Esta noite, a hora indeterminada,
desconhecidos vandalizaram o monumento ao fado, constituído por uma guitarra de
Coimbra em forma estilizada de mulher, junto aos Arcos de Almedina e da
Traição. Tributo à Canção de Coimbra, esperada classificação, a par de Lisboa,
como património imaterial da humanidade, elegia sentida à alma da cidade, esta
espectacular obra de arte em bronze, a par também da escultura de homenagem à
Tricana de Coimbra com assento no início das Escadas de Quebra-Costas, é da
autoria do escultor Alves André.
Segundo o testemunho de Catarina Rosas, de uma
loja de artesanato em frente, que gentilmente cedeu as fotos, “de manhã, quando chegámos para abrir a
porta, deparamo-nos com este atentado à cultura, desrespeito profundo ao
património artístico da cidade, e ofensa ao génio humano.”
À hora que escrevo, cerca do meio-dia,
saliento o facto positivo de dois funcionários camarários já terem reparado a
escultura, assim como, em tentativa falhada, a parede pintada do banco Millenium, ao lado, e também grafitada com
uma frase, curiosamente, “abaixo o machismo contra a cultura”.
Lembro os atentados, nos últimos anos, no
Jardim da Sereia -a própria Tricana de Coimbra, inaugurada em 2008, obra do mesmo autor e situada um pouco mais acima, já foi também vandalizada. Recordo há cerca de um mês a destruição de um corrimão em
ferro numa escada da Alta. Em face dos milhares de euros despendidos pelo
erário público, alguma coisa terá de se fazer. Não se pode, passivamente,
continuar a olhar para estes desmandos como coisa vulgar e que vai caindo numa
certa habituação. Isto acontece por três motivos. O principal é o continuado
desinvestimento na educação e a seguir na formação de adultos. Quem fez isto é
crescidinho. O ensino universitário continua a apostar apenas na
intelectualização e pouco na cidadania. O segundo é o continuar a licenciar
estabelecimentos toda a noite e como se este fosse um caminho certo para manter
os jovens ocupados. Caminhamos alegremente para o abismo social e, pela passividade,
pela falta de exigência cidadã, deixamos que os (maus) gestores municipais,
esquecendo os moradores, sejam coniventes com o apocalipse da vivência nas
urbes e da aniquilação social dos jovens e continuem a semear a cultura do
noctívago selvagem. Em terceiro lugar, é a falta de policiamento, de vigilância, que contribui para o abandalhamento da convivência com a arte.
Hoje, e já há bastante tempo, o Centro Histórico, Baixa e Alta, está entregue à
sua sorte. O que é de admirar, por incrível que pareça, é não a haver ainda mais
devastação monumental. Neste estado a que chegámos a norma é imperativa: “faz o que te apetece! Se estás frustrado
com a tua vida, bebe uns copos e arrasa qualquer coisa!”.
3 comentários:
Ahahaha! Contra CUltura... não será uma referência ao avantjado traseito da estátua?
Obrigada, Andreia. Leia aqui a sua resposta:
http://questoesnacionais.blogspot.pt/2014/07/um-comentario-recebido-e-uma-resposta.html
Eu acho lamentável que se vandalize uma escultura que simboliza precisamente a cultura de um povo e em especial de uma cidade que é milenar, universitária e que deve saber respeitar ideias e opiniões diversas com inteligência, civismo e decência.
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