(Imagem retirada da Internet)
Qualquer
presidente, para se aproximar dos cidadãos,
deveria
levar à prática a consideração individual e colectiva.
Como
amostra, pelo menos de seis em
seis meses, o Salão
Nobre
da Câmara Municipal deveria
ser aberto a todos quantos
desejassem
interpelar o presidente e todos os vereadores, com
e
sem pelouro. Numa espécie de
prestação de provas semestral,
num
bate-papo informal, sujeitando-se os eleitos a responder às
questões
suscitadas, mostrar ao povo que aquela é a casa de todos.”
Neste
último Domingo, li a
entrevista de Jordi Hereu,
ex-autarca de Barcelona e agora consultor de planeamento urbano, no
jornal Público. Enquanto lia
e treslia ia pensando no
que se passa na (minha) cidade dos
estudantes.
Sendo administrador
de um sítio virtual como a Página da Câmara Municipal de Coimbra (Não Oficial), esta função
que desempenho com grande empenho, tem-me proporcionado uma outra
auscultação sobre Coimbra, que se não funcionasse nesta qualidade não me aperceberia.
Levando
à letra os desabafos dos mais de sete mil membros,
de facto, Coimbra, o
nosso burgo, para além de ser cinzento, talvez sofra de défice de bairrismo (basta ver os comentários na
página virtual).
No entanto,
por estranho que pareça,
acontecem dois movimentos contrários. Um, é o dos jornais
publicados na cidade que, tentando contrariar a onda pessimista,
numa captação fotográfica inerte onde falta a crítica imparcial,
porque dizer bem tem um leque de recepção mais abrangente, e
logo interesseiro, acabam a
sobrevalorizar tudo exageradamente, sejam
actos públicos ou manifestações empresariais,
e concorrem para dar uma imagem falseada dos acontecimentos e
do que se pode esperar do lugar onde convivemos diariamente.
Outro, por parte da opinião publicada nas redes sociais, dá-se uma atenção
exagerada ao que corre mal e um foco diminuto ao que corre bem, com
uma crítica acintosa e destruidora.
Isto é, tal como se aflora no
artigo de Jordi Hereu,
ex-autarca de Barcelona, é
como se os conimbricenses andassem mal e
não se identificassem com o
sítio onde vivem. E, de facto, a meu ver, muitas pessoas,
demasiadas, andam de relações cortadas com a Lusa Atenas.
E A QUESTÃO É: PORQUÊ?
Comecemos
pelo positivo, é um lugar
calmo e que dá gozo habitar,
com gente que se respeita mutuamente, às vezes, até é solidária.
- embora, parece-me, a crise de 2012 veio arruinar e diminuir em
muito os laços dessa
fraternidade. É um cosmos
onde a criminalidade é pouco expressiva e o torna apetecível para
se criar família.
Tem uma malha urbana densa,
mais ou menos servida por uma rede de transportes colectivos que
facilitam a mobilidade, o que contribui para arrendar uma casa a
valores médios. Apesar de ter
o seu coração comercial doente, a Baixa, a cidade dos estudantes
detém uma oferta ao consumidor que faz inveja a muitas outras.
Embora o emprego seja precário,
incluindo os pequenos investidores no terciário do seu tecido
urbano, há sempre um lugar para mais um.
MAS, SE NAS GRANDES OPÇÕES É ASSIM, AFINAL, O QUE FALHA?
Falha
nas pequenas coisas. E
na comunicação política. Nos
pequenos detalhes,
em exemplo, apontemos o lixo abandonado em tudo quanto é artéria, urbana ou
rural. Coimbra, por falta de interesse político em resolver este
problema através de sanções, tem cidadãos pouco aprimorados e
desligados do seu espaço
envolvente. Tratam a cidade
como se o seu corpo fosse, como direito, para usar desalmadamente e, sem ponta de obrigação, não respeitar o bem público, que é de todos.
Ainda
nos pormenores, atentemos na segurança interna. Ainda há dias o Comandante distrital da PSP, Rui Moura, numa entrevista concedida ao Diário de Coimbra, em jeito de político
que defende que está tudo
muito bem,
aflorava, de bandeira desfraldada, que a cidade não tem valores
estatísticos de criminalidade relevantes. É verdade! Mas, na
prática, o que se constata? Que
a pequena transgressão, como não é participada, não chegando ao
conhecimento das autoridades, logo, não existe como dado. Mas, o transeunte convivendo com ela no dia-a-dia, com desconforto, sente gerar nele conflitos
vários, sobretudo insegurança e por considerar que a justiça não funciona e,
sobretudo, que os seus impostos não são canalizados para os fins
que deveriam ser.
No
dia a seguir a esta entrevista, constatei,
no meio da Rua Ferreira Borges,
à hora de almoço, um sem-abrigo, como se gozasse com todos os
passantes de ocasião, retirou
o pénis e, à vista de todos,
urinou em plena via. É grave?
Talvez não seja, mas cria o tal sentimento de que, por um lado, não
há polícia, por outro, que qualquer um, sem restrições, faz o que
quer.
Ainda
nessa mesma semana, numa rua estreita, um miúdo de 16 anos furtou um
objecto de cinco euros. Sem tentar desculpar o comerciante, mas sendo
justo, embora a sua reacção fosse desproporcionada, tem de se
compreender, e envolveu-se à chapada com
o puto. O que valeu, para que
tudo corresse pelo melhor, foi uns vizinhos se
envolverem e conseguirem apartá-los.
Ora,
está de ver que se nestas ruas houvesse policiamento de proximidade,
para além de se estar a contribuir para a prevenção e
aumentar um necessário clima de segurança,
evitava quadros terceiros-mundistas.
E NA COMUNICAÇÃO POLÍTICA?
Coimbra,
digo eu, após a revolução dos cravos, talvez desde Mendes
Silva (PS) e António Moreira (PSD), anos de 1979 a 1989, a cidade nunca mais teve presidentes de câmara que abraçassem
os cidadãos, ou, no mínimo,
que pareçam compreender as suas agruras.
Os chefes autárquicos que vieram a seguir – com uma pequena e
curta excepção para Barbosa de Melo, 2011/2013, que deixou marca
presencial de
humildade na Baixa – desde Manuel Machado (PS) a Carlos Encarnação (PSD), nunca cultivaram o relacionamento pessoal com os munícipes, a não ser em campanha eleitoral. A sua conduta, a
raiar a prepotência, a
grosseria e a superioridade
existencial, foi sempre de
afastamento e nunca se
aproximaram do citadino. Com
uma invisível barreira de vidro segregacionista, passou a ser entendido pelo
residente como “nós” e “eles”. É certo que esta visão social é transversal a toda a classe política nacional.
Mas, nas autarquias, sem quebrar este muro transparente, que não se vê mas se pressente, não há descentralização
ou regionalização que valha. Deve atacar-se
o meio, como princípio de
cimento relaccional,
e menos o finalizante. O final,
bom ou mau, será sempre o resultado dos instrumentos sociais aplicados na prática.
Qualquer
presidente, para se aproximar dos cidadãos, deveria
levar à prática a consideração individual e colectiva. Como
amostra, pelo menos de seis em
seis meses, o Salão Nobre da
Câmara Municipal deveria ser aberto a todos quantos desejassem
interpelar o presidente e todos os vereadores, com e sem pelouro.
Numa espécie de prestação de
provas semestral, num bate-papo
informal, sujeitando-se os eleitos a responder às questões
suscitadas, mostrar ao povo que aquela é a casa de todos.
Tomando atenção
ao presente, nem vale a pena
recordar o que foi a batalha para que o actual detentor do poder,
Manuel Machado, receba, por obrigação, os munícipes, cumprindo o
estabelecido no regulamento.
Por
outras palavras, a meu ver, este divórcio entre os conimbricenses e
a cidade assenta em muito em não se “amar” o seu líder.
Mas não é só uma questão de mal-amar. É também em reflexo de
promessas não cumpridas, obras faraónicas “não inscritas” para
ganharem eleições e mal aceites pelo prejuízo que causam aos autóctones -que, se
calhar, se não houvesse défice de comunicação, poderiam ser mais
bem acolhidas pelo geral.
E ainda mais: o
facto de, para deslocações presidenciais, se adquirirem automóveis
topo-de-gama, com valores de custo acima do rendimento do
trabalhador-médio. Volto a recordar Barbosa de Melo, que, no seu
movimento entre-muros, andava de Smart. O exemplo é tudo,
digo eu, que já sou velho.
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