a passarem fome. O deles, o seu ordenado, está certo, sabe? Esse, verdadeiramente, é a causa de todos os nossos problemas. Estamos a ser dirigidos por pessoas que não têm o mínimo de sensibilidade social. Com tantos edifícios devolutos, levam daqui cada vez mais serviços públicos e transferem-nos para a periferia. Querem o quê? Eu gostava de ter um presidente de Câmara dinâmico, que olhasse nos olhos os pequenos comerciantes. Estive tantos anos na Rua Velha e aqui há cerca de cinco anos e, nem este (Barbosa de Melo) nem o anterior (Carlos Encarnação), nunca os vi no meu estabelecimento. Gostava de ver um presidente, pelo menos uma vez num mandato e fora da campanha eleitoral, a entrar por aquela porta e que me cumprimentasse. Por culpa deles, há um enorme divórcio entre os políticos eleitos e nós, pequenos empresários. Estamos a viver um momento de sufoco. Para nos aguentarmos deveriam embaratecer a Luz, a água, as taxas, os impostos. Como se colocassem uma gota de veneno diariamente no nosso prato, estão a matar-nos lentamente. Se continuar assim é impossível sobrevivermos.
Penso muitas vezes em abandonar a Baixa  –por vontade do meu Victor já tinha ido há muito. Mas sabe? Não gosto de deixar nada a meio. Não gosto de desistir. Se fosse mais nova emigrava. Cada vez me sinto menos gente e mais coisa com as pessoas responsáveis pelo nosso destino. Sinto-me inferior, discriminada. Sinto ser um joguete nas mãos e na vontade de quem nos governa. Apesar de tudo, ainda conservo alguma esperança que isto um dia mude. Este sistema que nos rege está falido. Temo muito pelos meus netos. Acredita?”






sábado, 18 de maio de 2013

A FESTA DA FLOR NA BAIXA



Está a decorrer hoje a festa da flor e da Planta na Baixa, entre a Praça 8 de Maio e Largo da Portagem. Visite esta alegoria.

sexta-feira, 17 de maio de 2013

quinta-feira, 16 de maio de 2013

LEIA O DESPERTAR...


LEIA AQUI O DESPERTAR DESTA SEMANA 

Para além  do texto "UMA ENTREVISTA, POR ACASO", deixo também as crónicas "DE RASGAR O CORAÇÃO";  "UM JANTAR PELOS COMERCIANTES"; "RANCHO DE COIMBRA A TODO O VAPOR"; e "REFLEXÂO: COINCIDÊNCIA"



UMA ENTREVISTA, POR ACASO

 Quando o vemos a percorrer as pedras da calçada nas ruas estreitas em passo ligeiro, se não o conhecermos, pelo porte atlético e espírito de gentleman, pela garbosidade, alma cheia e autoestima no máximo, imaginamos estar na presença de um juiz jubilado, ou, no mínimo, perante um Charlton Heston incarnado, saído dos anos de ouro do cinema de Hollywood. De pele bem cuidada, e sempre vestido com gosto, de fato e gravata, barba bem aparada, cabelo prateado e bem penteado, ninguém diz que, por um lado, o José Luís Montenegro é alfaiate de profissão e, por outro, que tem 74 anos de idade. Em silogismo, tendo em conta o seu labor profissional, poderemos ser levados a especular que, no extenso rol de clientela, terá Deus como freguês e Este, pela compensação, subtrai-lhe umas primaveras e trata-lhe do aspeto. Por acaso, sempre por acaso, cruzei-me com o Montenegro, ali na Rua do Almoxarife, junto à sua alfaiataria. Como todos os profissionais do corte, sabe ser incisivo e certeiro. Vamos ouvir o que tem para nos dizer:


Estive 32 anos com oficina em Santa Clara, na Avenida João das Regras. Há 14 anos, como guerreiro que retorna sempre à sua origem, deu-me uma saudade danada e vim para Baixa. Sou salatina, nasci na Rua do Cabido, na Alta, e por aqui, pela zona histórica, cresci e me fiz homem. Atualmente, tenho o meu atelier na artéria mais emblemática desta zona velha: a Rua do Almoxarife. Toda gente fala de crise. Graças a Deus não sei o que é a crise! Nem tenho tempo para me coçar. Desde há 60 anos que laboro todos os dias, incluindo sábados e domingos, sempre que necessário. A minha freguesia é constituída por professores, juízes, médicos e empresários bem-sucedidos. Embora sempre trabalhasse com todas as extirpes sociais, mas a classe média morreu. Apesar de ainda fazer alguma obra para este grupo social, e mesmo até para agrupamentos de folclore. Tenho sempre trabalho. Também é verdade que na cidade, salvo erro, só existem três alfaiates. Tenho muita pena, sabe? É uma profissão em vias de extinção. Eu gostava de ensinar miúdos, mas ninguém quer. Deviam colocar a arte de alfaiataria no Centro de Formação. Se preciso fosse, iria pra lá ensinar de bom grado. Dá-me uma dor no coração sentir que a minha profissão, desaparecendo os existentes, vai acabar sem glória. Você não acha estranho, neste tempo de falta de emprego, que ninguém se interesse? Quem manda nos nossos destinos deveria abrir uma escola nesta área enquanto é tempo e há alguns mestres que podem ensinar. Poucos querem trabalhar, este, verdadeiramente, é o problema do nosso definhamento. A decadência da Baixa também passa por aí, pela falta de esforço de quem aqui ganha a vida. Os comerciantes deveriam abrir mais cedo e encerrar mais tarde. Nem patrões nem empregados querem ir além do mínimo. Uma pessoa vai para Viseu e Aveiro e lá estão todos os comércios abertos. Aqui não. Já fomos a terceira cidade do país. Agora, definitivamente, fomos ultrapassados e estaremos aí em décimo lugar no ranking nacional. A recuperação desta zona de antanho passa inevitavelmente pelo trabalho. Se todos não se esforçarem mais não haverá hipótese nenhuma. Não vejo futuro para isto. A Baixa morreu muito devido à falta de transportes públicos nas ruas largas. Os meus clientes estão sempre a falar disso. A continuar como está, se não fizerem nada, em poucos anos fecha tudo. A partir das 19h00 esta área desertificada passa a ser um cemitério. Nunca vi a Baixa assim –abana a cabeça e engelha a fronte em manifestação sentida. A Câmara Municipal deveria participar mais nesta recuperação. Iniciativas como a Feira do Livro e do Artesanato deveriam ser realizadas aqui e não no Parque Verde. A autarquia é pouco bairrista. Está aqui implantada mas gosta pouco da Baixa.
Com uma nova direção, de que sou o presidente, estamos a tentar ressuscitar das cinzas o velhinho Rancho das Tricanas de Coimbra. Já estamos a ensaiar o rancho folclórico para o trazer para as ruas. Lamento muito que, aquando da tomada de posse, tivesse convidado todas as forças vivas da cidade e somente os presidentes de junta, de São Bartolomeu e Santa Cruz, tivessem respondido à chamada. Se não ligam patavina a estas coletividades, que desde há um século foram sempre o embrião na movida destas zonas residenciais e comerciais, querem o quê?"


DE RASGAR O CORAÇÃO

 Na velha loja de velharias, implantada na cidade há quase duas décadas, perdida nos encontros da história e nos cruzamentos da vida, os objetos expostos no estabelecimento tremem de dor perante os continuados apelos ouvidos e saídos da boca de gente que merecia mais consideração e respeito: “por favor, senhor, compre-me esta boneca. É da minha neta! Mas o que hei-de fazer? Ela está desempregada! A minha reforma é de duzentos e poucos euros. Nem dinheiro tenho para a farmácia –lá, já não me fiam. Estou a passar fome, senhor. Acredite!”
No canto, um velho Gramofhone, invenção de 1887 do alemão Emil Berliner, que nos anos loucos de 1920 alegrou e engrandeceu uma qualquer grande casa senhorial, em face da verborreia de lengalenga da senhora idosa, parece contrair-se em sofrimento, como se, em especulação, comparasse o seu tempo de abastança com este início de século prenhe de quadros de miséria humana. Ao lado, um velho relógio de torre, em lembrança de Trindades ouvidas num campo lavrado à força de um homem suado e uma parelha de bois, toca a reboque para reunir outros congéneres. Mas o seu chamamento não surtiu efeito. A maioria dos contadores deste tempo que não deixa recordação, tal como os humanos, estão adormecidos, sem corda, sem força anímica, para poder entabular reação.
Um passo à frente, e no mesmo ambiente secular, um busto em terracota, certamente um reivindicativo republicano do final da Monarquia, austero, de bigodes retorcidos e olhos pregados na cena, parece pensar se teria valido a pena a mudança de sistema e augura condenar esta política hodierna que manda para o charco a tão apregoada dignidade da pessoa humana. Sem falar e apenas pela imagem do semblante duro, sugere que o que está acontecer é uma tragédia social de consequências terríveis e incomensuráveis e não pode continuar. É demasiado atroz para se poder passar ao lado. Como a dar-lhe razão, o cuco de um relógio com o mesmo nome, um Junghans fabricado na Alemanha, solta seis ais, gemidos e chorados, como se estivesse solidário com a causa republicana nacional. Na mesma parede, ao lado, uma máquina portuguesa, da velhinha Boa Reguladora, praticamente engolida na destrutiva onda da globalização, quem sabe por desprezo, nem se dignou responder ao símbolo da indústria alemã.
Em frente, numa mesa, tosca e carcomida pela memória e talvez fruto de um desaparecido marceneiro que pela noite dentro ganhava a vida em suprimento familiar, umas dezenas de pratos da Fábrica de Sacavém jazem inertes como esqueletos de engenho e arte que, dando trabalho a milhares de pessoas até aos idos anos de 1980, foi engolida nos fumos revolucionários da Abrilada. Numa prateleira, uns quantos rádios a válvulas, embora mudos mas prontos a debitarem música e notícias a qualquer momento, do seu olho-mágico avaliam todo o cenário envolvente com apatia e misericórdia. Em frente, uns alfarrábios empoeirados, que conservam na lapela as impressões digitais de várias gerações, sugerindo em analogia um lago de águas paradas e sem vida, parecem questionar: o que é isto? Para onde caminhamos?


UM JANTAR PELOS COMERCIANTES

 Na próxima quarta-feira, dia 22 de Maio, pelas 20h00, a Comissão Instaladora da recém-criada Associação de Beneficência ao Comerciante de Coimbra (ABCC), constituída por Luís Quintans, Armindo Gaspar, Francisco Veiga, António Pereira, João Braga, Arménio Pratas e Henrique Ramalhete, vai levar a efeito um jantar no Restaurante Jardim da Manga. O custo do repasto será de 9 euros. Para além de se pretender um encontro profícuo entre profissionais, a intenção maior é tentar organizar uma ou várias listas concorrentes à eleição dos corpos-gerentes que se realizará passada uma semana, no dia 29, entre as 9 e as 19h00, na sua sede provisória, no Largo da Freiria, número 4, primeiro andar. Conforme a Publicação de Acto Societário através do Instituto dos Registos e do Notariado, a apresentação pública de listas a sufrágio decorrerá entre o dia 23 e as 19h00 do dia 28 de Maio.
Através deste meio, a Comissão Instaladora apela a todos os profissionais que façam um esforço para comparecerem. Num tempo de individualismo crescente, onde a miséria cava fundo e os dramas estão ao virar da esquina, é preciso dar um pouco de nós para o bem comum. Interroga a comissão: “podemos contar consigo?”.


RANCHO DE COIMBRA A TODO O VAPOR

 Na semana passada, na quarta-feira, sob a batuta do maestro Manuel Manascina, realizou-se no Rancho das Tricanas de Coimbra, o primeiro ensaio do renascido rancho. Com as cantadeiras Celeste Dourado, Almerinda Querido, Fátima do Salvado e os instrumentistas José Malva, no acordeão, José Alberto, no cavaquinho, o Oliveira, no bandolim, o Jaime, o Vilas e o Quintans, nas violas. As imensas fotos de presidentes já desaparecidos até pareciam dançar nas paredes deste velho salão. Com um grupo de dançarinos de excelência, onde consta, entre outros, a Ana Cristina, a Susana, o Armando e o Hugo esta velha catedral do ócio até saltava de contentamento. Quem não disfarçava, em sorriso de orelha a orelha, a alegria sentida de ver que, pelo menos até agora, sem qualquer ajuda, se está a iniciar uma boa obra, era o José Luís Montenegro, o presidente da nova gerência que há pouco tomou posse.



REFLEXÃO: COINCIDÊNCIAS

 Quem faz o favor de ler esta página verifica que na rubrica “Uma entrevista, por acaso”, realizadas a pessoas anónimas com a sua vida imbricada na cidade, entre os entrevistados, há pontos comuns quase parecendo passados a papel químico. Podemos ler que, entre outros, defendem a passagem dos transportes coletivos no canal, uma nova metodologia, para o estacionamento de rua, uma discriminação positiva da autarquia para os comerciantes. Perante esta semelhança de opiniões, uma interrogação se depreende: quem está errado? Eles, que aqui labutam e conhecem a terra que pisam, ou a Câmara Municipal de Coimbra que, nadando contra a corrente e não ouvindo os cidadãos, continua a impor o seu modelo?