quinta-feira, 14 de maio de 2015

O ETERNO RETORNO DAS HISTÓRIAS REDONDAS



“Cercado” dedica-se a descrever os bastidores da vida política de José Sócrates nos últimos dez anos, a partir de documentos e entrevistas a muitos dos seus colaboradores, mas é nos processos mediáticos e controversos de que foi alvo que o livro concentra mais a sua atenção. Livro sobre bastidores da vida política do ex-primeiro-ministro socialista revela detalhes sobre 40 entregas de dinheiro feitas ao longo de um ano pelo empresário Carlos Santos Silva.”
“A 2 de abril de 2014, uma quarta-feira, Carlos Santos Silva entregou pessoalmente a José Sócrates 10 mil euros em notas. O ex-primeiro-ministro precisava de pagar à sua secretária pessoal, Maria João, saldar a sua conta na agência de viagens Top Atlantic e cobrir as despesas de alojamento em Paris, onde manteve uma casa a seguir a ter concluído o seu mestrado de Filosofia Política em Sciences Po.” –retirado do semanário Expresso.

Ao ler estas frases no livro que vai dar ao prelo hoje em Lisboa, numa primeira impressão, sou tomado pelo estranho sentimento que estamos numa segunda versão do “caso Maddie”, contada em livro por Gonçalo Amaral, e cujo final –se é que foi mesmo o fim- deu no que deu. Ou seja, numa indemnização de 500 mil euros que o antigo inspetor da Judiciária vai ter de pagar ao casal inglês.
Antes de prosseguir vou fazer uma ressalva, nem defendo nem acuso gratuitamente José Sócrates. Desaprovo quem de uma forma irresponsável o defende e faz acusações infundamentadas ao juiz do processo como também o acusa sem o julgamento a que qualquer cidadão tem direito.
A primeira pergunta que se pode fazer é saber se concordo que se escreva um livro sobre alguém dando como comprovado o que ainda não foi provado na justiça. Não, não concordo. E como tal não me tira o sono que estas pessoas sejam sentenciadas por difamação agravada em quantias avultadas. Trata-se de um deliberado abuso de degradação da honra dos visados e, para piorar, tendo por horizonte o enriquecimento fácil. Ainda que o que transcrevem em centenas de páginas vá de encontro ao que a maioria pensa e baseado numa mera convicção individual, há um porém: estes arguidos, ou suspeitos, ou não foram ainda julgados –como é este caso de José Sócrates-, e por isso mesmo falta o transitado em julgado, ou nunca se provou a sua implicação –como é o dossier “Maddie”.
Neste processo do famoso preso 44 da Cadeia de Évora, José Sócrates, por muito que pensemos que o homem esteja atolado até às orelhas, não podemos nem devemos esquecer que ainda não foi julgado –e, pelo que se diz, nem sequer acusado. Logo, para mim, este livro é um abusão que, não tendo nada a ver com a liberdade de imprensa, busca simplesmente, por um lado, uma condenação pública antes do desfecho do último recurso, por outro, uma antecipação do que vai acontecer. Ora, isto para o focado, seja ele ex-primeiro-ministro ou varredor da rua, é terrível. É a procura do justicialismo popular em toda a sua dimensão incomensurável. Se é certo que até agora temos tido uma justiça de linhas paralelas, uma para pobres e outra para ricos, não devemos cair na tentação de fazer pré-julgamentos e devemos acreditar que ela vai funcionar. É lamentável a saída deste livro antes da audiência do homem. É um mau exercício da liberdade. Vamos ver se a montanha não vai parir um rato e o parto não vai destruir o monte tal como o conhecemos. Aguardemos cenas dos próximos capítulos. Por uma questão de bom senso, convém que ninguém deite foguetes antes da procissão chegar ao adro da igreja e o santo voltar ao altar.




1 comentário:

Super-febras disse...

Amigo

Aqui só entre nós; panem et circenses ( Junenal )

Não se enche o armazém de seda quando na loja a freguesia quer "tirilene".
Isto é o que o nosso povo quer! No dia que quiser justiça também a terá. Mas isso entre nós portugueses nunca vai acontecer. Sabe, para que possamos reclamar direitos temos que obedecer às regras, e as regras são deveres.
Mudar as coisas, eles, os que dão nacos de pão, restos da suas virulentas mesas para que o povo venha ao circo, também não querem. Isso seria matar a galinha dos ovos de oiro.
Afinal não é o povo quem mais ordena?

Para si que luta, um abraço
Álvaro José da Silva Pratas Leitão