sexta-feira, 6 de abril de 2018

EDITORIAL: SANTOS DA CASA NÃO FAZEM MILAGRES






Hoje temos de pensar muito para se dar um passo maior que a perna -não quer dizer que não fosse sempre assim, mas noutros tempos, por haver mais dinheiro em circulação e os rendimentos das famílias ser maior, podia-se arriscar.
Na actualidade, quem se aventura sem rede corre o sério risco de cair e ficar paraplégico para sempre.”

Nas instalações da Escola de São Bartolomeu, na próxima terça-feira, pelas 19h00, a convite do Núcleo de Coimbra da Confederação Portuguesa das Micro, Pequenas e Médias Empresas (CPPME), representado por Vitor Carvalho e Arménio Pratas, vão reunir-se os comerciantes da Baixa para debater o presente e o futuro (que é já amanhã) das suas/nossas vidas. De salientar que o secretário-geral da confederação, José Brinquete, vem de Lisboa a Coimbra de propósito para ouvir os profissionais de comércio.
Enquanto comerciante e em nome de todos quantos aqui exercem a sua profissão, se posso escrever assim, começo por agradecer à CPPME este renovado esforço para, conjuntamente com os interessados, se procurarem soluções de âmbito localizado. Claro que, para isto acontecer, é preciso que os mercadores acorram em massa. Quanto maior for a adesão à reunião, maior será a mensagem que chegará à Câmara Municipal de Coimbra, a entidade política e administrativa local que deveria estar mais interessada em apoiar esta classe e, num desprezo escandaloso, nada faz, e ao Governo central, uma vez que a Confederação, enquanto associação nacional, pode levar à Assembleia da República, através de um grupo parlamentar, a gravíssima situação económica/financeira que os comerciantes de Coimbra estão a atravessar.
Para quem, como eu, todos os dias calcorreia estas pedras da calçada, descolando do seu balcão de conforto e falando com um e outro colega, sabe/sente/pressente que a situação é muito preocupante. Digo eu, especulando, é mais grave do que se pensa. E sem entrar em grandes pormenores, porque sei do que escrevo, para muitos o único caminho possível é o encerramento depois de muitos meses de renda ficarem por pagar e outras dívidas por cabimentar. E os fechos estão à vista de todos: em Janeiro encerraram 6 lojas e em Março 7. Neste Abril e Maio já estão comprometidos com vários anúncios que correm ao vento.
Quem, há dias, tomou atenção a uma conferência de Imprensa da DECO, mais que certo, apercebeu-se que, segundo declarações da entidade de defesa de consumidores, 6% dos sobre-endividados nacionais pertencem a pessoas que se meteram em negócios e falharam. Os seus sonhos, legítimos de alcançarem uma vida melhor, pela inexperiência e conjuntura, redundaram em desastre que dificilmente esquecerão. Contrariamente ao que se apregoa, que o crescimento económico veio para ficar, quase a empurrar os jovens para o empresariado, ser empresário hoje só com uma grande dose de loucura. O que perpassa é que a situação do país nunca esteve tão boa para se apostar. Basta abrirmos qualquer revista suplemento de qualquer diário nacional e, pela metamorfose apresentada, ficamos com uma ideia completamente errónea da realidade das cidades. Mesmo sabendo que não vai além de escassos meses, qualquer negócio novo, diferente e original, é apresentado como uma lança em África. Depois, como mostrou a DECO, as tragédias estão ao virar da esquina.
Hoje temos de pensar muito para se dar um passo maior que a perna -não quer dizer que não fosse sempre assim, mas noutros tempos, por haver mais dinheiro em circulação e os rendimentos das famílias serem maior, podia-se arriscar.
Na actualidade, quem se aventura sem rede corre o sério risco de cair e ficar paraplégico para sempre.
Os únicos que ganham sempre, com um salto bem ou mal calculado, são a Autoridade Tributária e o Governo. Não falando do género do investidor do BES, sempre que alguém aplica dinheiro num negócio próprio, seja com aforramento ou crédito, para além de desenvolver a economia, através de impostos directos e indirectos, financeiramente está a contribuir para o Fisco. Por outro lado, para o Governo quanto mais pessoas se meterem em aventuras, sejam de sucesso ou o contrário, melhor. São números a abater no Instituto de Emprego e Formação Profissional.
E estive para aqui a perorar como uma espécie de sermão aos peixes porquê? Porque o futuro é dos jovens. Não são os mais velhos que, na maioria, vão tocar a economia para a frente.
Voltando à reunião que vai acontecer na próxima terça-feira sobre o comércio da Baixa, é precisamente aos jovens que mais interessa ouvir e intervir. No imediato, como meio de obtenção de rendimento, são eles os mais interessados no futuro desta zona.
Como todos sabemos, precisamente pela crise latente, os mais velhos estão a largar os seus comércios e a passarem para os mais novos -e é aqui, nesta passagem que cada um deve tomar atenção onde põe os pés. Não se pense que estou a passar o ónus para quem trabalhou uma vida inteira. Nada disso! Aliás, se há uma classe desclassificada, espezinhada e desrespeitada pelo poder político, acredite-se, é a dos comerciantes. Se assim não fosse, por exemplo, teriam direito a subsídio de desemprego. E não têm! Querem desconsideração maior?
Quem conseguiu poupar alguma coisa ao longo da vida pode ter uma velhice digna. Os que não conseguiram estarão em muito maus lençóis. E com os jovens, aqueles que agora se lançam na vida comercial, podem crer, será ainda muito pior. Porque já sou velho, talvez num arremedo de falsa autoridade, deu-me para avisar.
Vale a pena pensar nisto?

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