“Talvez
o termo “abatido” não seja o correcto,
encontrei
um homem cansado de lutar contra
a
displicência, o amorfismo, o deixa-correr que
atravessa
toda esta parte baixa da cidade.
Como
eu entendo! Sinto o mesmo!
Por
conseguinte, tal como lhe disse, vou também embora.”
Subitamente
o anúncio triste deu à estampa no Facebook: “Venho
por este meio anunciar o encerramento das portas da minha livraria
sito no Adro (baixa de Coimbra) a partir de 31 de Março, portas
estas que, ao longo de três espaços comerciais, permitiram
actividade livresca desde 1994. Passarei a partir desta data a actuar
comercialmente com propostas livreiras descritas na minha livraria
profissional on-line www.livro-antigo.com e também com participação
nas Feiras do Livro para as quais for convidado.”
Depois
de mais de vinte anos a servir Coimbra com espaço físico, o Miguel
Carvalho, um dos mais importantes livreiros a nível nacional, com um
acervo digno de uma grande cidade capital, vai encerrar a sua loja no
Adro de Cima, por trás da Igreja de São Bartolomeu e junto à Praça
do Comércio. Depois da livraria Coimbra Editora, depois da livraria 115, depois da livraria Casa do Castelo restam apenas duas casas a
venderem livros novos na Baixa. Até quando?
Fui
falar com o Miguel. Com a frente do estabelecimento pejado de carros
-aliás, toda a Baixa está transformada num enorme estacionamento
caótico-, encontrei-o um pouco abatido. Talvez o termo “abatido”
não seja o correcto, encontrei um homem cansado de lutar contra a
displicência, o amorfismo, o deixa-correr que atravessa toda esta
parte baixa da cidade. Como eu entendo! Sinto o mesmo! Por
conseguinte, tal como lhe disse, vou também embora.
Quando
quem, nas penúltimas e últimas eleições autárquicas, foi eleito
para proteger e pensar a cidade no desenvolvimento harmónico das
suas actividades, comerciais, serviços, industriais, prometendo uma
nova dinâmica e regeneração, no caso a maioria socialista na
Câmara Municipal, não quer saber e abandona à sua sorte uma zona
histórica tão rica em monumentalidade recentemente classificada
pela UNESCO como Património Mundial ao deus dirá, só resta aos
intervenientes desistirem de lutar. É que o comércio, para quem não
sabe, é uma actividade que visa o lucro e só se realiza na sua
plenitude havendo gente e dinheiro a circular. Se a Baixa da cidade
sofre de uma desertificação acelerada de pessoas como nunca se
viu, quem espera milagres? É óbvio que, com a postura municipal,
mais estabelecimentos fecharão portas.
Resta-me
a esperança, se calhar vã, deste presidente da autarquia, Manuel
Machado, conforme se consta por aqui, partir para um cargo político
importante e ser substituído por alguém com mais visão política e
cidadã. Vá, Machado! Mas vá depressa, que não deixa saudades!
Na
sua página do Facebook, Miguel Carvalho agradece a todos quantos
colaboraram com o seu negócio, “quero
agradecer a todos os clientes (bons porque nunca me ficaram a dever
dinheiro) e amigos/as que desde 1994 me apoiaram nesta nobre
actividade de livreiro na cidade de Coimbra. Um grande bem haja
também, e muito especial com imenso carinho, a todos os poetas,
escritores, pintores, fotógrafos, editores, académicos, críticos,
investigadores, etc, que nestas instalações assim como nas
anteriores da Rua Ferreira Borges, realizaram apresentações,
mostras, leituras, reuniões e tertúlias partilhando presencialmente
com o público a suas paixões, as suas propostas e as suas visões.”
Da
mesma forma, porque conheço o Miguel há mais de vinte anos e
reconheço nele qualidades ímpares de generosidade e sã camaradagem
-coisa rara nos nossos dias-, em nome da Baixa, se posso escrever
assim, e em meu nome pessoal, o nosso muito
obrigado. Uma grande salva de palmas!
6 comentários:
Subscrevo.
Palmas para o Miguel, para o que construiu e as amizades que soube, como poucos, honrar.
Não sei como vai ser dada volta a esta situação que vai desertificando comercialmente a Baixa com encerramentos a ritmo cada vez maior(se é que ainda resta algum com verdadeiro interesse...)O mal é profundo e quem devia tomar decisões concretas não as toma porque o que há a fazer não passa por meros remendos ...mas sim por uma discussão alargada a todas as forças vivas da cidade e não só, donde saiam medidas de fundo realistas.Ou então nada fazendo ficaremos apenas com uma cidade virada para o Turismo Univeritario e Monumental...e com os "eucaliptos comerciais" a cercar a cidade até se ramificarem para o seu coração,secando secando uma bela cidade!
Que pena, aos poucos e poucos se destrói o que tínhamos de bom em Coimbra. A cultura nunca foi tão maltratada e Coimbra nunca foi tão desprezada. Lástima!!
Que pena, aos poucos e poucos se destrói o que tínhamos de bom em Coimbra. A cultura nunca foi tão maltratada e Coimbra nunca foi tão desprezada. Lástima!!
Só uma referência à hipotética substituição de MM, se sair o n.º 1 assume o n.º 2. Acha que há diferenças?
Pois, vã esperança essa...
...será, para mim, sem dúvida, uma das grandes tristezas de 2018 - sim, eu sei, ele e eu, continuaremos a ser AMIGOS, mas...quando me "vejo" / quando o "vejo" há mais de 20 anos na Rua de Tomar com o seu primeiro espaço, sinceramente, hoje, as lágrimas afloram...
Enviar um comentário