quarta-feira, 21 de março de 2018

EDITORIAL: UMA CÂMARA COM PAREDES PROTECTORAS DE VIDRO

(Imagem de Leonardo Braga Pinheiro)




Quero aqui apresentar um problema que tem vindo
a agravar-se no tempo e que se situa no Ribeiro da
Póvoa, S. Martinho do Bispo, mais concretamente
na interseção da Rua Fonte da Preguiça com a Rua
do Lagar e Rua Adelino Batista, sem que tenha havido
qualquer tipo de intervenção por parte dos sucessivos
responsáveis locais.
(Extracto do comunicado de José Manuel Silva. Pode ler mais aqui)


Mais uma vez José Manuel Silva, vereador sem pelouro do movimento “Somos Coimbra”, recorreu às redes sociais, nomeadamente ao Facebook, para que os eleitores conimbricenses tomem conhecimento de uma proposta apresentada pelo movimento na última reunião do executivo, na segunda-feira 19. Por parte da imprensa diária, pelo menos eu não li nada, nem uma amostra do que se passou. Nada demove os periódicos da sua estaticidade.
O que nos deve chamar a atenção nesta comunicação de José Manuel Silva, representante e parte do bloco da oposição no Executivo camarário, é o facto da sua publicação funcionar com um grito de ajuda. Pelo mutismo imposto por “mordaça”, não sabemos se o assunto mereceu provimento pela vereação e teria sido motivo de discussão minuciosa. Como já vem sendo hábito, enquanto cidadãos, não sabemos nada! O que sabemos é que este silêncio atrofiante por parte dos jornais escritos em papel locais beneficia descaradamente o exercício do poder instituído. Embora indirectamente e sem poder ser criminalizado, o princípio da transparência da publicitação dos actos públicos está a ser beliscado. Bem sabemos que podemos sempre consultar as actas, mas quem faz isso? Se a imprensa publicada não dá relevância e a maioria com assento parlamentar nada faz para tornar público, está de ver, estamos a viver num viciado círculo fechado, estanque, onde só sobressai o que interessa à ordem instituída.
Como ressalva, declaro sobre palavra de honra que não fui nomeado defensor deste movimento e de outros partidos que compõem a oposição. O que me leva a manifestar opinião é ter noção de que enquanto sujeitos de direitos (e obrigações), deixando correr as coisas sem protesto, por um lado, estamos todos a ser coniventes com uma situação lesiva, por outro, estamos a contribuir para um situacionismo que tarda em alterar. O que estamos a assistir é demasiado gravoso e atentatório da vida política e social. Talvez seja por isto mesmo que cada vez mais o futebol é o rei das conversas de rua e a política a cortesã mal-vista de uma relação bilateral que devia ser incentivada.
Mas não é só o facto dos jornais não cumprirem a sua obrigação social que deveria fazer refletir o cidadão médio e mais ou menos informado, é também a conflituosa relação entre governo local e oposição que nos deveria deixar preocupados.
Quem segue a forma de actuar desta maioria socialista desde 2013, e relembra as queixas amiúde nesse distante mandato de quatro anos de José Ferreira da Silva, ex-vereador do movimento Cidadãos por Coimbra, facilmente chega à conclusão do que está por trás deste procedimento de José M. Silva. Ou seja, em especulação, parece que a tentativa de furar o cerco, a fuga para a frente do movimento “Somos Coimbra”, é, em metáfora, como um náufrago perdido no oceano a colocar os braços no ar, a mostrar que está vivo e a pedir auxílio. Como a oposição não é tratada com o respeito e a dignidade que merece, vê-se na necessidade de, para levar a sua mensagem aos conimbricenses, tentar furar todos os muros de silêncio imposto com o conluio de uma imprensa local que deixa muito a desejar.
Enquanto cidadão e munícipe que lê os jornais diários e parcialmente vai apreendendo o que se passa, sinto-me profundamente ferido com a manifesta falta de exercício democrático, isenção e independência e, acima de tudo, pela falta de formação cívica e humana, com laivos de autoritarismo, de certos eleitos que deveriam primar pelo respeito inter-pares.
Por notícias que se vão sabendo e lendo pela Baixa, muito baixinho para não causar mossa em contrabalanço entre o que se sabe e o que se desconhece, o panfletarismo apregoado em artigos de opinião na imprensa não passa de uma manobra de diversão. E como se fosse pouco, o clientelismo virulento continua a estender a mão.
Com franqueza, estou muito preocupado. Ou melhor, enquanto cidadão comum, sinto-me profundamente irritado. Coimbra, a nossa polis do conhecimento e da sabedoria, que deveria ser um exemplo de liberdade para o país, não merece ter certas pessoas tão limitadas, que numa pomposa arrogância parecem ter a pose do dono disto tudo, à frente do fórum que governa a cidade. Esquecem que foram eleitas para servir e não para se servirem do lugar que ocupam.
Nestes vinte dias que já leva este mês de Março, em torno da degradação da Baixa e do encerramento da livraria do meu amigo Miguel Carvalho, uma ou outra pessoa -nomeadamente Carlos Fiolhais-, poucas, colocaram o dedo no rasgão que dilacera a alma da cidade. A maioria prefere perder-se em choros de carpideira que não conduzem a nada nem mudam uma única pedra da calçada.
É preciso trazer para a rua, para a discussão pública, este sufoco democrático de que Coimbra sofre. Se é uma obrigação de toda a oposição denunciar o que está acontecer -e nem por isso se vêm grandes protestos-, não o é menos por parte dos cidadãos que compõem a base activa deste lugar milenar, mais antigo que o país.

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