Estão
aí os ecos da imprensa internacional sobre a eleição de Joacine
Moreira, em representação do partido Livre. E nem sempre lá fora
com o tratamento de análise que o tema merece. Cá dentro, no país,
olhando o sol através da peneira, é o costume.
Deixemo-nos de
hipocrisias. O que está em causa não é o facto da investigadora do
ISCTE ser gaga. Nada disso! O que se salienta é saber se um cidadão,
homem ou mulher, que sofre de distúrbio de temporalização da fala
pode concorrer a deputado, onde, como se sabe, a fluidez de palavras
saídas em resultado de um pensamento claro é essencial à qualidade
de tribuno.
Como se vê a
igualdade de acesso ao cargo político não está em causa. Tal como
a um qualquer “Zé Cabra” não lhe será vedada a possibilidade
de concorrer a um Festival da Canção, ou até gravar um disco. Mas
há uma diferença substancial: se no segundo caso, no candidato a
cantante, há filtros para impedir a prossecução, já no primeiro
caso, no acesso a deputado, em nome de uma falsa igualdade, porque
está na moda entender que tudo descamba em racismo, desigualdade e
discriminação, mesmo por incapacidade de desempenho, temos todos de
gramar durante os próximos quatro anos. Está aberta a porta para,
em próximos pleitos, um surdo-mudo ser candidato ao Parlamento.
O que estamos a
assistir na política -só na política, salienta-se - é a um novo
movimento positivista : independentemente da sua condição física,
todos são iguais para concorrer e o resultado esperado é medido por
uma única bitola -sem ter em conta as diferenças.
A meu ver, elevando
a desigualdade notória a uma igualdade incomparável, que nunca será
alcançável, o Partido Livre está a usar (e usou) a deficiência de
desempenho como uma qualidade para sensibilizar o eleitorado. Ou
seja, a meu ver, estamos perante um duplo abuso que, por um lado,
visa desencadear a bondade e a compreensão forçada do colectivo,
por outro, usando uma pessoa incapaz de executar com mestria uma
função, sem olhar a meios para alcançar os fins.
Por outras
palavras, porque é proibido criticar, temos de abafar a revolta de
um caso que, estou em crer, ainda vai fazer correr muita tinta,
implicitamente com grave prejuízo para Joacine Moreira.
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