quinta-feira, 6 de março de 2014

ROSTOS NOSSOS (DES)CONHECIDOS: O INTUITIVO



Quantas vezes nas últimas décadas já passámos por ele junto ao Centro Comercial Sofia? E, na sua ladainha tão própria dos invisuais, ouvimos: “ajude o ceguinho, por amor de Deus, Senhor!”. Tantas, tantas que até pensamos que o Valdemar Ribeiro Simões Martins é o porteiro de serviço do antigo Convento de São Domingos, na Rua da Sofia.
O Valdemar tem 67 anos e é completamente cego. Nasceu a ver, não muito mas alguma coisa. Aos 16 anos teve meningite e a visão encolheu. É solteiro por opção, porque teve um grande amor na sua juventude, mas não quer falar disso. Anda pela Baixa há cerca de quatro dezenas de anos e assentou praça há 35 no local onde o encontrei agora. É ali que vende a sorte aos outros porque para ele não precisa. É muito feliz e nunca andou triste, diz-me em palavras bem vincadas. Nasceu em Vila Nova de Poiares. É filho de uma prole muito pobre que deu ao mundo 11 rebentos. Como os progenitores não tinham possibilidades para os criar foram todos distribuídos por vários asilos do país. A ele calhou-lhe em sorte ir para Castelo de Vide. Para sua negra memória, foi a direcção deste asilo situado no Alentejo que decidiu mandá-lo para Lisboa para arrancar os olhos. Embora fosse há 50 anos, lembra-se como se fosse hoje. “Foi a sangue frio. A anestesia não fez efeito e foi com um sofrimento atroz que mos retiraram. Foi para estudarem. Naquele tempo era assim!”, enfatiza. “Mas Deus compensou-me. É muito meu amigo! Eu não ando na escuridão. Caminho na luz do Senhor. Eu “vejo” tudo através da intuição! Para além disso, tenho uma memória geográfica e auditiva fora de série. Nunca me perco. Ainda há tempos um grupo de amigos me convidou para jogar à moeda. Limpei-os a todos! Sabe porquê? Porque pelo quase inaudível tilintar das moedas nas mãos dos jogadores eu sabia quantas levavam! Nunca mais quiseram jogar comigo. A gente sabe que há Deus, o Filho e o Espírito Santo, na Santíssima Trindade, é ou não é? Então entrego-me a Ele e cuida de mim!”

2 comentários:

Anónimo disse...

Ola boa noite! O senhor da foto é meu tio! Seu ultimo sobrenome é Matias e não Martins. Ele é muito querido por todos nós. Lidia Amorim.

Anónimo disse...

Este senhor ainda é vivo? Nunca mais o vi por Coimbra.