Nos seus 85 anos de vida nunca a Previdência
Portuguesa, com sede na Rua da Sofia número 193, em Coimbra, contou com tamanha
afluência para participar num sufrágio. Ontem, sexta-feira 19, durante mais de
duas horas, largas dezenas de associados mantiveram-se estoicamente em pé para
serem reconhecidos e poderem exercer o seu direito de votar para uma direcção,
que conduzirá esta associação mutualista durante o próximo triénio, 2015-2017, e um novo
Conselho Fiscal. Havia dois agrupamentos candidatos em confronto. A lista A, representando o projecto do
anterior executivo, era de continuidade. A Lista
B, cuja composição tinha alguns funcionários da instituição, alegadamente,
era de mudança.
O processo de averiguação presencial dos sócios
e respectivas procurações foi concluído por volta das 22h45. Tendo sido dado
início aos pontos agendados na Assembleia Geral logo foi pedida a palavra por
um associado, Fausto Dinis, advogado, que lavrou à mesa um protesto e um pedido
de esclarecimento. A reclamação foi baseada no processo moroso que levava à
certificação do direito a votar. A clarificação avocada pelo jurista da cidade
e associado incidia em dois pontos respeitantes ao funcionamento da Assembleia
Geral, o artigo 63.º, 2 –em que se transcreve: “Os associados podem fazer-se representar por outro nas reuniões da
Assembleia Geral, mediante documento escrito e assinado pelo representante e
cuja assinatura seja reconhecida pela Mesa da Assembleia ou por outro meio
legal.”- e o artigo 72.º, 1 – em que
se indica: “Os associados não podem
votar, por si ou como representantes de outrem, em assuntos que directamente
lhes digam respeito e nos quais sejam interessados os respectivos cônjuges,
ascendentes, descendentes e equiparados.”
No respeitante ao formulado no
artigo 63.º, 2, interrogava Fausto Dinis se o preceituado fazia sentido. Isto
é, sendo o voto pessoal e intransmissível se era possível ser exercido por
procuração.
No artigo 72.º, 1, o causídico
defendeu que o voto por mandato, em representação de familiares, levado pelos
membros proponentes à nomeação colidia com o espírito deste clausulado. Ou
seja, segundo a sua argumentação, estando em causa interesses próprios -visados
na eleição-, haveria conflitos de interesses e os candidatos não poderiam usar
o voto por representação.
Presente na sala António Manuel Arnault, outro
conhecido advogado na cidade, logo veio refutar a argumentação do colega,
dizendo que tal raciocínio não fazia sentido, já que o exarado neste
regulamento era o admitido no Código das Associações.
Foi apresentada à assembleia uma
moção para votação sobre as dúvidas levantadas por Fausto Dinis e foi rejeitada por maioria.
E O QUE DIZ A LEI?
“A
posteriori”, consultada a Lei sobre as Associações Mutualistas, Decreto-Lei
72/90, de 3 de Março, verifica-se que “ipsis
verbis”, com as mesmas palavras, os artigos em causa foram integralmente
transcritos para o Regulamento da Previdência Portuguesa. Embora, naturalmente, não seja despiciente outra interpretação.
E TUDO CONTINUA IGUAL. GANHOU A LISTA A
E passou-se à votação. Todos os associados
presentes exerceram o seu direito, mas, perante a questão levantada por Fausto
Dinis, foi notada alguma tensão na mesa e na hora da contagem dos boletins. Foi
como se esta ficasse sobre observação. O silêncio caiu na sala quando foram
anunciados os resultados. A lista A, liderada por António Martins de Oliveira, obteve 146 votos e por isso mesmo ganhou o
pleito. A concorrente B conseguiu apenas 125.
A BRONCA DOS VOTOS ANULADOS
Ao mesmo tempo que foram declarados os
resultados foi dito também pelo presidente da Assembleia que 280 votos foram
considerados nulos, levando um membro da mesa, pertencente à lista vencedora, a
interpelar o orador para o fundamento de não terem sido classificados.
Questionando sobre os associados ali representados em papel, disse: “foram contactados por mim!”. Respondeu o
presidente da mesa: “Ai foram? Não diga
mais nada!”
A explicação dada à Assembleia foi que a
maioria dos votos recebidos por correspondência não cumpria o preceituado no
artigo 73.º, 2, do Regulamento, uma vez que as assinaturas não tinham sido
feitas notarialmente ou presencialmente por advogado. 277 procurações foram
exaradas por dois causídicos do mesmo escritório e autenticadas com base em
documento de identificação, sem ser presencial conforme é exigido por lei.
O segundo ponto agendado, a apreciação e
votação do Relatório e Contas do Exercício, bem como o programa de acção para o
ano seguinte, foi aprovado por maioria e a Previdência Portuguesa, como caravela a sulcar os mares, continua em frente.
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