quarta-feira, 27 de julho de 2016

terça-feira, 26 de julho de 2016

FALECEU CUNHA ROCHA

(Deixo esta minha composição em elegia ao mestre)




Pelas 11h00, faleceu hoje, no Hospital de Leiria, Cunha Rocha, um dos maiores artistas nacionais das artes plásticas. Com obra reconhecida espalhada pelo mundo inteiro, desde a América, passando pelo Canadá e Brasil, até à Austrália, Rocha foi sempre um apaixonado por Coimbra -nasceu na Rua Fernandes Tomás, número 34, já lá vão 84 anos. Era ali, naquela casa humilde que a sua mãe, Florinda da Silva Pratas, amassava, cozia e depois vendia, aos cafés Nicola, Central, Briosa e outros, as melhores arrufadas de Coimbra de todos os tempos.
Em 1944, com 12 anos, começou a trabalhar com o Vasco Berardo -um outro grande vulto da pintura e escultura coimbrã. A sua primeira exposição foi em 1956, na desaparecida galeria d’O Primeiro de Janeiro, na Rua Ferreira Borges. Nesta altura, assinava “Achor Anhuc”, que era o seu nome invertido, para lhe dar um certo ênfase estrangeiro. Depois rubricou as suas obras com “António Rocha” e só mais tarde passou a marcar todos os seus trabalhos com “Cunha Rocha”, nome que ficaria para sempre gravado para a posteridade.
Em 1966, já consagrado pintor de artes plásticas, em busca de uma vida melhor, partiu para o Canadá. Depois de nove anos neste país norte-americano foi para o Brasil. Aqui, na ex-colónia portuguesa, o seu mérito artístico viria a ser reconhecido com uma medalha de ouro e outra de prata. Regressou a Coimbra em 1978. Nesta época, por acaso fortuito, em namoro de ocasião, foi para a praia da claridade, Figueira da Foz, onde, na areia, enterrou para sempre o coração em promessa de amor eterno. Na companhia da sua paixão de vida, a esposa Isabel, fez da cidade-praia o seu berçário e uma das razões do seu viver.
A última exposição deste grande pintor ocorreu em Coimbra em 2013, na Praça do Comércio. Nessa altura, tive o privilégio de o entrevistar para o jornal O Despertar. Padecente de um edema pulmonar que lhe atrofiava as vias respiratórias há vários anos, Cunha Rocha foi sempre um resignado à sua dor. Sofria em silêncio. Era capaz de fazer tudo pelo seu amigo. Não se interessava pelos bens materiais. “Embrulhava-se completamente nas causas sociais e sentia o sofrimento alheio na sua própria alma” nas palavras de Isabel, a sua esposa.
Em jeito de crítica, Coimbra foi sempre madrasta para os seus artistas. Naturalmente que Cunha Rocha não poderia fugir à sina desta cidade sem reconhecimento.
Amanhã, quarta-feira, pelas 10h00, o seu corpo estará presente para velório na capela do Crematório da Figueira da Foz. Pelas 15h00, será a missa de corpo-presente e uma hora depois, pelas 16h00, seguir-se-á a cerimónia de cremação.
À Isabel Mora, a esposa e dedicada companheira, e restante família, nesta hora de profunda dor, em nome da cidade -se posso escrever assim-, em nome da Baixa, os nossos sentidos pêsames. Embora o génio prolixo e vasta obra pictórica o recorde até à eternidade, foi-se um de nós. Até sempre, amigo Cunha Rocha.

quinta-feira, 21 de julho de 2016

BAIXA: COIMBRA É UMA LIÇÃO




A Farmácia Nazareth, a mais antiga da cidade e do país -foi fundada em 1815-, vai sair da Baixa, da Rua Ferreira Borges. Se Adolfo Rocha (Miguel Torga), que era cliente, ainda estivesse entre nós mandava um palavrão que rebentava os tímpanos a muito boa gente.
Segundo informação de alguém que pediu o anonimato e que sabe do que fala, “o alvará foi vendido há cerca de dois anos e o novo adquirente vai deslocalizar os serviços para a Avenida Afonso Henriques, junto à Escola José Falcão, em Coimbra, até ao fim do ano.”

E O QUE VAI ACONTECER ÀS CENTENÁRIAS INSTALAÇÕES?

Uma coisa se adivinha facilmente, a Baixa vai perder o seu estabelecimento comercial mais antigo e ainda em actividade. Saber o futuro daquele magnífico espaço museólogico é um enigma -para não dizer que é a pergunta de um milhão de euros.
Dizer também que já nada pode evitar uma perda destas -mesmo juntando os cacos- é o óbvio de La Palisse. No entanto -e segundo o meu depoente tal hipótese pode não ser descurada-, no mal menor para a colectividade, poderia, por exemplo, transformar-se o espaço ainda ocupado pela “Pharmacia Nazareth” em museu, sei lá, da Associação Nacional de Farmácias.

E NINGUÉM SE IMPORTA?

Em nome da verdade, é bom dizer que a Câmara Municipal de Coimbra, à luz das directivas europeias concernentes à livre concorrência, nada pode fazer para evitar a transferência para outro local da cidade. Transposto para o ordenamento jurídico nacional, a lei é geral e abstracta.
Porém, a meu ver e já vem de longe, a edilidade faz o que costuma fazer sempre: assobiar para o lado. Faz de conta que nada se passa. Por vezes até se debate, debate, debate e nunca se sabe qual é a cultura de Coimbra. Ainda há dias foi o leilão da insolvente ACIC, Associação Comercial e Industrial de Coimbra, fundada há mais de 150 anos. Na última Assembleia Municipal, de há cerca de duas semanas, Manuel Machado, presidente da autarquia, foi questionado por um deputado sobre o interesse que a Câmara Municipal estava a dar à execução patrimonial. Perante todos, Machado disse mais ou menos isto: a edilidade está a seguir com toda a atenção a venda judicial. Quando for caso disso, faremos exercer o direito de preferência. Até porque a ACIC e a autarquia são parceiros num projecto comum -salvo erro a NOVOTECNA. O leilão da ACIC decorreu nas instalações da Relvinha. Alguém leu alguma coisa nos jornais acerca da intervenção municipal a exercer a preferência na venda?
No entanto, pelo que julgo saber, para evitar o desaparecimento de estabelecimentos emblemáticos antigos, há um instrumento legal em vigor há décadas -pouco utilizado pelas autarquias- que é classificar um espaço patrimonial com a Declaração de Interesse Municipal. Como é de prever, julgo, é um processo moroso que, implicando a concordância de várias entidades, leva tempo e até se obter luz verde não nos doa a cabeça. 
Como foi anunciado há dias na imprensa, a Câmara Municipal de Lisboa tem em mãos a discussão de um novo Regulamento Municipal para a classificação de "Lojas com História".

CROCHÉ SOCIAL DOS LARGOS DA BAIXA RECOMENDADO PELA ASSEMBLEIA






Segundo uma informação pouco credenciada mas séria às vezes, na próxima Assembleia Municipal de Coimbra vai votar-se uma recomendação ao executivo para atribuir a medalha de cortiça ao croché colocado em suspensão no Largo da Freiria.
Está a decorrer desde 04 de Julho até 31 de Agosto de 2016 o IV Festival de Croché Social de Coimbra. É uma iniciativa da Câmara Municipal de Coimbra e com a colaboração de IPSS's, Associações, entidades e comerciantes de Coimbra, com instalações artísticas em espaço público.
Anunciado em cartazes distribuídos na cidade, ao vivo e a cores, as mostras artísticas deveriam poder ver-se na Rua Fernandes Tomás, Escadas de Quebra Costas e Largos do Arco de Almedina, Largo do Poço, Largo do Paço do Conde e da Freiria.
Este ano, e excedendo tudo o que até agora foi concebido e realizado, as obras distribuídas na Baixa ultrapassaram tudo o que se possa imaginar. As peças expostas nos Largos do Poço, Paço do Conde e da Freiria, numa técnica até agora nunca praticada em Portugal, foram tão meticulosamente tecidas que até parecem invisíveis. Como arte viva, sente-se a sua forte presença a tocar os sentidos mas não se vê. A balouçar ao vento como velas desfraldadas imaginam-se as caravelas henriquinas. O Sol, como raios x, atravessa o tecido e não provoca sombra. Invisíveis para todo o género de animais, incluindo três simpáticos gatinhos que se divertem no Largo da Freiria, os quadros entrelaçados estão livres de levarem uma cagada fortuita da passarada. Ou até da destruição de vândalos. É de prever que, contrariando as mostras antecedentes, em que as obras ficaram queimadas pelos raios solares, para o ano estarão impecáveis e prontas a ser colocadas em toda a cidade. Como se sabe, um dos problemas maiores foi sempre a forte degradação dos painéis trabalhados à mão.
É uma criação tão fantástica, tão excepcional, tão grandiosa -que ultrapassa tudo o que se possa imaginar. Só visto! Nem admira a proposta dos deputados em levar o assunto ao executivo.

Ó QUEIRÓS, É ASSIM QUE PENSAS EM NÓS?






A divulgação do evento foi realizada com eficácia. Os panfletos informativos foram distribuídos esta semana de loja-em-loja e transmitiam o seguinte:


Ou seja, ontem, 20 de Julho, na Praça 8 de Maio, pelas 17h30, com a presença de Francisco Queirós, vereador da CDU no executivo municipal, João Pedro Ferreira, economista, Manuel Rocha, eleito pela CDU na Assembleia Municipal, e Rui Canas, presidente da junta da União de Freguesias de Setúbal, iria ser apresentada uma “SESSÃO PÚBLICA” com os temas “Defender, Reabilitar, Povoar e Dinamizar a BAIXA!

E CHEGOU A HORA

Às 17h45, entre sentados e em pé, cerca de três dezenas de espectadores ouviam Rui Canas a falar da sua experiência enquanto autarca de Setúbal. De Manuel Rocha, anunciado como palestrante, nem sombra.

IR BEBER À FONTE

Lendo a página da CDU, no Facebook, ficamos a saber que a “Sessão Pública da CDU em Coimbra sob o tema "Defender, Reabilitar, Povoar e Dinamizar a Baixa de Coimbra". A CDU tinha como objectivo discutir a Baixa, na Baixa com quem nela está, vive e trabalha, daí a escolha da rua para realizar a sessão. O resultado foi um debate participado.”
Continuando a citar, “O diagnóstico feito foi de degradação, descaracterização da Baixa e envelhecimento dos seus habitantes. Concluiu-se que ceder às pretensões da especulação imobiliária e das grandes superfícies comerciais é contrária aos interesses dos habitantes e utilizadores da baixa. Concluiu-se ainda que a participação envolvimento da população são essenciais para encontrar soluções.”
E ainda mais um bocadinho, “O mal que se fez à Baixa ao longo das últimas décadas não foi todo feito na Baixa, mas nas novas centralidades que se produziram sem programação que não fosse a da obtenção do lucro rápido das bolhas a que os centros das Cidades foram sacrificados. É preciso inverter este rumo! "Queremos aqui ver moradores, através de soluções habitacionais de baixo custo. E os SMTUC envolvidos na solução, beneficiando – os Serviços e os cidadãos – de uma via de transporte exclusiva, potenciando um sistema de mobilidade que é um traço essencial desta Cidade. E comércio, serviços e equipamentos de Cultura e de lazer."

Ó QUEIRÓS, ESTÁS A MANGAR DE NÓS?

Em forma de amansar a fera, começo com uma ressalva, com toda a franqueza, gosto da forma humilde de ser de Francisco Queirós, vereador eleito pela CDU na Câmara Municipal de Coimbra. É um tipo acessível -embora não único, é uma qualidade rara na vereação do executivo socialista. Para além disso, porque já constatei, é um sujeito sensível às questões humanitárias -para mim, premissa maior para qualquer eleito por sufrágio universal.
E agora vou às hostilidades. Vamos lá às questões:
Primeira, qual é a ideia da CDU apresentar uma sessão pública sobre a Baixa às 17h30, direccionada essencialmente para os comerciantes interessados, quando se sabe que a esta hora todos têm de estar a trabalhar nos estabelecimentos? Foi por pensar que os lojistas, neste ou noutro qualquer horário, não apareciam nem que lhes oferecessem um moscatel de Setúbal?
A segunda, cabe na cabeça de alguém, exceptuando na dos comunistas, realizar um fórum em jeito de comício na via pública num horário de ponta e intenso barulho?
Terceira este evento teve apenas por intenção não ficar atrás do movimento Cidadãos por Coimbra na resolução dos problemas da Baixa? Se foi, está cumprida a missão da CDU!

AGORA VAMOS À PÁGINA DO FACEBOOK

"Defender, Reabilitar, Povoar e Dinamizar a Baixa de Coimbra". A CDU tinha como objectivo discutir a Baixa, na Baixa com quem nela está, vive e trabalha, daí a escolha da rua para realizar a sessão. O resultado foi um debate participado.”

Perguntas tolas: se a intenção tinha como objectivo discutir a Baixa com quem nela está, vive e trabalha, é às 17h30 e, ainda por cima, na rua que se vai realizar um evento com tal propósito assim?
Os debates foram participados? Por quem? Pelos mesmos do costume?

O diagnóstico feito foi de degradação, descaracterização da Baixa e envelhecimento dos seus habitantes. Concluiu-se que ceder às pretensões da especulação imobiliária e das grandes superfícies comerciais é contrária aos interesses dos habitantes e utilizadores da baixa. Concluiu-se ainda que a participação envolvimento da população são essenciais para encontrar soluções.”

Perguntas idiotas: se o diagnóstico está feito -todos sabemos que está e há muito tempo- a conclusão não deixa de surpreender. Qual é o placebo que se toma para acabar com a especulação imobiliária? E para as grandes superfícies comerciais, que são contra os interesses dos habitantes e utilizadores da Baixa?
E já agora, camarada Queirós, qual foi o sentido de voto da CDU, no executivo, aquando da aprovação do IKEA, no Planalto de Santa Clara, numa média superfície na Mesura, junto ao Observatório Astronómico, e a instalação do Continente, na Auto Industrial?
E essa conclusão da participação e envolvimento da população serem essenciais para encontrar soluções também é fantástica, camarada! Como é que se busca esse objectivo? É a fazer eventos às 17h30 na via pública? É com um regimento aprovado na Assembleia Municipal em que para um qualquer cidadão intervir no plenário tem de se inscrever com antecedência mínima de cinco dias úteis? E se for para interferir no executivo terá de se inscrever com uma semana?
Desculpa lá, ó camarada Queirós, mas só podes mesmo estar a mangar com nós!

O mal que se fez à Baixa ao longo das últimas décadas não foi todo feito na Baixa, mas nas novas centralidades que se produziram sem programação que não fosse a da obtenção do lucro rápido das bolhas a que os centros das Cidades foram sacrificados. É preciso inverter este rumo! "Queremos aqui ver moradores, através de soluções habitacionais de baixo custo. E os SMTUC envolvidos na solução, beneficiando – os Serviços e os cidadãos – de uma via de transporte exclusiva, potenciando um sistema de mobilidade que é um traço essencial desta Cidade. E comércio, serviços e equipamentos de Cultura e de lazer.

Perguntas estapafúrdicas: Se “o mal que se fez à Baixa ao longo das últimas décadas não foi todo feito na Baixa, mas nas novas centralidades que se produziram sem programação que não fosse a da obtenção do lucro rápido das bolhas a que os centros das Cidades foram sacrificados”, o que quer isto dizer? Qual foi o sentido de voto da CDU, no Executivo municipal, ao longo destes últimos vinte anos?
Como é que se inverte AGORA -depois da destruição parcial do tecido económico, comercial e industrial? Com mezinhas? Rezando o terço? Com umas promessas a Nossa Senhora de Fátima?
Como é que se colocam aqui moradores, através de soluções habitacionais de baixo-custo? À custa de quem? Dos privados? Saberá o camarada que as rendas antigas praticadas na Baixa, em média, estão entre os vinte e os cinquenta euros?
E os imensos prédios camarários desocupados e em avançado estado de degradação?
E essa de ver “os SMTUC envolvidos na solução, beneficiando – os Serviços e os cidadãos – de uma via de transporte exclusiva, potenciando um sistema de mobilidade que é um traço essencial desta Cidade”?
Então mas ó camarada Queirós, desculpa lá, não fazes parte do Conselho de Administração dos SMTUC? Será preciso um qualquer cidadão apresentar a tua proposta no dito conselho? Homem de Deus, se o problema reside aí, falemos, carago, que eu escrevo!

quarta-feira, 20 de julho de 2016

BOM DIA, PESSOAL...

FALECEU UM DOS NOSSOS





Segundo o Diário de Coimbra e o anúncio necrológico colado numa das portas dos seus estabelecimentos, na Rua Adelino Veiga, faleceu Serafim Ramos, proprietário da Românica. Com 91 anos e uma longa história de trabalho e luta empresarial, este bem-sucedido comerciante deixa marca profunda na cidade e na rua do poeta-morto.
Embora não o conhecesse pessoalmente, sei que foi um homem muito considerado pelos seus pares nesta parte histórica e comercial da cidade.
O seu funeral realizou-se hoje, quarta-feira.
À família enlutada, se posso escrever assim, em nome da Baixa e dos comerciantes que por cá continuam na labuta diária, os nossos sentidos pêsames.

EDITORIAL: O VAI E VEM DA INSEGURANÇA





Este blogue foi criado em 2007. Com quase uma dezena de anos, e a raiar o milhão de leitores, é feito na completa carolice do editor, que, por acaso sou eu. É um sítio da Internet sem grandes ambições. Não se fazem grandes coisas para a sua promoção. Actualmente, em média semanal, tem 500 visitas diárias. Sem escala hierárquica, nasceu pela minha intrínseca necessidade de escrever; pela necessidade de intervir na zona onde estou inserido; pela necessidade de contar histórias do homem comum; pela necessidade de relatar os acontecimentos a frio, na subjectividade, sem ter de agradar a alguém; pela necessidade de falar de assuntos comezinhos que normalmente passam ao lado da imprensa local; pela necessidade de usar a escrita como catarse, como desabafo, para acalmar os demónios que me consomem o interior. Tenho necessidade de explanar o meu pensamento. Também não ficará mal dizer que, provavelmente, também pela necessidade de protagonismo. Como se vê, demasiadas necessidades para um homem só e para deixar de continuar a escrever, apesar de cada vez mais desmotivado.
Talvez também por achar que a nossa imprensa escrita local -devido à conjuntura económica e revolução no sector- está cada vez mais afastada e enviesada. Prejudicando o leitor diário, escreve cada vez mais para agradar a um certo poder instalado. O futuro deste calcorrear caminho em pezinhos de lã, perdendo o seu legítimo direito/obrigação de intervir na sociedade, denunciando arbitrariedades, não pode trazer grandes benesses para o fosso da desigualdade crescente.
Desde os primeiros tempos, o blogue teve sempre três géneros distintos de leitores. Um, é aquele que se move por saber notícias descomprometidas da Baixa. Tenho visitantes no mundo inteiro, na diáspora, desde a China à Austrália. Outro, constituído pelas instituições, é aquele que lê somente por obrigação, no fundo, para estar a par de assuntos que, na sua resolução, são da sua competência. Outro ainda, é o constituído por um grupo de comerciantes, colegas, que detestam a minha forma de estar na Baixa. Se eles pudessem, há muito tempo que este blogue estava arrumado. Este grupo tem uma ideia formatada de que, por exemplo, ao noticiar sobretudo os assaltos estou a “destruir” a Baixa. Desde os primórdios do blogue que sou acusado de promover a desclassificação da Zona Histórica. Entendem que ao publicitar assuntos pouco agradáveis estou a espalhar ao mundo que esta área é insegura. Reconheço que das várias premissas extraídas aquela é uma delas. Mas como é que se faz a triagem? Quem como eu escreve sabe que estamos obrigados a relatar o bom e o mau. E porquê? Porque o que é mau para uns poderá ser bom para outros. Quem escreve com honestidade, sem interesse partidário, está somente sujeito à verdade e ao leitor, que é o primus da existência do escritor.
O tempo veio sempre a dar-me razão. Quando estes comerciantes são assaltados são os primeiros a gritar “Ó DA GUARDA”! Aconteceu assim em 2008/2009/2010, quando uma vaga de assaltos varreu a Baixa e esteve na origem da implantação das câmaras de video-vigilância -que foram uma espécie de barriga de aluguer para suster a criminalidade que assolava esta parte da cidade. Depois de milhares de euros aplicados, nunca funcionaram em pleno e em direcção ao objecto que se propunham. Tanto quanto tive conhecimento, apenas uma vez deram origem à prevenção e os assaltantes foram presos no local por acção das imagens visionadas. Num procedimento egoísta estes lojistas, sem levar em conta a situação económica do lesado, procuram abafar o incidente, o grito individual para não prejudicar o colectivo.
Por outro lado, a contribuir para a ignorância dos factos, muitos dos ofendidos, para evitar passos inúteis que conduzem normalmente ao arquivamento, não comunicam as ocorrências à PSP e, como é óbvio, o que não é transmitido por queixa escrita, logo, não existe. Ou seja, as polícias trabalham com estatística e, pelos chefes, o maior gozo que lhes podem dar é mostrarem os baixos valores casuísticos numa colectividade urbana, numa mistura de facto político e princípio da segurança -para não levar ao alarme social e à imitação da criminalística.
Diz-me a experiência, a questão é que se ocultarmos os episódios de violência contra o património a PSP não age. Repito, isto mesmo aconteceu no período citado de 2008/2009. Volto a lembrar que, na altura, a violência urbana foi sustida e as coisas acalmaram pelo clamor gerado e também porque se “obrigou" as autoridades a agir em conformidade. O “gangue” acabou preso pela PSP -e com isto não se pense que estou a desvalorizar o trabalho árduo deste corpo de polícia pública.
Isto tudo para, por um lado, para explicar a razão de eu, quase como missão, dar nota de todas as ocorrências criminais e outras que se passam na Baixa -pelo menos as que tenho conhecimento. Por outro para dizer que depois de um certo período de acalmia -isto é cíclico, como se sabe-, progressivamente, sem querer ser alarmista, estão a acontecer demasiados assaltos na Baixa nos últimos tempos.
Naturalmente não tenho dados que me permitam consubstanciar a minha análise, mas, lendo os jornais diários em que se noticiam várias apreensões de droga nesta área da cidade dá para ver que a toxicodependência está a aumentar por aqui. Há dias, quando conversava com uma amiga ligada a instituições de apoio à toxico-dependência sobre o aglomerado de viciados concentrados e a injectarem-se à vista de todos junto à Loja do Cidadão, dizia-me ela: “sabe, tem havido uma preocupação enorme em encerrar becos junto à Rua Direita para impedir o acesso dos dependentes de drogas. E com as obras do Terreiro da Erva a mesma coisa. O resultado é que não havendo espaços mais recatados eles são obrigados a vir para a frente dos olhos de todos. E lembre-se, se mandarem embora as instituições de apoio a estes párias -como parece ser intenção do presidente da Câmara Municipal, Manuel Machado, vocês, comerciantes, preparem-se para o pior. É uma falácia pensar que transferindo os serviços para outra zona da cidade os toxicodependentes vão atrás.

ASSALTO AO RAIAR DA MANHÃ





O alarme tocou na central às 07h13. Por sua vez os serviços de vigilância contactaram a PSP, que viria a prender o suspeito dentro da loja “Mimos & Comp.ª”, na Rua Visconde da Luz.
Segundo Rafael Abrantes, funcionário, “foi um indivíduo sozinho. Partiu o vidro da porta principal e introduziu-se dentro do estabelecimento. Não devia estar no seu perfeito juízo. Presumo que deve ser toxicodependente. Quando a polícia veio estava ele a tentar retirar moedas de uma máquina de brindes. Azar danado do meliante. Ontem à noite esteve cá o técnico a arranjá-la e não tinha uma única moeda. Foi apanhado sem grande dificuldade.
Embora não tivesse levado nada, julgo, -foram mais os prejuízos com o vidro-, ficamos com uma sensação de desnorte. São 11h00 e ainda tenho tudo desarrumado.”
A “Mimos & Comp.ª” está na “calçada” há cerca de três anos e foi a primeira vez que teve uma intrusão.

segunda-feira, 18 de julho de 2016

BAIXA: ASSALTO AO AMANHECER






Esta madrugada, a horas indeterminadas, por um ou mais desconhecidos com recurso a rebentamento de vidro em porta lateral, foi assaltado um estabelecimento de peles e artigos da Serra da Estrela, na Praça do Comércio, junto ao Pelourinho. Esta loja não possui grades de protecção.
Por até ao momento não ter sido possível contactar os ofendidos, falei com uma vizinha que pediu o anonimato. Foi adiantando que “as senhoras estão muito abaladas. Parece que levaram muita coisa. De manhã, no chão, eram visíveis manchas de sangue. Foi chamada a PSP, que tomou conta da ocorrência. E mais não sei!” -rematou a minha depoente.
Se conseguir chegar à fala com as duas senhoras comerciantes, logo que detenha mais informações aqui darei conta.

FOI PRECISO VIR PARA A BAIXA

O casal Rosa Miranda Melo e Luís Melo, marido e mulher septuagenários, falando a uma só voz, está inconsolável. Enquanto os funcionários de uma empresa da especialidade fazem a recolocação do vidro da porta estilhaçado, vão confidenciando: “há 33 anos que somos comerciantes na cidade e, até vir para a Baixa, há cerca de quatro anos, aqui para a Praça do Comércio, nunca tínhamos sido assaltados. A primeira vez aconteceu mais ou menos há seis meses. Como esta loja tem uma entrada traseira pelo Largo do Romal, entraram sem danificar a porta -que o seguro nem queria acreditar- e levaram artigos, sobretudo peles, no valor de 10 mil euros.
Esta noite foi o que se sabe. Levaram muita coisa mas, como ainda não conferimos, não podemos adiantar valores.
Isto é horrível, senhor! Poderíamos estar sentadinhos no sofá a ver televisão, mas, como gostamos de produzir, somos de outro tempo, sabe?, continuamos a trabalhar. Mas, diga-me, vale a pena?”

ONDE PÁRA A POLÍCIA?

Continuam, “poderá até dizer-se que o problema reside na falta de alarme ou estruturas de segurança como grades. Não, não é isto não! É preciso dizer que, exceptuando as festas, nunca se vê polícia durante a noite. Verdadeiramente esta é mesmo a única fragilidade apontada. Por parte da polícia, não temos segurança nocturna. Quanto custa colocar aqui grades de segurança? E com o negócio como está? Sabe o que nos apetece fazer? Ir embora e desistir de vez. Sentimo-nos como se tivéssemos sido esventrados.”

O BOATO DO SUSPEITO

À boca cheia, corre aqui pelos becos e travessas que teria sido um toxicodependente, morador nas redondezas. Com alguma ironia e injustiça à mistura, diz-se também: “como ficou uma poça enorme de sangue junto ao vidro e mais alguns indícios, vai ser desta vez que a PSP vai apresentar em tribunal um suspeito de assalto na Baixa.



sábado, 16 de julho de 2016

UM EXEMPLO A SEGUIR EM COIMBRA, MAS COM MAIS CERTEZAS...




"Câmara de Lisboa distingue 63 lojas históricas mas não promete salvá-las"


"A Câmara de Lisboa vai começar por distinguir 63 estabelecimentos da cidade com o selo "Lojas com história" e definir medidas de apoio no âmbito deste programa, mas reconhece que só isso não chega para assegurar a sua sobrevivência". CONTINUE A LER AQUI.

EDITORIAL: A FÁBRICA DE HERÓIS PRÉ-FABRICADOS





É sabido que, desde os confins da História Universal, os regimes políticos utilizaram e utilizam a homenagem pública como uma espécie de masturbação intelectual de todos os da mesma cor. No fundo, é como da mesma forma que a Igreja Católica, para se renovar de fora para dentro -contrário ao que deveria ser-, sente necessidade de apresentar novos beatos e candidatos a santos, as instituições partidárias, seguindo o mesmo exemplo, para se manterem vivas, tenham de recorrer a ícones com pés de barro e estejam continuamente a criar falsos deuses profanos.
Por cá, até finais do século XIX, na Monarquia, foi um desvario de comendas para tentar sustentar o regime real, tão bem retratado por Rafhael Bordallo Pinheiro, n'A Paródia de 1900, e pela pena de Almeida Garret, na primeira metade do século do liberalismo em Portugal, que criou o aforismo “foge cão que te fazem barão”.
Com a implantação da primeira República, em 1910, o que tanto era criticado pela oposição ao regime, continuou com o mesmo delírio na distribuição de comendas públicas. Com a subida de Salazar ao poder, como ministro das Finanças em 1928, parece-me, passou a haver alguma contenção na atribuição de homenagens públicas. No entanto, sem dados históricos, julgo que a partir de 1933, com a consagração do Estado Novo como regimento autoritário e a plena glorificação e adoração nacional do homem forte de Santa Comba Dão, os galardões passaram a incidir directamente no Presidente do Conselho. É óbvio que, embora de certo modo alheio a homenagens, Salazar usou e abusou das comendas como forma de “comprar” adversários mais permeáveis e sensíveis à vaidade. Marcello Caetano, delfim de Salazar, seguiria a mesma bitola mas, digo eu, sempre com um “low profile”, uma discrição implícita.
Com a terceira República, com o início do período do 25 de Abril de 1974, (re)começou o regabofe na distribuição de títulos nobiliárquicos. As Ordens Honoríficas do Estado Português, desde arma política, passaram a servir para tudo menos para o objecto que foram criadas -seria interessante saber quantas comendas e comendadores temos a circular no país sem a devida vénia, naturalmente.
Começou com Ramalho Eanes, que atribuiu 2.005 medalhas, e passando por Mário Soares foi um forçar vilanagem. Vale a pena citar o jornal online Observador, “Enquanto Presidente da República, Soares abusou como ninguém das distinções honoríficas do Estado Português. Não há praticamente nenhum amigo que não tenha recebido uma condecoração, enquanto outros cidadãos, que tanto mereceram, não obtiveram qualquer distinção durante o seu ‘reinado‘”. Quem o disse? António Marinho e Pinto, então jornalista do Diário do Centro, a 15 de março de 2000, ainda longe de se tornar bastonário da Ordem dos Advogados, mas já uma figura controversa.
Continuando a citar o Observador, Mário Soares foi quem mais abraçou agraciados. A um ritmo de quatro condecorações por semana, Soares distinguiu 2.505 pessoas.
Seguiu-se Jorge Sampaio com 2.374 homenagens. “No último ano de mandato como Presidente da República, entre 2005 e 9 março de 2006, Jorge Sampaio foi muito mais generoso do que os seus antecessores e atribuiu um total de 802 condecorações  –a um ritmo de quase duas condecorações por dia.
O mais modesto foi Cavaco Silva, que só assinalou pouco mais de 1.100 feitos heróicos. Já no final de mandato viria a condecorar muitos dos seus pares partidários que faltavam subscrever no recordatório nacional. Mas não foi só, também não se livrou da polémica ao não condecorar Salgueiro Maia, Capitão de Abril, bem como José Saramago, Prémio Nobel da Literatura -aliás, numa falta de respeito, nem no funeral do escritor se apresentou.
E, há escassos meses, foi entronizado Marcelo Rebelo de Sousa. No começo do seu "reinado" foi notório um discurso contra as homenagens públicas a esmo. Mas foi sol de pouca dura. Com a pressa em condecorar os jogadores da Selecção Nacional -colocando até de lado outros campeões laureados recentemente-, Marcelo veio dar o dito por não dito. Aliás, era de prever. Tendo um carácter popular -a raiar o populismo gratuito-, é de prever que, nos próximos dez anos, a metade de portugueses que falta para ter uma medalha a vá ter. É uma questão de tempo e paciência.
O curioso é que as autarquias até seguiram o exemplo do Chefe de Estado e, nestes primeiros meses deste ano, até foram contidas. É evidente que não deixaram de homenagear. Porém, dando o exemplo de Coimbra, foram distinguidas duas personalidades ligadas ao aparelho socialista, que suporta o executivo municipal. Um dos reverenciados, Jorge Lemos, já falecido -uma óptima pessoa que tive o grato prazer de conhecer-, foi-lhe atribuída uma rua para perpetuar o seu nome. Outro, António Arnault, felizmente de boa saúde, para além da deferência, foi honrado com um busto no Parque da Cidade.
É evidente que, como em tudo, há sempre os que concordam plenamente com estas glorificações. Naturalmente, como é o caso, há aqueles cidadãos que, no seu direito legítimo, discordam e, pelo exagero e abuso de posição dominante na distinção, manifestam a sua indignação.
Já que os proponentes das distinções parecem não enxergar, em nome da dignidade nacional que deve superintender este nobiliárquico acto público, fica o apelo para que os futuros nomeados, em nome da honra, deixem de aceitar tais tributos. É que, sem o sentirem, estão a contribuir para a discriminação negativa de cidadãos que muito fizeram pela cidade (ou pelo país) e nunca foram laureados. Um exemplo, entre vários, em Coimbra? Mário Nunes!

BOM DIA, PESSOAL...

UM RELATO PARA PENSAR SENTADO NA SANITA

(Imagem da Web)




Tenho para mim que um dos maiores problemas da classe política é ter facilmente acesso ao dinheiro público. A consequência é, em face dessa falta de controlo, ser gasto em iniciativas populistas e colocando de lado prioridades básicas. Só para exemplificar, quanto custou ao erário público a viagem dos dois caças que escoltaram o avião em que viajava a Selecção Nacional em espaço aéreo português e que vinha de França?
Depois, como é óbvio, não há dinheiro nem sequer para papel higiénico.
Atente-se no relato de um cidadão, repescado no Facebook, passado ontem, sexta-feira, por acaso -só por acaso-, na Loja do Cidadão, em Coimbra.


Hoje, estando em Coimbra, necessitei de recorrer a um WC.
Como estava perto da Loja do Cidadão, entendi utilizar, precisamente, as instalações daquele espaço.
E o que encontrei?
Nem mais nem menos do que, tantas vezes, acontece encontrarmos em estabelecimentos de restauração: inexistência de papel higiénico, inexistência de sabonete no lavatório e, no caso de hoje, um sanitário sem fecho de porta e que me obrigou a estar atento e com um pé na mesma, não fosse outro pretender servir-se daquele espaço.
Já sei que somos, falando genericamente, um povo porco e vândalo.
Mas, num espaço público não deveria, apesar disso, haver o cuidado de procurar responder adequadamente às necessidades, neste caso literalmente, dos cidadãos.
Resumindo e concluindo: o povo, o tal que é porco e vândalo, tem governantes à sua imagem.

António Carlos Machado Martins”

sexta-feira, 15 de julho de 2016

BOM DIA, PESSOAL...

(Foto de Alcino Silva, retirada do Facebook, com a devida vénia)



Ora vivam todos, sem excepção. Os esquerdistas, os centristas, os direitistas, os “manobristas”, os “riquistas”, os “pobretistas”, os ateístas, os “agnosticistas” e todas as terminações em “istas”, como, por exemplo, “comunistas, fascistas, “lambebotistas” e outros que estou a pensar, mas não escrevo porque parece mal. Pronto já viram que este cumprimento é alargado a toda a comunidade, com telhado e sem beira.
Não é para me justificar mas, como mandam as boas regras de educação, já há um tempo que não dou cumprimento a esta rubrica. Por motivos vários, por aquilo e aqueloutro, não tem dado. Já esta semana é diferente, tenho andado anestesiado com várias notícias, umas grandes e outras assim, assim. Vou começar na maior, a vitória da Selecção Nacional à França. Estou que nem posso. Palavra, pela alma de alguém que me foi chegado e partiu. Desde Domingo que as noites passaram a ser dia, como quem diz, nunca mais dormi nada. Foi uma coisa do outro mundo. É certo que, graças aos muitos terços rezados do ex-professor Marcelo e agora Presidente da República, Deus ajudou. Suponho que se fosse eu a pedir Ele não me ligaria nenhuma, mas também não é de admirar. Sendo Ele a personificação e extensão da imagem do homem, o que se poderia esperar senão uma entidade diferenciadora nos pedidos rogados? Por outro lado, pergunto: Deus não deveria ser também agraciado com a ordem de mérito?
Depois vieram as homenagens aos jogadores, em promessas de comendadores, também atribuídas por Marcelo. Embora aumentasse a minha ansiedade, achei justíssimo. Heróis como estes, tão esforçados no amor à camisola, a ganharem tão pouco, tão mal alimentados e em aposentos tão paupérrimos, depois de um feito tão heróico, se eu não estivesse de acordo tinha de ser mesmo bota de elástico. 
Por conclusão, é evidente que estou rendido à proposta da JSD, Juventude Social Democrata, de levar à Assembleia Municipal de Coimbra a recomendação ao executivo para ser atribuída a medalha de ouro da cidade a Éder. Mais, por ser contra a discriminação, vou até mais longe: os seleccionados, seleccionador, chefe do vestiário, cozinheiro da selecção, psicóloga de Éder, o presidente da Federação de Futebol, devem ser todos homenageados com a medalha de ouro. Ah, é verdade, até se me varria mas ainda fui a tempo -livrei-me de boa! Sobretudo do PAN, Partido dos Animais- todos os bichos de estimação ligados a estes infatigáveis campeões estão convidados a passarem uma semana em Coimbra, em hotel de luxo, com visitas guiadas em “tuck tuck”, e sobre supervisão da associação Gatos Urbanos.
A seguir foi a notícia da implantação do repuxo no leito do Mondego -para a oposição foi baptizado de “repuxeco”. Enquanto não vi a ideia materializada não descansei. Então, ontem à noite, peguei nos meus vários óculos de visão sectária e fui apreciar. Com a mala cheia, e a pressa, até me esqueci da máquina de retratos -como sou de outra época não uso as modernices do telemóvel.
Enfiando no nariz as minhas lunetas de comunista, achei um mau gosto e um desperdício. Mau gosto porque o vermelho deveria ser a cor única e não é. Desperdício porque, para além de custar uma fortuna, aquele jato de água está no sítio errado. Deveria ser colocado na Praça 8 de Maio. Para além da justa reposição do legado histórico de Carlos Encarnação, também servia para muitos polidores de esquinas, trabalhadores incansáveis da Baixa, tomarem banho.
Colocando os meus óculos de social-democrata, vi logo que isto trazia gato escondido com rabo de fora. Admite-se que o laranja não faça parte das cores alegóricas? E mais, colocado no meio do rio só pode ser mesmo ofensa aos conimbricenses. É como se se pretendesse passar a mensagem de que em Coimbra só se mete água. E o custo do “repuxeco”? Uma provocação!
Ajustando os meus visores de bloquista, deu para ver que é uma obra alegórica ao Antigo Regime. Só pode! Aquele mastro de água em direcção ao Céu só pode significar um facho. Como diria Francisco Louçã, isto é obra engendrada para lixar o povo!
Pendurei as lentes de cidadão, desinteressado e sem ligação ao poder ou à oposição, e então o que vi? Que esta obra convence, engrandece a Baixa e marca a cidade. Está simplesmente magnífica! Pode ser questionável o preço mas, sem dúvida, a alteração paisagística para melhor justifica os 160 mil euros pagos pela empresa Águas de Coimbra -se este custo não se fizer repercutir futuramente nos consumidores. Aliás, estando o repuxo colocado entre as duas pontes, pedonal e de Santa Clara, dá para ver que faz sentido colocar outro repuxo em frente à Estação Nova.

DAR UM POUCO DO NOSSO INTERESSE PARA O COLECTIVO





Hoje, cerca do meio-dia, uma ambulância dos Bombeiros Voluntários de Coimbra, foram chamados para transportar uma idosa, moradora no Largo da Freiria, ao hospital. A viatura ficou estacionada no Largo do Poço. Enquanto percorriam a pé a meia centena de metros até à residência da enferma, as imprecações e os lamentos dos soldados da paz eram audíveis e visíveis no rosto em trejeito de contrariedade: “porra! Um dia destes acontece uma tragédia e ninguém quer saber! Para chegar aqui foi um problema sério por causa da parcial ocupação das ruas estreitas. Para sair vai ser a mesma coisa. É sempre assim!
Começo com uma ressalva, hesitei muito antes de escrever este texto. Não é a primeira vez que plasmo sobre este assunto. Por que é assim, se não escrever a contar o que se passou, se acontecer mesmo algo grave um dia destes, estarei a ser conivente; se escrever (como acabou por acontecer), mais que certo, sendo mal interpretado, os visados vão perceber (mal) e pensar que, para além de lhes querer mal, estou contra a sua permanência. É óbvio que nada me move contra a ocupação de via pública. Aliás, é um pouco da identidade da Baixa comercial e deve manter-se a qualquer custo. O que entendo é que cada comerciante, desligando um pouco do seu individual interesse egoísta, deve salvaguardar o bem maior que é a protecção colectiva, a defesa consubstanciada na segurança de todos. Se colocassem o nosso bairro acima do maior empenho nem era preciso dizer nada. Pelo princípio da reciprocidade, tudo era feito automaticamente e sem reparos desnecessários.
Pelas informações que me vão chegando, até sei que os agentes da fiscalização municipal, muitas vezes, por compreenderem as dificuldades do comércio dito tradicional, têm sido esmerados na sensibilização. Neste aspecto, saliento em nome da verdade, nada há apontar-lhes. Para estes funcionários que cumprindo ordens superiores, e muitas vezes numa discricionariedade louvável, conseguem transcender a sua função de fiscalidade, em nome de todos, o nosso muito obrigado.

O ARLINDO, DOS RETRATOS, PRECISA DE UMA MEDALHA MUNICIPAL





O Arlindo de Almeida Santos, nosso vizinho, e por mim declarado oficialmente fotógrafo da Baixa de Coimbra, comemorou recentemente 62 anos de actividade. Com 72 anos, feitos em 2 de Abril, está para as curvas. De pedra e cal, vendo encerrar tudo à sua volta, sobretudo, do que é loja de fotografia, mantém-se à frente dos estúdios Diorama, na Rua dos Esteireiros por amor platónico, diz-me no meio de um sorriso entreaberto entre a seriedade e a matreirice.
Sem querer ser venenoso -que isso aqui não entra, nem me passa pela cabeça ser-, diria que se Arlindo fosse filiado no PS, mais que certo, já teria uma medalha de mérito empresarial da cidade, atribuída pelo executivo municipal. Se fosse mais novo e tivesse marcado um golo nas redes do destino, um único golo bastava, provavelmente a JSD, Juventude Social Democrata, estaria a levar o assunto à Assembleia Municipal para comendar um dos maiores retratistas ainda a trabalhar na Zona Histórica. Mas o retratista de quem falo não liga às poucas vergonhas da política e, sem me confidenciar, acredito, até paga para não ser “usado” para fins partidários pouco recomendáveis. E paga já muito pelo desrespeito por ser velho. Acrescento eu que as medalhas municipais atribuídas deveriam ser pagas pelos proponentes da homenagem. Assim, sem mácula de qualquer espécie, faria sentido e os políticos da nossa aldeia -que, por serem oriundos de uma elite, pouco sabem de história e de vidas- poderiam continuar a jogar à “elegia do coisa nenhuma” e, pagando do seu próprio bolso, a alimentarem-se da sombra de heróis imaginários.

UM POUCO DE PASSADO E MENOS DE FUTURO

Como milhares de portugueses nascidos nas décadas de 1940/50/60, que romperam as teias da miséria a trabalhar noite e dia, o Arlindo nasceu em 02 de Abril, em Arrifana, no Sopé da Serra da Estrela. Com apenas 10 anos começou a trabalhar numa oficina de fotografia. A partir daí, como alpinista a escalar a montanha da vida, nunca mais parou e, em confidência, diz que vai trabalhar até ao último suspiro. “Os meus amigos dizem que vou morrer aqui. Um dia chegam cá e eu estou de “pernil estendido". Para mim, isto é uma carolice, um amor platónico a que não consigo fugir. A fotografia artística, ou melhor, dita comercial, não tem futuro. Quando os “carolas” como eu desaparecerem este retratar, tal como o conhecemos, acabou.”
Em 1982, reunindo 600 pessoas no Estoril, organizou o 1.º Congresso de Fotografia em Portugal. Ainda se realizaram mais dois, um em Troia e outro em Viana do Castelo, mas, tal como a arte que os sustentava, caíram para não mais se erguerem.

E QUEM QUER SABER DA MEMÓRIA?

Continua Arlindo, “gostava que as minhas máquinas fossem para um museu. Gostava que alguma entidade se ocupasse do meu espólio -tenho no meu acervo largas dezenas de exemplares. Só nestas máquinas gigantes, que aqui vê, em custo inicial e já amortizado, estão à volta de cem mil contos, quinhentos mil euros. Em tempos alguém da Câmara Municipal de Coimbra escreveu-me para doar o meu tesouro. Para ser franco, o que adorava mesmo era ter o meu próprio museu. Mas, pela improvável concretização pessoal, não digo que não venha a acontecer um dia uma doação. Mas, a tornar-se realidade, só o farei quando tiver a certeza de que ficará em boas mãos.”  

UMA IMAGEM POR ACASO...




O LOURENÇO ESTÁ DE VOLTA. O cabo-verdiano Lourenço Pina, que é um músico de excelência e nos faz companhia há muitos anos a alegrar e a contribuir para dinamizar as ruas ensimesmadas da Baixa, está de volta depois de uma paragem forçada por questões de saúde.

terça-feira, 12 de julho de 2016

PEDITÓRIO PARA O SENHOR DO BOM JEITO




TEXTO ESCRITO A QUATRO MÃOS.
POR MÁRCIO RAMOS E LUÍS FERNANDES


Neste último sábado, durante a tarde, antes e durante a procissão da Rainha Santa para a Sé Nova, reparei que na minha rua, Visconde da Luz, quatro mulheres, sem nada que as distinguisse das demais, andavam a pedir esmola em grupo. Olhando mais atentamente, pela ladainha, vislumbrei que o peditório tinha um qualquer fim -para mim desconhecido. Reparei que não tinham identificação de qualquer espécie, nem um colete sequer. Com uma abordagem intempestiva, interpelavam agressivamente as pessoas. Metendo abusivamente um autocolante na lapela, constatei que muitos transeuntes se sentiam incomodados. Alguns lá davam umas moedas. Poucos eram os que escapavam a estas “carraças”. Pareceu-me que levavam objetos na mão, julgo que para venda, não posso precisar.
No dia seguinte, no domingo antes de passar a procissão de regresso a Santa Clara, como senhoras de um território conquistado sem grande esforço, cá estavam estas angariadoras de niqueis com novas roupas mas com a mesma ladainha e a fazer exactamente o mesmo.

UMA MOEDA COM OU SEM AMOR

Aquando do concerto de Mariza, no Convento de São Francisco, verificou-se também que uma senhora de meia-idade e um rapaz mais novo -ambos com um cartão pendurado no pescoço- pediam uma moeda em nome da “missão sorriso”. Como se sabe a “missão sorriso” foi uma campanha do Continente para a Unicef. Ou seja, provavelmente, quem doou uma moeda, a pensar que era para ajudar as crianças, presumivelmente teria sido burlado.

O ENGODO QUE JÁ FAZ PARTE DE NÓS

Talvez não fique mal ao comando da PSP sensibilizar os agentes para sempre que constatem apelo ao óbulo intervirem, sobretudo verificando se de facto os donativos solicitados têm ou não o destino rogado. Tanto quanto sei, a PSP só actua quando há denúncia. E já aconteceu. Ora, a ser assim na apatia, contrariando o princípio da prevenção, está de ver que está abrir caminho fácil para qualquer um menos escrupuloso, em nome de outrem, ganhar umas massas facilmente.
Fica o alerta.


sábado, 9 de julho de 2016

EDITORIAL: TANTA FESTA, PÁ...!





Coimbra comemora o V centenário da beatificação da Rainha Santa Isabel, padroeira da Lusa Atenas. Integrando as Festas da Cidade de Coimbra e da Rainha Santa Isabel, este ano, como não há memória, tem sido um encher o olho de actividades seculares e religiosas.
Se eu fosse optimista -que me parece ser o caso-, diria que, tendo em conta o anterior cenário de acções lúdicas na cidade, não há fome que não dê em fartura. Desde a vinda de vários artistas ao recém-inaugurado Centro de Congressos São Francisco, passando por uma Feira Popular que convence, até à congregação de várias festas normalmente não englobadas no programa, reconheço que estamos a viver um momento único no historial festivaleiro da cidade. Até o êxito da selecção nacional de futebol por terras de França está a ajudar a esquecer as normais preocupações da época. Se fosse pessimista, diria que a factura para pagar tudo isto virá depois. Sendo realista, com muito positivismo à mistura, direi que depois se verá. Retirando os “ses”, com franqueza, declaro: gostei de ver.
Até hoje, Sábado, foi bonito de verificar a Feira da Rainha Santa na Praça do Comércio. Durante a manhã deu um gozo danado ver as ruas estreitas serem percorridas com os grupos folclóricos e as suas melodias tradicionais encherem a nossa alma. Como já escrevi tanta vez, é pena que o comércio no seu todo não responda a esta chamada e ao bater das 13 badaladas quase todos os lojistas desertem em busca de uma sombra paradisíaca melhor. Já escrevi tanto sobre este abandono que até me fadiga. A pergunta -sem resposta- que faço a mim habitualmente é: se as coisas estão más, por que razão não se esforçam mais os profissionais do negócio? Mesmo a custo, tenho de reconhecer a razão a algumas críticas que se fazem a este fraco desempenho profissional. A crise será mesmo grande como a pintam? Enquanto comerciante, com as mãos na massa já há décadas, sinto que sim. De facto as coisas estão mesmo complicadas. Mas, sendo assim, como entender que com este movimento febril na cidade, com o turismo a começar a chegar -apesar de se dizer o contrário, estes primeiros seis meses foram piores do que no ano transacto-, tudo continue no remanso e pacatez habituais? Às vezes penso que só eu sinto dificuldades. Claro que não é verdade. Depois de uma duração de pouco mais de seis meses em actividade, volta e meia lá se vê uma loja a fechar e, algumas vezes, a transferir instalações para outra zona da cidade em busca de uma clientela melhor -esta semana foi um estabelecimento na Praça do Comércio que embarcou.
Quando tento entender, em forma de catarse, olho para trás e vejo o quanto os meus pais, na década de 1950, laboravam na agricultura para que, pelo menos, a fome não invadisse o espaço familiar. Numa estupidez minha, na altura, não conseguia perceber como é que, denegando o ócio, trabalhavam de sol a sol e todos os dias da semana. Tinha dificuldade em aceitar que, escolhendo o esforço físico, o meu pai não frequentasse a taberna da aldeia e ao Domingo fosse jogar ao fito ou uma “suecada” com os restantes homens da aldeia. Tive de transpor as portas da velhice para alcançar o grande significado de abnegação dos meus progenitores. Por que eram assim? Seria apenas ambição para ter uma vida melhor? Ou, pelo contrário, seria a recusa em render-se a uma miséria que teimava em rodear a maioria dos vizinhos? Provavelmente as duas premissas estarão certas.
É por isto mesmo que sinto impedimento em abarcar totalmente a essência das coisas. Mas também não faz mal! Parcialmente consigo lograr que, efectivamente, a vida nem está tão difícil assim -pelo menos comparando com quando eu era criança, na época dos meus pais. Tenho para mim que, nos nossos dias, a maioria -não todos, felizmente- perdeu uma certa vergonha e necessária ambição, que implica suar a estopinhas para almejar um caminhar de cabeça erguida, sem alguém a perseguir-nos por que lhe devemos dinheiro. A meu ver, hoje temos uma população vencida, cativa ao situacionismo. Com pouco passa e com pouco se mantém. Se reclama é em surdina. Nunca dá a cara -e se a der diz o contrário do que pensa e de acordo com o interlocutor.
Está tudo numa “nice”.

BOM DIA, PESSOAL...

sexta-feira, 8 de julho de 2016

HERÓIS DESCONSIDERADOS À NOSSA PORTA: CENTRO CULTURAL E SOCIAL 25 DE ABRIL






Para uma maioria de conimbricenses, a porta número 92 da Rua da Sofia será simplesmente mais uma entrada para um edifício setecentista numa artéria classificada, pela UNESCO, como Património da Humanidade. Como muito outro edificado desconhecido nesta antiga rua dos colégios, visto de fora, será avaliado como mais um património morto, decrépito, sem actividade e sem alma no seu interior de paredes de pedra com um metro de largura.
Tudo começa pelas 08h00 quando crianças meio-ensonadas, acompanhadas pelos pais, sobem as escadas ladeadas com azulejo século XVII até ao segundo andar. Em baixo, em cima do passeio, sem lugar para estacionamento adequado e para o efeito, viaturas, utilitárias e já com muitos anos de rodado, ficaram por momentos abandonadas e sujeitas a uma coima de um agente municipal pouco compreensivo. Se assim acontecer, e acontece demasiadas vezes, o magro ordenado irá encolher e em algum lado se irá reflectir, mais que certo na mesa e nas refeições pouco abonadas em calorias.
Para uns, para os que ainda têm trabalho, o tempo falta para chegar a horas ao emprego e pouco mais cresce do que dar um beijo furtivo ao miúdo e deixá-lo aos cuidados de uma das funcionárias do jardim-de-infância e tempos-livres. Para outros, há muito sem salário fixo, desempregados de longa duração, vindos das ruas estreitas da Baixa, onde o Sol só toca o chão a partir do Verão e o cheiro a pobreza se entranha nos locatários do casario de antanho, de intra-muros e dos subúrbios da cidade, desde a Adémia, Ingote, Santa Clara e até Montemor-o-Velho. Logo de manhã, num corrupio de abelhas em busca de pólen, pressente-se naquele errante calcorrear de calçada um espírito de missão, a esperança de oportunidades que fintem a desigualdade marcada a ferros de estigma e um amanhã melhor para os petizes. Para qualquer um destes progenitores este espaço solidário é um porto de abrigo, um lugar seguro na cidade alheia aos problemas individuais, uma possibilidade de proporcionar o indispensável aos seus filhos já que, para muitos deles, devido à carência económica, não lhes seria possível dar-lhes o mínimo exigível.

UM POUCO DE HISTÓRIA

Para quem já detém cabelos brancos, deve recordar, no início da década de 1970, a Baixa e a Alta com hordas de miúdos maltrapilhos e descalços, oriundos de famílias numerosas paupérrimas, a estenderem a mão à caridade nas ruas e nas entradas dos cafés. Embora o hábito ratificasse o costume e tornasse insensível o olhar do cidadão comum, a verdade é que a moralidade do Estado Novo dormia muito bem com esta chaga social.
Veio a revolução de Abril de 1974. Foi então que, em Outubro do mesmo ano, um grupo de moradores da Zona Histórica, constituído em comissão, para dar solução a estes quadros negros de miséria infantil que fustigavam a Baixa, decidiram fundar o Centro Social e Cultural 25 de Abril, na Rua da Sofia número 92, segundo andar. Talvez pelos odores revolucionários impregnados na acção só seria legalizada como associação em 1982 e nessa altura, por parte da Segurança Social, foi reconhecido o alto valor humanitário e constituídos acordos para prosseguir o objecto para que tinha sido criada a instituição. Até aos nossos dias, teriam passado por aqui milhares de crianças que, sendo adultos hoje, estarão eternamente gratos aos esforços desenvolvidos por uma equipa guiada pelo lema: fazer bem sem olhar a quem.

E NA ACTUALIDADE? COMO É QUE É?



Hoje sobre o leme de Sandra Campos, directora técnica e a trabalhar na instituição há 24 anos, o Centro Social e Cultural 25 de Abril, como barco a precisar de ir ao estaleiro, contra ventos e marés, continua fiel ao seu destino. Porém com muitas dificuldades.
Como utentes, temos 120 crianças, entre os três e os doze anos, divididas entre jardim de infância e tempos livres, com lotação esgotada e uma enorme lista de espera” -enfatiza Sandra, uma relações-públicas simples, sem peneiras, cuja atribuição de idade será indefinida, de mangas arregaçadas e, intuo, habituada a colocar as mãos na massa e a fazer tudo para que todas as crianças, sem excepção e independentemente do extracto social, não se apercebam das imensas dificuldades diárias.
Prossegue Sandra, “os órgãos sociais são constituídos pelos pais das crianças que frequentam a casa ou já frequentaram. O amor à camisola é diariamente uma prova dada por todos, desde qualquer funcionário até ao presidente, o José Cruz, que, numa entrega total, há vários anos dá aqui muito do seu tempo.
Os nossos maiores espinhos, que tolhem os nossos movimentos diariamente, são as dificuldades financeiras dos agregados familiares dos miúdos. Cerca de oitenta por cento (sobre)vivem com carências económicas. Repare que proporcionamos a todas as crianças o pequeno-almoço, a seguir, a meio da manhã, um reforço e depois o almoço. A meio da tarde, damos o lanche, horas depois, ao cair da tarde, um reforço alimentar e, para os utentes mais necessitados, ainda enviamos jantar. Notamos que o bem-estar das famílias está a deteriorar-se. Temos 15 miúdos que estão a ser acompanhados pela CPCJ, Comissão de Proteção de Crianças e Jovens.
Mantemo-nos no fio da navalha. Quinze por cento das famílias associadas não pagam. Noventa e cinco por cento pagam até 40.00 euros. Só para cinco por cento a mensalidade vai acima dos 50.00 euros. A mais elevada é de 118.00 euros.
Tenho de confessar que estamos a entrar em rotura financeira. Os ordenados dos 12 funcionários estão a começar a ser melindrados. Neste mês de Julho, estamos a liquidar o Maio -obviamente com algum atraso.”

O IGUALITARISMO QUE PROVOCA DESIGUALDADE DA SEGURANÇA SOCIAL

Prossegue Sandra Campos, directora do Centro Cultural e Social 25 de Abril, “o nosso maior problema são os critérios de atribuição de verbas publicadas em Diário da República e distribuídas pela Segurança Social. As tabelas são atribuídas a todos por igual sem levar em conta as carências económicas dos agregados familiares, como é o nosso caso. Tanto recebemos nós, como o jardim-escola João de Deus, a Bissaya Barreto, ou qualquer IPSS, Instituição Particular de Solidariedade Social, nas mesmas condições consignadas nas tabelas. Ora, está de ver, tendo em conta as forças de cada entidade, o fosso é enorme.
O que nos vale são as imensas ajudas desinteressadas de cidadãos anónimos que entendem o nosso objecto social.”

E OS POLÍTICOS DA NOSSA PRAÇA?

Com franqueza, só temos de agradecer o empenho do Dr. Jorge Alves, responsável pelo pelouro da Acção Social e Família e vereador da Câmara Municipal de Coimbra. Já reunimos várias vezes este ano e, tenho a certeza, pela sua grande experiência na área social, reconhece o valor e a importância que desempenhamos na comunidade. O esforço deste edil tem sido inexcedível no apoio. A divisão que superintende tem sido o nosso abrigo. Assim como também para a União das Freguesias agregadas o nosso muito obrigado. Temos batido a todas as portas! Infelizmente, mesmo assim, a situação está a piorar. Como náufragos em mar alto, em nome das nossas crianças, precisamos de auxílio.”

E O QUE DIZ O PRESIDENTE?


José Cruz, reconhecido empresário hoteleiro, sócio do vetusto Café Santa Cruz, é o presidente da direcção e, desempenhando várias tarefas, está no Centro Cultural e Social 25 de Abril há cerca de uma dezena de anos. Com algum pesar, lamentando as ondas alterosas que a instituição que comanda atravessa, vai dizendo: “estamos implementados numa zona problemática, que abarca a Baixa e outras áreas com manchas elevadas de pobreza, com o desemprego a aumentar. As famílias, sem emprego, sem rendimentos, têm muitas dificuldades. O Centro Social está há sete anos com resultados negativos. E o que mais me preocupa é que a situação tende a agravar-se. Apelo às entidades responsáveis, ao tecido social da cidade, da Baixa em particular, que nos ajudem nesta aflição. São 120 crianças que precisam de todos nós.
Aproveito este meio para agradecer encarecidamente ao vereador Jorge Alves, da Câmara Municipal de Coimbra, ao Dr. Jorge Antunes e ao senhor Hélder Abreu, da União de Freguesias agregadas, ao senhor Victor Marques, presidente da APBC, Agência para a Promoção da Baixa de Coimbra, que recentemente organizou a campanha do “Bacalhau Solidário”, cuja verba será entregue brevemente. Gostaria também de enviar um agradecimento ao presidente do executivo, Manuel Machado, que, embora ainda não nos recebesse pessoalmente, tem delegado no vereador do pelouro, Dr. Jorge Alves.
Apesar de insuficiente, é por verificar que somos apoiados que continuo a exercer o cargo de presidente desta tão digna e meritória associação.
Por último, como quem não pede não ouve Deus, gostaria de chamar a atenção do executivo para as nossas depauperadas instalações. Apesar de algum conflito latente entre o proprietário do edifício e o Centro Cultural, o inquilino, levantando a bandeira do bem-fazer social, temos tentado prosseguir o nosso caminho. Contudo, apesar de estar muito longe do necessário, só teremos sede assegurada até 2021. Após esta data o senhorio pode resolver o contrato de arrendamento.”