Eu nem sei por onde começar mas tenho de denunciar
esta indignidade. O meu Silvano merece uma medalha e, pelos vistos, ninguém
quer saber –para que se entenda melhor, o Silvano é o meu jumento, aquele que
me atura as neuras e carrega comigo quando já ninguém me suporta.
Bem sei que deveria ter dirigido
esta missiva à mais alta magistratura do Estado ou, sei lá, aos órgãos locais
cá do nosso concelho, mas, penso eu, como andam todos tão ocupados em inaugurar
o bule da Joana Vasconcelos, no Portugal dos Pequenitos, não quis estar a
interferir nos discursos do primeiro-ministro, Passos Coelho, nem na
concentração institucional do presidente da Câmara Municipal de Coimbra, Manuel
Machado -que estava a “aproveitar a oportunidade”,
conforme declarou em solilóquio-, nem nos pensamentos da família presidencial
republicana, Maria e Aníbal Cavaco Silva, que apesar de não estarem lá é como
se estivessem –que, aliás, nem percebo como é que, perante uma inauguração tão
excepcional o Chefe de Estado não veio também a Coimbra. Bolas, é uma obra de
arte que, em abstracto, dá à luz em forma de chá. É certo que poderia ser uma
ponte, sei lá um teatro, mas no caso é um bule gigante em ferro forjado. Tendo
em conta que na cidade-berço do ferro martelado não há ninguém a trabalhar na
arte, só por isto mesmo, deveria estar todo o Governo, a presidência da
República e até a Assembleia da República, com a sua presidente e muitos
deputados. Caramba! É uma obra da Joana Vasconcelos! Será que ninguém vê a
imponência majestática da criação? Devia vir mais gente de Lisboa! Não admira,
por isso mesmo, que a Cultura não tenha ministro.
Mas não foi por querer bater no ferro frio que
me levou a escrever esta crónica asnática. O que gostava de chamar a atenção pública
é para a grande iniquidade que o meu Silvano, o meu burro como já perceberam,
está a ser vítima. Já ando há anos para escrever sobre esta injustiça mas, como
se trata de um elemento da minha família, estive sempre a travar para não ser
acusado de prevaricação na ajuda aos meus.
Este ano, como nos anos
anteriores, no Dia de Portugal, cerca de quatro dezenas de portugueses vão ser
condecorados pelo Presidente da República. Se juntarmos os que são agraciados
no Dia da Cidade, em todas as urbes,
qualquer dia já não há português que se preze que não tivesse sido medalhado. É
claro que eu sei que, por este andar e com a crise demográfica, como vão faltar
pessoas, mais tarde ou mais cedo, as instituições vão virar-se para os animais.
E isso é que me chateia! O meu Silvano não é igual a outra besta qualquer.
Tenham paciência! O meu bronco é um sujeito de qualidades ímpares. É solidário
comigo e com quantos precisam de ajuda. Adora crianças –no bom sentido, nada de
confusões. Não é comunista. Se fosse, até se entende que a mais alta figura do
Estado –seguindo o mesmo procedimento do Saramago- nem lhe olhasse para o pelo.
Acontece que eu respondo pelo meu Silvano! Comunista nunca! (até fiz o sinal da
Cruz!) Deus nos livre! Ainda ontem vi, no cinema, o filme “A Criança número 44” –não tem nada a ver com esse que está a
pensar, este, se pudessem, mandavam-no para o meio do oceano sem boia- e fiquei
aterrorizado com o que se passou na ex-URSS, no tempo de Estaline.
Continuando, o meu Silvano não é
empresário mas sabe muito bem que, apesar das palas nos olhos, ninguém o faz
tomar por lorpa. Mas é um grande produtor de essências perfumadas e estrumadas.
As suas cagadas são de mestre. É um cantor de elevados dotes artísticos, quando
urra todo a vizinhança se coloca em sentido. E fica pasmada, arre!
O meu Silvano é um bom cidadão;
tem o registo criminal limpinho e sempre me acompanhou à mesa de sufrágio. E
mais: votou sempre nos que ganham. Ah pois! Não está implicado nas falcatruas
do BPN ou do BES. O meu burro, apesar de liberal, não vai em cantigas do grande
capital. É um grande artista, este meu tolo adorado. Até desenha no chão poeirento
e, se não me engano, até faz versos de fazer chorar quem o ouve com atenção.
Acho que tem queda para a astrofísica. Muitas vezes vou dar com ele a contar as
estrelas. E mais, dizem que os burros não riem? Venham visitar o meu Silvano e
vejam como ele ri, sorri, volta a rir a carroças desbragadas do que se passa
por cá com esta gente a fazer figuras que até dá para chorar de desgosto.
Porque é que não concedem uma insígnia da
Ordem de Mérito ao meu Silvano? Tenho de fazer uma ressalva, não falei com ele
sobre esta minha intenção. Se calhar, estou para aqui a pedir uma comenda para
o animal e, às tantas, ele não aceita “mitos urbanos”, parafraseando Passos
Coelho.
1 comentário:
Amigo
Caralhos me fodam se o bule não ficava bem sobre o tanque na Praça 8 de Maio!
É que há gente que pensa que dois mal dá um bem.
Estes lerdaços chifrados tiram-me do juízo e ele já é tão pouco.
Tenha paciência
E já agora um abraço ao Silvano. É mesmo parecido com o meu.
Álvaro José da Silva Pratas Leitão
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