quinta-feira, 10 de outubro de 2019

O NOVO POSITIVISMO POLÍTICO





Estão aí os ecos da imprensa internacional sobre a eleição de Joacine Moreira, em representação do partido Livre. E nem sempre lá fora com o tratamento de análise que o tema merece. Cá dentro, no país, olhando o sol através da peneira, é o costume.
Deixemo-nos de hipocrisias. O que está em causa não é o facto da investigadora do ISCTE ser gaga. Nada disso! O que se salienta é saber se um cidadão, homem ou mulher, que sofre de distúrbio de temporalização da fala pode concorrer a deputado, onde, como se sabe, a fluidez de palavras saídas em resultado de um pensamento claro é essencial à qualidade de tribuno.
Como se vê a igualdade de acesso ao cargo político não está em causa. Tal como a um qualquer “Zé Cabra” não lhe será vedada a possibilidade de concorrer a um Festival da Canção, ou até gravar um disco. Mas há uma diferença substancial: se no segundo caso, no candidato a cantante, há filtros para impedir a prossecução, já no primeiro caso, no acesso a deputado, em nome de uma falsa igualdade, porque está na moda entender que tudo descamba em racismo, desigualdade e discriminação, mesmo por incapacidade de desempenho, temos todos de gramar durante os próximos quatro anos. Está aberta a porta para, em próximos pleitos, um surdo-mudo ser candidato ao Parlamento.
O que estamos a assistir na política -só na política, salienta-se - é a um novo movimento positivista : independentemente da sua condição física, todos são iguais para concorrer e o resultado esperado é medido por uma única bitola -sem ter em conta as diferenças.
A meu ver, elevando a desigualdade notória a uma igualdade incomparável, que nunca será alcançável, o Partido Livre está a usar (e usou) a deficiência de desempenho como uma qualidade para sensibilizar o eleitorado. Ou seja, a meu ver, estamos perante um duplo abuso que, por um lado, visa desencadear a bondade e a compreensão forçada do colectivo, por outro, usando uma pessoa incapaz de executar com mestria uma função, sem olhar a meios para alcançar os fins.
Por outras palavras, porque é proibido criticar, temos de abafar a revolta de um caso que, estou em crer, ainda vai fazer correr muita tinta, implicitamente com grave prejuízo para Joacine Moreira.

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