(Imagem da Web)
Escrevi
esta crónica em Junho de 2014.
Vão
perdoar a arrogância, mas continua
tão
actual que não resisti a trazê-la novamente
à
colação. Ora leiam, e vejam se não tenho razão!
“Hoje
não continua tudo igual? Claro que sim! Porém, como as vacas
minguam e o leite é escasso, cabe menos a cada um dos compadres, dos
ajudantes que contribuíram a eleger o homem do leme.”
Tenho
uma faculdade que nunca contei aqui: detenho uma memória visual
fantástica. Olho um rosto e raramente esqueço os seus traços,
mesmo passadas décadas. Posso não saber de onde é imediatamente
mas, matutando, matutando, chego lá. Então se forem caras
conhecidas, políticos ou artistas mesmo fora de moda, raramente me
escapam. Quando alguém, depois de sair da ribalta e vestido num fato
de anonimato, entra na minha loja e o trato pelo nome desmancha-se
todo no seu encómio de admiração: “conhece-me?!?".
Então personagens locais que passem pelos jornais reconheço-os
imediatamente. Escusado será escrever que me ignoram completamente,
como nunca me vissem mais gordo e mesmo que já tivessem privado
comigo de perto fazem tudo para não me dar importância. Este
comportamento –anormal, posso escrever assim?- é extensível a
praticamente todos os que voam lá no alto, nem que seja somente na
sua própria imaginação. Curioso, que este comportamento também se
passa com quem já percorreu o caminho das pedras e de um momento
para o outro se vê catapultado para um lugar importante. Então
sempre que se cruzam connosco, para não nos cumprimentar, puxam do
telemóvel e fazem de conta que estão a ter uma longa conversa. Um
monólogo de presumido, idiota que não vale um caracol. Se não
fosse o trampolim político continuava anódino.
Para
este tipo de gentinha, é como se a sociedade se dividisse em duas
placas: superior e inferior. Na grelha inferior cabe toda a
desaparecida classe média, com todos os trabalhadores assalariados
ou independentes. Este tipo de gentalha, com um olhar altivo e
dominador –tantas vezes a disfarçar um incómodo complexo de
inferioridade-, quase segregacionista, apenas se relaciona com a
classe superior. A excepção será para quando alguém que, ocupando
um cargo na administração, lhe dê interesse e lhe sirva de ponte
para a resolução de algum problema. Quando assim é, usa e abusa
descaradamente de quem utiliza como escada para os seus fins que não
conhecem meios.
No
caso da figura que vou falar hoje e que deu origem a este
apontamento, conhecemo-nos há trinta anos. Ou melhor, eu conheço-o
desde o seu nome até a todos os passos que deu e vieram noticiados
nos jornais. Ele já falou comigo algumas vezes e até sabe que tenho
uma loja na Baixa da cidade, mas de mim não sabe mais nada. Não é
uma ignorância de conjectura ocasional mas um desconhecimento tácito
e planeado. A sua diferenciação social faz parte de um plano urdido
em noites de insónia e baseado no aforismo “mostra-me com quem
andas e digo-te o que vales”. Para ele, eu serei apenas uma
sombra que se cruza com a sua orquestrada imponência de pavão.
Sempre tive ideia de que a sua figura foi construída
milimetricamente, assente numa imagem de show-of, vazia de
conteúdo, como se a sua representação dramática assentasse na
frontaria e fosse apenas um cenário de filme ou de teatro
imaginário. Aos meus olhos, sempre viveu ancorado em esquemas, em
teias entrelaçadas no poder instituído. É um camaleão, ou diria
antes, uma cobra a saracotear a pradaria citadina do burlesco. Ao
longo das últimas décadas viveu sempre no crepúsculo de uma dita chamada e apregoada cultura, tantas vezes defendida em grupo de
intelectuais de pacotilha como este artista, a querer fazer crer aos
imbecis, como eu, que esta “coltura” era essencial
para o modus vivendi do burgo. Mas, verdadeiramente, este
género de cagão sempre esteve interessado em subtrair uns
cobres ao erário público e nada mais. Ao longo das últimas
décadas, com sorrisos e bolinhos enganou os tolinhos que passaram
nos passos perdidos para outros, mas para ele sempre bem
aproveitados no Paço do Concelho. Enganou? Não! –Não é o termo
correcto! Extraiu de mão beijada aos patetas que chefiaram, e
continuam a chefiar a edilidade. Foi sempre um contrato de mútuo. O
pacóvio da autarquia -que era, e é, também artista- precisava, e
precisa, de mostrar ao munícipe estúpido que estava, e está, a
fazer coisas importantes, a cuidar da “coltura” da cidade,
e como os milhões não lhe custaram nada –o eleito é apenas um
mau administrador da massa falida-, e até caíram sempre do
Orçamento Municipal, do Orçamento Geral do Estado, ou do céu
europeu, aos trambolhões, distribuía-os, e vai distribuindo, pelos
acólitos mais chegados.
Hoje
não continua tudo igual? Claro que sim! Porém, como as vacas
minguam e o leite é escasso, cabe menos a cada um dos compadres, dos
ajudantes que contribuíram a eleger o homem do leme. Então como a
distribuição só está a chegar a alguns, os não contemplados, por
onde passam atiram setas envenenadas ao ex-idolatrado e apoiado no
último sufrágio. Foi o caso deste cagão que encontrei há
dias a vociferar e a deitar fogo pelas narinas como touro
enraivecido. Vejam bem que em 30 anos praticamente nunca me dirigiu a
palavra para além de um cumprimento à la carte, daqueles
assim no género: “está bom, passou bem?”. Mas,
continuando a caminhar na sua nuvem esotérica de pedestal, sem
esperar resposta.
Dizia eu, então, vejam bem que o cagão oportunista há dias estava tão sozinho, tão carente de ser ouvido –por que já ninguém atura as suas descaradas desavergonhices de pendura- que até falou comigo –eu, o tal, o insignificante aos seus olhos- a lamentar a postura do outro, o agora ocupante da cadeira do poder. Dizia-me ele: “veja bem que até foi a minha casa convidar-me para o apoiar! Prometeu-me mundos e fundos, e agora não aprova o meu programa! Já viu? Isto está bem para quem não tem vergonha! Fulano, marido da tal, e mais o tal que fez tal viram os seus desejos satisfeitos. E eu nada! É um sacana! E fui eu apoiar um gajo destes!?! Eu que até dei um salto mortal nas minhas convicções ideológicas?!?”
Dizia eu, então, vejam bem que o cagão oportunista há dias estava tão sozinho, tão carente de ser ouvido –por que já ninguém atura as suas descaradas desavergonhices de pendura- que até falou comigo –eu, o tal, o insignificante aos seus olhos- a lamentar a postura do outro, o agora ocupante da cadeira do poder. Dizia-me ele: “veja bem que até foi a minha casa convidar-me para o apoiar! Prometeu-me mundos e fundos, e agora não aprova o meu programa! Já viu? Isto está bem para quem não tem vergonha! Fulano, marido da tal, e mais o tal que fez tal viram os seus desejos satisfeitos. E eu nada! É um sacana! E fui eu apoiar um gajo destes!?! Eu que até dei um salto mortal nas minhas convicções ideológicas?!?”
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