São
cerca de 15h00 deste Sábado tão igual a outro qualquer penúltimo
dia da semana não fora o caso de a esta hora o termómetro marcar
41º graus Célsius. Na
Rua da Sofia, no passeio onde o Sol castiga todos quantos se
aventuram e evitam a sombra, como se pretendesse uma expiação
perpetrada pelo astro-rei por pecados incontáveis de amor, um homem
de cabelos compridos e prateados, esparramados sobre os ombros,
caminha sozinho. Curvado para a frente, sobre o seu próprio destino,
de mãos cruzadas nas costas, com passo cadenciado de maltrapilho,
com as roupas a desfazerem-se em lágrimas de promessa por
substituição, como sombreado das trevas, parece uma imagem
projectada de “Os Miseráveis”, de Vitor Hugo.
Encontramo-lo
muitas vezes a deambular pelas ruas da cidade. Acerca de si,
narram-se histórias efabuladas. Conta-se que estudou engenharia e é
senhor de grande riqueza ali para os lados dos Campos do Bolão.
Dizem que dá pelo nome de Valdemar e já foi personagem de
entrevista em jornal semanário.
Alheio
à materialização das coisas, ao interesse que move o humano, ao
lucro que faz cair políticos e ordena que partidos entrem em catarse
existencial, se calhar procurando a espiritualidade e renegando a
opulência terrena, o Eremita, o homem sozinho sobre quem
escrevo, como se gozasse com a nossa ambição, a minha, a sua, a tal
avidez que todos aceitamos como natural por fazer andar o mundo, de
rosto compenetrado e escondido de olhar conspícuo e curioso, parece rir de
nós.
Mas
por detrás desta possível encenação teatral que nos parece
legítima e natural não estará uma demência a pedir que as
autoridades competentes se debrucem sobre este caso?
Por quanto mais tempo vamos continuar a olhar a sua decrepitude acentuada sem nada fazer?
Por quanto mais tempo vamos continuar a olhar a sua decrepitude acentuada sem nada fazer?
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