terça-feira, 26 de maio de 2015

ENSAIO PARA PERCEBER A QUEDA DA ECONOMIA NACIONAL (2)





O ENTERRO DA ECONOMIA DE SUBSISTÊNCIA

Como vimos anteriormente, no primeiro texto, atravessámos dois terços do século XX com uma agricultura rudimentar, onde a humana força braçal e os animais domésticos eram os motores do desenvolvimento. A terra era o berço da auto-sustentação. Nela tudo crescia, num processo de transformação tudo era aproveitado e, como num eterno retorno, à terra regressava. Como exemplo, vemos o mato das grandes planícies compostas por pinheiros, eucaliptos e outras árvores, que eram aproveitados para os currais dos animais. Qualquer campo de sequeiro, leira ou horta eram cultivados, servindo os seus frutos para a alimentação da família e o excedente, como rendimento, era vendido nos mercados locais. Desde laranjas a limões, sem medidas padronizadas, sem certificação, tudo era valor acrescentado para as vivências locais. Era o tempo da reutilização. Desde a garrafa de vidro, passando pelo cerzir do vestuário e apanhar malhas em meias de vidro, até ao electrodoméstico tudo era reconvertido para durar o mais possível. Havia toda uma economia em rede, desde o padeiro até ao merceeiro, que funcionava e evitava a desertificação total dos povoados.
Certamente entendendo que o progresso de uma Nação passa inevitavelmente pela agricultura, deveria ter sido por isso mesmo que Marcelo Caetano, proeminente figura incontornável do Estado Novo e enquanto Presidente do Conselho, no período de 1969 a 1972, teve uma política de incremento excepcional com um acréscimo de subsídios à reconversão agrária de mais de 62%. Os apoios concedidos para a moto-mecanização agrícola e florestal aumentaram cerca de 300%. Éramos um país rico em ouro –no 25 de Abril tínhamos 865.936 toneladas de ouro em reservas no Banco de Portugal –em 2010 o existente era de 382.509.58 quilos.
Até ao 25 de Abril de 1974, cerca de um milhão e meio de portugueses escolheram o estrangeiro como destino para melhorarem as suas vidas, fugindo da guerra colonial e de um país pobre e subdesenvolvido. A economia nacional estava nas mãos de grandes grupos que já vinham de grandes famílias do início do século XX, os chamados donos de Portugal. Grassava o latifúndio, contribuindo para a existência de duas classes: o rico e o pobre. Com a nacionalização da banca e o desmantelamento da grande propriedade, na revolução dos cravos, com o aumento do salário mínimo para 3,300$00, multiplicando a procura interna, assistimos ao emergir da classe média e de uma nova burguesia inexistente até aí. De 1973 a 1982 assistimos a um crescimento de mais de 18 por cento. Foi uma época intensa de busca do bem-estar, desde frigoríficos, televisores até automóveis. Desenvolveu-se a indústria da publicidade e marketing na criação de novas necessidades.
Os preços eram tabelados pela administração. Ou seja, as margens de comercialização eram reguladas pelo Estado. Por exemplo, na hotelaria, consoante a categoria do estabelecimento os preços eram verticalmente impostos e iguais. A revisão Constitucional de 1982, com Mário Soares como primeiro-ministro, abre-se ao sector privado e dá-se início à privatização da economia. Por outro lado, começa aqui uma nova categoria social: os políticos privilegiados. Com a ascensão de Cavaco Silva ao poder, no governo, em 1985, dá-se a total liberalização de preços, a chamada economia de mercado. Desabrocha a primeira grande superfície a que se seguirão dezenas e dezenas de muitas mais e que irão ser o coveiro do comércio tradicional. Cada operador passa a vender pelo preço que mais lhe convém e que cada comprador estaria disposto a dar para adquirir o produto.
Vinda já desde 1983, com uma acentuada recessão da economia e com intervenção do FMI, Fundo Monetário Internacional, assiste-se a uma desenfreada inflação e dependência externa, com as importações a cavalgarem a todo o galope. Perseguia-se a mais-valia, isto é, o vender o mais caro possível, o lucro, era o objecto da actividade comercial. O consumidor era uma massa abstracta, sem força e desorganizada.

A ADESÃO DE PORTUGAL À CEE

Depois de ter apresentado a candidatura em 28 de Março de 1977 e ter assinado o acordo de pré-adesão em 03 de Dezembro de 1980 e adesão em 12 de Junho de 1985, em 1 de Janeiro de 1986, pela mão do primeiro-ministro Mário Soares e no Mosteiro dos Jerónimos, Portugal passou a ser membro de facto da então CEE, Comunidade Económica Europeia.
Já com Portugal endividado, a Europa constituiu uma ponte de salvação para as finanças públicas e privadas. Talvez por isso mesmo, tanto quanto me lembre, excepto o PCP, Partido Comunista Português, nenhuma outra organização política questionou as implicações desta associação política e derrubar de fronteiras territoriais para pessoas e bens. Todos estavam interessados em ganhar alguma coisa. A Europa era o Eldorado, a mina de ouro para os políticos portugueses. Pelos milhões de contos diários que vieram beneficiar mais uns que outros –muitos se aproveitaram e nunca foram julgados-, a Nação vinculou-se a obrigações, hoje consideradas por muitos, absurdas. Como exemplo, com o argumento do menor custo de produção de estados membros, abateram-se barcos de pesca, olivais, vinhas e sementeira cerealífera. Criaram-se dificuldades ao pequeníssimo agricultor para criar gado e alienar bens da terra. E a Comunidade Europeia pagou para se aposentarem compulsivamente muitos operários, que passaram a ocupar bancos de jardins públicos a olharem o Céu. E muitos destes reformados, como única saída possível, viraram-se para a construção civil e comércio.

A GLOBALIZAÇÃO

Em 15 de Abril de 1994 Portugal aderiu à Organização Mundial de Comércio. E começa a segunda fase da destruição industrial –hoje denomina-se pomposamente “destruição criativa”. Com os políticos a assobiarem para o lado, em nome do baratinho –pelas “lojas dos 300”- começou a aniquilação massiva de fábricas de guarda-chuvas, de ferramentas, de siderurgia, de electrodomésticos, computadores e mais tarde os têxteis. Os países emergentes, sobretudo a China, com custos de produção sem regras e onde vale tudo, passaram a ser o nosso fabricante mundial e, de produtores, passamos todos a vendedores. Poucos se lembraram que encerrando as nossas fábricas, abandonando os campos, desapareceria o emprego. Talvez se entenda por que se tenha hoje de recorrer à multa para fazer limpar os campos para evitar incêndios. Em contraposição, custa a compreender como é que se estabelecem coimas de valor mínimo de 500 euros para quem for apanhado a vender bens que produza, mesmo para a sua sustentabilidade.
Cerca de 300 mil portugueses deixaram o país nos últimos anos em busca de um horizonte visível.
Com todo este ziguezaguear da vida nacional se justifique o desmembramento da família tradicional e a violência brutal que se abateu na sociedade portuguesa.
Hoje, com uma dívida galopante, senão impagável –segundo a imprensa, no último trimestre aumentou mil milhões e pagamos de juros à Troika 22 milhões de euros por dia- importamos cerca de 80 por cento do que produzimos e exportamos cerca de 6 por cento. Virámo-nos para os mercados… de contracção de dívida, de novos empréstimos, obviamente. No entanto, segundo o Governo, caminhamos a passos largos para a recuperação económica.



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