Quantas vezes nas últimas décadas
já passámos por ele junto ao Centro Comercial Sofia? E, na sua ladainha tão
própria dos invisuais, ouvimos: “ajude o ceguinho, por amor de Deus, Senhor!”.
Tantas, tantas que até pensamos que o Valdemar Ribeiro Simões Martins é o
porteiro de serviço do antigo Convento de São Domingos, na Rua da Sofia.
O Valdemar tem 67 anos e é
completamente cego. Nasceu a ver, não muito mas alguma coisa. Aos 16 anos teve
meningite e a visão encolheu. É solteiro por opção, porque teve um grande amor
na sua juventude, mas não quer falar disso. Anda pela Baixa há cerca de quatro dezenas de anos e assentou praça há 35 no local onde o encontrei agora. É ali que vende a sorte aos outros porque
para ele não precisa. É muito feliz e nunca andou triste, diz-me em palavras
bem vincadas. Nasceu em Vila Nova de Poiares. É filho de uma prole muito pobre que
deu ao mundo 11 rebentos. Como os progenitores não tinham possibilidades para
os criar foram todos distribuídos por vários asilos do país. A ele calhou-lhe
em sorte ir para Castelo de Vide. Para sua negra memória, foi a direcção deste
asilo situado no Alentejo que decidiu mandá-lo para Lisboa para arrancar os
olhos. Embora fosse há 50 anos, lembra-se como se fosse hoje. “Foi a sangue frio. A anestesia não fez
efeito e foi com um sofrimento atroz que mos retiraram. Foi para estudarem.
Naquele tempo era assim!”, enfatiza. “Mas
Deus compensou-me. É muito meu amigo! Eu não ando na escuridão. Caminho na luz
do Senhor. Eu “vejo” tudo através da intuição! Para além disso, tenho uma
memória geográfica e auditiva fora de série. Nunca me perco. Ainda há tempos um
grupo de amigos me convidou para jogar à moeda. Limpei-os a todos! Sabe porquê?
Porque pelo quase inaudível tilintar das moedas nas mãos dos jogadores eu sabia
quantas levavam! Nunca mais quiseram jogar comigo. A gente sabe que há Deus, o
Filho e o Espírito Santo, na Santíssima Trindade, é ou não é? Então entrego-me
a Ele e cuida de mim!”
2 comentários:
Ola boa noite! O senhor da foto é meu tio! Seu ultimo sobrenome é Matias e não Martins. Ele é muito querido por todos nós. Lidia Amorim.
Este senhor ainda é vivo? Nunca mais o vi por Coimbra.
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