sábado, 29 de junho de 2019

CMC: CRÓNICA DO MALHADOR (10)


(Vídeo produzido pelo jornal online Notícias de Coimbra -para quem vai o nosso agradecimento)






Quem esteve presente nesta última sexta-feira, 28 de Junho, na Assembleia Municipal de Coimbra, nomeadamente a comunicação social e deputados - porque público assistente não havia -, mais que certo, ficou de boca-aberta perante a reacção intempestiva (talvez devesse escrever histérica mas fico-me pelo pensamento) do presidente, Luiz Marinho, perante a minha intervenção pública naquele parlamento local.
Para compreender tudo é preciso recuar. Em 16 de Maio inscrevi-me no Atendimento ao Público. O assunto transcrito obrigatoriamente no impresso foi: “Vem requerer para intervir na próxima sessão da Assembleia Municipal para apresentação da proposta aos deputados municipais para que estes recomendem ao Executivo a mudança de horário de intervenção pública nas reuniões de Câmara, das 17h00 para as 15h00. Isto é, a bem do pluralismo, que seja proposta a mudança para o Período Antes da Ordem do Dia, em vez do final da sessão.”
Nestes últimos dias, tive o cuidado de ir à página institucional da Câmara Municipal ler a convocatória e reparei que não constava no ponto 1, na Abertura, a menção à intervenção pública. Pensei que poderia ter sido lapso e facilmente ultrapassável pela boa-vontade do regente.
Cerca das 14h20 desta sexta-feira, um pouco antes de começar a sessão, apresentei-me no Salão Nobre da Câmara Municipal. Como é protocolar, dirigindo-me à funcionária que assessoria a reunião e dando-lhe conhecimento de que estava matriculado para intervir, aguardei sentado numa da meia-dúzia de cadeiras vazias reservada aos assistentes. Segui a auxiliar com os olhos e, pela sua movimentação e contactos breves, deu para perceber que iria ter problemas em conseguir chegar ao micro. Passados minutos, vi o presidente da Assembleia, acompanhado do secretário da mesa Vitor Carvalho, dirigir-se a mim. Numa delicadeza invulgar, assim de mansinho, depois de me cumprimentar simpaticamente, atirou: “Sei que o senhor Quintans está inscrito para intervir nesta sessão. Acontece que não tive tempo de examinar o assunto e o levar à “Conferência de líderes”. Pergunto-lhe, importa-se de vir na próxima sessão, depois, para eu analisar?
O que Luís Marinho não me disse – mas eu sabia – é que a próxima reunião é em Setembro. Ou seja, eu teria de esperar cerca de três meses para poder expor o tópico.
Rapidamente respondi ao digníssimo presidente: “Importo sim! Se o senhor não fez o trabalho de casa é um problema seu. Estando inscrito legalmente, estou aqui para intervir hoje!
Se há coisas que aprecio ver é no que, num piscar-de-olhos, um humano se pode transformar. De repente, numa metamorfose da banda desenhada, a representar Bruce Banner e o Incrível Hulk, à minha frente tinha uma pessoa completamente fora de si, sem controle nas suas emoções, a mostrar bem parte da sua alma inquietada. Como retirasse da bainha a sua espada de poder, que lhe confere domínio sobre os simples, com voz potente e grave, atirou: “Ai isso é que não intervém. Eu não deixo. Eu sou o presidente!”
Calmamente respondi: “E eu sou um munícipe com direitos. Para me impedir é melhor chamar a PSP. Se não me deixar intervir oficialmente, vou apresentar a matéria que me trouxe no meio do salão para os deputados!
Percorrendo os cerca de vinte metros entre o “curral da mula”, que é onde se arruma e aconchega o escasso público assistente no grande salão, e a mesa dos trabalhos, calmamente, como nada se passasse, dirigindo-se aos deputados, disse que “gostava de informar também que há uma situação de um cidadão que me surpreendeu neste momento, que é de um cidadão que gostaria de intervir para apresentar um problema que tem contornos regimentais. É um problema de mudança da ordem de apresentar a palavra, (…) é um problema de carácter regimental. O Regimento diz uma coisa e a pessoa que pede para falar diz outra. Eu não levei este assunto na última reunião… à última reunião da… à ultima reunião da... Conferência de Líderes, que é ela que decide em última análise a quem é que se concede o direito de palavra. Deveria ter levado mas, como a agenda era extremamente pesada, acabei por não levar. Mas reconheço a preocupação dos serviços de que o pedido foi feito”. Num tom considerado normal, exclamou: “Tem um minuto para falar. Tem um minuto para falar, e depois a Comissão Jurídica analisará o pedido. Faz favor!”- e largou a mão com displicência, como se quisesse dizer: vai lá minha besta!
Ainda ia eu a meio da sala e já Luís Marinho interrogava: “O seu nome, faz favor?”. Voltou a repetir: “Tem de me dizer o seu nome!
Assim que cheguei ao pódio, apreendendo a pressão disfarçada do maestro da reunião camarária, retorqui: “Senhor presidente, vamos com calma! Primeiro deixe-me chegar ao micro! Primeira questão: chamo-me António Luís Fernandes Quintans. Segunda questão: Um minuto não é um tempo razoável”, prossegui.
Por quatro vezes, sempre cada vez mais alto, Luís Marinho, um afamado fadista da cidade e conceituado democrata, berrou: “TEEEEMMMM AAAA PAAAALLLAAAVRRA!
Lamentável desempenho senhor presidente da Assembleia Municipal de Coimbra, Luiz Marinho. Triste “fado para um amor ausente” à democracia.


POST SCRIPTUM: UM ENORME AGRADECIMENTO A FERNANDO MOURA, DO JORNAL NOTÍCIAS DE COIMBRA, POR, MAIS UMA VEZ, COM O SEU EMPENHO CIDADÃO, PERMITIR QUE A HISTÓRIA FIQUE DOCUMENTADA EM IMAGENS E PALAVRAS.




quinta-feira, 27 de junho de 2019

NOSSO SENHOR, ANTÓNIO COSTA, LEVAI O NOSSO AMADO LÍDER





A Comissão Nacional do PS reúne-se hoje para iniciar o processo de escolha dos seus candidatos a deputados às próximas eleições legislativas, que será encerrado em 23 de julho com a aprovação final das listas.





NOSSO SENHOR, ANTÓNIO COSTA, LEVAI O NOSSO AMADO LÍDER


Pai nosso, António Costa, que estais para Portugal como Deus está para o Céu, ilumina com a tua luz espiritual a pretensão da Federação do Partido Socialista de Coimbra para levar Manuel Machado, o nosso presidente camarário, para deputado da Nação;
Santificado seja o Vosso nome, assino por baixo que leva o melhor produto político alguma vez fabricado com a marca “Made in Coimbra”;
Venha a nós o Vosso reino, e pode acreditar que qualidades não lhe faltam. O senhor Manuel é sério, estudioso, competente e bom condutor de homens e mulheres. Às vezes, só às vezes, é um bocadito emproado, mas tendo em conta a idiossincrasia dos portugueses, que gostam de ser tratados com prepotência, é um elevado atributo que gera capitalizações;
Seja feita a Vossa vontade, assim na terra como no Céu, assino de cruz que se deixamos partir de bom grado o nosso amado líder é por altruísmo e amor à Pátria;
O pão nosso de cada dia nos dai hoje, mas, jurando sobre a Bíblia, não sei se aguento a saudade. Ainda não partiu e já estou a remoer-me de nostalgia;
Perdoai as nossas ofensas, mas não perdoai as dele, que às vezes me chateia de mais. E até me provoca urticária;
Assim como nós perdoamos a quem nos tem ofendido, claro que perdoamos - desde que Machado vá para o Parlamento. Lá é o seu lugar! Bons lugares para quem os merece. E mais nada!
E não nos deixeis cair na tentação de ele não aceitar tão elevado cargo. A bem do povo, prometemos não activar a cláusula de rescisão;
Mas livrai-nos do mal, fazendo rezas, figas e mezinhas para que quem vier a seguir seja um bocadito melhor - só um bocadito.
Amém.

"O ENDIVIDADO" (SIMPLESMENTE ESPECTACULAR)

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UNIVERSIDADE DE COIMBRA: A JUSTIÇA TARDA MAS NÃO FALHA. SERÁ?






Muitos destes professores, sumidades de peito cheio,
que caminhando em bicos de pés pelos corredores
se julgavam acima dos mortais, deveriam ser julgados por
ter matado o sonho de milhares de portugueses,
sobretudo, nos últimos quarenta e cinco anos”


Embora aparentemente sem lhe atribuirmos um grande significado, está acontecer uma verdadeira revolução na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra.
Segundo o Diário de Coimbra desta última quarta-feira, “Alunos de Direito afirmam que a justiça foi reposta”. Prosseguindo na citação do jornal, “O Núcleo de Estudantes de Direito da Associação Académica de Coimbra (NED/AAC) considerou ontem que “a justiça foi reposta” depois de o reitor ter emitido um despacho que suspendeu o processo avaliativo da disciplina de Economia Política II. (…) Os estudantes acusaram o docente responsável pela disciplina, Victor Calvete, de usar critérios de avaliação que violam, “de forma clara”, o Regulamento do Curso de Licenciatura em Direito da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra. Em causa estava a decisão de Calvete de não cotar para vinte valores a prova escrita. O método de correcção utilizado na prova escrita (…) dando a cotação máxima possível à prova escrita de 19 valores.”
Antes de prosseguir, recorro a uma ressalva, faço parte do imenso lote de portugueses que, pela pobreza associada, começou a trabalhar logo no final do ensino básico (hoje 1.º ciclo) e não puderam estudar em tempo útil. Ao longo da vida, o adquirir do conhecimento e da formação, para além do empírico, foram feitos em horário pós-laboral e no gosto pela leitura. Em 1999, então com 42 anos, com muito custo, entrei na Faculdade de Direito através do “ad hoc”, método de acesso criado para essa finalidade. Transpor a Porta Férrea foi o maior sonho da minha existência. Sempre imaginei um dia ser advogado. Nessa altura, se me propusessem a troca por cem mil euros eu teria convictamente optado pelo curso de direito. Por ler bastante e deter um conhecimento razoável do que me rodeava, estava convencido que entre o primeiro e o quinto ano – foi antes do Processo de Bolonha – eram favas contadas. Não deixando de me rir agora pela arrogância e estupidez, cheguei a apostar com o Celestino e o Faustino - dois colegas de curso nas mesmas condições e amigos – que faria a licenciatura em cinco anos, sem chumbar. Fiz este acordo no restaurante “Zé Manel dos Ossos”, na Baixa da cidade.
Começaram as aulas e com elas uma alegria esfuziante e indescritível. Sendo os três quarentões, com os filhos já crescidos, parecíamos adolescentes, novatos e com a mesma idade, ao lado dos caloiros mais novos. E se nós, juntos, estudávamos com afinco! Lembro-me, o Faustino tinha uma memória prodigiosa. Bastava ler uma passagem e ficava tudo. Eu não, decorar não era comigo. Tinha de ler várias vezes e compreender. Nessa primeira turma de 1999 havia muitos alunos como nós e até mais velhos.
Vieram as primeiras frequências e, com notas medíocres, os primeiros desaires. Vi raparigas e rapazes a receberem zero de avaliação e caírem para o lado, a chorarem desalmadamente. Alguns alunos apanharam esgotamentos e mudaram de curso pela incapacidade de compreender o que almejavam os docentes.
Do alto da sua importância metafísica, os regentes das várias disciplinas, com pompa e circunstância, como se estivessem a dizer uma grande coisa para além do disparate imbecil, apregoavam que a frequência era para 20 valores mas o máximo de nota que dariam seria 14. Outro exemplo mesquinho, no caso em Introdução ao Direito, era afirmar com gáudio perante mais de uma centenas de alunos, que no primeiro ano havia cinquenta por cento de chumbos, mas já no último ano a percentagem de sucesso era superior a cem.
Outro desrespeito notório no interesse dos discípulos, que concorria para a iliteracia e maus resultados académicos, no tempo em que por lá andei, nunca foi feita uma correcção a qualquer frequência. Sobre vários artigos do Regulamento da Faculdade de Direito, que não sendo cumpridos, era feita tábua rasa. Exemplos? Tantos, mas o que mais recordo com mágoa, porque mesmo chamados à razão os lentes gozavam do alto da sua razão de conveniência, era a não permissão de assistência às orais -quando no Regulamento da Faculdade eram prescritas imperativamente como públicas.
Relembro um colega, também estudante trabalhador, hoje já advogado, ter ido 14 vezes fazer o mesmo exame. Fiquei a saber de outros que, por a sua indumentária não agradar ao regente, foram destratados em plena oral examinatória.
Relembro ainda, num exame no Auditório, antes de começar a prova escrita e alerta sobre copianço, durante cerca de 15 minutos assistir a um clima de ameaças por parte da professora responsável e ter proporcionado um ambiente tenso parecido com uma tourada. Participei por escrito a ocorrência ao Conselho Pedagógico e nunca me foi dada resposta.
Depressa apreendi que, onde se deveriam formar cidadãos para intervir nas injustiças do mundo, ali formatavam-se pessoas arregimentadas para não se distinguirem do comum.
O Faustino, dizendo-me muitas vezes que ali os mais velhos como nós eram discriminados intencionalmente, foi o primeiro a claudicar. Tentei demovê-lo. Eu achava que, perante o meu amor ao direito, jamais desistiria. Erro meu! Passados poucos anos com algumas cadeiras concluídas, saí pela porta pequena, como sói dizer-se. Trouxe comigo um anátema de cavalgadura que custou muito a passar. Achava mesmo que era burro e que o meu tempo tinha passado. Só quem por lá percorreu o chão de pedra milenar consegue entender a dor que fica no coração. Apesar de tudo, o Celestino, talvez por ser funcionário público, com mais tempo para estudar, e mais persistente, concluiu a licenciatura.
Muitos destes professores, sumidades de peito cheio, que caminhando em bicos de pés pelos corredores se julgavam acima dos mortais, deveriam ser julgados por terem matado o sonho de milhares de portugueses, sobretudo, nos últimos quarenta e cinco anos.
Esta semana, no Jornal Público, veio publicado o resultado de um estudo da Fundação Belmiro Azevedo sobre as desigualdades no ensino superior. É um primeiro passo para chegar aos elevados chumbos e interrupções nos cursos universitários.
Parabéns ao Núcleo de Estudantes de Direito. Parabéns ao novo Reitor, Amílcar Falcão.



terça-feira, 25 de junho de 2019

CMC: PROPOSTA PARA ESTUDO DE UM CASO DE VETO SISTEMÁTICO





Aquele espaço metafísico é como uma catedral,
só é recebido de bom grado quem comungar do mesmo
credo, ajoelhar e venerar as imagens dos santos em carne.”



Tudo começou em Fevereiro, último, quando, estando devidamente inscrito para intervir na reunião de Câmara, fui simplesmente ignorado, e até desprezado, pelo digníssimo presidente do hemiciclo. Por não ser pessoa para me deixar ficar enrolado no meu sofrimento, sobretudo se provocado por outro, prometi a mim-próprio, a partir dessa data, inscrever-me em todas as sessões subsequentes até me cansar. Falar na Câmara não é para mim nada de novo. No período de regência da Coligação por Coimbra, entre 2001 e 2013, várias vezes compareci na sala de reuniões camarárias e na Assembleia Municipal para tornar público assuntos da Baixa da cidade.
Avisando que, nos próximos tempos, poderia contar comigo mais vezes sentado naquele banco do réu, em jeito de provocação, lancei o desafio para me coartar mais vezes o meu legítimo direito à livre-expressão. Confesso, não estava à espera de o repto ser levado tão a sério e à letra. Mas foi mesmo! 
Talvez a síndrome de Estocolmo explique, mas a verdade é que, com a indignação a corroer-me a alma, lentamente fui perdendo o rilhar de dentes do primeiro impacto de revolta e comecei a ganhar uma forte admiração pelo esforçado pessoal do Gabinete de Apoio à Presidência (GAT). Evitar moscardos empecilhos com ideias, não é fácil, só trazem chatices, conjecturei com os meus botões. Algumas vezes tentei colocar-me no seu lugar e imaginei-os em longas noites de insónia a pensar que motivo haveriam de inventar para me barrar o caminho. Para estes incansáveis burocratas do sistema, erguer muros que obstaculizasse a minha presença na Câmara passou a ser um desígnio. Nada fácil, contemporizei com lástima.
Em Março, na minha segunda participação, depressa percebi que não era bem-vindo à sala de reuniões. Aquele espaço metafísico é como uma catedral, só é recebido de bom grado quem comungar do mesmo credo, ajoelhar e venerar as imagens dos santos em carne.
Na terceira mostra, ainda no mesmo mês, com a sessão a começar às 18h50, ou seja, uma hora e cinquenta minutos depois da hora prometida no Regimento das Reuniões, que é às 17h00, fui tratado com crispação e nitidamente a despachar. Mostrando que não havia tempo para me ouvir, nem folga para me responder às questões formuladas, fui sendo advertido que só tinha direito a três minutos de explanação quando o regulamento prevê dez.
Em Abril, na quarta inscrição, a escassas horas da apresentação pública recebi um e-mail a informar que, por faltarem documentos de suporte, não poderia comparecer. Claro que não contavam com a minha resposta rápida à lacuna e foram forçados a aceitar a minha presença. Mas, pagando bem a teimosia, comecei a ser ouvido cerca das 22h00, isto é, quase cinco horas depois. Para além disso, Manuel Machado, tentando interromper a minha prestação, recorreu a ruído provocado por si no microfone. Neste mesmo mês, na quinta exposição camarária, sem aviso, adiantaram a sessão para as 11h00.
Em Maio, na sexta declaração, comecei o meu discurso com 1h45 de atraso. Na sétima figuração, ainda em Maio, houve (apenas) um atraso de vinte e três minutos.
Em Junho, na minha oitava descrição, a poucas horas da mostra, recebi um e-mail do GAT a informar-me que “os cidadãos interessados em intervir” devem fazer a sua inscrição a solicitar esclarecimentos. “Pelo exposto, não poderá ser aceite esta inscrição para intervenção na reunião de Câmara, por inexistência de norma legal ou regimental que permita a sua aceitação” (sem comentários. Só podemos rir).
Depois de refazer uma nova inscrição conforme os elaborados desejos, nesta última segunda-feira apresentei-me novamente para intervir. Comecei a minha exposição às 20h13. Ou seja, três horas e tal depois das 17h00, que, repetindo, é a hora regulamentar. Para carregar tal carga tem de se ser um grande cristão. Mas eu sou mesmo um homem de muita fé. De tal modo que até acredito que um dia, não sei quando, o PS com assento governativo na cidade vai perceber que está a matar a confiança dos acólitos que votam no seu programa eleitoral. Nessa altura, quando os senhores do poder local despertarem do sono letárgico e respeitarem o cidadão comum, eu deixarei de frequentar quinzenalmente aquela igreja.
Nestes quatro meses de participação política, a favor da polis, inscrevi-me nove vezes e consegui marcar presença em 6 sessões. Bom resultado para os burocratas! Mas, tenho a certeza, ainda farão melhor se apertarem mais a malha!
Já fiz uma exposição ao órgão regulador das autarquias, já fiz vários assentos no Livro de Reclamações. Estou a preparar uma exposição à Provedoria de Justiça para se pronunciar sobre a inconstitucionalidade do art.º 10º, ponto 2, do Regimento das Reuniões da Câmara Municipal de Coimbra, já que, salvo melhor opinião, colide com o texto constitucional nos artigos 37º, 1 e 2, e o 48º, ponto 1.
Na próxima sexta-feira, dia da reunião da Assembleia Municipal, em penitência, vou apelar aos fiscalizadores que, em nome do povo, recomendem ao Executivo conimbricense que não continue na senda da destruição local da participação política. Vão me deixar intervir? Hum…

CMC: CRÓNICA DO MALHADOR (9)

(Imagem de Leonardo Braga Pinheiro)



Ontem, 3h15 depois do horário regulamentar – a hora prevista é às 17h00 -, e depois de ter sido vetado pelos serviços na sessão anterior com o argumento de que não tinha preenchido o requerimento correctamente, fiz a minha intervenção pública na Câmara Municipal de Coimbra com o mesmo texto que deveria ter sido apresentado há cerca de três semanas. Um facto digno de registo, ou talvez não: o presidente, tendo recebido uma chamada telefónica um pouco antes, ausentou-se da sala. Foi o vice-presidente Carlos Cidade que, em substituição de Machado, ouviu a explanação. E, seja digno de nota, sem levantar problemas de maior, esteve muito bem.
De salientar, repetindo o mesmo procedimento que tem sido feito comigo, que ontem mais um cidadão devidamente inscrito para intervir – segundo alegou – ficou a falar sozinho.
É o hemiciclo prepotente e ditatorial que Coimbra merece? Se calhar…




Ex.mo Senhor Presidente da Câmara Municipal de Coimbra, Senhores Vereadores, meus senhores e senhoras:

Começo com uma ressalva, depois de devidamente inscrito para intervir na última reunião da Câmara, vi vetada a minha participação. E qual foi o argumento que, desta vez, serviu de base ao impedimento, perguntarão? Não escrevi no impresso a frase “solicitar esclarecimentos”. Perante resultados tão brilhantes a obstaculizar sistematicamente a minha participação pública, por um lado, sinto-me lisonjeado pela importância que me atribuem, por outro, sinto-me na obrigação de elogiar o pessoal do Gabinete de Apoio à Presidência. São mesmo muito bons a construir muros! De tal modo que questiono: será que não deveriam estar noutra profissão? Nestes quatro meses de participação política, a favor da polis, inscrevi-me nove vezes e consegui marcar presença em 6 sessões. Bom resultado para os burocratas! Mas, tenho a certeza, ainda farão melhor se apertarem mais a malha!
E agora vou ao texto que deveria ter lido na última sessão: Contrariamente ao que se crê e reivindica, Coimbra nunca foi um grande polo industrial. É certo que, ao longo dos últimos três séculos, algumas fábricas marcaram forte presença na olaria, nos têxteis, na porcelana, na azulejaria mas, historicamente, o comércio de rua foi o tronco e a pequeníssima indústria associada foram os ramos que fizeram respirar a cidade. Os comerciantes, mesmo tendo agregado um legítimo interesse egoísta, através da sua visão arrojada, arriscando o seu magro pecúlio e contraindo empréstimos, sacrificando a sua vida e a da família, elevando a esperança e o sonho da concretização, foram sempre o motor do desenvolvimento da cidade. A história destes humildes lavradores de noites mal dormidas e semeadores nas agruras dos tempos, que fugindo da pobreza dos lugarejos em redor, começando como marçanos e subindo a corda a pulso, ainda não foi devidamente reconhecida nem contada.
Basta atentarmos na toponímia corporativa de certos largos e artérias da Baixa, Praça do Comércio, Largo das Olarias, Ruas da Louça, dos Esteireiros, das Padeiras, para percebermos o quanto a pequena produção artesanal aliada à venda foi importante e esteve sempre presente na economia local.
Sobre os auspícios do raio de luz intelectual da Universidade, com muitos ministros,´secretários-de-estado e até um presidente do conselho que ali foram docentes, após a implantação da República, em 1910, a Lusa Atenas, ao longo de todo o século XX, sobretudo por ser um epicentro comercial a céu aberto de confluência, foi o centro do centro de Portugal e afirmou-se como terceira cidade do país. Sem o esforço, dedicação e entrega destes mercadores, alguns ainda vivos e outros que já pereceram, não teria sido possível este engrandecimento regional.
Socorrendo-nos novamente da toponímia, até à introdução da democracia, em Abril de 1974, um comerciante, pequeno, médio ou abastado, era o modelo de cidadão, reverenciado, símbolo da palavra honrada, sinónimo de comendas e respeitabilidade pública. Após o troar dos canhões da revolução, lavando a classe com sabão clarim, trocando o nome pomposo para “empresário”, foram sendo desvalorizados completamente no reconhecimento de integridade. Confundindo a árvore com a floresta, vinculando-os aos grandes grupos económicos que era preciso abater pelo anátema, praticamente, os negociantes foram remetidos para as calendas do esquecimento, como se fossem apêndices instrumentais do Estado Novo e tivessem de liquidar uma impagável dívida à sociedade.
Por incrível que pareça, na Baixa, entre os 79 e os 95 anos, temos hoje 11 comerciantes ainda a marcarem presença e a labutarem nos seus estabelecimentos. Sem esquecer outros tantos ainda de boa saúde mas afastados das lides comerciais. Por questões óbvias não divulgarei aqui as suas identidades.
Nesta minha intervenção política, trago uma proposta e uma solicitação de esclarecimento. Como proposta, na minha qualidade de munícipe, sugiro que esta Câmara Municipal, rectificando uma lacuna de muitas décadas, assumindo um critério de escolha, deveria agraciar este lote especial de profissionais com a medalha de prata da cidade no próximo 04 de Julho, Dia da Cidade.
É politicamente correcto? É sim senhor! Mas, para o caso, pouco importa. Se for levada em conta esta minha intervenção cidadã, o que interessa como valor maior é que o município, através desta aclamação pública, está a reconhecer que tendo sido ingrato para uma classe de obreiros que ajudaram a construir a cidade, apesar de tardiamente, está agora a emendar a mão.
Como esclarecimento, solicito a seguinte informação: qual a razão que sustenta que, em 45 anos de liberdade, apenas um comerciante tenha sido agraciado com a medalha de prata da cidade? Nomeadamente, José da Costa, votado por unanimidade em Assembleia Municipal em 28/6/1993 e medalhado no Dia da Cidade, em 04 de Julho de 1993

TEXTOS RELACIONADOS


quinta-feira, 13 de junho de 2019

FALECEU CARLOS DIAS, UM ÍCONE DA CIDADE






Segundo informação provinda do Diário de Coimbra, faleceu hoje Carlos Dias, de 95 anos, um reputado negociante de velharias e antiguidades com o “Velhustro”, a sua loja no Largo do Romal a fazer parte do roteiro da cidade.
Nunca foi acessível estabelecer conversa com o “senhor Carlos do Velhustro”, como sempre foi carinhosamente conhecido. Homem de argumentos eloquentes, convicções poderosas e ideias feitas acerca de tudo o que o rodeava, não era fácil condescender e apanhar a sua flexibilidade. Sem aparente filiação ideológica, não era fácil de chegar ao pensamento crítico interior que o movia. Talvez fosse um anti-sistema ou, sei lá, um anti-poder instituído, no sentido que, embora não o afirmasse claramente, sabia que toda a autoridade corrompe e pode ser corrompida.
Com o seu bigodinho fino por cima do lábio superior, numa mistura entre a sedução de Errol Flyn e a intransigência do escritor filósofo e romancista Albert Camus em aceitar de ânimo leve as correntes existencialistas e marxistas, a verdade é que, fosse pela imagem, fosse pela sua idiossincrasia, Carlos Dias - sem o ser - foi sempre um “intelectual”, um figurão respeitado na sua área profissional, pela generalidade dos conimbricenses, e até pelos presidentes camarários que se foram sucedendo na cidade.
Reconhecido por este blogue como uma das vinte personagens mais carismáticas da Baixa de Coimbra -a que chamei “Rostos Nossos (Des)Conhecidos”, com esta sua partida para a eternidade fica um vazio nesta terra antiga e feita por pessoas de têmpera, ou, como sói dizer-se, “pêlo na benta”, se preferirem.
À família enlutada, em meu nome e da Baixa comercial, se posso escrever assim, os nossos sentidos pêsames. Até sempre, senhor Carlos Dias. Descanse em paz!


POST-SCRIPTUM: O corpo do saudoso Carlos Dias encontra-se em câmara ardente no Centro Funerário Nossa Senhora de Lurdes (Capela Páscoa) onde amanhã, sexta-feira, 14 de Junho, pelas 15h00, será realizada a missa de corpo presente e em seguida o funeral para o Complexo Funerário Municipal de Coimbra, em Taveiro.

VENDA AMBULANTE: OS TOMBOS DE UMA VIDA DE UM HOMEM DE MEIA-IDADE




Como a vergonha nem o sentido de justiça
nunca foram qualidades intrínsecas dos políticos
que governaram, e continuam a governar, esta
terra, entre o compromisso vazio e o interesse
partidário, foram enganado os lojistas papalvos
e manipulando estas pessoas ao sabor da
indignidade e da mesquinhês.” 



Hoje, durante a manhã, mais uma vez, talvez pela enésima, metade dos vendedores de etnia cigana, ultimamente instalados no Largo da Maracha, foi empurrada uns metros mais para a frente. O motivo da separação do grupo foi o prédio onde funcionou a taberna do Manuel Vasques, abandonado há cerca de vinte anos, ter entrado em obras.
Tudo começou com o alojamento temporário (definitivo) destes comerciantes nos finais de 1970 no espaço hoje ocupado pela Loja do Cidadão. Em 1998, com Manuel Machado, o actual timoneiro do município, à frente da Câmara Municipal o terreno foi vendido em hasta pública à empresa Braga Parques por cerca de um milhão de contos.
Por volta de 2000, para início das obras pela firma de Braga, os vendedores de rua foram acomodados no Largo da Maracha.
Em 2001, Machado perdeu as eleições para Carlos Encarnação, com Pina Prata como vice-presidente da autarquia e "ex-aequo" presidente da desaparecida ACIC, Associação Comercial e Industrial de Coimbra.
Fazendo parte do caderno eleitoral a promessa de disciplinar a venda desregulada, para agradar aos comerciantes tradicionais instalados, o primeiro passo foi abrir a discussão pública para um novo Regulamento da Venda ambulante. Através da deliberação número 1819, entraria em vigor em 10 de Fevereiro de 2003. Esta nova postura, em relação ao anterior, era completamente vanguardista. Por exemplo, doutrinava que nenhum vendedor ambulante poderia estar a vender a menos de 50 metros de um estabelecimento comercial e a 100 de uma igreja. Ora, tal requisito só existia no meio do Rio Mondego. Como tal, como o propósito era desonesto e a intenção era simplesmente tentar extinguir um modo de vida e um quadro cénico a todos os níveis deprimente para uma cidade que, nesta época, aspirava a ser Património da Humanidade, fácil foi antever que tudo continuou igual. Mas falharam num pormenor: desvalorizaram a resiliência do povo cigano.
Mas, na altura, a coligação PSD/CDS, com o vereador Pina Prata a arrebanhar as massas ignorantes, não desistiu. Com a desculpa de se reclassificar o empedrado do Largo da Maracha, os ambulantes-fixos, deslocando-os meia centena de metros, foram jogados para a frente do extinto Armazéns Amizade. Com a promessa de atribuição de quiosques, chegaram a ser marcados os espaços no chão do Largo da Maracha, onde estiveram antes, mas, sabe-se lá por quê, com investidas regulares da ASAE, continuaram a resistir e a oferecer os seus artigos junto ao falido Armazéns Amizade. Entre “ó freguês leve por apenas cinco euros” e um carisma que ninguém lhes pode negar, passaram a fazer parte integrante da Baixa da cidade.


NOSSA SENHORA DAS ELEIÇÕES AJUDE QUEM PRECISA


Esquecidos e sem qualquer consideração por parte da Câmara, em 2008, próximo de eleições, e novamente para agradar aos comerciantes da Baixa, os jornais da cidade anunciavam em parangonas “PSP (e autarquia) põe ordem na venda ambulante do Bota Abaixo”.
Clarinho como a água, como nunca houve vontade de resolver o problema, por lá continuaram mais uns anos. A contrariar os políticos, que pensavam vencer pela fadiga, os vendedores transformaram um recanto sujo numa pequena feira participada por público. É que há um fenómeno que ninguém pode escamotear: estejam onde estiverem, mesmo que seja no meio do mar, revitalizando o seu meio por pregão e outras formas de publicidade, os ciganos resistem sempre.
O tempo, na sua modorra habitual, transformando o injusto em justo, naturalmente, foi fazendo a inclusão dos vendedores ciganos. Se no princípio, eram olhados de soslaio pelos confinantes lojistas -fazendo com que o espaço ocupado para o seu negócio fosse encarado como uma ilha -, à medida que o declínio e a crise comercial se tornava transversal, porque juntam muita gente à sua volta, começaram a ser olhados pelos vizinhos com simpatia. A natureza das coisas, sem recorrer a discursos políticos ocos de ocasião, encarregou-se de dirimir uma tensão de muitas décadas.
Como a vergonha nem o sentido de justiça nunca foram qualidades intrínsecas dos políticos que governaram, e continuam a governar, esta terra, entre o compromisso vazio e o interesse partidário, foram enganando os lojistas papalvos e manipulando estas pessoas ao sabor da indignidade e da mesquinhês.


NOSSA SENHORA DAS ELEIÇÕES NOS VALHA, MAIS UMA VEZ


Um ano das eleições, em Outubro de 2012, pelo executivo liderado por Barbosa de Melo, da Coligação por Coimbra, foi anunciado que iriam ser instalados novos quiosques para a venda ambulante, na Praça do Comércio e no Bota Abaixo. Escusado será dizer que este comprometimento nunca foi levado a sério. Mas teve um resultado: os vendedores instalados na Praça do Comércio, fartos de ser destratados por pessoas que não valem um caracol e que sempre brincaram com a sua humildade, progressivamente foram desistindo de vender na medieval praça. Hoje, nem um serve para amostra. A autarquia conseguiu pelo cansaço o que não logrou alcançar com medidas regulamentares. E isto é digno? (Não precisa responder!)
Claro que os vendedores do Bota Abaixo, goste-se ou não deles, como são diferentes, pela teimosia, não se deixando calcar, lá foram continuando.


E, REPETINDO UM VELHO FILME, VIERAM OS SOCIALISTAS


Em 2013, apeando os sociais-democratas do poder, os socialistas ganharam as eleições autárquicas. Como é óbvio, sendo as diferenças de procedimentos diminutas entre os dois partidos, não é preciso ser bruxo para adivinhar que estes novos vencedores, senão piores, serão iguais. O futuro, que é hoje, veio mostrar que vindo de um regime socialista nem bons lojistas nem bons comunistas.
Em 22 de Junho de 2015, no executivo camarário, foi analisado um novo Regulamento Municipal das Feiras, Venda Ambulante e da Restauração ou Bebidas Não Sedentárias. Muito inovador e radical, com vestes modernaças, como se calcula, foi feito para “inglês ver”, como quem diz, para os turistas que nos visitam. Quase a fazer cinco anos e, para não variar, tudo continua igualzinho.
Há cerca de um ano, invocando a nova Avenida Central, foram mudados novamente para o Largo da Maracha.
A semi-transferência de hoje dos vendedores vai no mesmo sentido. Mas, calma que ainda não vai ficar assim. Vamos ter eleições para a Câmara Municipal em 2021, não é? Tenhamos fé! Desta próxima vez é que vai ser!

terça-feira, 11 de junho de 2019

ATENÇÃO INQUILINOS, E PROPRIETÁRIOS (COMERCIANTES E OUTROS) - ARTIGO REVISTO

(Imagem de Leonardo Braga Pinheiro)





Por desconhecimento, estou em crer, estão a ser transaccionados prédios na Baixa em propriedade vertical (com um único artigo a englobar várias fracções) cujo direito de preferência não está a ser comunicado devidamente por parte dos senhorios aos seus arrendatários com contratos habitacionais. Tal lacuna, como é lógico, pode implicar danos patrimoniais para uns e outros.

1 - Em 29 de Outubro passado foi publicada a Lei 64/2018 que alterou substancialmente o artigo 1091º do Código Civil no que toca à preferência dos inquilinos. Ou seja, até àquela data sempre que se vendesse um prédio com um único número de artigo inscrito na matriz predial a obrigatória comunicação ao arrendatário para exercer o seu legítimo direito de preferência era feita a incidir no valor global de todo o edificado.

Não percebeu? Vou explicar melhor: Até 29 de Outubro de 2018, um proprietário negociava um prédio, com loja no rés-do-chão e dois andares superiores todos arrendados, (com um único artigo matricial) pelo valor de 100,000.00 €. Estava obrigado a comunicar a todos os inquilinos com contratos de arrendamento há mais de três anos a possibilidade de qualquer um deles ou em com-propriedade poder adquirir o bem, por inteiro, pelo valor de venda (100,000.00€).

2- Após a publicação da Lei em 29 de Outubro de 2018, foi alterado o exercício da preferência para todos os contratos com mais de dois anos – até aqui era superior a três anos.
E mais, e aqui é que reside a matéria fulcral que veio modificar toda a essência das coisas. Sendo mais claro, o exercício da preferência foi alargado também ao locado arrendado. Isto é, o inquilino com contrato para habitação passou a poder adquirir unicamente o seu espaço contratualizado -ou o prédio em bloco.
Mais, e atenção: na comunicação, para além do preço total do prédio, passou também a ser obrigatório referir o preço de cada fracção habitacional proporcional, por permilagem -esta informação deverá ser constante na informação a cada um dos inquilinos promitentes interessados em exercer o direito de preferência.

Não fui muito claro, pois não? Não há problema, volto a explicar: Depois de 29 de Outubro de 2018, um prédio com loja comercial no rés-do-chão, ocupada, e dois andares superiores com contratos de arrendamento cujo valor total será de 100,000.00€ vai ter de ser comunicado aos inquilinos com o preço correspondente individualmente. Ou seja, por hipótese, ao inquilino do primeiro-andar o valor é 40,000.00€. Ao do segundo-andar, sendo idêntico, será também informado do mesmo valor de 40,000.00€. O inquilino do rês-do-chão, por ser arrendamento comercial, não está abarcado pela preferência da sua quota-parte. Isto é, só pode comprar o prédio por inteiro.

ATENÇÃO:

-Aos lojistas está vedada esta possibilidade de adquirirem a sua quota-parte arrendada para comércio, indústria, serviços, ou outros.
-Sobre pena de caducidade, o prazo de resposta por parte dos inquilinos habitacionais é de 30 dias.
-As comunicações entre senhorios e locatários é sempre feita por carta registada com aviso de recepção (a contar da data de recebimento).
-Na parte habitacional, para usufruir do direito o inquilino tem de garantir que a finalidade da compra é para habitação própria e não para outro fim qualquer, como arrendamento para estudantes, por exemplo.

Já percebeu? Ou nem por isso? Esta leitura é apenas uma chamada de atenção. O passo seguinte deve ser dado na direcção da consulta de um advogado.

Como há pouca informação na Internet sobre esta problemática, deixo uma minuta (carta-tipo) a ser utilizada por proprietários:


ASSUNTO: EXERCÍCIO DO DIREITO DE PREFERÊNCIA (APENAS PARA HABITAÇÃO)



Conforme já é do seu conhecimento, estão avançadas as negociações para venda do prédio em propriedade vertical, inscrito com o artigo matricial …………, situado em………………….....em que V. Ex.ª é inquilino do segundo-andar.
De acordo com o Código Civil Português, artigos 1091º, 416º e 417º, e alterado pela Lei 64/2018, de 29 de Outubro, pode exercer o direito de preferência para todo o edifício ou apenas para o locado que ocupa contratualmente.
O valor atribuído por permilagem à fracção correspondente ao andar, em que V. Ex.ª é digno arrendatário, é de ………………......€, digo, …………………………………………..
Mais digo que o valor atribuído ao primeiro-andar é de………………€, digo, ……………………………… ......................................................................................................
Mais informo que o valor total para todo o edifício, respectivamente, rés-do-chão, primeiro-andar, segundo-andar, é de ………………..€, digo, ………………………….........
Com os melhores cumprimentos.


Coimbra, ….. de …………. de 2019


O Proprietário:


NOTA DE RODAPÉ:



Esta Lei 64/2018, a 29 de Outubro de 2018, segundo o Ekonomista, foi aprovado a 21 de setembro de 2018 pela Assembleia da República, com votos contra de PSD e CDS-PP e a favor de PS, BE, PCP, PEV e PAN. (Depois de uma segunda alternativa) O novo diploma foi promulgado pelo Presidente da República a 12 de outubro de 2018, depois da primeira versão ter merecido o veto presidencial.”
Segundo julgo saber, o PSD pediu a fiscalização sucessiva de constitucionalidade da lei ao Tribunal Constitucional. De grosso modo, pode verificar-se que os comerciantes, sendo parte integrante de um leque de arrendatários num prédio, comercial e habitacional, são discriminados em relação aos seus congéneres com contratos para habitação.
Por outro lado, dá para ver que basta um inquilino (habitacional) expressar o seu interesse na sua fracção para imediatamente o pré-contrato de venda se extinguir por parte do promitente comprador. Ou seja, com este diploma, foi criado um instrumento temporário de destruição para qualquer contrato patrimonial de compra e venda.
Por outro lado ainda, sendo esta lei aprovada apenas com os votos da esquerda, fica bem sublinhada a sua preocupação com o comércio de rua. Com esta sua posição, não deixam dúvidas sobre o que pensam sobre o comércio tradicional: pura e simplesmente, não conta nada para o desenvolvimento das cidades, vilas e aldeias.

E mais: está criado um sério imbróglio jurídico. Até onde vão dar as consequências desta lei? Não se sabe! Vale a pena ler esta crónica publicada na página da Ordem dos Advogados (antes de ser promulgada pelo Presidente da República).