sábado, 10 de março de 2018

A CASA COELHO COMEMOROU 85 ANOS






O estabelecimento de que vamos falar, como sói dizer-se, antes de o ser já o era. A sua existência como espaço mercantil na Rua do Corvo, em Coimbra, entrará nos anais da história comercial da cidade muito antes do século XX. Mas como a memória não escrita é passível de se esboroar pelo esquecimento teremos de nos submeter aos registos. O que se sabe é que em 1932 Joaquim Marques Cordeiro era proprietário de uma loja de tecidos a metro na Rua do Corvo, com os números de polícia 18, 20 e 22. Pode aventar-se que, provavelmente, o nome do estabelecimento teria a ver com o apelido do dono, ou seja, “Cordeiro”.
Sabe-se também que neste ano de 1932, em que, no exílio próximo de Londres, faleceu D. Manuel II, o Patriota ou o Desaventurado, o último Rei de Portugal e dos Algarves, o lojista Joaquim Cordeiro tinha um empregado de nome Joaquim Coelho e que, por escritura pública lavrada em cartório, o primeiro cede ao segundo a continuação do negócio. É este agora empossado mercador que vai passar a ostentar na frontaria do edifício um painel de madeira com letras pintadas a negro: Casa Coelho.
Em finais de 1960, esta casa conhecida em Portugal e além-fronteiras, com oito funcionários, era já reputada pelos seus artigos de qualidade superior e muita variedade para escolha dos seus clientes. Na Baixa da cidade dos estudantes, que por esta altura era o centro do centro do país na actividade comercial, detinha somente um rival: o José Novais, no Largo da Portagem. Os seus activos em inventário, as suas existências de bens em stock, entre centenas de peças de tecidos e milhentos artigos para o lar, era absolutamente fora do comum e, com a loja no rés-do-chão, prolongava-se em direcção ao Céu, ao longo de quatro andares do prédio onde decidiu continuar a sua história mercantil.
Em 1971, não se adivinhando completamente as motivações, sabe-se que Joaquim Coelho e a sua amada esposa Zilda, ambos gerentes do estabelecimento e responsáveis por oito empregados ao seu serviço, decidiram contratar mais um caixeiro, um profissional aprumado e formado na escola da vida comercial, de nome Manuel António Mendes de Abreu. A laborar desde criança para fazer face à pobreza familiar e da época, Mendes Abreu, rapaz franzino, ágil e de olhos vivos, começara a trabalhar com 11 anos, como marçano, na loja Carlos Lopes, nas Escadas do Cego, junto à Praça do Comércio. Quando as borbulhas da adolescência irrompiam no seu rosto vivaço, com 15 anos, mudou-se para a Casa de Tecidos Viriato, ao fundo das Escadas do Gato, hoje a retrosaria Ziguezague.
Então, depois de década e meia na Casa Viriato, na altura com 31 anos, sem o saber, António Abreu iria ser a pedra-de-toque, o padrão que vai determinar a pureza de uma jóia preciosa que se haveria de perpetuar no infinito do tempo.

ANTES E DEPOIS

Sem abusar das suposições, é de calcular que o grande comerciante e a mulher, depois de obtidas exaustivas informações, teriam visto no jovem balconista qualidades ímpares que não vislumbravam no pessoal ao seu serviço. Será também de acreditar que, neste ano de 1971, Joaquim Coelho e dona Zilda, ambos já com idade acentuada, se sentiriam bastante cansados e, imaginamos, que precisavam de alguém que passasse a ser o seu braço-direito para se desligarem mais da azáfama diária da compra e venda.
A verdade é que a entrada do novo funcionário teria tido o mesmo efeito de um pedregulho arremessado para um lago de águas paradas. Se até aí o remanso de poeira tinha assentado arraiais nas centenas de peças de tecido a metro que não eram vistoriadas há décadas no edifício da Casa Coelho, a partir daí, com a agitação a tomar todo o espaço, expulsando o pó, tudo foi trocado de lugar, cortadas amostras do pano, feitos cortes por medida para fatos de homem e saias para mulher, e com actualização de preços. Com a filosofia “imposta” por António Abreu de que, a todo o custo até à inevitabilidade, era preciso vender o que havia em casa e evitar comprar mais para amontoar, em dois anos o casal Coelho, constituído por Joaquim e Zilda, financeiramente, viram a sorte sorrir-lhes.
Em 1973, dois anos depois de ter entrado para a firma, em reconhecimento pela revolução silenciosa e entrega à causa esforçada, como prova de mérito e reconhecimento, os cônjuges Coelho atribuiram graciosamente a António Abreu uma quota de vinte por centos nos lucros da casa.
Em 1982, no Dia do Empresário, a ACIC, Associação Comercial e Industrial de Coimbra, já desaparecida, homenageou a empresa Joaquim Coelho, Lda com uma placa comemorativa da efeméride.
Em 1983 faleceu o velho amigo e patrão Joaquim Coelho. Com o comércio de rua, dito tradicional, a decorrer em pleno apesar da grave crise, económica e financeira, que o país atravessava e que levou à intervenção do FMI, Fundo Monetário Internacional, a intervir, Manuel António de Abreu Mendes adquiriu a totalidade das quotas. Poupado, cumpridor e disciplinado, com a sorte a cumprir a sua parte, em poucos anos, alargando para os lados, a empresa cresceu e tornou-se numa referência a nível nacional e internacional. Em 1995 tinha 12 pessoas ao serviço.
Hoje, com quatro funcionários, na confecção e venda de modelos de grandes marcas ligadas a vestidos de noiva e na oferta de um vasto catálogo de vaporosos tecidos a metro, a empresa familiar está de boa saúde e recomenda-se. Na Rua do Corvo onde sempre esteve e irá continuar por muitos e bons anos, em Coimbra, a Casa Coelho é muito mais que uma marca consagrada, é uma instituição.
Em nome da Baixa, se se pode escrever assim, longa vida e uma grande salva de palmas para toda a família Abreu!





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