(Copiado de aqui)
Em pleno século XXI, o progresso laboral Made by Sonae!
Hipermercados são um lugar horrível:
cínico, falso, cruel. À entrada, os consumidores limpam a sua má consciência
reciclando rolhas e pilhas velhas, ou doando qualquer coisa ao sos hepatite, ao banco alimentar ou ao pirilampo
mágico. Dentro da área de consumo, cai a máscara de humanidade do hipermercado:
entra-se no coração do capitalismo selvagem. O consumidor, totalmente
abandonado a si próprio (é mais fácil de encontrar uma agulha num
palheiro do que um funcionário que lhe saiba dar 2 ou 3 informações sobre
um mesmo produto), raramente tem à disposição mercadorias que, apesar do
encanto do seu embrulho, não dependam da exploração laboral, da contaminação
dos ecossistemas ou de paisagens inutilmente destruídas. Fora do hipermercado,
os produtores são barbaramente abusados pelo Continente (basta que não
pertençam a uma multinacional da agro-indústria), que os asfixia até à morte e,
quando há um produtor que deixa de suportar as impossíveis exigências que
lhe são impostas, aparece outro que definhará igualmente, até encontrar o mesmo
fim. Finalmente, nas caixas do hipermercado, para servir o consumidor como
escravos idênticos aos que fabricaram os artigos comprados, estamos nós.
O hipermercado está portanto no centro
da miséria que se vive hoje no mundo. O consumidor, o produtor e nós temos uma
missão comum: contribuir para que os homens mais ricos do planeta fiquem cada
vez mais ricos – contribuir para que a riqueza se concentre como nunca
antes na história. Se somos todos diariamente roubados e abusados, é por
este mesmo e único motivo.
Vou-vos relatar apenas a minha banal
experiência diária (sem pontos de exclamação já que o escândalo é
comum a qualquer um dos tópicos que irei descrever). Espero que sirva de
alguma coisa, apesar de saber que ninguém se incomodará muito com ela. Afinal,
é a mesma selva que está já em todo o lado.
1.
formatação do corpo
Relativamente à aparência física, devemos
formatá-la meticulosamente, ao gosto sexista do patrão. Na loja onde trabalho,
várias colegas tiveram por isso de eliminar os seus pírcingues, apagar também a
cor das unhas (lá só é admitido o vermelho) e uma até teve de mudar de
penteado. O patrão quer que nos apresentemos como autênticas bonecas. Faz
lembrar os escravos que eram levados para as Américas, a quem se retiravam as
suas marcas corporais para serem explorados sem outra identidade que a de
escravos (seres humanos transformados em mercadorias).
2.
trabalho em dias de folga
Para perpetuar a falta de funcionários
na loja, obriga-se aqueles que lá estão a trabalharem pelos que fazem falta,
oferecendo assim todos os meses algumas horas do seu tempo de vida e de
descanso ao patrão, que deste modo poupa no número de salários a pagar. Mais
absurdo: num dia em que esteja de folga, posso ser convocada para ir à loja
para fazer inventário. Sou obrigada a ir, apesar de estar na minha folga, e
apenas posso faltar mediante justificação médica. E, como se não bastasse, até
já aconteceu eu ser avisada no próprio dia da folga.
3.
precariedade
4.
salário
Trabalho 20h semanais em troca de 260€
mensais, o que dá pouco mais de 3€ por hora. Que isto se possa pagar a
alguém em 2015 devia ser motivo de vergonha para um país inteiro. Que seja um
milionário a pagar-me esta esmola devia dar pena de prisão efectiva.
5.
trabalho não remunerado fora do horário de
trabalho
Se o futuro é uma incógnita, o
presente é sempre igual: todos os dias, sem excepção, trabalho horas extra
grátis que me são impostas. O meu horário de saída é às 15h mas, depois dessa
hora, ainda tenho para executar várias tarefas obrigatórias, que me levam entre
15 a 20 minutos diários, como arrumar os cestos das compras e os artigos que os
clientes deixam ficar na caixa ou guardar o dinheiro no cofre. No quase ano e
meio que levo a trabalhar no Continente, devo ter saído uns 5 dias, no total, à
hora certa. E já cheguei a sair uma hora e meia depois das 15h, apesar de os
meus superiores saberem muito bem que dali ainda vou para outro trabalho e de,
por isso, eu ter sempre imensa pressa para não me atrasar.
6.
cada segundo de exploração conta
Neste ano e meio, cheguei uma única vez
5 minutos atrasada e a minha superior foi logo bruta e agressiva comigo,
tendo-me gritado e agarrado pelo braço, apesar de supostamente haver uma
tolerância para se chegar até 15 minutos atrasada. Nunca mais voltei a
atrasar-me. Nem 10 segundos. (Já sair pelo menos 15 minutos mais tarde do que a
hora prevista, isso é todos os dias.)
7.
pausa para comer/urinar/descansar é
crime
8.
gerem-nos como se fôssemos animais
Há uns tempos, uma colega sentiu-se mal
quando estava na caixa, fartou-se de pedir licença para ir à casa de banho, mas
foi obrigada como de costume a esperar tanto, tanto que lá se vomitou, quase em
cima de um cliente.
Não se calem e denunciem todos
os abusos nas redes sociais e nos blogs.
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