domingo, 12 de julho de 2015

AS SENTINAS PORCALHONAS DA FEIRA POPULAR

(Foto do blogue Denúncia Coimbrã)



Já passaram vinte e cinco anos. Foi em 1990. Conjuntamente com um grupo de jovens –embora eu já trintão na altura- fiz parte dos primeiros alunos do ITAP, Instituto Técnico e Artístico Profissional de Coimbra. Este projecto criativo saiu de uma aliança entre a ACIC, Associação Comercial e Industrial de Coimbra, e a Câmara Municipal de Coimbra e funcionou, nos primeiros anos, junto à Auto Industrial, no primeiro-andar e por cima de um stand de automóveis. Tinha um leque de professores excelentes. Infelizmente esqueci o nome da maioria deles e só recordo dois, que me impressionaram de sobremaneira e também porque, ao longo destas duas décadas e meia, continuei a encontrá-los de vez em quando. E só por isso, sem demérito para os restantes, faço recorrência aos dois bons mestres, cujo nome gravei na memória, a Teresa Carreiro e Luís Moura.
A Teresa era na altura uma jovem recém-licenciada e ministrava a disciplina de português. É a ela que devo a persistência no continuar a escrever. Foram pelos elogios de incentivo, dados por esta docente à forma de me expressar, que persisti no garatujar.
Já quanto ao professor Luís Moura, engenheiro de formação e ligado à empresa de fumigação Cafum, o que mais me impressionava era forma como, recorrendo a metáforas, transmitia o conhecimento. As suas aulas eram um delicioso festim de aprendizagem para os sentidos. Muitos anos mais tarde vim a encontrar no cinema a sua forma de ensinar no filme “Clube dos Poetas Mortos”, com o desaparecido Robin Williams no extraordinário papel de professor Keating. Servindo de introdução, deixo esta singela homenagem a estes dois grandes pedagogos. Prosseguindo, uma das muitas imagens mentais que Luís Moura me deixou e que nunca esqueci foram estas: a qualidade da cozinha de um restaurante vê-se na limpeza das casas de banho e o poder financeiro do seu proprietário adivinha-se na quantidade de tabaco à venda.
Ontem lembrei-me da analogia do engenheiro Luís Moura quando entrei nas sentinas da Feira Popular, que está a decorrer no Choupalinho, na margem esquerda. Saliento que estas infraestruturas são municipais. Pretendi lavar as mãos e o que presenciei era simplesmente um horror de porcaria. Papel não havia em nenhum dos muitos lavatórios. Percorri as cerca de uma dezena, creio, de sanitas e papel nem amostra. Muitos dos receptáculos estavam destruídos e reparei que algumas sanitas estavam completamente borradas por tudo quanto era superfície. Saí irritado com aquela falta de respeito –afinal paguei 1,50€  para entrar e deixei lá mais uns quantos euros numa barraca de comes e bebes. Mas eu tenho mau feitio –temos pena, já não há nada a fazer, diria o meu ego se pudesse expressar-se- e não sou muito de levar com aquela merda toda na cara, como quem diz, obviamente. Saí e, avistando um homem ao fundo do corredor que presumivelmente abria o portão para saírem viaturas, junto ao acesso à catedral das necessidades, interpelei: desculpe, o senhor pertence à organização –queria dizer se era funcionário. Com um murmúrio ininteligível respondeu qualquer coisa que não percebi. Continuei, olhe lá quem responde pelo estado destas casas de banho? Que nem um único centímetro de papel para usar tem? Foi então que ele avançou e disse, mostrando um grande saco com rolos e guardanapos soltos –misturados com alguns já usados- que era ele que estava encarregado de fornecer o necessário limpa-tudo. Disse também que “não poderia haver papel lá dentro porque roubavam tudo”.
Ora bem, o funcionário até pode estar certo na explicação –até porque já ouvi José Simão, o responsável por este evento e membro da União de Freguesias Agregadas, dizer isto mesmo na Assembleia Municipal- o que não está certo é o todo pagar pela má educação de uma minoria. Quero dizer o quê com isto? Que sendo assim, para não prejudicar os cumpridores, dever-se-ia recorrer a outros meios mais inteligentes para não mostrar que somos todos selvagens. É que eu, que sou um tipo tendencioso e mal-amanhado, até posso pensar que aquele cenário terceiro-mundista, por um lado, até dá jeito para poupar papel, por outro, é uma forma de reivindicar o subsídio camarário que não houve –mas eu não tenho nada a ver com essas guerras. Se é certo que também não construo nada, também é certo que ninguém me paga um cêntimo nem para escrever –o que é uma pena, dado o meu incomensurável talento, passando a notória imodéstia.
Deixo uma pergunta um bocado merdosa ao senhor José Simão: já se viu sentado numa sanita e depois de evacuar deparar-se-lhe que não há papel? Como é que se limpa o rabiosque? Pode não parecer mas, para quem já passou por isto, é uma pequena tragédia. Veja lá se resolve esta situação e afasta aquela vergonha. Sim, vergonha! Foi o que eu escrevi!
Quanto à constatação, se a imagem do engenheiro Luís Moura estiver certa quanto à limpeza da casa de banho, fique a saber, meu caro José Simão, que se for tocado por uma indisposição intestinal pelo que comi ontem na nossa Feira Popular e que o senhor administra vamos ter de falar. Mas fique descansado que não usarei as sentinas da Feira Popular.

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