LEIA AQUI O DESPERTAR DESTA SEMANA
Para além do texto "A BAIXA VAI PARA A CAMA COM AS GALINHAS", deixo também as crónicas "A OURIVESARIA COSTA SOPROU 76 VELAS"; "PARABÉNS À CRISTINA"; e "REFLEXÃO: IKEA GATO"
A BAIXA VAI PARA A CAMA COM AS GALINHAS
São 21h30 de quarta-feira da
semana passada. As Ruas da Louça, Corvo, Eduardo Coelho e Padeiras estão
desertas de vivalmas. Na Praça do Comércio, os restaurantes “A Taberninha” e ao
lado o “Praça Velha” estão vazios de clientes. Na esplanada deste reputado café,
Vitor Silva, o gerente, conversa com o “Zé” Neto, do estabelecimento com o
mesmo nome ali ao lado na Rua das Azeiteiras, que está de mãos nos bolsos, como
se esperasse clientes vindos do infinito. Na Rua Adelino Veiga, no Restaurante
Paço do Conde, o Alfredo prepara-se para mandar tocar o clarim para “destroçar”
o pessoal. Ao lado, no antigo Saul Morgado, o “Be Fado” prepara-se para iniciar
uma sessão de fados. No salão superior cerca de uma dúzia de frequentadores preparam-se
para ouvir um espetáculo que só por sorte dará para as despesas afetas.
Volto atrás e sigo em direção às
Escadas do Gato. O restaurante junto à igreja de São Bartolomeu está a
encerrar. Mais à frente, os três da Rua de Sargento-mor a mesma coisa. O “Aeminum”,
pelos poucos comensais, aparentemente, prepara-se também para dar por terminada
a sua faina laboriosa. Subo até ao Largo da Portagem. Nesta praça, do alto do
seu pedestal, Joaquim António de Aguiar, como faroleiro, verifica que os cafés
Montanha, Briosa, Toledo, e gelataria Itália estão todos já com as esplanadas
recolhidas e prontos a bater em retirada. Entro n’A Brasileira e tomo um café
acompanhado por dois clientes na mesa ao lado. O Mário, o gerente, está a recolher
a ementa que faz sentinela à porta e comenta comigo que dentro de meia hora vai
fechar. Não há pessoas e, pelos elevados custos, não dá. Saio e sigo em frente.
As Ruas Ferreira Borges e Visconde da Luz estão praticamente vazias de
transeuntes. Estas artérias estão despovoadas de gente e nem o facto de estar
um tempo outonal, com algum frio e a prometer chuva pode explicar esta total deserção.
A Praça 8 de Maio, com o Café Santa Cruz encerrado esta semana para manutenção,
parece o largo da minha aldeia. Nem um cão ladra, nem um gato mia. Os
estabelecimentos em redor ou estão prestes a encerrar, como é o caso do
Restaurante Carmina de Matos e do “Indiano”, na entrada da Rua do Corvo, ou
estão já fechados.
Já escrevi vários textos sobre
esta Baixa que puxa os lençóis e abre a cama às 19h00 e vai deitar-se nela às
22h00, como as galinhas. Isto não pode continuar. É a falência total dos poucos
estabelecimentos de hotelaria que vão resistindo. Não se pode entender que a
zona da Sé Velha e a Praça da República tenham excesso de pessoas noctívagas, a
ponto de serem gerados conflitos com os residentes, e esta zona velha e
histórica esteja completamente entregue aos pombos a dormirem nos beirais.
Alguma coisa, com urgência, terá de ser feita. E a meu ver, perante esta
catástrofe anunciada, a edilidade deveria meter mãos à obra. Em face do
desastre que se prevê, a Câmara Municipal não pode ser apenas uma entidade que
serve para licenciar novos investimentos na cidade e nos seus arredores, e sem
levar em conta a sobrevivência dos instalados há décadas e que contribuem para
a vida intestina da urbe. A autarquia tem uma responsabilidade sobre os ombros
redobrada, e o que se nota é que continua a assobiar para o lado como se nada
se passasse mesmo nas suas barbas. O Paço do Concelho não pode continuar a ser
apenas uma espécie de quarto onde, durante umas horas, se vai despejar os egos
de todos os espíritos arrebanhados. Não pode. Não deve. É impossível o
executivo e a oposição e até a Assembleia Municipal continuarem a ignorar o que
está acontecer na Baixa. Estamos perante uma mortandade comercial e, sabe-se lá
por quê, ninguém se importa. São precisas medidas políticas de fundo para esta
zona de antanho. É difícil de ver? É necessário fazer um desenho? Quantas
tertúlias sobre esta parte histórica serão precisas fazer mais para o poder da
Praça 8 de Maio acordar da letargia em que está invernado?
A OURIVESARIA COSTA SOPROU 76 VELAS
José da Costa fala orgulhoso da
sua “menina” ourivesaria. E não é para menos, nos dias que correm, comemorar 76
anos de atividade comercial é um feito extraordinário. Nos tempos que se
aproximam para o comércio de rua, dito tradicional, em vez desta longevidade
exemplar, espera-se um abrir e fechar de lojas como o pestanejar de um olhar.
Será uma espécie de “usar e deitar fora”. Experimenta-se o negócio durante uns
meses e, passado o prazo da ilusão, é mais um que não deixa história.
É por isso mesmo que o “senhor
José da Costa”, como é cumprimentado com carinho e como sempre foram tratados os
obreiros do comércio nesta Baixa, está tão feliz. Soprar as velas da sua loja,
para ele, é o mesmo que assinalar o seu próprio aniversário. Porque é tão forte
a ligação de amor platónico que os une que é impossível dissociar homem e
estabelecimento. Quando o vemos caminhar na Rua Ferreira Borges, imediatamente
o associamos à sua amada ourivesaria. Em metáfora, em símbolo, ele é o
timoneiro de uma traineira encantada que atualmente navega num oceano revolto
de incongruências, injustiças e falta de respeito por quem tanto deu ao
desenvolvimento da cidade. Este grande comerciante, de 69 anos de idade, faz
parte de uma narrativa profissional que está a chegar ao fim do seu ciclo. Não
terá continuidade, pelo menos como sempre a conhecemos. E, pelas rugas de
preocupação, José da Costa sabe isso. Ninguém mais como ele, com o mesmo
empenho e entrega à causa mercantil, voltará a ser presidente da ACIC,
Associação Comercial e Industrial de Coimbra, e receberá uma medalha de prata
do município pelos relevantes serviços prestados. Parabéns aos dois: à Ourivesaria
Costa e ao seu mentor.
PARABÉNS À CRISTINA
Este fim-de-semana, último, a Rua
Eduardo Coelho esteve em festa. Na sapataria Teresinha houve beijinhos e
abraços e até um grande “bouquet” de flores deu à estampa na rotina dos
sapateiros. E o caso não era para menos é que a Cristina Loureiro, a musa
encantada daquele reputado estabelecimento, e tantas vezes confundida como
patroa uma vez que ela é o rosto simpático que desde há 16 anos marca os dias,
comemorou mais um aniversário de umas dezenas de primaveras. Quantas foram? Isso,
só ela sabe. O melhor mesmo é irem interroga-la pessoalmente. Se não fosse cá
por coisas aventava que andará pela “ternura dos 40”.
REFLEXÃO: IKEA GATO
A semana passada, quase
sub-repticiamente, o executivo municipal aprovou por unanimidade um pedido de
informação prévia apresentado pela sociedade IKEA no planalto de Santa Clara,
junto ao Fórum Coimbra, com uma área bruta de construção de 24 mil metros quadrados,
uma grande superfície direcionada para mobiliário e decoração.
Segundo o semanário Campeão das
Províncias, o único jornal da cidade a noticiar a viabilidade deste acto de
licenciamento, “A aprovação do pedido ocorreu mediante proposta do vereador
Paulo Leitão, com base num parecer subscrito pelo diretor de urbanismo e pelo
diretor do Departamento de Gestão Urbanística e Renovação Urbana (DGURU). O
titular da Direção Municipal de Administração do Território, António Cardoso, e
o diretor do DGURU, Luís Leal, advertem que a multinacional de origem sueca
deve dar garantia de concretização do denominado nó do planalto de Santa Clara
(ligação à variante ao IC2 a Poente da cidade) até à emissão do alvará de
licença de construção da referida loja.”
Perante este deferimento de
instalação de uma nova grande superfície comercial, quando a oferta está há
muito esgotada e a procura em queda livre, várias questões se levantam.
Aleatoriamente, nesta altura de tão grave crise no consumo, poderemos
interrogar o que faz mover esta sociedade internacional para um investimento
tão elevado? Será apenas a venda de bens, ou terá outros projetos imobiliários
em mente?
Outra interpelação ainda: como é
possível que, perante o estado decrépito do tecido comercial, executivo e
oposição, sem ouvirem as entidades representativas dos comerciantes, tenham
votado em bloco e em unanimidade? Não são estes senhores eleitos e candidatos
futuros que apregoam a salvação da Baixa? Já agora, para que serve a ACIC,
Associação Comercial e Industrial, na cidade?
Perante o desprezo manifestado
pelos órgãos eleitos camarários, para com os milhares de famílias que tentam
sobreviver a comprar e a vender no concelho de Coimbra, não se deveria pensar
em concorrer com uma lista independente que defendesse os comerciantes?
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