LEIA AQUI O DESPERTAR DESTA SEMANA
Para além do texto "REFLEXÃO: A BAIXA ESTÁ A MUDAR?", deixo também as crónicas "BAIXA: UM CONTRASSENSSO NO BOTA-ABAIXO"; "ROTEIRO MUITO INTERESSANTE PARA O COMÉRCIO"; e "A VOLUNTÁRIA".
REFLEXÃO: A BAIXA ESTÁ A MUDAR?
Como se sabe, quando estamos dentro do
turbilhão, olhando para a esquerda e para direita, só vemos desgraça. Bem sei
que, enquanto escriba da calamidade, a noticiar o menos bom sou o primeiro
mensageiro. Mas, se posso escrever assim, como todos os anjos do desastre são bipolares, que têm dois polos opostos, de vez
em quando tenho uma espécie de reviravolta e faço uma pirueta. E é assim que
com base em pequenos indícios, parecendo um político, esta semana sinto algum otimismo
em relação ao futuro desta zona velha. A procura de locais para arrendar
continua em alta. É uma pena os proprietários não entenderem que são uma parte
fundamental do futuro que se adivinha e devem baixar as rendas. Tudo indica que
vamos ter uma nova unidade do McDonald’s
na Rua Visconde da Luz –o que, a par de outros investimentos, pode constituir o
motor necessário para revitalizar a Baixa, de dia e de noite. Já aqui dei conta
de imensos obstáculos para os transeuntes e comerciantes em geral e da responsabilidade
da autarquia. Ora, tenho verificado que a resposta, por parte da edilidade,
pode tardar mas é eficaz. Os exemplos são muitos e não vou descrevê-los. Por
outro lado e ainda, para além das iluminações públicas que estão anunciadas
para o próximo dia 6, vários eventos estão calendarizados para esta quadra de
Natal. Com um orçamento baixo, mas racional, parece-me de bom senso. Bem sei
que a tentação para criticar é grande mas, lembremo-nos, estas festas,
contrariando outros tempos, não custam um cêntimo aos comerciantes. Ora, a
cavalo dado não se olha o dente. Estou a ser claro?
BAIXA: UM CONTRASSENSO NO BOTA A BAIXO
Desde há várias semanas, excetuando o sábado e
domingo e praticamente todos os dias, dois agentes da Polícia Municipal (PM) deslocam-se
ao Largo das Olarias, em frente à Loja do Cidadão, e ali permanecem algum
tempo. Embora seja percetível o elevado trato respeitoso para com os
automobilistas que chegam e pretendem parar, muitas viaturas particulares têm
sido multadas nos últimos dias.
Por parte de alguns comerciantes, as queixas
de “perseguição ao comércio da Baixa”
têm sido mais do que muitas. Ainda ontem um lojista com estabelecimento junto à
Praça do Comércio, que pediu o anonimato, aproveitava para desabafar comigo: “Já viu o que está acontecer no “Bota-abaixo”
com a PM? Eles querem mesmo arrumar connosco. O que eles querem é que as
pessoas não venham para aqui fazer compras e vão para os Centros Comerciais. Ou
então estão a fazer o jogo dos parques de estacionamento em redor. É um
escândalo! De quem será a (i)responsabilidade? As ordens virão do comandante da
PM? Ou virão diretamente da vereadora responsável pelo pelouro?”
Naturalmente que não sei responder. O que sei,
porque vejo, é a constatação do facto da permanência diária dos agentes da PM
no largo que alguns dizem ser de maldição. Para quem não conhecer, é uma praça
central que, já desde os anos de 1960 aquando das primeiras demolições para a
construção da futura Avenida Central, sempre foi uma espécie de ancoradouro
onde tudo o que mexe atraca. Ainda no mandato do então presidente da Câmara
Municipal de Coimbra -e atual-, Manuel Machado, no virar do novo milénio, após
alienação do terreno em concurso público à empresa Bragaparques, SA, viu surgir um grande estacionamento na cave e
subcave e edifícios à superfície com um projeto de vias largas e destinadas à
passagem do Metro Ligeiro de Superfície. Catorze anos se esfumaram e o Metro,
com toda a polémica associada que se conhece, nunca passou do papel. Porém,
vá-se lá entender o motivo de se continuar a proibir a paragem de veículos no
local como se estivesse sempre eminente o trânsito do trem fantasma. Ou seja,
interrogando diretamente: que razões superiores estão na base de proibir a
paragem num local tão central? Penso que nenhum fundamento atinente se levanta
a não ser o “sim por que sim”. Aliás
estamos perante uma absurda atitude burocrática, lesiva para a coletividade e
antieconómica. Ou seja, a lógica, o bom-senso, manda que se coloquem ali
parquímetros com a primeira hora a pagar um valor irrisório –por exemplo 20
cêntimos- e as subsequentes com preços iguais a outros estacionamentos
públicos, incluindo o espaço destinado à carga e descarga –que, por ser
gratuito, nunca funcionou com eficácia.
Contrariamente ao que a maioria de
comerciantes defende –a gratuitidade- é preciso desmitificar de uma vez por
todas esta questão. O estacionamento na Baixa deve ser sempre onerado. Só sendo
pago se consegue uma ordenação. Se for sem pagar é ocupado logo de manhã e todo
dia se mantém. O seu custo terá é de ser muito baixo, sobretudo na primeira
hora. Um dos maiores problemas da acessibilidade a esta zona velha é o elevado
preço praticado pelos parques.
Talvez estivesse na altura do executivo
camarário demonstrar que, sendo diferente do anterior, tem uma outra visão
prática e clara de alguns problemas que impedem esta zona comercial de ser mais
aberta para todos. Ficamos à espera.
ROTEIRO MUITO INTERESSANTE PARA O COMÉRCIO
Há muitos anos que se fala na necessidade de
articular o turismo religioso com o comércio da zona histórica. Pelo menos de
uma forma clara, sem subterfúgios, e de modo a que todos, independentemente da
sua grandiosidade comercial, possam, em condições iguais, receber nas suas
lojas uma parte dos milhares de visitantes que todos os dias chegam à cidade.
Sensibilizada para o problema, a Aposenior, Universidade Sénior de
Coimbra –com sede no Convento de Santa Clara-a-Nova, que tem por objetivo promover o envelhecimento activo, através do
estímulo do exercício intelectual e cognitivo, e combatendo a solidão através
da partilha de experiências-, decidiu contribuir para a dinamização da
cidade e para a sua promoção através da atração de público e que, na interação,
desenvolva movimento para o seu comércio local, sobretudo para a Baixa, e criou
o “Roteiro monástico Coimbra”. Quem
nos vai explicar este projeto é Diogo Teixeira Dias, coordenador do “Roteiro Monástico”: “por que vivemos intensamente os problemas da
cidade, entendemos que havia uma lacuna na ligação entre os mosteiros e
conventos das duas margens do Mondego e o comércio da Baixa. Percebemos que
deveria ser estabelecido um circuito turístico, maioritariamente pedonal, que,
para além das ruas largas, passasse também nas artérias estreitas da Baixa, e,
sobretudo, que abrangesse os estabelecimentos comerciais, a sua história e os
seu “modus vivendi” na urbe. Como se entende, o público-alvo a captar é não só
o turista nacional e estrangeiro como também os utentes das universidades
séniores do País, com quem a Aposenior mantém contacto privilegiado, que
constituem um público mais disponível, quer a nível de tempo, quer a nível
financeiro, para este tipo de circuitos -as universidades séniores inscritas na
RUTIS (Rede das Universidades Séniores) são 254 - o que equivale a mais de 36
mil estudantes. Não pretendemos cobrar nada aos comerciantes aderentes. Apenas
solicitamos que, no ato de inscrição –que através do preenchimento de uma
ficha, pode ser enviado para rmonastico@gmail.com, ou por correio, ou para a APBC, Agência
para a Promoção da Baixa de Coimbra, onde a recolheremos- nos seja indicado um
desconto para os turistas que acompanhamos. Aproveitando esta sua crónica,
solicitamos aos senhores comerciantes que se inscrevam e todos juntos,
Aposenior e lojistas, lutemos para uma vivência mais útil e feliz. Muito
obrigado pela oportunidade.”
A VOLUNTÁRIA
Passam poucos minutos das vinte horas deste
último sábado, no Pingo Doce da Portela. Três pessoas, dois homens e uma
mulher, envergam camisolas com a inscrição “Banco
Alimentar”. Como sentinela alerta, através dos seus olhos negros e pequeninos,
ela olha tudo e todos em redor. Está junto de quatro carrinhos do supermercado
praticamente a abarrotar de géneros alimentícios. Tem uma figura esbelta.
Conheço-a de vista. Tenho a certeza, já nos encontrámos antes. Afinal, Coimbra
é uma aldeia grande, reconhecemo-nos todos de vista. Apetecia-me escrever sobre
a motivação dos voluntários, aquela vontade que, individualmente, move cada um
dos cerca de 42 mil que, neste fim-de-semana, estiveram presentes em todo o
país a angariar alimentos para quem mais precisa. Não quero saber se foram
recolhidas mais ou menos de duas toneladas nesta primeira ação benemérita. Isso
são números para os jornais.
Dá pelo nome de Maria Manuela Afonso e, embora
não pareça, já sessenta e cinco primaveras lhe deixaram marca no corpo, por
sinal, ainda muito belo. Foi bancária até 31 de dezembro de 2005. Mal o barulho
das rolhas a saltarem das garrafas de espumante se desvaneceu e o estalejar do
fogo-de-artifício se apagou, a 2 de janeiro já estava á procura de uma associação
para poder trabalhar em prol dos outros. Nunca tinha feito nada no género mas,
como sonho antigo, sabia que era isto que queria. Entrou para a associação “Casa”, Centro de Apoio ao Sem-abrigo, e durante cinco anos cozinhou na sua
habitação os alimentos que, à noite, eram distribuídos na cidade por outros
voluntários aos mais necessitados. Está há quatro anos na ADAV, Associação de Defesa e Apoio da Vida, na Praça da República.
Passados nove anos, a fazer bem sem olhar
a quem, sente-se muito feliz. “Quando
estou a ajudar transcendo-me, ganho uma segunda alma”, confidencia-me. “Auxiliar uma causa, ou alguém, é uma parte
muito importante da minha vida. Ao retribuir torno-me um ser melhor. As pessoas
dão-me oportunidade de eu agradecer tudo o que tenho. Sei que não posso mudar o
mundo mas se salvar uma única pessoa sinto que estou a fazer algo de único. Sou
católica-praticante, acredito na redenção da alma. Mas, como agora em que
pratico a bondade, a solidariedade, a interação com o outro, religa-me o sentimento
prático de que estou a contribuir para a salvação do corpo de alguém.
As
pessoas mais humildes são as mais generosas. Apercebo-me. Oferecem um pacote de
açúcar e pedem desculpa por dar tão pouco. Infelizmente, não raras vezes, os
mais abastados, neste serviço de voluntariado, olham-nos com sobranceria, como
se fôssemos carecentes de amor e, pela solidão, fizéssemos isto em substituição
do vazio. Nada de mais errado. Para além de sermos muito felizes, temos muito
carinho para dar a quem precisa. Contrariamente ao que se pensa, os jovens, de
vinte e tal anos, também dão com uma humildade impressionante. É certo que a
crise que vivemos toca a todos, mas estou convencida que a diminuição das
ofertas tem mais a ver com a multiplicação das campanhas. Há uma massificação
intensiva das instituições a recorrer à dádiva pública. O resultado é o cidadão
começar a ficar farto e, como defesa, a deixar de responder. Acaba por ser mau
para todos. Estou aqui há três horas. Acredita que não estou cansada? Se alguém
tiver uma vida melhor pelo meu esforço sinto-me muito bem. Sou uma felizarda.
Fui abençoada por Deus!”
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