(Da minha autoria, esta crónica
foi publicado no Diário De Coimbra em 11 de Junho de 1994. Porque, agora,
pretendo escrever um texto e servir-me do que nele defendi, na altura, tomo a
liberdade de o transcrever novamente)
Há cerca
de dois anos a autarquia fez anunciar, na imprensa, o concurso para a
construção de um imóvel que seria apoiado com esplanada e com localização no términus
da Avenida Sá da Bandeira.
Entre as várias cláusulas havia uma que apostolava que ao fim de duas
décadas o imóvel revertia a favor do município. Havia outra em que o
concessionário tinha de permanecer obrigatoriamente no evento no mínimo sete
anos (salvo erro). E outra ainda de que se obrigava a promover espectáculos de
animação cultural.
Embora, novamente, eclodisse a contestação por parte dos hoteleiros
legalmente estabelecidos… muitos deles concorreram.
Depois de abertas as propostas, veio a ser contemplado um empresário de
reconhecido mérito na arte de bem comer, que embora ficasse classificado em
segundo lugar, no montante ofertado, foi preferido por proposta do senhor presidente
da Câmara e baseado no argumento de que o outro candidato vencedor não reunia
as condições necessárias. O projecto arrancou e durante o ano transacto (1993)
abriu com pompa e circunstância. Houve logo quem chamasse a obra de aborto
urbanístico e de duvidosa qualidade estética.
Após a abertura deste espaço, os comerciantes instalados depressa se
aperceberam da alteração do percurso da sua clientela; apertaram as mãos na
cabeça e começaram a ver as suas casas às moscas.
Embora o ódio estivesse presente, durante meses ele permaneceu em incubação.
Até que há quatro meses, subitamente, o concessionário escriturou a cedência de
quotas. E então o ódio, até aí reprimido, dispara tal qual bala de canhão.
Surge então em cena uma misteriosa personagem de “grande coragem e de
reconhecida frontalidade” que, escrevendo ao presidente da autarquia, o ameaça
de morte e fazendo referência à esplanada. Como era de direito e legitimamente,
o presidente enviou a missiva para a Polícia Judiciária. A partir daí, para os
castigados comerciantes, começou a peregrinação para a Rua Venâncio Rodrigues.
Ou seja, tem sido um “ver se te avias” de perder tempo para os lados da Polícia
Judiciária.
Por entremeio, surge a notificação, por parte da Câmara, para reduzir a
esplanada ao Tropical e ao Académico. De salientar que estes dois
reconhecidíssimos cafés da praça possuem esplanada a ocupar o passeio em frente
aos seus estabelecimentos há mais de duas décadas. Admoestados pelo corrupio à
Judiciária e ainda mais esta prepotência, os proprietários destes
estabelecimentos perderam completamente o verniz e alguns excederam-se.
Finalmente, ao que parece, o bom senso e a compreensão prevaleceram
pelas bandas da Praça 8 de Maio e, neste momento, o ambiente é calmo. Os
hoteleiros apenas se queixam de que tarda a aparecer a primeira manifestação
cultural, conforme o clausulado contratual. Estes empresários merecem todo o
respeito e carinho de uma classe que muito se orgulha em ter, no seu seio,
pessoas de tão reconhecido mérito. Eles representam os “self made man’s” que
com muito suor e lágrimas subiram a corda da vida. Estes hoteleiros são o
retrato humano que cada um de nós gostaria de mostrar aos nossos netos.
Luís Fernandes
(Coimbra)
(Terça-feira, 14 de Junho de
1994)
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