sexta-feira, 25 de outubro de 2019

BAIXA: A ÚLTIMA CRÓNICA DO MALHADOR

(Imagem de Leonardo Braga Pinheiro)




Por em Fevereiro, deste ano, depois de estar devidamente inscrito para intervir na Reunião de Câmara Municipal e, abrupta e mal-educadamente, a raiar o enxovalho, ter sido impedido pelo presidente da Câmara Municipal, Manuel Machado, afirmei na sessão seguinte que, até me cansar, e os cidadãos passarem a serem respeitados, iria comparecer a todos os plenários subsequentes.
Durante oito meses fui ostracizado de várias formas. Desde a tentativa dos serviços do Gabinete de Apoio à Presidência tentarem obstaculizarem a minha comparência com o argumento de que não plasmei no requerimento de inscrição “Solicitar esclarecimentos”, até permanentes interrupções na minha explanação, incluindo ruído no microfone, por Machado, tudo foi feito para que a minha desistência fosse consumada.
Muitas vezes fui obrigado a engolir a minha frustração para não cair no exagero do insulto qualificado, que algumas vezes pressenti ser essa a intenção do meu interlocutor. Ali, na interpelação entre o cidadão e o presidente da edilidade, o cidadão, para além de se sentir pequenino, está em desvantagem.
Por um lado, é preciso muita segurança para não se ultrapassar as margens exigidas do decoro e poder entrar-se facilmente na ofensa a detentor de cargo político (artigo 184º do Código Penal), cuja pena mínima pode ser de 150 euros. Claro que os políticos abusam desta posição dominante e é aqui que o equilíbrio se torna difícil. Por outro, para se manter firme, o munícipe tem de ser acompanhado de uma forte convicção de missão. Por outro ainda, temos de se ler muito, estar a par do que se vai discutir e, sobretudo, conhecer a lei e os regulamentos que vamos invocar.
Muitas vezes me senti idiota. Fazendo de conta que não notava os olhares de “compaixão”, em especulação, assim no género: lá vem este outra vez. Coitado, não tem trabalho para fazer e vem para aqui chatear quem cá está!
Os meses iam passando e o atraso, senão habitual de mais de uma, duas, três horas depois do tempo regulamentar, e tudo continuava igual. Em cada intervenção, antes de entrar no assunto que me lá levou, dirigindo-me a Machado, fazia sempre uma ressalva: “como é hábito, passam duas horas depois do tempo prescrito, que é às 17h00, o senhor presidente teima em desrespeitar-me. Ao faltar-me ao respeito, por extrapolação, está a fazer o mesmo ao cidadão-comum em que, mesmo sem procuração, procuro representá-lo.
Esta introdução era calculada por mim, com intenção de, através de provocação, cansar o mayor da cidade. Como picado por abelha, o chefe da autarquia começava a revolver-se na cadeira e não tardava com as interrupções. E eu, numa espécie de verbalização para dominar a insegurança, lá proclamava: “não me interrompa, que depois fico nervoso e demoro muito mais tempo.
Os meses iam passando e eu sem ver uma porta que me permitisse sair com dignidade. Já tinha prometido a mim mesmo que iria até 2021, ano das próximas eleições, a menos que acontecesse um milagre, fenómeno que, pela reiterada teimosia e arrogância do presidente, não acreditava.
A oposição continuava passiva e serena. Para além de algumas palmadinhas suaves nas costas, acompanhadas de grande encómio assim no género “parabéns pela persistência”, mais nada fazia.
Foi então que na segunda sessão, ocorrida em 23 de Setembro, para além das minhas palavras sacramentais na introdução, fui mais duro. E perguntei se, com este reiterado comportamento, o presidente pretendia ficar na história como soberano forte, absolutista, por transformar os munícipes em estúpidos – no qual me incluo. Disse também que não gosto do trabalho da oposição acerca desta temática. Perante este continuado achincalhamento dos munícipes – por que eu ali, embora sem credencial para o efeito, represento o cidadão -, a oposição, ali na reunião, pouco se importando com quem está à espera de intervir, não demonstra suficiente revolta.
Foi a pedra de toque de toque para a oposição acordar da letargia e apresentar uma proposta conjunta, subscrita pelo PSD e movimento Somos Coimbra.
O resto já se sabe, nesta última sessão foi aprovada uma moção para que os munícipes sejam ouvidos impreterivelmente às 17h00. Em face disto, como se calcula, a minha missão terminou, pelo menos na comparência sistemática das reuniões. Claro que quando necessário lá estarei presente.
Pode todo o executivo, vereadores com e sem pelouro, dormirem descansados. Para já, livraram-se de uma grande melga.

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