(Imagem de Leonardo Braga Pinheiro)
FACTOS:
Em
quarenta e cinco anos de eleições para o poder local (1976-2021), a
Câmara Municipal da Mealhada foi “apenas” conquistada
duas vezes pelo PSD, em 1979 e 1985 – no primeiro mandato, em
coligação com o CDS/PP, Centro Democrático Social, e PPM, Partido
Popular Monárquico. Nos restantes 10 mandatos autárquicos o PS
ganhou sempre com maioria absoluta.
RESSALVA
Esta
crónica, sem ter a veleidade de ser confundida com análise
científica, a ter alguma razão para ser escrita, tem somente uma
ideia de, ao esmiuçar factos históricos, contribuir para ajudar a
clarificar um fenómeno, que certamente não sendo único no país,
não deixa de constituir um certo mistério.
E
porquê o PSD? Interrogou um membro, leitor, aquando do lançamento
tema para discussão no grupo “Mealhadenses que Amam a sua Terra”, no Facebook.
Respondendo
objectivamente, adianto que, no oposto, poderia colocar a questão ao
contrário e interrogar o porquê de, ao longo de mais de quatro
décadas, os Socialistas terem tanto sucesso. Poderia, mas, do ponto
de vista jornalístico, ressalta muito mais o insucesso dos
Sociais-democratas.
Se
no princípio era o verbo, devemos começar pela democracia, pelas
primeiras eleições locais para o Executivo, em 1976, para a
Assembleia Municipal e para as Juntas de Freguesia, depois do 25 de
Abril de 1974.
Por
falta de tempo – e se calhar, para o caso, nem é muito importante
– vou debruçar-me simplesmente sobre as eleições para a Câmara
(executivo).
COMECEMOS,
ENTÃO, PELO PRINCÍPIO
Pegando
no historial do PS/Mealhada:
Em
1976 o PS local estreou-se logo com uma maioria absoluta.
Em
1979, com o PSD a concorrer em coligação (AD), o PS veria fugir-lhe
a vitória para os Sá-Carneiristas. Estes viriam a conseguir a sua
primeira maioria absoluta.
Em
1982 o PS recuperaria novamente a liderança com maioria.
Em
1985, com o PS a sair derrotado, o PSD, concorrendo sozinho,
recuperaria a maioria absoluta.
Em
1989 o PS recuperaria novamente a edilidade com maioria.
Em
1993, com uns retumbantes 55 por cento, o PS repetiu a façanha.
Em
1997, com cerca de 54 por cento, o PS continuava de pedra e cal no
Executivo.
Em
2001, com cerca de 43 por cento, continuava a acenar com o lencinho
ao maior partido da oposição.
Em
2005, com cerca de 50 por cento, o partido liderado por José
Sócrates continuava de pedra e cal na terra do leitão.
Em
2009, com o PS local a eleger cinco vereadores numa possibilidade de
sete, lá longe, Sócrates dava saltos de contente.
2013,
com o PSD a concorrer em coligação, o PS viria a obter cerca de 47
por cento e a eleger quatro vereadores contra três da coligação
“Juntos Pela Mealhada”.
Em
2017, mais uma vez o PS sairia vencedor com cerca de 48 por cento,
elegendo quatro representantes contra três da coligação “Juntos
pelo concelho da Mealhada”.
PARTIDOS
À ESQUERDA QUEM VOS VÊ NA BANCADA?
Em
1976 começaram por concorrer à Câmara o MRRP e a FEPU, Frente
Eleitoral Povo Unido, uma coligação liderada pelo PCP e outras
agremiações à sua esquerda. Juntos, sem elegerem representantes,
conseguiram cerca de dez por cento do eleitorado.
Em
1979 a APU, Aliança Povo Unido, teve um resultado de cerca de 12 por
cento. Elegeu um vereador.
Em1982
a APU, elegendo um representante, obteve um resultado de cerca de
dezanove por cento do eleitorado. E o PCPT/MRPP teve menos de meio
ponto.
Em
1985 a APU, novamente elegendo um vereador, voltou a obter cerca de
dezanove por cento. O MRRPP já não concorreu.
Em
1989 o PCP-PEV (CDU) teve cerca de seis por cento.
Em
1993 o PCP-PEV (CDU) conseguiu cerca de quatro por cento.
O
PSN, Partido da Solidariedade Nacional, ligado aos aposentados, viria
a contar com 1.75%.
Em
1997 o PCP-PEV (CDU) teve 6.11%.
Em
2001 o PCP-PEV (CDU) conseguiu cerca de quatro por cento.
Como
curiosidade, neste ano, um grupo de cidadãos concorreu à Câmara e
conseguiu um resultado de cerca de vinte por cento e eleger um
vereador.
Em
2005 a CDU teve cerca de oito por cento nas urnas.
Em
2009 a CDU conseguiu cerca de sete por cento.
Em
2013 a CDU teve cerca de oito por cento.
Em
2017 a CDU teve 6.5%, muito atrás do Bloco de Esquerda, que obteve
6.66%.
O
CENTRO-DIREITA A SUMIR-SE NO HORIZONTE
Em
1976 o CDS obteve um resultado para a Câmara de 9.22%.
Em
1979 e 1985 concorreu em aliança com o PSD.
Em
1989 o CDS desapareceu em combate.
Em
1983 teve um resultado de 1.83%.
Em
1997 teve 2.68%
Em
2001 desapareceu.
Em
2005 teve 1.22%.
Em
2009 desapareceu nas trevas.
Em
2013 desapareceu nas trovas do vento.
Em
2017 continua-se à procura no concelho onde pára o CDS.
A
ABSTENÇÃO COMO FONTE DE REFLEXÃO
Em
1976 a Abstenção foi de 45.36%.
Nos
anos seguintes, até 1997, foi descendo para a ordem dos trinta por
cento.
Em
1997 foi de cerca de quarenta e três por cento.
Em
2001 foi de cerca de trinta e oito por cento.
Em
2005 a Abstenção foi de cerca de quarenta e dois por cento.
Em
2009 foi de cerca de quarenta e três por cento.
Em
2013 foi de cerca de quarenta e nove por cento.
Em
2017 a Abstenção foi de cerca quarenta e nove por cento.
VOTOS
BRANCOS CONTAM?
Em
1976 os eleitores do voto em branco alcançou uma percentagem de
2.47%
Ate
1997 o número de brancos, em queda, manteve-se estável.
Em
1997 a percentagem de brancos foi de 3.12%
Em
2001 foi de 1,95%.
Em
2005 foi de 3.75%.
Em
2009 foi de 2.92%.
Em
2013 foi de 4.41%.
Em
2017 a percentagem de votos brancos foi de 4.19%.
CONCLUSÃO
NÃO CONCLUSIVA
Dá
para apreender que o concelho da Mealhada, que elege sete vereadores para o executivo, na política não anda bem
de saúde. Seguindo o rotativismo entre o PSD e o PS, sendo igual ao que se passa
na política executiva nacional mas que dá hipótese a outras forças
políticas de respirarem, nas terras mealhadenses os partidos pequenos não conseguem
furar o bloqueio e, com esta não-inscrição, contribui fortemente para o seu desaparecimento. Só para exemplificar, basta ver que para além
dos dois grandes partidos, PS e PSD, só a APU elegeu um
deputado nos anos de 1979, 1982 e 1985. E também o movimento cívico,
em 2001, conseguiu eleger um representante.
Ou
seja, em quarenta e cinco anos de democracia, só em quatro mandatos
partidos fora do arco do poder conseguiram eleger.
E
isto é grave? A meu ver, que pouco percebo de política, por distorcer as forças em confronto e impedir alianças à esquerda e à direita, acabando por favorecer o partido mais votado, do ponto de vista da alternância, é
gravíssimo.
MAS,
E CULPADOS HÁ?
Salvo
melhor opinião mais avalizada, o Método de Hondt, fórmula
matemática destinada a calcular a distribuição de mandatos
proporcionalmente ao número de votos, será
porventura o factor maior que está
a deteriorar
fortemente
a diversidade partidária
neste concelho.
A
seguir vem a abstenção, esse enorme monstro que tanto preocupa os
políticos, mas só em tempos de eleições. Depois de eleitos, em quatro anos de mandato,
durante três todos a esquecem e convivem alegremente com a falta de
comparência de eleitores às urnas. No ano que falta para o
sufrágio, como sempre vamos ouvir o apelo ao voto , desde o
Presidente da República até ao deputado mais apagado do Parlamento.
Nas últimas décadas, nem o maestro máximo da Nação, nem qualquer
político com assento numa câmara perdeu tempo a pensar como se
ultrapassa o fenómeno da abstenção. Não sabem porque não querem.
Vejam o exemplo dos presidentes de junta e aprendam. Estes homens do
povo, na maioria simples e sem canudos, estão sempre ao lado de quem os elegeu – claro que há execepções na Mealhada, mas isto
também acontece em todo o lado.
Costumo
comparar muito a abstenção nas eleições com a crise que alastra
na imprensa local. A abstenção não é um fim em si mesmo. É um
meio para demonstrar a revolta, o abandono a que foram votadas as
populações. A não comparência nas urnas é um subproduto da não
ligação existente entre os eleitos e os eleitores, do desprezo, pela
altivez e soberba presunçosa com que são tratados os cidadãos.
A
imprensa local, de igual modo à política, perdeu a proximidade. Os
periódicos, praticamente sem excepção, em vez de escreverem sobre
os problemas políticos
da sua zona, sem difundirem o que se passa nas
ruas da cidade, as
dificuldades das povoações em redor, falam de outros concelhos e de
notícias distribuídas pelas agências noticiosas. E o mais grave é
que estão a contribuir para a iliteracia e o analfabetismo social.
Como é que querem, assim, vender jornais?
Como
é que os políticos autárquicos, sem passarem cavaco aos munícipes
querem captar o seu voto?
Vale
a pena pensar nisto?